sebentas MTPA 2022

 

AA 2023/24

Plano de Sumários

 

 

UNIDADE 1 método quantitativo e qualitativo

 

1 A ciência da sociedade

3 método qualitativo

4 método quantitativo

5 os informantes

6 os questionários

7 as entrevistas

UNIDADE 2 trabalho de campo

 

8 método de investigação etnográfica

9 teoria e técnica da investigação comparativa

10 métodos de pesquisa do particularismo (Boas)

11 lógica e fundamento da organização social

12 métodos difusionista (Graebner)

UNIDADE 3 método do funcionalismo

 

13 Bronislaw Malinowski

14 os mitos de fundação

15 desenvolvimento do projecto

16 objecto métodos e finalidade do projecto de pesquisa

17 investigação funcionalista

18 novo método etnográfico

19 a neutralidade do pesquisador

UNIDADE 4 metodo do relativismo cultural

 

20 método relativista (Mead)

21 metodo configuracionista (Benedict Ruth)

22 os modelos como paradigmas de analise social

 

 

UNIDADE 5 metodo do estruturalismo funcional

 

23 antropologia social británica

24 Edward Evan Pritchard: funcionalismo estrutural

25 Artur Radcliffe Brown: o método na antropologia

 

 

UNIDADE 6 metodo do estruturalismo

 

26 método etsruturalista (Lévi-Strauss)

27 natureza e cultura

28 as categorias de analise cultural

29 as estruturas

 

UNIDADE 7 método interpretativo

 

30 o círculo hermenêutico 

31 além do sujeito e objecto

32 o ponto de vista do nativo

33 a cultura como texto

34 as estratificações de Geertz

35 o novo método etnográfico de James Clifford

 

UNIDADE 8 método de trabalho de campo

 

36 observar: delimitar o universo 

37 escolher: as amostras

38 participar: os informantes

39 descrever a cultura: etnografia

40 comparar e analisar os dados: etnologia

41 observar e participar: Malinowski

 

BiBLIOGRAFIA

 

RESUMO DO MÉTODO DOS  PRINCIPAIS  SNTROPOLÓGOS

 

 

AUTOR

Trad.

Data

Paradigma / Método  de pesquisa

Campo  d e aplicação / Objecto

Conceitos/ Palavras  chave

Louis-Francoise Jauffret (professor de   ciências da natureza)

 

fr

 

1770-

1850

 

Perspectiva da comparação, estudo comparativo

 

Observar o homem nas suas mudanças

 

observar, diferença, comparação, ciência humana, compreensão dos outros, processo de derrubar os preconceitos

 

Joseph de Maistre

Richard Wathely (bispo Dublino)

 

d

 

 

Filosofia do poder teológico, criacionismo (divino)

 

Teoria da degeneração do selvagem

 

razão do Iluminismo, um acto de arrogância, de degradação do homem, civilização-divino dom, símbolo, pecado

 

Herbert Spencer (sociólogo)

 

br

1820-

1903

Filosofia    sintética,    Evolucionismo    e    progresso, darwinismo social, indução

 

Estudo da sociedade como um organismo

sociedade de contínua adaptação, sociedade-super-organismo, sobrevivência do mais apto, seleção natural, acumulação e continuidade cultural

 

 

John Lubbock (arqueólogo)

 

 

br

 

1834-

1914

 

 

Antropologia prehistórica

 

Funcionalidade Leyll, teoria do paradigma de invariância das leis do desenvolvimento material /cultural

 

 

processos de transformação, arqueológico-etnográfico, medidor de progresso, testemunham o passado

 

 

 

Edward Burnett Tylor

 

 

br

 

1832-

1917

 

Evolucionismo antropológico vitoriano, emergência e desenvolvimento do pensamento racional, antropologia cultural

Teoria tyloriana do animismo, ciência da cultura primitiva, o avanço do conhecimento, processos de retrocesso cultural, religião como aptidão individual

 

 

organização social simples-complexa, povos inferiores-superiores, estádios culturais, cultura e civilização, traços do passado, sobrevivências, sequências de desenvolvimento social

 

 

William Robertson Smith (professor de hebraico)

 

di ebraico)

 

 

br

 

1846-

1894

Mediorientalista antropologia, geografia limitada comparativism (ex e. Pritchard, método comparativo 'escala')

Estudo comparativo das instituições sociais e religiosas, a dimensão social do estudo coletivo da instituição do sacrifício como uma unidade simbólica da sociedade

 

ritos e crenças 'pronto para uso,' identidade política do excesso determinação cultural atividade religiosa-homologia

 

 

 

James George Frazer

 

 

br

 

1854-

1941

 

Perspectiva tyloriana-psicológica do evolucionismo antropológico, método comparativo,

 

 

O ramo dourado, mundo mágico e primitivo, pensamento mágico e religioso (Freud Totem e tabu)

 

 

teoria da transição de pensar mágico, religioso, científico como maturação lenta, idéia de progressivo

 

 

Friedrich Max Muller (professor    de  filosofia comparada)

 

 

d

 

 

1823-

1900

 

Antropologia na base filosófica, metodologia comparativa em fontes escritas, as relações entre linguagem-pensamento

 

teoria do simbolismo religioso, língua como um vetor de idéias historicamente transmitidas,  de conhecimento de linguagem primitiva de etnografia

 

livre pensamento simbólico da linguagem, símbolos, metáforas, eterna aliança profana, a linguagem-pensamento descartado, expressar-refletir linguagem raça., símbolos, filosofia e fisiologia, : expressar o que não é expresso, contrario a tradução, interpretação literal

 

 

 

 

Lewis Henry Morgan

 

 

 

US

 

 

1818-

1883

Empirismo etnológico, evolução de sistemas classificadores da lógica classificatória àquela descritiva, projecto evolucionista com degraus automáticos na escada da evolução, desenvolvimento sequencial

 

organização sócio-política das Tribos hiroquenses, sistemas de relações de parentesco, encadeamento cumulativo  invenções -descobertas

 

 

Terminologia de parentesco, família de línguas, similaridade de linguagem, sistema de relacionamento, sistemas descritivos: consanguíneos: colaterais: sistemas de classificação períodos étnicos, sequência reta selvagem-bárbaro-civilizado, desenvolvimento progressivo,  instituições de    'germes primários de pensamento', a instituição da propriedade privada, carácter do sistema de domínio semânticos

 


 

 

AUTOR

Trad.

Data

Paradigma / Método  de pesquisa

Campo  d e aplicação / Objecto

Conceitos/ Palavras  chave

 

 

 

Franz Boas

 

 

 

US

 

 

 

1858-

1942

Fundador do particularismo histórico ou método histórico, etnologia puramente descritiva , perspectiva empírica - idiográfico, total aversão  à perspectiva nomotética (generalizações teóricas), investigação circunscrita (por exemplo, e. Pritchard, método comparativo em 'escada' reduzida)

 

Organização social e as sociedades secretas dos índios Kwakiutl da costa do Pacífico, análise particularistas única  da cultura

 

 

 

crítica da evolução 'pura'  e da perspectiva causal, preconceitos etnocêntricos, psicologia social, processos de mudança cultural, prática de potlatch, limites do método comparativo em antropologia, dinâmicas reações individuais às pressões culturais, determinismo da língua no pensamento (hipótese de Sapir-Whorf)

 

 

 

Alfred L. Kroeber

 

 

 

US

 

 

1876-

1960

 

Método descritivo, explicação por causas e origens, relevo dos aspectos simbólicos e psicológicos da cultura

 

teoria dos cumes  culturais, teoria do Superorgânico  da cultura,  (analogia com Leslie a. White), autonomia dos processos culturais, imagem super orgânica e sovra individual da cultura

 

 

fusão, fatores simbólico-decorativos, interpenetração, explicação total de tendências parcial   distinção natureza-cultura, relacionamentos de parentesco, psicologia veiculada pela linguagem  crítica de Lévi-Strauss na estrutura como palavra passe isenta de valor heurística

 

 

Robert Lowie

 

US

1883-

1957

 

Descritívo-analitico, estudo dos processos culturais

Cultura e Etnologia, teoria do desenvolvimento cultural global

 

fenômenos culturais, espaço diferencial, descontinuidades  entre biologia e cultura, o conceito de língua indígena como parte integrante da pesquisa de campo

 

 

Clark Wissler

 

US

 

1870-

1947

 

Classificatório-sistematico

Teoria de áreas culturais, definição e distribuição das áreas culturais americanas aborígenes

 

 

relatório de ambiente-cultura, centro de irradiação,  centro cultural (clímax cultural de Kroeber), a área de cronologia (irradiação temporal), traços culturais

 

 

Ruth Benedict

 

US

 

1887-

1948

Endereço da cultura e personalidade, combinando e integrando os traços culturais, modelagem (padronização social), padrões de cultura

 

 

Crenças de espírito guardião entre os índios dos EUA

 

 

configuração cultural, comportamento integrado,  dimensão simbólica da cultura, cultura como algo a mais do que a soma, o modelo-padrão, o mesmo tipo de personalidade

 

 

 

Margaret Mead

 

 

US

 

 

1901-

1978

 

Estudos empíricos com influencia boasiana,  diferentes valores culturais e diferenciação de modelos educacionais,estilo malinowskiano mais do que  boasiano

 

 

Formação da personalidade dos Samoanos, influência da cultura sobre o indivíduo, fins da antropologia coletar dados para agarrar a vida

 

 

processo de socialização, processo de educação, adaptação de valores, sociedade,  determinantes culturais, contexto social, não precisava conhecer o idioma nativop   para o trabalho de campo (em oposição a Boas/Malinowski)

 

 

Emile Durkheim (sociologo)

 

 

fr

 

1858-

1917

 

 

Empírico-positivista

A divisão social do trabalho, as formas elementares da vida religiosa, a natureza do pensamento primitivo

habilidade social ', engenharia social, consciência coletiva, crenças comuns, solidariedade mecânica - consciência coletiva, solidariedade orgânica consciência indivídual, representações fundamentais, poder moral do facto social , coerção sobre os indivíduos, a função social

 

 

Robert Hertz

 

fr

 

1882-

1915

Orientação, concepção de durkheimiana, perspectiva etnográfica, contra o determinismo biológico, mesmo se cai no  Determinismo social

 

Estudo sobre a representação coletiva da morte, a prevalência da mão direita, estudo sobre a polarização religiosa

 

representações coletivas compartilhadas,  processos mentais, contextos sociais, diferenciação, preeminência da mão direita,assimetria orgânica, princípio bipolar universal direita positivo

 

Lucien Levi-Bruhl

 

fr

 

1857-

1939

 

trajetória teórico filosófica, filosófico-Hermenêutica,  modelos sociais  de  disposições mentais

 

 

a morale e a ciência  dos costumes, as funções mentais, natureza do pensamento primitivo

moralidade objetiva, compreensão da diversidade, funções mentais, sistemas primitivos de pensamento, impermeabilidade à experiência,  conceito de pré-lógico, diferença qualitativa,  civilizado-primitivo (por exemplo, inconsciente estrutural de Lévi-Strauss),

 

 

Marcell Mauss

 

fr

 

1872-

1950

 

Perspectiva    durkheimiana    potencializada,    impronta etnocêntrica

 

Ensaio sobre o dom

o princípio da reciprocidade, triplo doar-receber-dar em troca, classificação mental como um reflexão, classificação social, homologia estrutural, fatos sociais totais-polivalentes, morfologia social

 


 

 

AUTOR

Trad.

Data

Paradigma / Método  de pesquisa

Campo  d e aplicação / Objecto

Conceitos/ Palavras  chave

 

Arnold van Gennep

 

fr

1873-

1957

etnológico-folclórico, material Folclórico e tradições

 

 

os rituais de passagem

três fases separação-margem-agregação , similaridade de forma-conexões, similaridade de conteúdo-contextual, transitabilidade, princípio classificatório

 

William Halse Rivers (medico e psicologo)

 

br

1864-

1922

Perspectiva difusionista, método genealógico para coleta de dados,

 

História  da  sociedade  Malesiana,  estudo  do parentesco

centro de difusão, empobrecimento progressivo cultural, povos de cultura inferior, pesquisador Europeu no mesmo plano do nativo 

 

 

Alfred Cort Haddon

 

br

1855-

1940

 

Ótica  multidisciplinar  

 

Expedição ao estreito de Torres, estudo do ambiente 

 

 

 

Charles George Seligman

 

br

1873-

1940

 

 

Pesquisas no Sudão anglo-egipcio

 

 

Robert Ranulph Marrett

 

br

1866-

1943

Antropologia       britanica         post        vitoriana,    anti tradicionalista evolutiva

 

O limiar da religião

animatismo como uma tendência para atribuir uma 'animação', crítico da teoria animista  de Tylor

 

 

 

Arthur Maudice Hocart

 

 

br

 

1883-

1939

 

Perspectiva estereoscopica entre a comparação evolutiva analogica e orgânica da società 

 

 

Estudo sobre anatomia comparativa da sociedade humana 

 

 

'funcionalismo' entendido como linguagem evolutiva das formas culturais, função, evolução, difusão, difusionismo de traços semelhantes com a mesma origem , rito, acto associativo, técnica de preservação, coexistência de acto pragmático e nível simbólico

 

 

 

 

Bronislaw Malinowski

 

 

 

br

 

 

1884-

1942

Método etnográfico da experiência vivida, anti difusionist do chamado hiper-difusionismo de G.E. Smith, W. Perry, defensores da idéia do processo de degeneração a causa do progressivo distanciamento 

 

 

 

Argonautas do Pacifico Ocidental: Ilhas Trobriand

 

Observador participante, camuflagem do individuo; troca ou Kula, cultura e sociedade como complexos relacionados, funcionalidade de uma instituição para manter a coesão global, princípio de reciprocidade explicativo da dinâmica social  

 

 

 

Bronislaw Malinowski

 

 

br

 

 

1884-

1942

 

antropologia social interpretativa, antropologia moderna, método de documentação estatística através  de prova concreta 

 

 

 

Teoria científica da cultura

sociedade e cultura como um conjunto de práticas e comportamentos integrados, da sociedade à cultura, a cultura como aparato instrumental, como resposta humana às necessidades basicas (mantenimento da sociedade), necessidades secundárias  (poder político, organização económica) e nível simbólico que através da linguagem permite a transformação (hipótese de Sapir-Whorf) 

 

 

 

 

 

Alfred  Reginald  Radcliffe- Brown

 

 

 

 

br

 

 

 

 

1881-

1955

 

Antropologia social com base no método indutivo das ciências naturais, pesquisas empírico-analíticas que determinam o funcionamento e transformação das sociedades, análise do funcionamento dos sistemas (relacionamentos homogeneos) e estruturas sociais (relatórios totais) 

 

 

 

 

 

Os ilheus das ilhas Andaman

 

Antropologia social como uma ciência natural da sociedade, o conceito de estrutura social como uma soma de relações interpessoais, irredutibilidade como incomensurabilidade entre ordens de realidade diferentes, estrutura social (relações), processo social (interacções), função social (relação entre estrutura e processo), o estruturalismo como uma rede de relações sociais  permanentemente integradas (metáfora da Tor Eiffel (morfologia), Lévi-Strauss relações sociais materia prima (Anatomia), Geertz teia de significados (química) 

 


 

 

AUTOR

Trad.

Data

Paradigma / Método  de pesquisa

Campo  d e aplicação / Objecto

Conceitos/ Palavras  chave

 

 

 

Alfred  Reginald  Radcliffe- Brown

 

 

 

 

br

 

 

 

1881-

1955

Estrutural-funcionalismo de Radcliffe-Brown reducionismo sociológico (funcionalismo como um processo de coesão da sociedade), estrutural-funcionalismo de Malinowski reducionismo psicológico (funcionalismo como satisfazer uma necessidade), repensar a teoria de durkheimian de totemismo 

 

 

 

 

 

A

 Teoria sociológica do totemismo

 

Princípios estruturais: solidariedade de grupo da linhagem de irmãos (unidade de solidariedade intra-grupo parentes colaterais e lineares) (descendência linear), relação funcional entre terminologia e atitudes sociais, totem, símbolo, atitude ritual precedente o uso, totem  como um símbolo social, porque já foi abordado como um objecto ritual 

 

 

Giuseppe Cocchiara

 

it

1904-

1965

 

Evolucionismo histórico

 

Folclore e tradições, demologia

sobrevivências não como fósseis sociais inertes mas dimensão simbólica altamente significativa, pensamento que ainda acolhe  

 

 

 

 

Ernesto de Martino

 

 

 

it

 

 

1908-

1965

 

Humanismo etnográfico, historicismo filosófico-crociano fenomenológica-existencial, antropologia do negativo, etnocentrismo crítico, auto-crítico  

 

 

 

Naturalismo   e   historicismo   na etnologia,  o mundo mágico

 

impossibilidade de redução da experiência humana para investigação científica, verdadeiro conhecimento exclusivamente histórico, incompatibilidade de pensamento mítico e pensamento racional, conceito de presença como ethos estado ético, o ser no mundo forma e funda a cultura (Heidegger, Dasein), re-discussão continua categorias analíticas, a própria cultura como uma unidade de medida 

 

 

 

Remo Cantoni

 

 

it

 

1912-

1973

 

Antropologia hermenêutico-interpretativa, orientação levibruhliana

 

 

O pensamento dos primitivos

 

filosofia da cultura como um contínuo recomeçar coerência estrutural  do pensamento primitivo, passagem dis-contínua da pseudo-ciência às Ciências (salto e não contínuo) 

 

 

Joseph-Marie de Gerando

 

fr

1772-

1842

Metodologia da Observação, interpretação, comparação 

 

Considerações sobre os métodos a serem usados na observação 

 

 

investigação etnológica, paradigma dominante, sequências de desenvolvimento, questionários 

 

 

A.W. Howitt, L.Fison

 

am

 

Empírica-analítico, descritivo, etnografia científica, técnicas de recolha de dados e análise dos dados 

 

 

tribos australianas, aborígenes australianos (1880)

Etnógrafos por correspondência, informantes  a distância, divisão de trabalho, etnógrafos  de campo e  teóricos

 

A.C. Haddon, W.H.Rivers, C.G.Seligman

 

br

 

Pesquisa etnográfica, pesquisas, investigação centradas numa única população 

 

 

Expedição ao Estrito de Torres, (1898-1899)

Abandono do método comparativo, monografia dedicada, emergência de paradigma funcionalista, sociedade primitiva como segmentada 

 

 

Henry Rowe Schoolcraft

 

br

1793-

1864

 

Recolha de material etnográfico, pesquisa empírica

 

Estudo das culturas indianas  de América

 

Linguística, estudo de campo

 

Marcel Granet

 

fr

1884-

1940

 

trabalho histórico e pesquisa etnográfica

 

Civilização cines

Etnografia francês  dimensão intelectualista, especulativa, proveniência dos estudos etnológicos da filosofia

 

Marcel Griaule

 

fr

 

1898-

1956

Fundador da etnologia africanista francês, etnologia vivida, estudo realizado em profundidade, etnologia como estudo das formas culturais diferentes e distinto

 

Mitologia Dogon, Deus da água,  teoria de escolha do colaborador 'indígena' 

 

Africanistica, prioridade dos Estudos monográficos sobre aqueles  comparativos,  tribo africana como entidade cultural étnica, linguística, olhar ao interior

 

 

 

Sigmund Freud

 

 

au

 

 

1856-

1939

 

 

Antropologia  psicanalítica,  fundador  da  ciência do inconsciente

 

 

Totem e tabu (der. O ramo de ouro de Frazer), O descontentamento da civilização

Complexo de Édipo, projeção indevida, triangulação pai-mãe-filho, incesto, tabu, proibição, ambivalência emocional, neurótico-tabu , tabus impostas, selvagem-tabus tribais, desejo-proibição-remoção-pulsão, relação entre cultura-sentido de culpa, configuração psíquica universal 

 

           


                            1a aula 10 de Outubro 

 

 

Lição nº 1

O MÉTODO NA CIÊNCIA MODERNA

Desde meados do século XIX, grande parte do pensamento europeu tem sido ocupado pelo esforço de aplicar a noção de método desenvolvida pelas ciências naturais ao estudo da realidade humana.

Iluminismo

O interesse cognitivo do homem pelos diversos aspectos de seu ser e agir já estava vivo no Iluminismo, quando foram lançados os alicerces do que, a partir do século XVIII, se denominou ciências humanas e ciências sociais.

Positivismo

Com o positivismo, este projeto é sistematicamente delineado graças à definição normativa do ideal cognitivo da ciência. O critério de demarcação entre conhecimentos que podem ou não ser chamados de científicos está na adoção do método experimental que emergiu da revolução científica do século XVII. A hipótese de um conhecimento positivo sobre o homem não apresenta, em seus primórdios, qualquer autonomia ou problemas. A realidade humana e social é simplesmente uma nova fronteira da razão científica, um novo território de expansão. A única diferença entre as ciências naturais e as humanas é uma variação no grau - não no gênero - da cientificidade e, em todo caso, está destinada a ser absorvida graças à aplicação rigorosa dos padrões apropriados ao estudo da natureza. As ciências sociais são ciências naturais que dizem respeito aos indivíduos em suas relações sociais, vinculadas aos mesmos critérios explicativos e igualmente orientadas para a objetividade.

Revolução industrial

No século XIX, os sucessos materiais da ciência e as transformações sociais produzidas por suas realizações parecem incontestáveis. O progresso técnico torna-se o principal critério para confirmar as teorias. Isso lançou as bases para uma legitimação incondicional do conhecimento científico, cujo ponto de vista factual sobre o mundo absorve todas as outras configurações possíveis de significado. A gênese naturalística do estudo sobre o homem é consistente com o impressionante trabalho de abstração e idealização do 'mundo da vida' (Lebenswelt) que Husserl (1954: 48) colocou na origem da ciência no Ocidente. Com efeito, constitui a sua expressão mais completa e radical.

A construção do modelo hipotético-experimental requer uma redução e seleção da experiência perceptiva, em si multiforme, imprecisa e complexa, para o que pode ser tratado racionalmente.

Galileo

Galileo Galilei exige que o cientista se concentre nos aspectos quantificáveis dos fenômenos, os únicos que podem ser medidos com a ajuda de instrumentos especiais. A função de controlar e classificar os dados observacionais havia sido antecipada pelo método indutivo e pelas 'tabelas' de Bacon (tabula presetrtiae, absentiae in proximidades, graduum), embora sem o rigor do dispositivo matemático galileu. Essas ferramentas terão grande influência na antropologia, tanto na versão comparativa tyloriana de “cotações estatísticas” e “variações concomitantes”, e na “documentação estatística por prova concreta” de Malinowski . Em ambos os casos, a possibilidade de formalização indica relevância científica.

No Saggiatore (1623), Galilei sanciona a famosa distinção entre propriedades primárias e qualidades secundárias das substâncias, que Locke mais tarde chamará de objetivas e subjetivas. As características matemático-mecânicas (figura, tamanho, número, posição no tempo e no espaço) são propriedades reais, inerentes à estrutura dos corpos e indispensáveis ​​à sua pensabilidade. Estes últimos (cor, sabor, cheiro) não têm subsistência própria, mas são o efeito da interação entre as propriedades reais e o aparelho perceptivo do homem. Essa divisão, que remonta à gnoseologia e à ontologia mecanicista de Demócrito, é parte integrante do projeto moderno de desantropomorfização da natureza. Tendo se tornado habitual na prática científica, gerou a equação entre a realidade científica e a realidade tout court, enraizada no senso comum apesar do caráter anti-intuitivo das teorias científica. O que era um efeito torna-se causa: as propriedades matemáticas não são quantificáveis porque são reais, mas são reais porque são quantificáveis. A prescrição de Galileu, 'um gênio que descobre e ao mesmo tempo esconde' (Husserl, 1954, p. 81), marca o destino das ciências humanas pelo menos até a crise da física clássica.

Newton

Da mesma forma, Newton distingue propriedades 'absolutas e relativas, verdadeiras e aparentes, matemáticas e vulgares' nos corpos (Newton, 1687, p. 101). Ele especifica que a ciência pode e deve lidar exclusivamente com o primeiro, porque o último tem alguma relevância apenas 'nos assuntos humanos'. Essa alusão polémica, uma das primeiras, à suposta inferioridade da cultura humanística, é uma hipoteca da qual a vulgata científica ainda luta para se livrar. Definir as propriedades sensíveis como 'aparentes', isto é, ilusórias, sugere que a 'verdadeira' realidade se encontra inteiramente e apenas no primeiro campo, o domínio de determinado conhecimento. Movendo-se para as ciências sociais na época de seu estabelecimento, essa abordagem deu origem ao paradoxo despercebido pelo qual o próprio 'humano' é programaticamente excluído como uma área de análise.

Des-historicização dos critérios de conhecimento

A des-historicização dos critérios de conhecimento é um ingrediente fundamental da reflexão filosófica da modernidade: da crítica baconiana da idola, à dúvida cartesiana, às regras espinosianas para a emendatio ingenii, à crítica kantiana, a modernidade constrói um conhecimento trans-histórico por um intelecto 'puro'. A universalidade do método equilibra a variedade de intelectos e condições iniciais. As polêmicas de Bacon e Descartes contra a tradição aristotélico-escolástica rectificam a 'nova lógica' não só a partir dos erros do passado, mas a partir do princípio da autoridade em geral, isto é, da herança histórica e cultural do pensamento. A radicalidade da dúvida cartesiana (hiperbólica) contrasta com a descoberta de um critério de verdade igualmente absoluto.


Descartes

Encontrado na autoevidência existencial do cogito, este fundamento, garantido e oportuno, permanece e pode permanecer sem mundo. Só a demonstração (virtuosa) da existência de Deus, que põe em causa a hipótese do 'génio enganador', permite recuperar a experiência dos sentidos e dos corpos. No entanto, a realidade re-descoberta não tem nada do mundo percebido. É antes a ideia clara e distinta do mundo conforme concebido pela mente e objectivado por ela, espaço puro, res extensa-res cogitans.

A natureza da matéria, ou do corpo em geral, não consiste nisto, que é uma coisa dura ou pesada ou colorida ou que toca os nossos sentidos de alguma outra forma, mas apenas nisso, que é uma substância estendida em comprimento. e largura e profundidade [...]. Sua natureza consiste apenas nisto: que é uma substância que tem extensão (Descartes , 1644, p. 73)

O dualismo cartesiano rompe a solidariedade milenar entre o homem e a natureza, certificando a certidão de nascimento contemporânea do sujeito moderno e o conceito moderno de natureza, ambos incomensuráveis ​​ao passado.

Ao contrário de Platão, para Descartes e com ele todos os filósofos modernos, tanto do lado racionalista quanto do empirista, a ideia tem um caráter formal. Não é o ser que se manifesta ao pensamento em sua perfeição eterna, mas o conteúdo mental e a representação. o que o sujeito cognoscente concebe como algo colocado e oposto a si mesmo.

Nesse sentido, Heidegger fala de 'um jogo recíproco necessário de subjetivismo / objetivismo' (Heidegger, 1950, p. 85). É o mesmo processo pelo qual o mundo se resolve em imagem, isto é, 'fixo' em sua totalidade como objeto de conhecimento, enquanto o homem se torna Sujeito, ser pensante e critério de verdade de representar. Nesse quadro, a objetificação representativa pode se desdobrar em uma série virtualmente ilimitada de áreas e sempre implicará em uma decisão metodológica sobre o que pode ser válido como objeto.

As Meditações Metafísicas de Descartes (1641) oferecem uma base epistemológica e metafísica para o mecanismo de Galileu e definem o esquema conceitual da ciência moderna. Eles universalizam a matemática como um instrumento de conhecimento: tà mathémata ou 'o que o homem sabe de antemão' (Heidegger, 1950, p. 74). Por outro lado, a teoria fixa as condições segundo as quais um fenômeno pode ser seguido (deduzido) na necessidade de seu desenvolvimento e, portanto, controlado antecipadamente com o cálculo. Por outro lado, para ser válido como fenômeno natural, o objeto deve estar apto a se enquadrar nos padrões quantitativos pré-estabelecidos. Os dados recolhidos constituem o material de apoio à hipotética indução das leis, das quais representam casos particulares indiferenciados. Da mesma forma, na verificação experimental, os fatos não falam por si, mas correspondem ao questionamento do cientista.

 

OS QUESTIONÁRIOS

No decorrer da modernidade, também em relação à especialização progressiva dos campos disciplinares, os estudiosos ora privilegiarão a perspectiva indutiva-empirista de Bacon , ora o modelo matemático-dedutivo de Descartes, ou os combinarão como os grandes cientistas Galilei e Newton.

Em todos os casos, o paradigma da ciência moderna assenta em pressupostos filosóficos precisos, relativos tanto ao conceito de natureza como à forma de conhecimento, que passam para as ciências sociais com o mesmo automatismo dos seus métodos. Isso se aplica, em parte, à metáfora do universo-máquina. A realidade é matéria em movimento. A estrutura e as transformações dos corpos são ilustradas, respectivamente, pelas leis da estática e da dinâmica. No século XVII, o domínio indiscutível dos modelos descritivo-explicativos da matemática e da física encorajou a 'mecanização do mundo', que encontrou em Descartes um de seus mais convictos defensores. Garantido o estranhamento dos res cogitares aos princípios da matéria estendida, o 'filósofo sistemático' pode estender o modelo mecanicista muito além das fronteiras estabelecidas pelo 'filósofo natural' Galileu. A famosa teoria dos animais-máquinas, da qual o corpo humano é um caso particular, teria sido ousada demais para o cientista pisano que, de fato, postulou a 'retirada do animal', isto é, do corpo sensível do homem, para garantir a realidade objetiva das propriedades essenciais (Galilei, 1623). Por outro lado, para Descartes, sensações, percepções e emoções são todos e apenas res cogitans de, cujo grau de evidência é inversamente proporcional ao vínculo com o corpo.

A naturalização do homem é o complemento necessário à desantropomorfização da natureza. A solução cartesiana tem pouca sorte diante da evolução das ciências da vida entre os séculos XVIII e XIX, quando o modelo explicativo do organismo, difundido na Antiguidade e particularmente vivo no Renascimento, voltou à moda ao lado da máquina. No entanto, o uso moderno da metáfora está subordinado a uma epistemologia empirista anti-finalista e anti-essencialista. A abolição da alma - que Descartes já concebia como mente - torna o corpo vivo a única entidade necessária para explicar as peculiaridades do humano. Por sua vez, a ideia de explicação está ligada a uma reformulação capital do conceito de causa que, desde o início imanente aos fenómenos, torna-se uma relação necessária entre os acontecimentos, ou seja, o direito. A ideia de regularidade ”e, portanto, de“ ordem ”é intrínseca ao conceito moderno de natureza, seja ela orgânica ou inanimada. Explicar não significa dar a razão de ser dos fenômenos, mas compreender as condições de sua ocorrência. É a eficácia generativa e eficiente que conota causalidade no sentido moderno, aquela que melhor se presta a uma interpretação matemática da realidade, funcional para o desdobramento do domínio humano sobre a natureza: 'ciência, de onde predição, predição, de onde está a ação' a conclusão icastica de Comte . No entanto, Hume já havia observado, nada garante que o elo lógico entre causa e efeito seja, por isso mesmo, um elo físico objetivo. Nada além do postulado metafísico (teológico ou psicológico) da uniformidade da natureza.

UMA CIÊNCIA NATURAL DA SOCIEDADE

O valor predicativo e os potenciais operacionais do método experimental prenunciaram, durante o século XIX, o fundamento metafísico do empreendimento científico em favor da evidência autocongratulatória de seus triunfos práticos. O domínio sobre a natureza previsto por Bacon não parece longe de ser alcançado e é prefigurado como um resultado necessário. Com o positivismo, a confiança na legalidade da natureza se estende à história e assume a forma da inevitabilidade do progresso. Auguste Comte foi, ao mesmo tempo, um dos mais convictos defensores da ideia de progresso, o teórico do positivismo e o fundador da sociologia. Diante de uma imensa erudição histórica e de um autêntico fascínio pelas disciplinas matemáticas em que era especialista, Comte interpreta a história como a história da ciência. Ele identifica nas conquistas do conhecimento de sua época o ápice da evolução da humanidade. A ciência não é um produto da história, mas o princípio de seu desenvolvimento, o motor da mudança, o próprio significado do devir. O projeto comtiano de reorganização enciclopédica dos saberes expostos em suas obras mais conhecidas (Corso diilosofia positivo, 1830-1842 e Discurso sobre o espírito positivo, 1844) baseia-se, em última análise, em uma filosofia da história, articulada na lei das três etapas.

De acordo com a filosofia positiva de Karl Lowith (1949), juntamente com as outras filosofias históricas mais importantes do século 19 - a teoria hegeliana do Espírito, o materialismo dialético do

Marx - representa a versão secularizada da escatologia judaico-cristã, a reedição moderna da “história da salvação”.

Para substituir o absolutismo teológico pelo relativismo científico, ele [Comte] foi forçado a colocar a própria relatividade como um princípio absoluto, unificando todos os fenômenos por meio da única e suprema lei do desenvolvimento progressivo. O conceito fundamental de um progresso temporal em direção a um fim futuro reflete a derivação da filosofia positiva da interpretação teológica da história como o devir da salvação ocorrendo no futuro. (Ibidem, p. 91)

Positivismo

Que o progresso seja um princípio imanente no curso dos acontecimentos, amparado por evidências factuais, não afeta sua profundidade meta-empírica, além de claramente etnocêntrica. O desenvolvimento histórico da humanidade não é de fato vagamente universal, mas tem seu ponto de partida unitário e determinado na 'raça branca' do Ocidente cristão. Como Lowith argumenta, 'apenas a civilização ocidental é dinâmica, progressiva e universal em sua missão' (ibidem, p. 90). O acontecimento capital da história não é mais o cristianismo, mas o advento do conhecimento positivo, do qual Comte oferece uma sistematização completa. 'Positivo' vem do latim positum, particípio passado do verbo ponete, que significa literalmente 'o que é colocado', ou seja, dado, efetivo, certo, concreto, real. Nessa perspectiva, a racionalidade científica e o método experimental são elevados à racionalidade universal: não há outra razão válida, nem qualquer outra racionalidade possível. A certeza do resultado define retroativamente a natureza do conhecimento. Todo conhecimento inadequado a esta norma não pode ser definido como tal.

A conhecida exclusão da psicologia da categoria do conhecimento positivo se deve, de fato, ao caráter híbrido de seu método e à inconsistência de seu conteúdo. O estudo objetivo do sujeito individual é impossível, uma vez que o espírito humano pode observar diretamente todos os fenómenos, exceto os seus próprios (Comte, 1830-1842). Melhor banir a psicologia das ciências do que violar a separação entre observador e observado. O positivismo também exclui o uso de entidades explicativas que são, em princípio, inatingíveis da explicação factual.

Se não houver 'factos psíquicos', haverá, em vez disso, os 'fatos sociais', o objeto de nova ciência empírica da qual acredita-se que Comte seja o fundador.

Física social

A sociologia inaugura o estudo positivo da sociedade como uma esfera autônoma, mas qualitativamente homogênea, com fenómenos naturais, igualmente atribuíveis a leis universais de valor preditivo. Para marcar a continuidade metodológica da nova disciplina com as ciências naturais, Comte utiliza o neologismo “física social”.

Porém, do ponto de vista lógico, metodológico e histórico, a ciência mais próxima da sociologia não é a mecânica, mas a biologia, que estuda os seres vivos e, portanto, apresenta um maior grau de complexidade. A proximidade entre a sociologia e a biologia no topo do sistema comtiano evidencia a mesma tendência de unificação típica da física, que busca explicar economicamente o maior número de fenómenos com o menor número possível de leis fundamentais. Também atesta o abandono do mecanismo e a rejeição do reducionismo. O modelo organicista é considerado mais adequado para dar conta das peculiaridades dos viventes. Os seres humanos são sistemas biológicos como qualquer outro. Sua extraordinária complexidade justifica a existência de uma disciplina autônoma capaz de compreendê-los. Ao contrário das ciências inorgânicas, a biologia e a sociologia passam do complexo ao simples, do todo à parte, da sociedade ao indivíduo.

Comte aplica a distinção fundamental entre estático e dinâmico à sociologia. A estática social estuda as leis da organização social, suas estruturas invariáveis. Dentre estes, o conceito de consenso marca a analogia entre o homem e outros seres vivos. Segundo Comte, existe uma 'ordem espontânea' que mantém as partes do sistema social em acordo e as faz contribuir para o equilíbrio do todo. Harmonia 'evidente', visto que a sociabilidade é considerada um fato natural e não efeito de um artifício contratual. Nesse ponto, que envolve as consequências mais especificamente políticas da sociologia, a relação entre a estática e a dinâmica social é muito próxima. A realidade social não é apenas ordenada, mas também orientada para uma organização cada vez mais racional, eficaz e duradoura. Com isso, o otimismo progressista de Comte se junta a outra noção norteadora da segunda metade do século XIX: a ideia de evolução.

Antropologia

Por razões cronológicas, a antropologia não tem lugar na enciclopédie comtiana. Idealmente, teria sido um desdobramento da dinâmica social. Ao se estabelecer como disciplina autônoma, contribuirá para o mesmo objetivo de indicar a “lei fundamental do desenvolvimento da sociedade humana”. O entrelaçamento ambíguo entre a leitura darwiniana, rigorosamente naturalística, do conceito de evolução e a versão especulativa oferecida por Herbert Spencer marcará os primórdios da ciência antropológica ao orientar seus objetivos e métodos. O modelo epistemológico é aquele traçado por Comte para a sociologia. A homogeneidade entre sujeito e objeto, ambos pertencentes à realidade humana, não afeta a modalidade objectificadora da abordagem, a separação entre observador e observado, a neutralidade da operação observacional. Os factos culturais são dados empíricos encontrados no mundo, acessíveis à observação direta e passíveis de formalização. O momento teórico da questão explicativa, em sua autonomia do plano factual, orienta a seleção dos dados e prepara a verificação das hipóteses.

A diferença entre as ciências sociais e naturais, se não diz respeito aos fins do conhecimento, porém, diz respeito aos instrumentos mais adequados para alcançá-los. No esquema de Comte, observação e experimento são mais adequados às 'ciências dos corpos brutos' (astronomia, física e química), enquanto a sociologia favorece os métodos das 'ciências dos corpos organizados' (os vários ramos da fisiologia), ou seja, comparação e historicização. Na antropologia, a ancestralidade naturalística dos métodos de pesquisa será ainda mais marcada, uma vez que nela, mais do que na sociologia, flui a herança substancial da história natural do século XVIII, da qual a antropologia física já havia emergido como um setor autónomo de investigação.

Descrição comparativa

Apesar do caráter unitário, coerente e fortemente prescritivo da epistemologia positivista, as implicações metodológicas que foram extraídas dela parecem bastante diferenciadas. A dimensão racional-formal, o sistema hipotético-dedutivo, a interpretação quantitativa do mundo continuam a refletir a indiscutível supremacia das ciências físico-matemáticas como paradigmas do conhecimento. Porém, em áreas como a história natural, a medicina, a sociologia e a própria antropologia, a influência do método baconiano foi igualmente contundente, apesar de suas limitações históricas em relação ao de Galileu. Precisão taxonômica e a classificação, a gradualidade e sistematização da generalização, a qualificação dos fenómenos por meio da descrição comparativa - que os identifica pela diferença e não na e a classificação, a natureza gradual e sistemática da generalização, a qualificação dos fenômenos por meio da descrição comparativa - que os identifica pela diferença e não a partir da uniformidade abstrata - mostrou-se mais útil quando a atenção estava voltada para as particularidades. O próprio Charles Darwin declarou que havia conduzido sua pesquisa escrupulosamente seguindo os ditames de Bacon.

Essa oscilação é significativamente evidente na antropologia. A perspectiva evolucionária inicial deu mais ênfase ao momento sistemático e generalizante, independentemente da forma como os dados foram coletados. Ao contrário, a etnografia moderna, com cunho malinowskiano, abordou as questões metodológicas relacionadas às etapas iniciais da pesquisa. A problematização 'de baixo' transformou radicalmente as ambições nomotéticas do evolucionismo.

O MODELO EVOLUCIONISTA

A nova ciência das sociedades primitivas é elaborada no clima positivista do evolucionismo. A teoria da evolução fornece um poderoso esquema sintético para organizar os dados coletados. A metáfora biológica e orgânica sobre os estágios de desenvolvimento das sociedades, das estruturas simples às complexas e, portanto, o conceito de estrutura constituem um recipiente útil para organizar eficazmente os dados coletados, extrapolados de seu contexto e colocados ao longo de uma escala de desenvolvimento unilinear.

Darwin

Os argumentos darwinianos tiveram um enorme impacto nas ciências sociais em formação, em particular na antropologia. Charles Darwin retomou os pressupostos lamarckianos da modificação dos organismos vivos por meio da adaptação ao meio ambiente e da herança de caracteres adquiridos, dando-lhes uma base experimental. Ele interpretou a variedade de espécies vegetais e animais como o efeito de mecanismos seletivos de origem biológica, como a aleatoriedade da variação genética e a sobrevivência do mais apto na luta pela vida. Ao serem traduzidos para a realidade humana, entretanto, esses princípios perderam sua conotação naturalista original para adquirir valores ideológicos e políticos alheios ao pensamento de seu criador. O poder explicativo da teoria da evolução justificou sua extensão ao critério de ordenação da vida em geral. O status meta-histórico e metaempírico dessa interpretação era totalmente estranho ao espírito do darwinismo. A teoria de Darwin é uma teoria biológica, expressão de uma abordagem naturalista, na qual o termo “evolução” tem uma conotação neutra, significando apenas “transformação”. A própria sobrevivência seletiva é limitada à capacidade de um organismo de acomodar mudanças em seu ambiente vital específico. Não representa uma melhoria em um sentido absoluto. O processo evolutivo não se desenrola teleologicamente. É um mecanismo natural e casual, afinalístico.

Spencer

O evolucionismo de Herbert Spencer, ao contrário, forneceu uma ampla interpretação do darwinismo em uma chave cósmica, uma doutrina filosófica sistemática resultante da sobreposição entre o conceito biológico de evolução e o conceito sociológico de progresso. Spencer concebe o estudo da sociedade como um campo do conhecimento no qual atuam as mesmas leis que determinam o funcionamento e o desenvolvimento de cada esfera da natureza. Ele acredita que os mecanismos da evolução biológica e social humana seguem os mesmos processos identificados por Darwin nas espécies de animais domesticados. Transpostos no plano sociológico, os princípios da diferenciação progressiva, da sobrevivência do mais apto, da seleção natural levam-no a identificar seu objeto de estudo, a sociedade, em termos de 'superorgânico'. Ele aplica o darwinismo indutivamente à classificação de todos os sistemas políticos conhecidos, que são, portanto, ordenados hierarquicamente em cinco estágios evolutivos. O degrau mais baixo é representado por sociedades simples sem nenhum líder; a segunda fase é composta por empresas diretas com liderança permanente; a terceira por aqueles compostos por uma hierarquia de líderes; seguir os estados políticos e, finalmente, as sociedades modernas (Spencer, 1862).

Revolução cultural

A associação muitas vezes confusa entre a teoria darwiniana, o evolucionismo spenceriano e a inevitabilidade do progresso penetrou profundamente na mentalidade da época, levando a uma autêntica revolução cultural. Como nota Fabietti (2011), a extraordinária fortuna da ideia de progresso no século XIX deriva de seu caráter sintético, “que expressava simultaneamente as ideias de continuidade cumulativa e cultural”. Na era da revolução industrial, a expansão dos mercados e a ascensão da burguesia, a mudança nas condições de vida das classes ricas, repentina e evidente como nunca antes, deu maior visibilidade à ideia de aumento do que àquela. de herança. O termo pró-gredir - que literalmente significa percorrer degraus. Na era da revolução industrial, a expansão dos mercados e a ascensão da burguesia, a mudança nas condições de vida das classes ricas, repentina e evidente como nunca antes, deu maior visibilidade à ideia de aumento do que àquela. de herança. O termo pró-gredire - que literalmente significa “avançar” - foi carregado com nuances de melhoria. Esta tradução é muito clara na formulação comtiana e representa a primeira violação sensacionalista da distinção entre fatos e valores sancionados pelo espírito positivo.

Fases da humanidade

A noção de evolução tem uma matriz naturalística também em Comte, já que a sociologia é o desenvolvimento necessário da biologia. A influência do Iluminismo o levou, entretanto, a isolar mais seletivamente o motor da mudança histórica no elemento intelectual, o que por sua vez ocasionou uma mudança de cunho social. A humanidade está invariavelmente destinada a passar por três formas peculiares de inteligência: a fase teológica, considerada a infância da humanidade e marcada pela crença em seres sobrenaturais; a etapa metafísica, correspondente à adolescência do pensamento, caracterizada pela explicação dos fenômenos com o auxílio de conceitos filosóficos abstratos; enfim, a fase positiva, época de plena maturidade intelectual, marcada pelo triunfo das ciências. A progressão no plano social é construída por Comte traçando a história do Ocidente europeu: uma etapa militar, que evoca formas medievais de beligerância, é seguida pela etapa legal, concebida no modelo dos estados absolutos do ancien régime francês. , até na fase industrial, a expressão máxima do progresso humano. O discurso sobre as fases pré-científicas do conhecimento não se entrega ao maniqueísmo iluminista, que estigmatiza qualquer explicação não racional como superstição. Cada momento é uma condição geradora para um maior desenvolvimento. Este julgamento evidencia um autêntico respeito pelo passado, mas também a certeza da concretização do objetivo.

Sociologia

A sociologia é o auge do pensamento e da história humanos. Por um lado, a nova disciplina expressa plenamente o estágio positivo> do espírito humano, compartilhando a mesma estrutura epistemológica rigorosa com a matemática, a astronomia e as ciências físicas e biológicas, longe dos erros especulativos da metafísica. Por outro lado, representa a forma de conhecimento absolutamente mais elevada e mais importante. O motivo iluminista da destinação social do conhecimento faz da sociologia uma ciência política, que teria fornecido as ferramentas não apenas para analisar cientificamente as sociedades industriais, mas, sobretudo, para direcionar suas mudanças futuras no plano político-administrativo. Na turbulência da era pós-revolucionária, o fundamento da física social é 'a maior e mais urgente necessidade', visando favorecer em todos os sentidos o avanço da inteligência, que em todo caso é um resultado certo e necessário (Comte, 1830 -1842).

A dimensão auto-congratulatória do positivismo social e evolucionário tornou sua exploração fácil e imediata. As franjas mais conservadoras da burguesia européia e americana legitimaram 'cientificamente' o liberalismo econômico por meio do chamado darwinismo social de Sumner (1907). Da mesma forma, a idealização da sociedade vitoriana como o auge do progresso humano endossava uma conotação defeituosa de diferença em termos de 'inferioridade' e 'superioridade'. Legitimava o domínio do Reino Unido e justificava ideologicamente o projeto colonialista que visava facilitar o caminho das sociedades deixadas para trás na ascensão à civilização.

A antropologia é totalmente parte do quadro epistemológico delineado pelas teorias evolutivas de vários estágios de Comte e Spencer, perseguindo um objetivo científico que é complementar em muitos aspectos ao da sociologia. Numa espécie de divisão do trabalho que inicialmente marcou a identidade das duas disciplinas, uma se concentra na análise das sociedades industriais ocidentais, enquanto a outra se concentra nas chamadas 'primitivas'. O uso do conceito de 'primitivo' para designar o sujeito da disciplina expressa de maneira muito eficaz a importância ideológica do evolucionismo. Populações espacialmente distantes do epicentro da civilização humana, o Ocidente europeu, também são relegadas ao longo do tempo e 'fixadas' nos estágios mais baixos do processo de desenvolvimento. O alegado atraso a nível técnico, económico e social é eleito a quintessência de uma inferioridade cultural e espiritual. Embora a própria ideia de evolução contenha uma referência à história, a presunção de haver atingido o estágio final do progresso humano também leva os povos 'exóticos' a um estado de êxtase. Os 'selvagens' estudados pelos antropólogos são interpretados como representantes contemporâneos da pré-história da humanidade. O documento etnográfico é equiparado ao achado arqueológico.

Esse uso ideológico e etnocêntrico da categoria de tempo está enraizado na visão universal e abstrata da episteme ocidental. É sintomático que a primeira tentativa de historicizar a ciência, isto é, a enciclopédia comtiana, seja feita contra o pano de fundo a-histórico da lei das três etapas. Como a historiografia coeva, a etnografia se constitui em um processo de distanciamento temporal e espacial, funcional à construção de seu próprio objeto específico de investigação (o passado, o primitivo, o exótico) e viabilizado pela escrita (De Certeau, 1975; 1985 ) A descrição da diferença cultural pelo uso do presente etnográfico - a estratégia discursiva posteriormente consagrada pelo funcionalismo - é o emblema da uryalocronia (Fabian, 1983) inscrito no projeto antropológico desde o início. A regressão aos primórdios do processo evolutivo ^ o congelamento do “tempo dos Outros”, ou melhor, dos seus sistemas sociais, são duas expressões da mesma recusa da coevidade entre observador e observado. Se essa omissão não pode ser pensada como tal pelos evolucionistas, o funcionalismo, em vez disso, a reproduz etnograficamente, como uma versão disciplinar da separação entre sujeito e objeto própria da ciência. Freqüentemente contrastado com o evolucionismo por sua negação da história, o funcionalismo fornece, antes, a confirmação teórica, 'do campo', da natureza estática dos povos primitivos.

A perspectiva evolucionária contribuiu para a naturalização do tempo histórico, libertando-o das hipotecas teológicas do criacionismo e degeneracionismo. O fixismo das espécies vivas, por um lado, e o dogma do pecado original, por outro, eram incompatíveis com a ideia de desenvolvimento, especialmente se atribuído apenas às habilidades humanas. O atraso dos povos primitivos era prova disso. Se a teoria darwiniana teve uma recepção mista devido às suas ousadas implicações antropocêntricas, a ideia de um progresso cultural e social do homem estava presente desde o século XVI e entrou na mentalidade comum com o Iluminismo. A interpretação secular da história universal como uma passagem de um estado selvagem original para a barbárie e desta para a civilização foi apoiada pela fé na racionalidade científica e desafiada contra o obscurantismo da Igreja Católica e o ancien régime. A autonomia da razão garantiu a priori, de forma universal e necessária, a fuga do homem do estado de minoria intelectual, moral e institucional em que viveu durante séculos. Na segunda metade do século XIX, quando o alerta kantiano realmente desdobra seu poder afirmativo, a teoria da evolução está em posição de integrar as especulações do século XVIII em um modelo sintético que expõe de forma coerente e unitária as passagens estaduais que culminam na civilização . Uma hipótese decididamente solidária com a auto-representação das mais poderosas nações europeias. A dotação universal da 'luz da razão' traduz-se na fórmula mais rigorosa da unidade psíquica da humanidade, que diferencia no grau, mas não na posse, as faculdades intelectuais da espécie. Esse postulado é a premissa teórica que torna possível estudar as sociedades humanas em termos científicos. Nesse contexto, o termo evolução também passa a significar pluralidade cultural.

Se todos os povos podem ser reconhecidos como produtores de cultura, a grande variedade existente entre os grupos sociais depende do nível de desenvolvimento psíquico alcançado. Em correspondência com o modelo individual, as sociedades menos desenvolvidas são consideradas a infância da humanidade; os ocidentais, a expressão plena da idade adulta para a qual todos tendem necessariamente. Essa significativa antecipação teórica substitui as tendências racistas, que vêem na selva apenas o emblema da degeneração do homem sem a graça divina, a emocionante reconstrução do processo global da cultura.

INFORMADORES REMOTOS

A separação entre teoria e dados, por um lado, fatos e valores, por outro, inerente à abordagem empírica, é elevada pelo positivismo à autoridade reguladora suprema. Supõe-se que o observador reflete fiel e diretamente a realidade. O pesquisador pode ser chamado a verificar uma teoria pré-existente ou a formular uma nova, mas sempre a partir da suposta objetividade irrefutável dos dados. No caso da antropologia, essa abordagem produziu um claro contraste entre o momento simplesmente descritivo da pesquisa, a etnografia, e o conhecimento teórico de ordem superior, epistemologicamente denso e complexo produzido pela antropologia. Muitos pais fundadores da disciplina insistiram fortemente na descontinuidade radical entre essas duas formas de conhecimento. A pesquisa antropológica é concebida como um movimento do particular ao geral, a partir de dois momentos independentes e ordenados hierarquicamente. Em primeiro lugar, o momento ideográfico individualizante, tendo a etnografia como fase de recolha e análise de materiais. Posteriormente, o momento científico comparativo, nomotético e generalizante. O trabalho de campo assume as mesmas funções que os experimentos de laboratório em química ou física, constituindo a base factual e observacional da antropologia científica. Como reservatório de dados de informação, antecede as elaborações teóricas. Na fase de verificação, oferece-lhes uma confirmação experimental. Essa perspectiva centra-se no resultado e não no processo de pesquisa, considerado epistemológica e metodologicamente não problemático. A questão surge apenas no nível da teoria e se refere a um ideal denotativo referencial e uma visão pictográfica da linguagem.

A separação entre etnografia e antropologia se expressa de forma mais clara no final do século XIX, por meio de uma diferenciação precisa de papéis e tarefas entre colecionadores-observadores e especialistas teóricos. Por um lado, viajantes, exploradores, missionários, administradores coloniais, comerciantes fornecem informações em primeira mão, seguindo as indicações dadas em questionários especiais, a instituições antropológicas como a Sociedade Etnológica e o Instituto Real de Antropologia de Londres, e a Société Ethno- logique de Paris. Por outro lado, um pequeno número de profissionais, em organizações semelhantes, processa informações em vários tipos de publicações. A divisão do trabalho entre colecionadores e teóricos foi institucionalizada pela figura  correspondente de revistas especializadas, como Man, órgão, fundado em 1900, do Royal Anthropological Institute.

A criação desses importantes centros de pesquisa certamente deu um forte impulso à pesquisa na área, influenciando profundamente suas modalidades. Os chamados 'correspondentes' não precisavam de nenhuma formação teórica prévia.

0 puramente metodológico. Acreditava-se que a subjetividade era garantida pela neutralidade do observador e pela ausência de preconceitos. Um exemplo emblemático é uma carta de Walter Spencer dirigida a James Frazer, talvez a combinação mais representativa desta fase de divisão do trabalho. Nele - como lembrado por Marett e Penniman (1932) - Spencer ilustra o conselho para sua assistente Gillen: 'Eu enviei a ele um número infinito de perguntas e coisas para procurar, e por acordo mútuo ele não deve ler o trabalho de ninguém em visar manter-se o mais livre possível de teorias ”(ibidem, p. 10).

Walter Baldwin Spencer, um dos principais 'informantes remotos' da época, foi um naturalista da geração pós-darwiniana. A relevância de sua função está intimamente ligada ao projeto científico promovido pelo museu Pitt Rivers em Oxford, importante instituição britânica dedicada à promoção da pesquisa na área. Seguindo os ditames do pensamento evolucionista, o objetivo do museu era construir um acervo de cultura material que permitisse a evolução de diferentes tipos de objetos, desde suas formas mais primitivas até as contemporâneas. Spencer, professor de biologia em Melbourne, foi aluno do zoólogo Henry Moseley em Oxford, onde estudou

1 Cursos Tylor. Ambos os mestres se envolveram no projeto do museu Pitt Rivers e o próprio Spencer começou a colaborar lá em 1894, quando participou como zoólogo na Expedição Horn no deserto australiano central. Na ocasião, ele começou a coletar material etnográfico sobre os aborígenes australianos e aprofundou seu interesse pela antropologia (Stocking, 1983, p. 78). Durante esta expedição conheceu Francis James Gillen, um magistrado residente na Austrália em contacto com os aborígenes australianos e em particular com os Arunta, com quem formou uma importante e duradoura parceria de investigação. Gillen coletou informações para Spencer que, de Melbourne, enviou-lhe perguntas evolutivas sobre classes de casamento a fim de verificar o trabalho de dois outros 'informantes remotos' importantes, os missionários Lorimer Fison e Alfred Howitt (Marett, Penniman, 1931; Quiggin, 1942; Mendelsohn , 1964; Geison, 1978). Howitt e Fison, ativos na Austrália entre 1872 e 1908 (Mulvanian, 1971; Walker, 1971), são o outro exemplo mais significativo do papel dos etnógrafos correspondentes. Eles colaboraram não só com Morgan e com Frazer também com Tylor. Para coletar material de primeira mão para enviar a acadêmicos na Europa, Howitt desenvolveu pessoalmente questionários, que mais tarde foram usados ​​por outros colecionadores australianos interessados ​​em aborígines (Taplin, 1879; Curr, 1886). Desta forma, Howitt e Fison adquiriram um conhecimento profundo de alguns grupos aborígenes, o que lhes permitiu produzir um dos primeiros relatos monográficos de duas tribos australianas, Kamilaroi e Rumai, publicado em 1880. Em seus escritos o postulado evolucionista que vê os indígenas como representantes de uma etapa remota da história da humanidade, em cuja sociedade, considerada simples e em perigo de extinção, era possível ler a fase auroral de muitos fenômenos e instituições sociais, inclusive o totemismo (Walker, 1971, pp . 323-329).

Spencer e Gillen, além de trabalharem como informantes, também escreveram algumas obras importantes, se beneficiando de sua frequência aos aborígenes australianos. Estes incluem The Native Tribes of Central Australia, de 1899, e The Northern Tribes of Central Australia, de 1904. Ao organizar o material coletado dentro do modelo evolucionário, esses trabalhos não estão ancorados nas categorias fornecidas pelos questionários e apresentam um nível de refinamento e análise aprofundada completamente incomuns para o padrão dos correspondentes da época. Por esse motivo, os ensaios de Spencer e Gillen foram considerados uma antecipação do estilo monográfico moderno, como foi reconhecido pelo próprio Malinowski. Seu impacto na disciplina foi significativo. Durkheim e Mauss os usaram para elaborar suas teorias sobre o totemismo e a religião primitiva. Outros, como Westermarck, Malinowski e Radcliffe-Brown, os consultaram para formular suas conceituações sobre as origens e funções da família e do parentesco. Por fim, Freud inspirou-se nessas contribuições, além das de Frazer, para Drafting Totems and Taboos in 1912.

A figura do antropólogo de poltrona expressa plenamente a abordagem metodológica positivista da era dominante. A partir de um feto, o estudioso elabora as leis evolutivas do progresso humano, comparando sociedades distantes com sociedades até então desconhecidas, sem, no entanto, ter conhecimento direto delas. Por outro lado, o 'correspondente', sem qualquer competência teórica anterior, recolhe os preciosos dados que seriam então utilizados pelo antropólogo, sendo-lhe simplesmente solicitado que combine a sua própria neutralidade com as listas de questões fornecidas por teóricos distantes. havia o pressuposto de que os dados etnográficos eram manifestações objetivas e factuais, facilmente acessíveis à observação direta, não muito diferente dos dados das ciências naturais (Goodenough, 1970; Holy, 1987). Por esse motivo, muito pouca atenção foi dada aos métodos de coleta e às dificuldades envolvidas em encontrar informações. As culturas eram consideradas objetos a serem registrados com o método científico, como espécimes das ciências naturais, de acordo com as concepções científicas da era vitoriana (Urry, 1972).

Como Evans-Pritchard aponta, não apenas até o final do século 19 nenhum antropólogo conduziu pesquisas na área, mas nenhum dos teóricos, como Frazer, jamais sonhou em dar uma olhada nos povos que passaram sua vive. estudando:

No entanto, é surpreendente que [...] nenhum antropólogo tenha feito pesquisa de campo até o final do século XIX. Ainda mais notável é o fato de que não parece ter ocorrido a eles que um escritor de fatos antropológicos pudesse dar uma olhada, talvez de passagem, em um ou dois exemplos do que passou sua vida descrevendo. William James nos conta que quando perguntou a Sir James Frazer sobre os nativos que ele conhecera diretamente, Frazer exclamou: “Deus me livre! ' (Evans-Pritchard, 1951, p. 90)

O que impressiona Evans-Pritchard é uma consequência direta da ideologia da época e do paradigma científico dominante. A figura do antropólogo de poltrona encontra seu lugar 'natural' no período evolutivo da disciplina. Seguindo o modelo de Darwin, e principalmente de Spencer, os antropólogos mais representativos da época, como Tylor, Morgan ou o próprio Frazer, utilizam povos exóticos ou 'tecnologicamente primitivos' para estudar a evolução do homem. O estudo da sociedade é concebido como um campo do conhecimento no qual atuam as mesmas leis que determinam o funcionamento e o desenvolvimento de cada esfera da natureza. O postulado da unidade psíquica da humanidade, desafiado contra as tendências racistas e degeneracionistas, representa a antecipação teórica mais significativa para guiar os estudiosos na reconstrução do processo geral de desenvolvimento da cultura. Nesse sentido, os 'selvagens' são considerados os representantes contemporâneos da Idade da Pedra, a serem estudados não pelo seu valor intrínseco, mas como modelos das origens da civilização, ponto de partida de uma sequência de desenvolvimento universal e unilinear no ápice em que se situa a moderna sociedade europeia.

A coleta de informações sobre os povos primitivos é, portanto, funcional para um compromisso amplamente especulativo, que os cientistas metropolitanos podem facilmente realizar em uma mesa. Significativo dessa perspectiva é a relação entre a quantidade eclética de informações coletadas e o caráter homologador de seu processamento estatístico e comparativo. Fatos considerados semelhantes e, portanto, teoricamente pertencentes ao mesmo nível de desenvolvimento são extrapolados de seu contexto de pertencimento e justapostos em sequências totalmente imaginárias (Burrow, 1966; Mercier, 1966; De Waal Malefijt, 1974; Fabietti, 2011). A total indiferença ao contexto cultural é o elemento-chave de um projeto tão ambicioso. Um artefacto, um costume ou um ritual são separados de seu horizonte de significado. Estão inseridos em um sistema de classificação universal, no qual as variáveis, por si mesmas insignificantes, interessam apenas por suas correlações.

Bibliografia

Husserl, E. (2008). A crise da humanidade europeia e a filosofia. Porto Alegre: ediPUCRS.

Malinowski, B. (1960). The Functional Theory. New York: Oxford University Press.

Descartes, R. (2012). Meditazioni di filosofia prima. In G. Reale (Ed.), Opere 1637-1649 (pp. 678–1395). Milano: Bompiani.

Bacone, F. (1810). Nuovo organo delle scienze. Bassano: Tipografia Remondiniana.

Comte, A. (2002). Discurso Preliminar sobre o Espírito Positivo. São Paulo: RCM.

Hume, D. (1971). Dialoghi sulla religione naturale. In U. Forti (Ed.), Opere I (pp. 757–866). Bari: Laterza.

Darwin, C. (2018). A origem das espécies. São Paulo: Edipro.

Spencer, H. (2013). Principi di sociologia. Torino: UTET.

Fabietti, U. (2011). Storia dell’Antropologia. Bologna: Zanichelli.

 

                            2a aula 17 de Outubro 

Introdução

A etnografia não é uma atividade improvisada num local, mas uma prática complexa que requer orientação, reflexão e formação específica.

Embora seja hoje utilizada por inúmeras disciplinas (sociologia, psicologia, ergonomia), a etnografia nasceu e se desenvolveu dentro da topologia cultural, como método fundamental para investigar os 'hábitos e costumes' locais de vários grupos sociais (Ronzon, 2008, p.7). No entanto

«Uma coisa em todo o caso é certa: é que o homem não é o mais velho problema nem o mais constante que se tenha colocado ao saber humano, o homem é aí uma invenção recente. Não foi em torno dele e dos seus segredos que, por muito tempo, obscuramente, o sa­ber rondou. De facto, dentre todas as mudanças que afectaram o saber das coisas e de sua ordem, o saber das identidades, das diferenças, dos caracteres, das equivalência, das pala­vras em suma, em meio a todos os episódios dessa profun­da história, deixou aparecer a figura do homem. E isso foi o efeito de uma mudança nas disposições fundamentais do saber». (FOUCAULT , 1999, p. 536).

E é exactamente nas formas fundamentais do saber que se fala de um engajamento do antropólogo que opera com os informantes a partir de um compromisso que o leva à partilhar e a apoiar as comunidades onde ele vive, colaborando com a educação pública, e nas áreas académicas promovendo uma crítica construtiva das instituições sociais. Mas permanece sempre o dilema: como operar? Que tipo de método adoptar? Qual deveria ser a ética que o conduz a operar entre as instituições que exercem o poder, ou as ONG?

Visibilidade pública

Como disciplina, a antropologia aumentou a sua visibilidade pública nos últimos anos com um crescente engajamento.  Embora seja solicitada a sair das universidades para operar nos diferentes problemas do mundo, a antropologia cultural debate-se entre uma postura teórico-conceptual e uma dimensão pratica, etnográfica de campo. Mas quais seriam os campos onde o engajamento é solicitado? Antes de tudo a participação e o apoio na educação e no ensino público,  na crítica social, no mundo das práticas sociais, e relembrando Morgan, até na advocacia e cooperação.  Mas o maior engajamento ocorre durante o trabalho de campo, através da prática etnográfica aplicada; em instituições folclórico-culturais, em institutos de investigação comunitária; e como pesquisadores individuais no contexto da guerra, da injustiça ambiental, dos direitos humanos, da violência e do terrorismo. Enfim os muitos dilemas que persistem na prática antropológica contemporânea provocam a antropologia e a solicitam a responder aos desafios da sociedade de hoje, e fazem dela uma das disciplinas humanas mais importantes (AIELLO, 2010, p. 201).

Método etnográfico

A etnografia pode ser colocada dentro da família mais ampla de métodos qualitativos (em oposição aos quantitativos). Suas peculiaridades, de facto, consistem na importância atribuída à técnica de observação participante: investigação in loco, interação com os próprios informantes, caráter analítico-descritivo das reflexões.

Há dificuldade dos alunos em assumir uma atitude empírica e sistemática na análise da vida social. De facto, nem sempre é fácil apreender e transmitir o método etnográfico a aplicar 'no terreno', em domínios disciplinares como as antropologia do parentesco, a antropologia da saúde, antropologia económica e a cultura material.

Com esta disciplina responde-se também a problemas particulares no futuro do estudante: necessidade de síntese, capacidade de articulação com outros saberes disciplinares, orientação para fins de formação direccionados, adaptabilidade a contextos de trabalho-profissionais específicos.

As práticas e as técnicas da etnografia como um conjunto de ferramentas de trabalho - um kit de ferramentas gerais, por meio do qual se detecta e monitora as diversas realidades socioculturais - ao invés de reduzir a uma rígida lista de pressupostos teóricos e disciplinares. Na verdade, minha exposição não quer vincular a etnografia a temas, lugares, agendas teóricas ou perspectivas documentais específicas, mas sim contribuir para a formação de um habitus de pesquisa, aberto à variedade de hipóteses analíticas e perspectivas interpretativas, presentes no interior da etnoantropologia. disciplinas.

Método monográfico

É necessario enfrentar uma monografia escrita por antropólogos específica e a realização de uma breve experiência de investigação (também simulada). De facto devia-se ligar a metodologia ao trabalho prático e a uma experiência real e efectiva de investigação. A breve pesquisa de campo deve, no entanto, permitir tocar a experiência, na vida cotidiana e em termos operacionais, como interações com pessoas reais.

 

Introdução

Após as conquistas coloniais feitas na costa ocidental do Golfo da Guiné após a primeira viagem por Diogo Cão de 1482, na última década do século XV, os Portugueses começaram a explorar o litoral e os rios da África Ocidental.  Seu objectivo era estabelecer contactos que facilitariam a penetração no continente através de relações diplomáticas e comerciais com reinos e sultanatos da Costa Atlântica.  Conforme relatado por Gluckman, naquela época, a cultura africana, transmitida e difundida apenas oralmente, não era conhecida na Europa excepto através de relatos de viajantes, jornalistas e missionários:

«passavam rapidamente de uma habitação indígena para outra e muitas vezes falavam a língua local tão atrofiada que deviam usar intérpretes cujo conhecimento da língua nativa do observador era totalmente inadequado.  Seus apontamentos tratavam de eventos aleatórios que ocorriam durante sua estadia. Eles escreviam aquilo que mais impressionava ou que possivelmente poderia impressionar os seus conterrâneos; é por esta razão que os seus diários e as cartas estavam cheias de elementos incomuns, exóticos, bizarros, grotescos fruto daquilo que observavam» (GLUCKMANN , 1963, p. 40).

Fontes da antropologia angolana 

Os diários de viagem e as observações feitas acerca da população local abraçavam momentos da história angolana, eventos e genealogias dos reis e heróis celebrados oralmente nos mitos de fundação.  Nos primeiros relatos, havia muitos elementos dignos de atenção.  Em primeiro lugar, é evidente que  as relações mais importantes eram de missionários, entre os quais, a partir da segunda metade do século XVII os capuchinhos (Girolamo da Montesarchio, 1646; Giovanni Francesco Romano 1649; Zacarias de Finale, 1649; Joris van Gheel, 1652; Giacinto de Vetralla, 1659; Antonio da Gaeta, 1669; Michelangelo Guattini de Reggio-Dionisio de Piacenza 1679; Luca de Caltanisetta, 1689; Giovanni Antonio Cavazzi de Montecuccolo, 1690; Lorenzo da Lucca, 1700; Gabriele de Bolonha, 1705; Filippo de Florença, 1711; Antonio Zucchelli de Gradisca, 1712; Giuseppe de Modena , 1723; Girolamo Merolla da Sorrento, 1726; Bernardino de Asti, 1740; Tavarone Hannibal de Gênova, 1769; Boaventura de Ceriana, 1790); importante fonte destes relatórios é a tradição oral Bakongo.  Todos estes são elementos úteis para reconstruir a evolução da realidade sócio-cultural angolana antes da colonização.  Estas primeiras testemunhas no campo descreveram a relação entre indígenas e autoridades da coroa português, destacaram os problemas sociais causados pelo impacto de diferentes culturas, denunciaram o tráfico de escravos, cartografaram o território e investigaram sobre os primeiros assentamentos humanos fornecendo notícias valiosas sobre a realidade geográfica, a flora, a fauna e as propriedades terapêuticas das plantas.  A análise destes trabalhos permite de obter dados importantes acerca da estrutura sócio-política do Reino do Congo, o ciclo de vida dos Bakongo, as normas de parentesco, as doenças e as crenças relacionadas à morte.  Não devemos esquecer, como diz Ekholm (1972, p. 9), que tudo é o resultado da interpretação feita por estrangeiros ligados a uma cultura específica e influenciada por pressupostos etnocêntricos que se manifestam ao longo da viagem. A Etnologia, como uma ciência documental, e a antropologia cultural angolana, como abordagem teórica, usam todos estes aspectos para extrair elementos valiosos úteis para a compreensão dos costumes, tradições, estruturas sociais, práticas, crenças e conhecimentos actuais naquele tempo entre numerosas populações não europeias, entre as quais os Bakongo (SURDICH, 1997, p. 43). No entanto, como diz Fabietti, os elementos que emergem dentro desta leitura antropológica  são o moralismo, o preconceito, o exotismo e o maravilhoso (FABIETTI, 200 1, p. 5).

Da leitura desses relatórios, além das formas expressivas embebidas de exotismo, entende-se que o autor se torna um actor que nos apresenta a relação entre o local que está sendo descrito e a palavra produzida por ele; há elementos que ele próprio enfatiza e descreve para agradar quem lê.

Bibliografia

Ronzon, F. (2008). Sul campo. Breve guida alla ricerca etnografica. Meltemi.

Foucault, M. (2000). As Palavras e as Coisas. Uma arqueologia das ciências humanas. Martins Fontes.

Gluckman, M. (1963). Custom and Conflict in Africa. Basil Blackwell.

Montesarchio, G. da. (1646). Viaggio del Ghongo, cio è Relatione scritta da un nostro missionario Capuccino (pro manusc). Archivio Provinciale Cappuccini.

Montesarchio, G. da. (1646). Viaggio del Ghongo, cio è Relatione scritta da un nostro missionario Capuccino (pro manusc). Archivio Provinciale Cappuccini.

Finale, Z. di. (1649). Cronica del viaggio di Zaccaria di Finale predicatore cappuccino.

Van Gheel, J. (1652). Vocabularium Latinum, Hispanicum e Congense. Ad Usum Missionarium transmittendum ad Regni Congi Missiones. Manuscript kept in the National Central Library of Rome: Fundo Minori 1896, MS Varia 274.

Vetralla, H. a. (1650). Doctrina christiana ad profectum missionis totius regni Congi in quatuor linguas. Typis eiusdem S.Congregatione de Propaganda Fidae.

Gaeta, A. da. (1669). La maravigliosa conversione alla santa fede di Cristo della Regina Singa. Jacinto Passaro.

Reggio, M. G. da, & Dionigi de Carli da Piacenza. (1679). Viaggio nel Regno del Congo. Iseppo Prodocimo.

Caltanissetta, L. da. (1972). Relatione della Missione fatta nel Regno di Congo. Rainero, Romain. Il Congo Agli Inizi Del Settecento Nella Relazione Di Padre Luca Da Caltanissetta, 100–478.

Montecuccolo, J. A. C. de. (1965). Descrição Histórica dos três reinos do Kongo, Matamba e Angola. Junta de Investigação do Ultramar.

Lucca, L. da. (1717). Lettere. In Relazioni di alcuni missionari cappuccini toscani (pp. 273–284). Archivio Provinciale Cappuccini.

Zucchelli, A. da G. (1712). Relazioni del viaggio é Missione di Congo Nell’Etiopia Inferiore Occidentale (…). Nelle quali si descrive attentamente tutto ciò che di notabile è occorso di vedere, ed operare al suddetto P.Missionario, sì nè lunghi viaggi da lui fatti, come pure nell’es. Bartolomeo Giavarina.

Piazza, C. (1980). Viaggio al Congo 1723. La missione del Soyo (1713-1716) nella relazione inedita di Giuseppe da Modena OFM Cap. L’Italia Francescana, 56, 385–471.

Piazza, C. (1980). Viaggio al Congo 1723. La missione del Soyo (1713-1716) nella relazione inedita di Giuseppe da Modena OFM Cap. L’Italia Francescana, 56, 385–471.

Bernardino, I. d’Asti. (1747). Missione in prattica de Padri Cappuccini ne Regni di Congo, Angola, et adiacenti. Biblioteca Civica, ms.457.

Tavarone, A. da G. (1712). Viaggio di Affrica e America Portughesa. Istituto Storico dei Cappuccini.

Ceriana, B. de. (1790). Instrumento em publica forma. pro manuscripto.

Ekholm Friedman, K. (1972). Power and Prestige. The Raise and Fall of the Kongo Kingdom. Skriv Service AB.

Surdich, F. (1977). Introduzione. In Viaggio nel Regno del Congo. São Paulo.

Fabietti, U. (2011). Storia dell’Antropologia. Zanichelli.


                           3a aula 24 de Outubro 

 

Existem muito poucos livros sobre método em antropologia social e cultural e quase todos eles são dedicados a ajudar o pesquisador de campo a colectar e descrever informações sobre culturas não ocidentais. Os antropólogos geralmente coletam dados quando efectuam viagens de pesquisa de campo etnográficas. Em segundo lugar, há artigos, introduções a monografias e, em alguns casos célebres (Bohannan 1954, Powdermaker 1966, Beattie 1965 e Read 1965), livros específicos sobre como um antropólogo conseguiu entrar na situação de trabalho de campo e colectar o dados que ele ou ela publicam sobre um determinado grupo ou etnia.

Abordagem Comparativa

O trabalho comparativo em antropologia é tão antigo ou mais antigo do que a tradição do trabalho de campo, remontando ao trabalho de Morgan no século XIX, de Tylor a Wheeler e Ginsberg, e Murdock e seus alunos em tempos mais recentes. Além disso, as comparações em pequena escala sempre foram uma preocupação central da disciplina. No entanto, nenhum trabalho específico sobre o método foi realizado.

Por outro lado, uma preocupação com o método e o treinamento em antropologia se desenvolveu nas últimas décadas, de modo que as escolas de campo de verão, os programas de treinamento em línguas de trabalho de campo e os institutos de verão sobre métodos e técnicas de pesquisa intercultural tornaram-se agora bastante comuns nos programas de departamentos de antropologia. Esses programas de treinamento indicam uma consciência crescente de que o treinamento metodológico em antropologia não é algo que um aluno deveria aprender de uma forma ou de outra ao longo de seu treinamento de pós-graduação. Em vez disso, deve haver um foco definido no método, de modo que a aquisição de habilidades profissionais se torne um segmento claro da preparação do aluno para a carreira antropológica. 

No trabalho de campo, há observação participante, colecta de genealogias, redação de notas de campo, redação de materiais de campo em relatórios e assim por diante. No trabalho comparativo, existem técnicas e abordagens qualitativas e quantitativas. A fim de apresentar todos esses métodos e técnicas, gostaríamos de efeito tem que sintetizar as várias vertentes da metodologia que se desenvolveram na disciplina ao longo do último meio século. Isso nós então chamaríamos de método antropológico.

Outra abordagem, um ponto de vista que nos permite uma perspectiva mais limitada sobre o assunto e que nos ajuda a focar nos tipos de técnicas e estratégias de pesquisa que gostaríamos de ver crescer e expandir dentro da disciplina.

No desejo de ver a antropologia se tornar um ramo cada vez mais rigoroso e científico das ciências sociais em geral.

 É esse desenvolvimento específico que traz um antropólogo dedicado principalmente ao trabalho de pesquisa comparativa em grandes amostras de sociedades para cooperar com um antropólogo dedicado principalmente ao trabalho de campo. Embora cada um de nós use dados um tanto diferentes, nossos objetivos são os mesmos, ou seja, a criação de teorias e métodos que se aplicam não a uma cultura, mas a várias delas.  Em outras palavras, a perspectiva comparativa existe se estejamos fazendo trabalho de campo em uma ou algumas sociedades, ou, por outro lado, amostrando entre um grande número de sociedades.

Isso não significa que sentimos que não existem outros objetivos e métodos de pesquisa valiosos ou sérios dentro da antropologia. Obviamente, existem e eles merecem alguma discussão. Dois deles são importantes e devem ser observados. Em primeiro lugar, há a abordagem holística ou o que chamaríamos de abordagem historicista ou específica da cultura e, em segundo lugar, há o estruturalismo formal. A primeira abordagem foi amplamente difundida na antropologia, enquanto a segunda tem um apelo mais limitado, mas recebeu ampla atenção.

A abordagem holística

A abordagem holística enfoca a cultura como o problema central. O objetivo é estudar e compreender uma determinada sociedade e sua cultura histórica, social, econômica, política, psicológica e até mesmo biologicamente. O pressuposto é que, para compreender qualquer parte da cultura, devemos olhar para todo o resto do contexto sociocultural. Assim, o etnógrafo, e mesmo o comparativista interessado em uma área cultural limitada, examinou um conjunto de fenômenos tão abrangente quanto possível. Eles usaram quaisquer métodos e técnicas que puderam encontrar e que poderiam ser adaptados a esse problema. Isso serviu para tornar a antropologia aberta e eclética. Mas também serviu para tornar o acúmulo de conhecimento antropológico um no qual análises de culturas particulares são empilhadas umas sobre as outras, como se a própria acumulação fosse o objetivo do empreendimento.

A abordagem estruturalista

No caso do estruturalismo formal, não o tratamos em detalhes, excepto quando ele entra na discussão das taxonomias formais e semelhantes na etnociência.  O estruturalismo formal praticado por Lévi-Strauss assume que há estruturas que são subjacentes à qualidade da experiência humana até constituir-se em leis formais ou regularidades que explicam as tendências estatísticas que observamos. Essas leis são derivadas de preceitos morais, ou “regras”, relativos à interação social. Assim, o processo social é o funcionamento dessas 'leis'. Contrariamente, assumimos que o ser humano social e a vida cultural dependem de muitos fatores, dos quais apenas um (embora importante) são os preceitos morais e éticos aplicáveis ​​a qualquer tipo de atividade.  Mas, como nas outras Ciências, vemos isso como resultado de

(a) análises detalhadas das propriedades estatísticas de fenômenos observáveis, e / ou

(b) de alguma representação simbólica dessas entidades e da aplicação teórica de uma lógica matemática que 'legalmente' inter-relaciona-os, e dos quais teoremas podem ser derivados. Em outras palavras, embora o estruturalista formal almeje a teoria nomotética, sentimos que é muito estreito em sua aplicabilidade atual, e errado em sua abordagem porque deriva leis formais de preceitos morais.

Portanto, nosso objetivo principal, que determina os outros, é a construção de teorias - e a metodologia é o nosso meio para procurar e inter-relacionar as categorias não únicas que nos permitem construir teorias cujas generalizações são aplicáveis ​​entre as culturas. Mas, dentro dessa estrutura, também tendemos a evitar abordagens nomotéticas que sentimos não concordar com nossa abordagem básica da natureza da realidade social e cultural.

Outro problema epistemológico importante é o lugar do método no empreendimento de pesquisa. Para nós, todo o impulso na pesquisa científica envolve uma série de fases inter-relacionadas ou aspectos intelectuais e práticos que podem ser aplicados em qualquer ordem, embora a própria ordem reflita uma estratégia de pesquisa particular. Esses aspectos são teoria, método e técnica. A teoria lida com generalizações, regularidades, relações, ou seja, a natureza dos fenômenos; e cria, ou trabalha para a criação de explicações que dão conta dessa natureza é também o objetivo principal da ciência.

Def. de Método é o meio pelo qual o conhecimento antropológico é obtido.

Em nossa opinião, refere-se principalmente às hipóteses que fornecem caminhos para a teoria e para o suporte ou, se forem confutadas, à negação da teoria uma vez que ela foi construída.

Técnicas de pesquisa

A técnica, ou a tecnologia da pesquisa, é uma característica mais especializada do método que o rápido desenvolvimento do processamento de dados, especialmente no campo da computação, agora transformou em um aspecto diferenciado do método. Uma técnica é um procedimento padronizado para produzir ou manipular informações. Assim, a observação participante, o método genealógico são todas técnicas. Elas podem ser categorizadas como tal porque há um amplo consenso sobre a maneira como devem ser usados ​​e ampla familiaridade com o tipo de informação que podem fornecer a um pesquisador. Em nossa opinião, elas não são, estritamente falando, métodos porque não fornecem e não podem, por si só, fornecer toda a estratégia lógica necessária para a realização de um projeto de pesquisa. Por exemplo, é o método a sugerir que uma técnica é mais apropriada de outra e, portanto, deve ser usada também é um aspecto do método e não é resolvido pela própria técnica.

Aspecto importante do método

Obviamente, um dos aspectos mais importantes do método é a escolha da técnica, mas o método conecta todos os aspectos da pesquisa -

1) coleta de dados,

2) apresentação,

3) projeto de pesquisa,

4) análise dos dados - fazendo dessas séries ou fases um conjunto lógico de etapas que, em seu conjunto, é o método de pesquisa.

Abordagem

Outro conceito que cruza teoria, método e técnica é o de abordagem. Uma abordagem é a aceitação de um conjunto de suposições em oposição a outro. Nesse sentido, talvez seja a qualidade mais fundamental no empreendimento de pesquisa, uma vez que tende, pelo menos inicialmente, a determinar o tipo de teoria, método ou técnicas que devem ser criados e empregados. Assim, por exemplo, se usarmos uma abordagem psicológica em oposição a uma sociológica, podemos estar assumindo a predominância de determinantes psicológicos. O método e a técnica são afetados por tais decisões, uma vez que podem executar a tarefa de pesquisa em termos de tais suposições e a coleta de dados é, em última análise, determinada pela abordagem. Em termos epistemológicos, uma abordagem, seja declarada ou não, reflete crenças fundamentais sobre a natureza da realidade sociocultural. Assim, Homans acredita que, em última análise, os materiais sociológicos e culturais podem ser reduzidos a materiais psicológicos, enquanto Needham considera tal abordagem uma parte importante do método antropológico sempre tenha sido direcionada para a observação, registro e, às vezes, explicar por que uma determinada cultura foi descrita, decidimos enfatizar o uso de tais fatos para provar, refutar ou criar generalizações que transcendem qualquer cultura. Em nossa opinião, essa perspectiva distingue entre informação e dados. O último é uma forma particular de informação que é justificadamente relevante para um problema científico.

Escolhemos essa abordagem, enfatizando problemas e teorias em vez de descrições detalhadas, porque acreditamos que existe atualmente uma tendência constante e crescente nas ciências sociais de penetrar as fronteiras disciplinares e reestruturá-las ao longo de linhas de interesses ou problemas comuns.  Hoje, o indivíduo está sujeito a uma individualização crescente que se expressa pela aquisição de uma autonomia e liberdade cada vez maiores. Ação individual; por outro lado, há uma pressão para a uniformização e participação social, talvez capazes de garantir segurança e certeza. Como será visto, a vida cotidiana é de fato o espelho dessa ambivalência entre individualismo e massificação, entre a necessidade típica do homem contemporâneo de se sentir livre para viver, se expressar e escolher independentemente dos outros, e a pressão de se sentir igual aos outros ao seu redor e com quem ele vive em contato.

Metodologia antropológica

A metodologia dentro da antropologia sempre foi algo subdesenvolvido. Se esperava que um aluno possa adquirir conhecimento suficiente para aplicar o método e realizar trabalho de campo ou análise dos dados.

Os alunos geralmente recapitulam o aprendizado metodológico herdado da geração anterior no mesmo ritmo. Ou seja, a técnica básica para a metodologia de ensino tem sido uma abordagem de “escola de golpes duros”. A filosofia pedagógica subjacente é que é impossível comunicar ou aprender tais habilidades - o aluno deve fazê-lo da maneira mais difícil, passando exactamente pelas mesmas experiências que aqueles que os profissionais reconhecidos na área fizeram. Isso, por sua vez, levou a uma imagem do trabalho de campo como um rito de iniciação, de um lado a iniciação ao método antropológico constitui o noviciado.

Em segundo lugar - e decorrente do primeiro - a atitude antropológica tradicional em relação à metodologia levou a uma tradição não acumulativa. Os antropólogos têm sentido tradicionalmente que todos devem passar pela mesma experiência e descobrir novamente as condições do trabalho de campo. Isso é o que significa a frase 'na mesma panela’. Significa que, se foram necessários de cinco a dez anos de experiência para produzir um antropólogo trinta anos atrás, deve levar exatamente o mesmo tempo para aprender a mesma quantidade de sofisticação metodológica na actualidade.

A explicação para essa abordagem conservadora da metodologia dentro da antropologia reside não tanto no conservadorismo básico de seus praticantes, mas nas condições de pesquisa e nos objetivos da disciplina. Geralmente, o antropólogo é a única pessoa capaz de colectar e registrar dados etnográficos dum canto remoto da terra. Isso significa que quanto mais completo e abrangente for o registro que ele for capaz de trazer de volta com ele, melhor. Além disso, e possivelmente dependente disso, é a suposição de que as culturas são um todo integrados e analisar esta entidade sem saber tudo isso produz uma alta probabilidade de erro na interpretação. Portanto, foi elaborada uma técnica pela qual o pesquisador usa toda a sua experiência como um registro da sociedade. Essa experiência pode ser manipulada até certo ponto, mas basicamente a pessoa é o principal instrumento de pesquisa.

Não é de se admirar, então, que o método seja difícil de registrar e desenvolver - em última análise, depende da pessoa e da personalidade de quem realiza o trabalho. A formação só poderia ajudar a “descentrar” a pessoa, tornando-a consciente da grande variedade de formas e meios que foram concebidos pelo homem para criar a sua sociedade e cultura. No final desse treinamento, muito poucas ou nenhuma das práticas conhecidas por terem sido realizadas em qualquer lugar do mundo parecem estranhas para o aluno. Os alunos devem estar cientes e preparados para não ficarem chocados, com medo ou escandalizados por quaisquer costumes ou práticas encontradas em qualquer lugar do mundo. Porém, além de desenvolver essa característica atitudinal, muito pouco mais é feito para preparar o aspirante antropólogo, embora esse processo de descentramento tenha sido um aspecto importante do treinamento e ainda o seja.

No entanto, esse treinamento está se tornando menos importante; em primeiro lugar, porque o conhecimento das diferentes culturas é muito mais difundido hoje do que quando a antropologia começou. A própria disciplina ajudou a diminuir o etnocentrismo entre o público não profissional. Portanto, há muito menos necessidade de treinar alunos nas verdades do relativismo cultural hoje do que há vinte e cinco anos atrás. A rápida mudança social em curso no mundo hoje, a falta de isolamento de povos não ocidentais e o facto de que sectores de suas vidas estão sendo estudados por outros cientistas sociais criaram uma espécie de crise na antropologia (Cohen, 1967).

As respostas não são fáceis de encontrar. No entanto, um dos resultados óbvios da mudança social mundial na antropologia como disciplina tem sido o agravamento dos problemas e uma menor ênfase na abordagem holística, como um objetivo fundamental de todo trabalho de campo. Isso, por sua vez, levou a pesquisas mais detalhadas e sistemáticas em setores limitados de uma cultura ou em várias culturas, usando uma abordagem comparativa. Uma vez que este desenvolvimento tenha sido admitido, e seu impacto em nosso próprio trabalho de campo e pesquisa comparativa seja totalmente sentido, então as questões metodológicas começam a surgir rapidamente. Problemas mais limitados exigem técnicas de pesquisa e estratégias metodológicas mais rigorosas e sistemáticas - e há muita pouca discussão sobre tais questões disponíveis na própria antropologia. Este é, com efeito, o propósito deste curso. Tentamos cobrir os vários tipos de problemas metodológicos que consideramos os mais urgentes no campo da pesquisa intercultural actualmente. Os estudantes já abordaram a epistemologia antropológica O enfoque então se restringe à metodologia de trabalho de campo e daí para problemas de análise comparativa. A tarefa desta disciplina não é tanto inventar novas formas de saber, mas sim sistematizar os métodos que estão sendo desenvolvidos nas próprias ciências. Assim, os escritos dos antropólogos representam, em geral, uma síntese do trabalho já desenvolvida pelos próprios albardeiros científicos que inventam as novas ideias e que muitas vezes devem inventar também novas maneiras de provar que tais ideias estão certas ou erradas. Isso significa que os filósofos da ciência nos fornecem bons textos sobre problemas epistemológicos convencionais na disciplina.

A análise de qualidade dos dados recolhidos no campo talvez nos ajude a não cometer erros em atribuir qualidades a um grupo que não as possui.

O PROCESSO DE TRABALHO DE CAMPO

Nesta seção do livro, tentamos ver o trabalho de campo como um processo pelo qual o conhecimento é obtido. Há dificuldades, bem como os resultados em programar rigorosamente o trabalho de campo.

Projecto de pesquisa

A escassez de projetos de pesquisa rigorosos em antropologia muito provavelmente tem sido um de seus pontos fortes historicamente. O antropólogo de campo é simplesmente instruído a trazer de volta o máximo de material possível documentando o modo de vida das pessoas com quem viveu.

Observação

A primeira fase para obter dados é a observação, a coleta de dados é valiosa - sobretudo quando estes estão desaparecendo. Esses dados formam a base do nosso registro da alteridade humana. Sem uma gama completa de tal mudança em todos os setores da vida social e cultural, a base para a generalização comparativa seria limitada. Quando um caso é totalmente único, ele indica as possibilidades de mudança - ao passo que, se não houver dados sobre este caso e nenhuma dessas possibilidades puder ser concebida, a comparação é impossível. Por exemplo, temos muitos casos de sistemas de descendência que mudam de matrilinear para outras formas, mas nenhum registro de um sistema patrilinear muda para matrilinear. Podemos então concluir que, por alguma razão (teoricamente importante), tal mudança é impossível. No entanto, se surgir um caso, essa teorização deve ser radicalmente alterada de acordo com os novos fatos.

Projecto de pesquisa

Problema de fundo, hipóteses, averiguação, compreensão, formulação da teoria e explicação, são fases que não surgiram automaticamente de uma literatura etnográfica em constante expansão. A teoria não é o resultado inevitável quando possuímos mais dados, embora essa visão ainda seja mantida por muitos antropólogos. Devemos compreender o contexto cultural dentro do qual a pesquisa é planejada de forma mais rigorosa. A área de planejamento de pesquisa é a fase mais importante do que todas as outras para levar a antropologia em direção a uma realização mais eficiente de seus objetivos teóricos de longo prazo.

Trabalho de campo

1) entrada no campo (Langness, Middleton, Uchendu e VanStone),

2) Escolher as amostras no trabalho de campo etnográfico (Honigmann),

3) A arte do trabalho de campo (Mead)

4) Como obter dados etnográficos

 Para que o trabalho de campo avance segundo o projecto formulados os instrumentos de coleta de dados deve ser mais padronizado,

a) o primeiro problema é e entrar na situação de campo e morar lá enquanto,

b) usar da vida cotidiana como um instrumento de pesquisa.

c) toda coleta de dados depende de uma compreensão do contexto;

d) o pesquisador está de fato vivendo numa sociedade e deve usar essa experiência para informar seu enfoque de pesquisa.

 

Todos - os escritores enfatizam a importância de seguir os canais adequados para chegar ao campo, a necessidade de estabelecer um papel e as dificuldades em fazê-lo, a necessidade de ir devagar no início e o fato de que os primeiros informantes devem ser bem escolhidos devem falar a língua das pessoas que moram em seu local de pesquisa.

 

Objectivo da antropologia

O objetivo da antropologia não é elaborar uma lista das variedades culturais das pessoas, mas nos ensinar a compreender o problema multifacetado, fascinante, (ai, complexo e muitas vezes insondável, multidimensional da vida humana). Assim, descobriremos semelhanças e diferenças, tramas e distâncias. Em suma, aprenderemos a conhecer um pouco mais sobre os seres humanos, mover nossos pensamentos e nossos passos melhor em uma realidade que é tão global e lotada e repleta de particularidades em alto risco de degeneração ou conflito.

O que requere a antropologia

A antropologia é, ao contrário, uma disciplina que requer observação constante, atenção, a habilidade de estabelecer ligações entre coisas que aparentemente são desprovidas de vínculos e, acima de tudo, uma boa dose de desapego interessado. Aqueles que estudam antropologia devem, de fato, estar interessados em coisas que são 'estranhas', ou suscitam alguma perplexidade entre nós, tais como certas crenças, práticas de rituais, como chamar parentes ou certos cliques. os povos possuem vida após a morte. não devemos julgá-los instintivamente, assumindo que nosso modo de ser e de sentir é o que conta.

A pesquisa etnográfica

A antropologia é uma disciplina baseada em trabalhos etnográficos aprofundados que lidam com questões teóricas mais amplas no contexto de condições locais particulares - para parafrasear um volume importante da série: grandes questões exploradas em lugares pequenos. A série tem uma missão particular: publicar trabalhos que se afastam da etnografia descritiva de estilo antigo - que é fortemente orientada para os estudos de área - e oferecem argumentos teóricos genuínos que interessam a um público muito mais amplo, mas que estão localizados e baseados em sólida pesquisa etnográfica. Se a antropologia é procura um lugar no mundo intelectual contemporâneo, então certamente deve ser através de tal pesquisa.

O suporte teórico

Partimos da pergunta: 'O que esse material etnográfico pode nos dizer sobre as maiores questões teóricas que dizem respeito às ciências sociais?', podemos também ribaltar a questão dizendo 'o que é que essas ideias teóricas podem nos dizer sobre o contexto etnográfico?'. Como Clifford Geertz disse uma vez: 'antropólogos não estudam as aldeias; eles estudam nas aldeias’.

Por lugar queremos dizer não apenas localidade geográfica, mas também outros tipos de 'lugar' - dentro de sistemas políticos, econômicos, religiosos ou outros sistemas sociais. Portanto, publicamos trabalhos baseados na etnografia dentro de movimentos políticos e religiosos, grupos ocupacionais ou de classe, jovens, agências de desenvolvimento, nacionalistas; mas também o trabalho que é mais tematicamente baseado - no parentesco, na paisagem, no estado, na violência, na corrupção, no eu.

Antropologia disciplina global

Hoje, a antropologia é uma disciplina global, mas está distribuída de forma desigual pelo mundo. Por muitos anos, era comum distinguir entre uma antropologia 'social' britânica e uma 'cultural' americana. Hoje, esse limite é impreciso.

Estudo comparativo da sociedade e da cultura

Este curso apresenta tanto o tema da antropologia social quanto um modo de pensar antropológico. O estudo comparativo da sociedade e da cultura é uma atividade intelectual fundamental, com implicações importantes para outras formas de envolvimento com o mundo. Através do estudo de diferentes sociedades, aprendemos algo essencial não apenas sobre os mundos das outras pessoas, mas também sobre nós mesmos. Em certo sentido, os antropólogos se destacam em tornar o familiar exótico e o exótico familiar através da comparação e do uso de conceitos comparativos.

Formas de explicar a diversidade

Nos últimos anos, a antropologia tem sido crescentemente desafiada por formas alternativas, altamente articuladas e publicamente visíveis de explicar a unidade e a diversidade da humanidade. Por um lado, disciplinas humanistas (às vezes agrupadas como 'estudos culturais') e, por outro lado, abordagens baseadas em ciências naturais (psicologia evolucionária ou sociobiologia de segunda geração, sendo a mais poderosa), propõem respostas para alguns dos problemas tipicamente levantados na antropologia social - relativas, por exemplo, à natureza da sociedade, à complexidade étnica, parentesco, ritual e assim por diante.

Etnografia, história e literatura

Os relatos credíveis da cultura e da sociedade devem ter um componente etnográfico, e que o conhecimento adequado de sociedades tradicionais ou de outras formas remotas.

[Antropologia] é menos um assunto do que um vínculo entre assuntos. É em parte história, em parte literatura; em parte ciências naturais, em parte ciências sociais; esforça-se por estudar os homens tanto de dentro quanto de fora; representa uma maneira de ver o homem e uma visão do homem - a mais científica das humanidades, a mais humanista das ciências. – É como uma viagem que leva o viajante das úmidas florestas tropicais do Kwilo Futa ao semi-deserto frio do Kwando Kubango; das ruas da cidade alta de Luanda às cabanas de barro da Serra de Canda; dos arrozais de Sanza Pombo aos campos de milho do Bailundo. O objetivo deste curso é duplo: fornecer mapas úteis e indicar alguns dos principais pontos culturais da nossa Angola (bem como alguns sites menos visitados).

Área de interesse da antropologia social

A antropologia social e cultural tem toda a sociedade humana como sua área de interesse, e tenta entender as maneiras pelas quais as vidas humanas são únicas, mas também o sentido em que somos todos semelhantes. Quando, por exemplo, estudamos o sistema econômico tradicional dos Bakongo, uma parte essencial da pesquisa consiste em entender como sua economia está conectada com outros aspectos da sua sociedade. Se esta dimensão estiver ausente, a economia dos Bakongo torna-se incompreensível para os antropólogos. Se nós não sabemos que os Bakongo tradicionalmente não podiam comprar e vender terras, porque eram possessos da kanda, seria claramente impossível interpretar a situação econômica deles, as mudanças impostas à sua sociedade durante o colonialismo no século XX. A antropologia tenta explicar a diferenciação social e cultural do mundo, mas uma parte crucial do projeto antropológico também consiste em conceitualizar e compreender semelhanças entre os sistemas sociais e as relações humanas. Como um dos principais antropólogos do século XX, Claude Lévi-Strauss (1908–2009) expressou-o:

“Antropologia tem a humanidade como objeto de pesquisa, mas ao contrário das outras ciências humanas, tenta apreender seu objeto através de suas mais diversas manifestações” (1983, p. 49).

Diferentemente formulada: a antropologia descobre como as pessoas podem ser diferentes, mas também tenta descobrir em que sentido pode-se dizer que todos os seres humanos têm algo em comum. Outro proeminente antropólogo, Clifford Geertz (1926–2008), expressa uma visão semelhante em um ensaio que trata essencialmente das diferenças entre humanos e animais: se quisermos descobrir o que o homem faz, só podemos encontrá-lo naquilo que os homens são: e o que os homens são, acima de todas as outras coisas, é diferente. É no entendimento do que é a diversidade - seu alcance, sua natureza, sua base e suas implicações - que chegaremos a construir um conceito de natureza humana que, mais do que uma sombra estatística e menos que um sonho primitivista, tem tanto substância quanto verdade. (Geertz 1973, p. 52) Embora os antropólogos tenham interesses abrangentes e frequentemente altamente especializados, eles compartilham uma preocupação comum em tentar entender as duas conexões dentro das sociedades e as conexões entre as sociedades.

Teorias antropológicas

À medida que nos aprofundarmos nessa pesquisa através do método e das teorias da antropologia social e cultural, há uma infinidade de maneiras de abordar esses problemas. Se alguém está interessado em entender por que e em que sentido os Ovimbundo acreditam nas bruxas (e porque a maioria dos europeus deixaram de fazê-lo), por que há maior desigualdade social entre Kamussequele, e Kwanhama? Se alguém está interessado no estudo da religião, na criação de filhos, no poder político, na vida econômica ou na relação entre homens e mulheres, pode recorrer à literatura antropológica e buscar inspiração e conhecimento. Os antropólogos também estão preocupados em explicar as inter-relações entre os diferentes aspectos da existência humana e, geralmente, investigar essas inter-relações, tomando como ponto de partida um estudo detalhado da vida local em uma sociedade particular ou em um ambiente social mais ou menos delineado. Pode-se, portanto, dizer que a antropologia faz grandes perguntas, enquanto, ao mesmo tempo, extrai seus horizontes mais importantes a partir de lugares pequenos. Por muitos anos, era comum ver seu foco tradicional em sociedades não industriais de pequena escala como uma característica distintiva da antropologia, em comparação com outros assuntos que lidam com cultura e sociedade. No entanto, devido a mudanças no mundo e na própria disciplina, essa não é mais uma descrição precisa.

Estudo dos sistemas sociais

Praticamente qualquer sistema social pode ser estudado antropologicamente e a pesquisa antropológica contemporânea apresenta uma gama enorme, tanto empírica quanto teoricamente. Alguns estudam feitiçaria em Luanda, outros estudam a diplomacia. Alguns viajam para o deserto de Namibe para trabalho de campo, enquanto outros pegam o candongueiro para a Camama. Alguns analisam as adaptações econômicas dos migrantes, outros escrevem sobre as redes sociais.

Bibliografia

Bohannan, P. (1995). How Culture Work. New York: The Free Press.

Powdermaker, H. (1966). Stranger and Friend. The Way of an Anthropologist. New York: Norton.

Beattie, J. (1965). Other Cultures, Aims, Methods and Achievements in Social Anthropology. New York: Routledge & Kegan.

Tylor, E. B. (1871). Primitive Culture. London: John Murray.

Homans, G. C. (1970). La naturalize de la ciencia social. Buenos AIres: Editorial Universitaria.

Needham, R. (1962). Structure and Sentiment. Chicago: The University of Chicago Press.


                            4ª aula 31 de Outubro 

 

Dificuldades objectivas

Na pesquisa um dos grande perigos é a superficialidade que leva a concluir apressadamente sobre as realidades culturais pretendendo de fornecer explicações que não são reais. Uma outra disposição que pode conduzir a erros graves é o acreditar em tudo aquilo que o campo oferece portanto ter desconfiança daquilo que aparentemente se apresenta e é socialmente tido como evidente. Há razões que fogem à observação superficial, trata-se de realidades e princípios que o antropólogo, na sua experiência, já constatou e que não podem induzi-lo em erros. Outros factos que contrastam abertamente com a nossa mentalidade se prestam a ser objecto de considerações ético-morais que porém não podemos emitir, excluindo do panorama da análise factos importantes. Portanto o antropólogo não se deve surpreender, nem admirar mas considerar os fenómenos tais como se manifestam, mantendo uma certa distância que é necessária e que o leva a não comprometer-se, apesar do seu esforço ser aquele de participar em pleno nos momentos e tempos da sociedade que é objecto do seu estudo.

Informantes

Por este efeito deve escolher bem os informantes, pois depende deles a sua percepção eliminando quanto antes a distância linguistica entre ele e os referentes. Se não for assim tudo vem filtrado e refuncionalizado pelo informante e a percepção da realidade não será completa. Muitos erros e mistificações foram cometidos pela incapacidade de comunicar directamente na língua local, os mais evidentes permanecem ainda nos topónimos que evidenciam claramente a incapacidade de perceber termos e processos numa simplificação sumária que sacrificou a cultura local.

Um fenómeno que pertença à esfera do sagrado pode ser conhecido somente apelando aos informantes. Estes devem ser conscientes e possuir a memória dos eventos. Às vezes acontece que por uma exagerada celebração da memória histórica o informante enfatize a realidade inventado e interpretando os fenómenos culturais ideologicamente. Portanto neste caso o intermediário dos verdadeiros agentes que podem ser funcionários legais ou religiosos, sacerdotes, feiticeiros, operadores do sagrado, mistifica as informações em vista duma mensagem que ele próprio quer transmitir. Tudo isso encobre a realidade que fica submergida por uma estratificação de interpretações. Mesmo assim esta operação não cessa de despertar o interesse do antropólogo, pois indica « ondas harmónicas » cheias de significados que emanam do objecto e que se forem consolidadas num sistema complexo constituem verdadeiras meta-culturas.

Suporte teórico: Geertz e Lévi-strauss

O antropólogo deve por atenção e operar uma espécie de de-construção em vista a obter o sentido profundo do objecto. Clifford Geertz, com a sua Antropologia interpretativa, nos coloca ao par de todas as técnicas necessárias para apurar e de-estratificar a camada de interpretações que se acumularam ao longo da história escondendo o objecto  e envolvendo-o num conjunto interpretativo. Eis portanto uma grande dificuldade, aquela de despir-se de todas as ideologias que estratificaram o objecto escondendo-o, e praticar uma espécie de arqueologia simbólica com escavações e pesquisas não no terreno sólido com pás e enxadas mas na tradição oral com as ferramentas da antropologia simbólica. Praticamente é aquilo que Levi-Strauss chama erro de Worf :

«Resultante de uma análise prévia, com observações etnográficas situadas num nível empírico ou no plano de uma análise ideológica que implica um recorte arbitrário da realidade. Comparam, assim, elementos que não são da mesma natureza, e correm o risco de desembocar em truísmos ou hipóteses frágeis» (LÉVI-STRAUSS, 1958, p. 97).

Uma pesquisa antropológica num lugar parte de um dos tópicos mais importantes que são os mitos de fundação duma etnia, linhagem, cidade. Agora acontece que a tradição popular fornece mais de uma versão sobre o mesmo fenómeno e acabamos por ter dois ou três mitos de origem. À qual das duas ou três versões acreditar? Fabricando fit faber. O antropólogo deve ser adestrado a cheirar de longe a verdade dos factos e ir além dos que querem convence-lo. Onde há mais insistências é presumível que haja re-interpretações, e estas são as armadilhas interpretativas que tornam ingénuo o acreditar. A percepção binária da realidade através de coplas opositoras de lewistraussiana memória, que atingem objectos empíricos e que se encontram no sistema de parentesco,  na ideologia política, na mitologia, no ritual, na arte e nos códigos que regem o comportamento entre indivíduos (LÉVI-STRAUSS, 1958, p. 98) favorecem a abordagem aos fenómenos culturais considerados dum ponto de vista estrutural. Quais são essas coplas? São: endógeno-exógeno, acre-doce, central-periférico, marcado-não-marcado, máximo-mínimo, quente-fresco. Um noto exemplo vem das casas dos Kabilas, uma etnia estudada por Bourdieu
2) através recolha e catalogação de objectos. O objeto é, em muitos casos, a comprova do facto social: catalogar os rituais.

Princípios da observação científica: objectividade

 

hípótese

Uma relação sistemática entre as variáveis, de modo que quando uma variável muda (varia), a outra (covariância) também muda. Exemplo: quando as temperaturas caem, a água solidifica.

Uma explicação proposta para uma associação; devem ser verificados e podem ser confirmados ou não. Exemplo: O conflito aumentará junto com o tamanho da população.

 

 

 

Explicação

 

A razão pela qual existe uma associação particular.

Exemplo: Girafas com pescoços mais longos têm taxas de sobrevivência mais altas e seus filhotes sobrevivem mais do que girafas com pescoços mais curtos, pois podem se alimentar melhor quando a comida é escassa.

 

Teoria

 

Uma estrutura explicativa de ideias logicamente interconectadas usada para explicar vários fenômenos.

Exemplo: A teoria da evolução darwiniana usada para explicar os pescoços longos das girafas e outras características adaptativas em diferentes espécies.

 

generalização

 

Uma declaração de que uma mudança em uma variável específica geralmente segue ou geralmente está associada a uma mudança em outra variável.

Exemplo: Quando as sociedades têm dietas com baixo teor de proteínas, elas tendem a ter mais tabus pós-parto do que quando a dieta é mais rica em proteínas.

 

Lei

Uma generalização que é universalmente válida.

Exemplo: quando a temperatura atinge 0 “C, a água se transforma

 

Será procurada objectividade na exposição, como na observação. Dizer o que sabemos, tudo o que sabemos, nada, mais do que sabemos. Evitar suposições, históricas ou de outra forma, que são inúteis e muitas vezes perigosas

Método de trabalho

Um bom método de trabalho será o método filológico que consiste na recolha dos contos, fazendo a colecção de variantes (exemplo: a primeira edição dos contos por Grimm); em seguida, as tradições especiais em cada aldeia, cada linhagem, cada família. Trabalho muitas vezes enorme, muito complexo. Ter em conta das pesquisas já feitas, e aquelas inacabadas,

O Holismo

Antropologia fixa como seu objectivo o estudo da alteridades cultural como um todo  ou seja holisticamente. No entanto todo comportamento humano é simultaneamente biológico e cultural «A evolução humana só pode ser entendida como um produto da interacção destes dois desenvolvimentosı». Trata-se da unidade biológica e social da humanidade contida na ideia de holismo onde nenhuma parte pode ser entendida plenamente, ou mesmo com exactidão, se separada do todo. A Antropologia toca virtualmente em todos os campos possíveis do conhecimento. Neste sentido Cultura é o sistema integrado de padrões de comportamento aprendidos, os quais são característicos dos membros de uma sociedade e não o resultado de herança biológica. A cultura não é geneticamente predeterminada; é não-instintiva. Ê o resultado da invenção social e é transmitida e aprendida somente através da comunicação e da aprendizagem (MAUSS 1926: 5-7).

Klucholm e Kroeber

A cultura consiste em padrões, explícitos e implícitos de comportamento e para comportamento, adquiridos e transmitidos por símbolos» que constituem as realizações distintivas dos grupos humanos, inclusive suas incorporações em artefactos; o comportamento distintivo de populações humanas diferentes é indiscutivelmente o produto da experiência cultural. Daí a necessidade de recorrer ao Método que nasce pela necessidade «de gravar e depois tentar de interpretar as coisas diferentes de nós» (CARDONA , 1976, p. 10)

Métodos

É a teoria da investigação que alcança os objetos de forma científica. Esse método é composto das seguintes etapas:

Método Indutivo

“Indução é um processo mental por intermédio do qual, partindo de dados particulares, suficientemente constatados, infere-se uma verdade geral ou universal, não contida nas partes examinadas”.

Três elementos são fundamentais para a indução, são eles:

“O problema da indução científica é apenas um caso particular do problema geral do conhecimento abstracto, pois a lei científica não é mais do que um facto geral abstraído da experiência sensível”.

Método Dedutivo

“Os argumentos dedutivos ou estão correctos ou incorrectos, ou as premissas sustentam de modo completo a conclusão ou, quando a forma é logicamente incorrecta, não a sustentam de forma alguma, portanto, não há graduações intermediárias. Resumindo, os argumentos indutivos aumentam o conteúdo das premissas com o sacrifício da precisão, ao passo que os argumentos dedutivos sacrificam a ampliação do conteúdo para atingir a “certeza

 

Método Dialético

É um método que descreve o movimento da realidade e do próprio pensamento por meio de uma forma dialética tese / antítese / síntese. Defende a necessidade do trabalho com a negação e com a contradição: por meio da confrontação entre as ideias. É possível gerar uma síntese que, por sua vez, deveria ser submetida a uma nova contradição e assim por diante

• Método Histórico

O método histórico, como o próprio nome diz, consiste em investigar acontecimentos, processos e instituições do passado para verificar a sua influência na sociedade de hoje, processos estes, desde o período de sua formação e suas modificações

Método Comparativo

Consiste no método que realiza comparações visando verificar similaridades e explicar possíveis divergências entre os resultados obtidos, sejam estes dados de grupos em qualquer tempo, seja no presente ou passado.

Os antropólogos se recusam a aceitar qualquer generalização sobre a natureza humana O antropólogo cultural estuda c compara o maior número possível de sociedades humanas, trabalho do campo = laboratório experimental os antropólogos modernos procuram uma sociedade ou uma série de sociedades que já contenham a combinação de factores necessários para o teste da teoria ou hipótese em questão

 

• Método Monográfico

É o método que busca fazer generalizações, já que parte do princípio de que em qualquer objecto de um estudo aprofundado, é também representativo de outros casos semelhantes. Busca partir um pequeno grupo, como o estudo de uma família, e ir tomando dimensões maiores, seja a comunidade ou grupos maiores, como cidades, estados, países

O método estatístico significa redução de fenómenos sociológicos, políticos, económicos, etc., a termos quantitativos. Seu papel é fornecer uma descrição quantitativa da sociedade, considerada como um todo organizado

• Método Tipológico

Ao comparar fenómenos sociais complexos, o pesquisador cria tipos ou modelos ideais, construídos a partir da análise de aspectos essenciais do fenómeno. A característica principal do tipo ideal é não existir na realidade, mas servir de modelo para a análise e compreensão de casos concretos, realmente existentes.

• Método Funcionalista

O método funcionalista, mais do que investigação, é um método de interpretação, em que se considera a sociedade como um sistema organizado formado por partes, cada uma com suas características desempenhando suas funções

• Método Estructuralista

Parte da investigação de um fenómeno concreto, passa-se ao nível abstracto, por intermédio da constituição de um modelo que represente o objecto de estudo, retornando, por fim, ao concreto, dessa vez como uma realidade estruturada e relacionada com a experiência do sujeito social. O método estruturalista  caminha do concreto para o abstracto e vice-versa. No plano abstracto elabora um modelo para analisar a realidade concreta dos diversos fenómenos.

 

O método do etnógrafo

Componentes da antropologia

Conforme explicado a antropologia cultural tem dois principais componentes acadêmicos: etnografia e etnologia.

Historicamente, a antropologia se concentrou nos povos tradicionais não ocidentais cujas línguas não eram escritas - pessoas cuja comunicação era frequentemente directa e cara a cara e cujo conhecimento sobre o passado se baseava principalmente na tradição oral. Mesmo em sociedades onde a escrita existe, não há muito do que interessa aos antropólogos, por escrito.

Trabalho de campo

Assim, os antropólogos fizeram questão de ir pessoalmente a esses lugares para observar e experimentar os povos e suas culturas de primeira mão. Isso é chamado de trabalho de campo. Hoje, o trabalho de campo antropológico ocorre não só em comunidades de pequena escala em cantos distantes do mundo, mas também em bairros urbanos modernos em sociedades industriais ou pós-industriais. Os antropólogos podem ser encontrados fazendo trabalho de campo em uma ampla gama de lugares e dentro de uma série de diversos grupos e instituições, incluindo corporações globais, organizações não-governamentais (ONGs), comunidades trabalhistas migratórias e pessoas refugiadas por causa de catástrofes naturais ou provocadas pelo homem. Em nosso mundo inesgotável e globalizante, onde fronteiras de longa data entre culturas estão sendo apagadas, novas redes sociais e construções culturais estão emergindo, tornadas possíveis pelas tecnologias de comunicação de massa e comunicação de longa distância. Atualmente, os antropólogos estão ajustando os seus métodos de pesquisa para melhor descrever, explicar e compreender essas dinâmicas complexas mas fascinantes na condição humana em rápida mudança do século XXI.

 

Os métodos de pesquisa etnográfica

Embora a antropologia se baseie em vários métodos de pesquisa, sua marca registrada é o trabalho de campo estendido em uma determinada comunidade ou grupo cultural. Este trabalho de campo apresenta observação participante em que o pesquisador não só observa e documenta a vida diária da comunidade em estudo, mas também participa dessa vida. Normalmente, o trabalho de campo inicial de um antropólogo é realizado solo e dura um ano completo. No entanto, alguns antropólogos trabalham em equipes, e algumas estadias de campo podem ser mais breves ou mais longas. Não é incomum que os antropólogos voltem aos seus locais de campo periodicamente ao longo de várias décadas.

Como e porque a pesquisa etnográfica evoluiu?

Os primeiros antropólogos documentaram as culturas tradicionais que estavam desaparecendo devido a doenças, guerras ou aculturações impostas pelo colonialismo, pelo poder crescente do estado ou pela expansão do mercado internacional. Alguns trabalharam como antropólogos governamentais, reunindo dados usados ​​para formular políticas relativas aos povos indígenas ou para ajudar a prever o comportamento dos inimigos em tempos de guerra. Após a era colonial ter terminado na década de 1960, os antropólogos estabeleceram um código de ética para garantir que suas pesquisas não prejudicassem os grupos que estudavam. Os métodos e conhecimentos antropológicos também são aplicados a uma série de desafios de globalização, incluindo desenvolvimento econômico, resolução de conflitos, negócios e políticas. Mas a finalidade da pesquisa antropológica é entender melhor, assinalar e explicar as diferenças e semelhanças entre culturas.

O estabelecimento de relações de confiança é um processo que decorre permanentemente, não se pode nunca dá-lo por concluído com qualquer sujeito. Para estabelecer relações de confiança, é importante que o etnógrafo seja capaz de se expor, de seleccionar situações em que possa revelar a sua vulnerabilidade. Caso contrário, estabelecerá uma relação de superioridade relativamente aos sujeitos reduzindo-os ao estatuto de meros objectos de pesquisa. Sem assumir o risco da exposição, o etnógrafo nunca crescerá enquanto sujeito no meio de outros sujeitos. Os riscos da pesquisa etnográfica

Como a pesquisa está relacionada ao método?

Os dados resultantes da pesquisa, sejam eles coletados através de trabalho de campo ou outro método, fornecem aos antropólogos o material necessário para produzir uma etnografia (ou uma descrição abrangente, escrita ou filmada de uma cultura). Além disso, eles fornecem detalhes que são fundamentais para a etnologia - comparações e teorias interculturais que explicam diferentes crenças e comportamentos culturais. Além de oferecer explicações, as metodologias nos ajudam a criar novas questões que aprofundam nossa compreensão dos fenômenos culturais. Os antropólogos apresentaram uma grande variedade de métodos, alguns dos quais foram substituídos ou melhorados por novas informações ou explicações melhores. Gradualmente, muito do que foi desconcertante ou desconhecido sobre as nossas espécies complexas e a sua fascinante diversidade social e cultural é exposto, revelado ou esclarecido através de pesquisas metodologicamente estruturadas.

método etnográfico


Em primeiro lugar, importa assinalar que um método de investigação (como a etnografia) não deve ser confundido com uma técnica de recolha ou tratamento dos dados:

Estrutura


o método é "uma praxe lógica da produção dos objectos científicos" (objecto científico entendido como grelha teoricamente construída que simultaneamente permite a leitura e a constituição da realidade).

Método


O método debruça-se assim tanto sobre os processos e os procedimentos de pesquisa como sobre os produtos criados através desses processos e procedimentos sustenta, as diversas fases e dimensões da pesquisa -
1 articulação teoria-prática à
2 selecção das técnicas e
3 análise de dados.

método etnográfico


tende a inverter a lógica do designo estereotipado, pois não é possível determinar a priori o curso de uma etnografia, sendo o trajecto da pesquisa constantemente redefinido
integração das diferentes fases da pesquisa enquadramento teórico, abrindo ao investigador à possibilidade de ser surpreendido porque o método é ordenado em função do real e não o real em função do método etnografia revela-se um método de forte carácter humanista e particularmente sintonizado com a experiência social

Os perigos da atracção pelo exotismo e pelo voyeurismo

Os investigadores correm o risco de misturar o estudo do fenómeno com o fascínio por algo que, pessoalmente, lhes pode aparecer como exótico e excitante seduzidos pelas diferenças culturais encontradas, podem negligenciar a análise dos fenómenos, tornando-se assim turistas, e voyeurs obcecados pelas diferenças culturais. Chocados com determinadas práticas de vida, podem intervir baseando-se em crenças e motivações pessoais acima dos interesses do estudo, assumindo mais o papel de assistentes sociais, políticos ou interventores do que de cientistas não deve existir uma sobreposição entre o nosso papel enquanto cidadãos e o nosso papel enquanto cientistas estratégia de investigação etnográfica revela, em princípio, algum distanciamento do investigador face a modelos realistas da cultura observada, preocupados com a identificação das causas caso empatizem e se identifiquem excessivamente com a cultura local, perdendo de vista a estranheza antropológica, os investigadores podem acabar por assumir disposições de exaltação É possível assumir uma abordagem romântica exaltando as qualidades culturais e o reconhecimento das capacidades dos sujeitos em estudo sem pôr atenção à análise do contexto de actuação

estatuto do pesquisador

É associado a questões de eficácia e moralidade , é apurado que o melhor método de entrada no terreno, e o mais óbvio, é dizer-se quem se é a nossa identidade não é algo que se revele logo a todos ao mesmo tempo. Nunca se dá toda a informação sobre nós próprios à primeira, nem se pede toda a informação sobre os outros à primeira – trata-se de uma regra de bom senso. O propósito fundamental da investigação de tipo etnográfico é a descrição cultural, possibilitada primordialmente pela observação participante de actividades desenvolvidas pelos membros de um determinado grupo durante um período de tempo relativamente longo.

Emerson, Fretz e Shaw

como dizem Emerson, Fretz e Shaw, esta aproximação não visa encontrar ou estabelecer «a verdade» daquilo que acontece ou aconteceu, mas sim «revelar as múltiplas verdades visíveis nas vidas dos outros»

Hélio Silva e Cláudia Milito

«(...) tentar não chegar à verdade, mas contar com um repertório mais amplo de mentiras que permitam, ao menos, a compreensão dos mecanismos de fabulação ali imperantes, o entendimento das fantasias, dos disfarces e das pistas falsas (...)»

Trata-se portanto de, através daquilo a que normalmente se chama de inside knowledge, ter acesso a diferentes representações do mundo que, constituindo a realidade de diferentes actores sociais, necessariamente encontram repercussão na diversidade das suas práticas.

A etnografia constitui-se desta forma como um processo de descrição e compreensão do sentido das trajectórias dos sujeitos e das comunidades. Nesta medida afigura-se de grande potencial heurístico para o estudo dos comportamentos desviantes Do mesmo modo revela-se um método potencialmente provocador na medida em que detecta sentido em comportamentos que, por medo e comodidade, nos fomos habituando a relegar para as margens da razão e da sociedade, excluindo-os do nosso convívio

Ernest Bekher

«Optar por uma teoria dos males humanos não se limita a uma opção pelo tipo de pessoa a quem teremos de prestar consideração em termos profissionais; significa também optar pelo tipo de mundo em que vamos acordar, pelos tipos de seres humanos com quem teremos de nos cruzar na rua»

Ao fazermos etnografia estamos a utilizar um método que prevê uma aproximação subtil e progressiva orientada para o estabelecimento de relações pessoais de confiança. Tais elementos do método, em conjunto com a disponibilidade do investigador para participar assumindo, de início, o papel de principiante, são fundamentais para uma boa entrada num mundo social

A questão do estatuto do etnógrafo no terreno é fundamental, estando-lhe associadas questões de eficácia e moralidade, o melhor método de entrada no terreno, e o mais óbvio, é dizer-se quem se é a nossa identidade não é algo que se revele logo de partida e a todos ao mesmo tempo. Nunca se dá toda a informação sobre nós próprios à primeira, nem se pede toda a informação sobre os outros à primeira – trata-se de uma regra de bom senso.

Em termos morais, uma questão incontestável é a de que o etnógrafo que nunca revela a sua identidade está a fazer-se passar por outrem e, a iludir os sujeitos com os quais realiza a pesquisa; é condenável que o cientista social se confunda com um espião. a descoberta da sua verdadeira identidade pode colocar em risco, pelo menos, o prosseguimento da pesquisa Para além disso, a opção por uma investigação conduzida em segredo tem também implicações em termos da eficácia da pesquisa: por um lado, impede o uso de outras técnicas como, por exemplo, as entrevistas formais o etnógrafo deve dar a conhecer claramente o seu papel, os seus interesses, as fronteiras que o separam dos sujeitos. E será a partir desse lugar que levará a cabo a difícil tarefa de conhecer o mais e melhor possível sem demonstrar uma curiosidade intrusiva típica dos agentes de controlo social curiosidade típica é a prática de formulação de perguntas directas que visam o estabelecimento dos factos processáveis pelo sistema burocrático da agência de controlo em causa e a identificação dos participantes nas categorias de culpados/inocentes, sãos/doentes, vítimas/ofensores.

relações com os informantes

trocas entre etnógrafo e informantes

Sabendo-se de antemão que as partilhas serão desiguais em virtude de cada uma das partes ter coisas bastante diferentes a oferecer, há quem opte por “profissionalizar” a relação, atribuindo gratificações monetárias aos sujeitos que participam na pesquisa e há quem nitidamente prefira outro tipo de intercâmbios, como a realização de favores do dia-a-dia a prestação de apoio em situações de conflito com a lei, a simples escuta do outro ou a partilha de bens de consumo rápido a qualificação da relação como sendo de tipo profissional corre o risco de inibir ou subverter o desenvolvimento de relações empáticas mais aprofundadas entre etnógrafo e informantes,

fundamento da etnografia

O propósito fundamental da investigação de tipo etnográfico é a descrição cultural, possibilitada primordialmente pela observação participante de actividades desenvolvidas pelos membros de um determinado grupo durante um período de tempo relativamente longo tentar não chegar à verdade, mas contar com um repertório mais amplo de dados que permitam, ao menos, a compreensão dos mecanismos que criam os hábitos, que fixam as tradições, que transmitem os valores culturais

Trata-se de, ter acesso a diferentes representações do mundo que, constituem a realidade das pessoas onde pesquisamos na diversidade das suas práticas.

A etnografia é processo de descrição e compreensão das praticas dos sujeitos e das comunidades. Estuda dos comportamentos desviantes, habitualmente designados de irracionais, loucos, estúpidos, incompreensíveis ou despropositados; de actos sem sentido

ETNOGRAFIA

revela-se um método provocador porque detecta sentido em comportamentos que, por medo e comodidade, nós fomos habituando a relegar para as margens da razão e da sociedade, excluindo-os do nosso convívio

A provocação, neste caso, resulta da necessidade de os enfrentar como fazendo parte de “Nós” e de confrontarmos as nossas noções de Bem e Mal. não limitar-se a escolher o tipo de pessoa a quem teremos de prestar consideração em termos profissionais; mas optar pelo tipo de mundo em que vamos acordar, pelos tipos de seres humanos com quem teremos de nos cruzar na rua adaptar o método ao objecto real, os mundos desviantes são, suspeitos e clandestinos, de difícil acesso através aos inquéritos ou as entrevistas formais, a etnografia é uma opção de investigação adequada o método etnográfico permite «aos “peões” das forças estruturais mais abrangentes emergirem como seres humanos reais que moldam os seus próprios futuros»

Ao fazermos etnografia estamos a utilizar um método que prevê uma aproximação e relações pessoais de confiança em conjunto com a disponibilidade do investigador para participar assumindo, de início, o papel de principiante, estes elementos são fundamentais para uma boa entrada num mundo social desviante

perigos

os investigadores correm o risco de misturar o estudo do fenómeno com o fascínio por algo que, pessoalmente, lhes pode aparecer como exótico e excitante seduzidos pelas diferenças que encontram, perdem a capacidade de observar, tornando-se assim uma espécie de turistas, obcecados pela identificação das desconformidades

Chocados com determinadas práticas e modos de vida, são mais preocupados de guardar crenças e motivações pessoais do que estudar e analisar, tornam-se assistentes sociais, políticos do que de cientistas não deve existir uma sobreposição entre o nosso papel enquanto cidadãos e o nosso papel enquanto cientistas A estratégia de investigação etnográfica leva ao distanciamento do investigador face a modelos realistas do desvio, preocupados com a identificação das causas do comportamento desviante e a eficácia das correcções

Regra n° 1: Observar!

Os Antropólogos colectam dados mesmo navegando nos arquivos e na literatura anteriormente publicada que seja relevante para as suas pesquisas, Quando juntam-se deliberadamente pessoas com diferentes tradições culturais, o trabalho de campo etnográfico provoca mal-entendidos, e surpresas como as que estão na ordem do dia, mas é com reuniões semelhantes, que a pesquisa de campo produz muitos resultados para que os antropólogos possam aprender acerca das pessoas de outras sociedades.

A recolha de dados durante um longo período permaneceu no contacto próximo com os membros de uma outra sociedade chama-se observação participante.

A observação participante, que é baseada no contacto directo com o povo no curso da vida diária, foi Malinowski a inventá-la e permanece típica da antropologia como disciplina

Com a observação participante os antropólogos são capazes de interpretar os discursos e acções no contexto mais vasto da interacção social e das crenças e valores culturais Por vezes também administram testes psicológicos e questionários dentro da finalidade da pesquisa no campo, mas eles nunca confiam unicamente nestes método

Porque as informações obtidas desta forma, por si só, não será possível contextualizar e são susceptíveis de ser muito enganador.

A observação participante é, talvez, o melhor método disponível para estudiosos que aspiram à compreensão holística da cultura e da condição humana

Trabalho de campo

Para a maioria dos antropólogos culturais pesquisa de campo etnográfica e experiência que caracteriza a disciplina.

A observação participante necessita de viver um pouco mais a próximo contacto possível com as pessoas cuja cultura se está estudando Em qualquer caso, as condições de vida no campo são importantes para a cultura estudada, Para a maioria dos antropólogos culturais a pesquisa de campo etnográfica é a experiência que caracteriza a disciplina. A fazem nos primeiros anos do curso ou na especialização, participando de projectos de pesquisa da Universidade em missões sob a direcção de experientes antropólogos, mas principalmente uma longa estadia no curso de estudo.

Onde e em qual matéria se deve geralmente pesquisar para especialização? Devemos obter os fundos. Solicitando financiamentos a fundações privadas ou órgãos do governo. Uma vez procurados os fundos, o antropólogo deve obter a permissão para executar a pesquisa na região seleccionada, que significa ter os contactos com o governo do país estrangeiro e com um centro de pesquisa ou universidade, ou com ambos.

Enquanto a aprovação do projecto recebido de pesquisa, cumpre seu iter, o pesquisador estabelece relações profissionais com académicos e instituições do lugar

Em muitos países uma afiliação profissional semelhante é obrigatória e os antropólogos consideram uma importante parte da pesquisa, porque os colegas inseridos na instituição fornecerão info úteis, informações e conversas. Os Antropólogos devem também cuidar de dar algo para as pessoas e para o país-sede. O ' mínimo que podem fazer é fazer participar os colegas convidando-os na pesquisa. As condições de vida no campo dependem da natureza da sociedade e do tipo de investigação que se pretende levar a cabo. A observação participante nos obriga a viver o mais próximo possível com as pessoas com as quais estudamos a cultura.

O antropólogo que trabalha entre povos distantes em florestas tropicais, desertos ou chanas talvez trará consigo uma tenda. Em outros casos, vai viver numa casa ou num apartamento da vila, do bairro ou da cidade onde a pesquisa se realiza

Nem todos os campos de pesquisa estão em tal contraste com extracção burguesa de muitos pesquisadores e de fato alguns são quase luxuosos, mas o estreasse e desorientação física e mental são previsíveis.

Que a partir de um país de clima temperado, se possam encontrar nos trópicos implica adaptar-se ao calor, e quem está fazendo pesquisa no Árctico, ao frio.

Especialmente em áreas quentes podemos deparar-nos frequentemente em plantas, animais, insectos e doenças (como a malária) nunca vistas antes e em todas as latitudes deve resignar-se à água e comida local

Além disso, existem diferenças culturais, e é o motivo pelo qual se quer ir. No início, só para chegar no fim do dia e encontrar alojamento e algo para comer, parece uma grande dificuldade, embora também existam dados a serem colectados, e pesquisas para fazer!

antropologia social

Assim, a antropologia incluía todas as manifestações da vida dos homens primitivos, da tecnologia às ideias sobre o sobrenatural. Radcliffe-Brown argumentou dizendo que era um critério pouco racional e queria que os assuntos fossem divididos em função de uma afinidade lógica. Antropologia Social. Uma das Distinções mais importantes é aquela entre a antropologia social vista como Sociologia comparativa, busca regras universais coloca as na base do comportamento social dos homens

etnologia

E o que ele definiu como etnologia, entendida como uma disciplina histórica, cuja tarefa era de reconstruir o tempo para a história de povos primitivos e classificar as raças e línguas. Foi Sir James Frazer, no entanto, a utilizar por primeiro o termo "antropologia social" no sentido em que é hoje entendido pelos antropólogos sociais britânicos. Em 1908, em sua palestra inaugural como professor honorário de antropologia social na Universidade de Liverpool, ele definiu claramente a natureza e o âmbito dos interesses da antropologia social Ele colocou a ênfase no fato de que as "histórias" escrita por etnólogos nunca tinham sido "reais", mas apenas divulgações especulativas e, no melhor dos casos, prováveis, mas na pior das hipóteses eram simples colecções de hipóteses não verificáveis

tarefa

A tarefa do antropólogo social e de formular e validar as generalizações sobre as condições de existência dos sistemas sociais (leis da estática social) e as regras que podem ser observados na mudança social (leis da dinâmica social) É necessário lembrar que quando um antropólogo está interessado numa tribo ou numa aldeia não estuda a natureza humana, como se fosse uma panela sem tampa', como diria Aldous Huxley

As características "especiais" com a qual temos de fazer são determinadas pelo sistema de segurança social, enquanto que o sistema de segurança social é por sua vez, determinado por características gerais da natureza humana, que constitui a base

Obervação Participante

 

Moderna metodologia da observação participante.

Esta forma de trabalhar no campo recusou um certo estilo de investigação, antropólogos, convocam, os "informantes" para falar da cultura numa tenda ou na varanda, as pessoas saiam para fora, para pesquisar "fazer da aldeia"

pesquisa de campo

Segue-se que um etnógrafo para trabalhar, aprende pelo menos, uma parte da língua A observação participante intensivo e, provavelmente, a mais duradoura contribuição da antropologia para ciências humanas

perigos

meio de transporte: separar a pesquisa do campo daquela do meio de transporte apagar a cidade capital e o contesto nacional

 

O Método no Trabalho de campo

olhar para a realidade de cada dia descobrindo os modelos e significados subjacentes ao mundo fenoménico descobrir o sistema de relações que confere significado às coisas a maneira com a qual a sociedade impõe um comportamento a antropologia vai além e descobre Crenças, práticas e formas culturais

Bibliografia

Geertz, C. (2008). A Interpretação das Culturas. LTC.

Lévi-Strauss, C. (1957). Tristes Trópicos. Anhembi.

Kottak, C. P. (2012). Antropologia culturale. McGraw-Hill.

Cardona, G. (1976). Introduzione all’etnolinguistica. Il Mulino.

Emerson, R. M., Fretz, R. I., & Shaw, L. L. (2011). Writing Ethnographic Fieldnotes. Chicago University Press.

Milito, C., & Silva, H. R. S. (1995). Vozes do Meio-Fio. Dumará.

Becker, H. S. (1993). Métodos de Pesquisa em Ciências Sociais. Hucitec.


                            5ª aula 7 de Novembro: método etnográfico 

 

a etnografia não é uma atividade repentinamente assumida no local, mas uma prática complexa que requer orientação, reflexão e formação específica.

Método etnográfico

O termo 'etnografia' deriva do grego ethnos, que significa 'raça', 'grupo de pessoas' ou 'grupo cultural', e de graphos, que significa 'escrita'. A expressão alude a um único método de pesquisa, mas pode se referir tanto às atividades de investigação quanto ao texto escrito em que as informações coletadas são relatadas. Embora agora seja usada por inúmeras disciplinas (sociologia, psicologia, ergonomia), a etnografia nasceu e se desenvolveu dentro da antiga topologia cultural, como um método-chave para investigar os 'hábitos e costumes' locais de vários grupos sociais. No seu conjunto a etnografia pode ser colocada dentro da família mais ampla de métodos qualitativos (em oposição aos quantitativos). Suas peculiaridades, de fato, consistem na importância atribuída à técnica de observação participante: investigação in loco, interação com os informantes, caráter analítico-descritivo das reflexões.

Como qualquer método, a etnografia também tem sua própria história disciplinar (ver Stocking , editado, 1983). Em suma, seu nascimento e desenvolvimento podem ser rastreados até três estágios.

No alvorecer da disciplina (na segunda metade do século XIX), o trabalho desenvolvido pelos primeiros antropólogos limitava-se a uma série de pesquisas documentais. Em uma época em que as disciplinas antropológicas recém-nascidas estavam amplamente entrelaçadas com as instituições dos museus, elas trabalharam, de fato, sem se mudar de seus centros universitários, referindo-se a exposições de museus e relatórios enviados para casa por observadores não profissionais, operando como missionários, funcionários ou comerciantes em áreas coloniais. Neste período, as análises baseavam-se, portanto, em materiais 'usados', recolhidos, por vezes, sem critérios científicos ou para finalidades diversas.

Método da varanda

A partir dos últimos anos do século XIX, novos métodos de pesquisa começaram a ser experimentados: esses esforços deram origem à chamada 'antropologia na varanda'. O pesquisador dirigia-se pessoalmente às pessoas de seu interesse, mas os encontrava fora dos locais onde realizavam suas atividades diárias. Normalmente, esse encontro acontecia, de fato, na varanda dos diversos escritórios militares, comerciais ou missionários, que pontilhavam os impérios coloniais.

Os limites de tal situação parecem evidentes: o lugar de troca não é neutro, a situação nada natural e, por fim, a informação é obtida exclusivamente a partir das histórias dos indígenas (sem qualquer tipo ou possibilidade de controle).

Método da pesquisa do campo

Com o tempo, os antropólogos passaram a praticar um tipo diferente de pesquisa, que mais tarde seria definido 'no campo' (trabalho de campo). A pesquisa de campo envolve a observação direta dos diversos grupos sociais e é realizada em visitas pessoais e por longos períodos aos locais onde residem. Nas primeiras décadas do século XX, essa prática se difundiu e se consolidou como o método peculiar das disciplinas antropológicas. Especificamente - ainda que certamente não tenha sido o primeiro a colocar em prática um tipo 'moderno' de pesquisa etnográfica -, é devido a Bronislaw Malinowski , que trabalhou nas Ilhas Trobriand (Melanésia) entre 1915 e 1918, ter tematizado explicitamente a centralidade da observação participante como um tipo específico de metodologia.

Observação participante

A expressão 'observação participante' já sintetiza as formas de interação do antropólogo com os membros do grupo social investigado: ele vive em sua comunidade, atende seu cotidiano (e, às vezes, participa dela), domina pelo menos em parte sua linguagem, sem nunca abandonar sua intenção cognitiva e sua posição de observador externo. Por meio de uma imersão em profundidade em um determinado contexto local, o pesquisador busca adquirir experiência e documentação útil para ilustrar e compreender o tipo de vida social do grupo estudado.

Pesquisa qualitativa

Embora os antropólogos muitas vezes falem disso de uma maneira 'insular' e com uma linguagem idiossincrática, a etnografia faz parte da família maior da pesquisa qualitativa. Dizer isso ajuda a enquadrar sua natureza metodológica, mas, em qualquer caso, não resolve o problema. Definir em que consiste a pesquisa qualitativa não é, na verdade, uma tarefa simples, pois, sob esse rótulo, estão incluídos uma variedade de temas, abordagens teóricas, métodos de coleta e análise de material empírico. A literatura fornece algumas definições amplas e inclusivas a esse respeito e outras mais restritivas.

Um dos critérios mais comumente usados ​​para definir os elementos comuns às várias abordagens qualitativas refere-se aos procedimentos de análise e interpretação utilizados: neste sentido, a pesquisa qualitativa adotaria procedimentos analíticos que não pressupõem a transformação dos fenômenos estudados em números (ie sua quantificação) e seu tratamento estatístico, mas procedimentos mais informais, que contam com a capacidade analítica e recursos do pesquisador, como a conceituação. Normalmente, a pesquisa quantitativa incluiria métodos como o experimento de laboratório e a pesquisa.

Outras caracterizações colocam a ênfase na orientação mais ampla para a pesquisa ou 'paradigma' de investigação. A pesquisa quantitativa seria, portanto, aquela conduzida dentro do paradigma positivista, cujo método preferencial de investigação é o experimento de laboratório, enquanto a qualitativa se referiria ao paradigma construtivista (ver abaixo, § 1.6).

Muitos outros critérios distintivos poderiam ser propostos, sem que se chegasse a uma solução totalmente satisfatória e que recebesse consenso unânime. Portanto, me limitarei a citar a definição mais conhecida: a de Denzin e Lincoln , segundo a qual a pesquisa qualitativa deve ser entendida como a pesquisa que adota uma abordagem naturalista de seu objeto de investigação, estudando fenômenos em seus contextos naturais e a tentativa de dar sentido a eles, ou interpretá-los, em termos do significado que as pessoas lhes dão.

Note-se que as abordagens qualitativas não são recentes nas ciências sociais, ainda que tenham se firmado sobretudo nas últimas três décadas, após terem ocupado uma posição marginal por muito tempo. Os efeitos do que vários estudiosos definiram como 'revolução qualitativa' podem ser encontrados tanto no aumento de publicações sobre métodos qualitativos nos últimos vinte anos, quanto na recepção cada vez mais favorável que este tipo de pesquisa encontra hoje no campo de aplicação. (as maiores resistências encontravam-se sobretudo na psicologia e na epidemiologia, devido ao domínio exercido pelos paradigmas positivistas, que durante muito tempo permaneceram quase em contraste, apesar dos debates surgidos no início dos anos setenta).

Dada a inclusão da etnografia na família mais ampla da pesquisa qualitativa, podemos agora identificar uma série de aspectos gerais que unem, em maior ou menor medida, as várias pesquisas etnográficas existentes:

a) a perspectiva sobre o 'objeto investigado,

b) a pesquisa métodos,

c) explicação científica,

d) pesquisador,

e) paradigmas de pesquisa mais amplos dentro dos quais a antropologia se encaixa

 

A abordagem do objeto

Um primeiro elemento saliente da pesquisa etnográfica é a sua forma de abordar o objeto estudado, que, de vez em quando, pode ser um caso, um acontecimento, um ator, um fenômeno ou uma situação sociocultural. Este objeto é visto em sua singularidade e particularidade (antes de examinar o que ele tem de semelhante ou diferente em relação aos outros) e analisado em profundidade, antes de fazer afirmações gerais (por exemplo, aplicável a uma população mais ampla) ou comparativo (comparações com outros casos). A princípio o pesquisador concentra sua atenção em um único caso e, somente posteriormente, supondo que o julgue adequado, faz uma comparação com diferentes casos. O que constitui um 'caso' então depende da teoria adoptada: por exemplo, um indivíduo e seu ponto de vista; uma interação que ocorre em um determinado lugar e tempo; um contexto social e cultural em que o evento ocorre.

A atenção à singularidade explica também o interesse dos investigadores qualitativos por casos e situações locais, específicos e circunscritos, e a tendência de salvaguardar e recuperar na análise a individualidade dos participantes, que normalmente se perde na complexidade das manipulações estatísticas (onde o interesse concentra-se na distribuição de um determinado fenómeno na população em geral).

O objeto estudado é observado em toda a sua complexidade. Isso implica atenção especial também para propriedades / características geralmente consideradas irrelevantes ou não investigáveis ​​pela aplicação de instrumentos de medição convencionais: propriedades / características que vão além da quantidade, quantidade, frequência e intensidade, geralmente medidas em uma escala numérica com níveis de precisão diferentes (que podem variar de o simples registro da presença ou ausência ao uso de unidades de medida constantes). Atentar para a complexidade do objeto também significa conceber o fenómeno estudado como um sistema - que é sempre mais do que a simples soma de suas partes e é o resultado de interdependências complexas - em vez de extrapolar propriedades ou características individuais dele para examiná-las em isolamento.

O objeto (um evento, uma interação, uma instituição) é observado e estudado no contexto natural em que está inscrito e se manifesta, sem, no entanto, influenciar sua ocorrência. O pesquisador qualitativo, portanto, evita manipular o contexto (por exemplo, transferindo o sujeito para o laboratório ou forçando, por meio de instruções experimentais, seu comportamento em uma direção específica) e tenta estudar os fenómenos à medida que se manifestam espontaneamente no 'mundo real'.

Outro elemento que distingue a pesquisa qualitativa é o interesse pelos significados que os atores sociais atribuem ao mundo em que vivem. Os participantes do fenómeno em estudo são vistos como indivíduos que - em interação com outras pessoas - desenvolvem significados, os transmitem, modificam e agem sobre eles. Sua atividade é mediada por comunicação verbal e não verbal, ações e práticas sociais. A linguagem, a comunicação, a interação, a ação no contexto físico, social, cultural e histórico constituem as ferramentas pelas quais traçar os significados (de maneiras diferentes dependendo das orientações teóricas existentes) e, portanto, representam o objeto centro de pesquisa da pesquisa qualitativa.

A perspectiva da teoria

Se a pesquisa conduzida pelo método hipotético-dedutivo se preocupa principalmente em verificar a aplicabilidade e generalização das teorias, a pesquisa qualitativa desempenha outra função complementar, igualmente importante no processo científico: a heurística da descoberta (Fetterman 1989, p. 32). O objetivo principal da pesquisa qualitativa é, de fato, descobrir fenômenos sociais novos ou pouco conhecidos e explicá-los a partir de sua observação. Este tipo de pesquisa, portanto, tem, em primeiro lugar, propósitos exploratórios e descritivos e é particularmente útil quando não há um conhecimento aprofundado sobre um determinado fenômeno, quando as teorias existentes são incompletas, inadequadas ou quando estão completamente ausentes (por exemplo, no caso de novos fenômenos).

Isso explica o fato de que a etnografia recentemente entrou em numerosos setores 'aplicados' da pesquisa social (comunidades, organizações, saúde, educação) e o fato de que a natureza das áreas de pesquisa é frequentemente específica e circunscrita (é, por exemplo, ligada à exploração das experiências subjetivas dos participantes).

Os objetivos da etnografia obviamente afetam a questão de pesquisa, sua origem e a forma como ela é formulada e reformulada durante a própria pesquisa. As questões de pesquisa não surgem do nada: sua origem frequentemente está na biografia intelectual do pesquisador, em seus interesses práticos e em seu envolvimento em determinados contextos sociais e históricos; durante o processo de pesquisa, eles são progressivamente especificados e delimitados. As principais questões de pesquisa que o pesquisador qualitativo se coloca geralmente visam descrever causas, processos, consequências, estratégias que levam a determinados resultados.

Ao contrário do modelo do processo hipotético-destrutivo, que busca por leis e teorias gerais, aplicáveis ​​a uma ampla gama de situações, quem realiza pesquisas qualitativas partem preferencialmente 'de baixo', tentando explicar fenómenos circunscritos, com uma de generalizabilidade. Não é à toa, quando falamos em 'teorias' no campo da pesquisa qualitativa, geralmente nos referimos a explicações válidas para uma área limitada de situações (ver abaixo, capítulo 4). Essas teorias podem, no entanto, ser estruturadas em diferentes níveis de generalidade e abstração, que vão desde a simples descrição de um conjunto de conceitos (o produto preliminar da atividade de análise, que consiste em uma série de categorias ou temas analíticos, possivelmente articulados em superordenados ou categorias subordinadas) para a identificação de relações de vários tipos entre os próprios conceitos.

Os objetivos que a pesquisa qualitativa se propõe e o nível de abstração de suas teorias têm consequências importantes na escolha das amostras dos participantes da pesquisa. Em particular, o requisito da representatividade da amostra em relação à população (fundamental no contexto da abordagem hipotético-dedutiva) perde aqui importância, dado que, neste contexto, não há ambição de descobrir leis gerais. Na verdade, existe uma atitude pragmática e flexível na definição de estratégias de amostragem.

Reflexão sobre métodos de pesquisa

Uma vez que o objetivo principal da etnografia como pesquisa qualitativa é analisar e compreender plenamente a especificidade de certos fenómenos socioculturais, o método também está sujeito a esse requisito. No modelo hipotético-dedutivo convencional, apenas o que pode ser rastreado até os métodos disponíveis é considerado digno de interesse científico; já para os pesquisadores qualitativos, o fator determinante para a escolha do método é o objeto estudado. Precisamente para fazer jus à complexidade do objeto de pesquisa, optam-se por métodos tão abertos quanto possível, que permitam que seja estudado em sua totalidade e no contexto cotidiano em que ocorre.

Daí o pluralismo metodológico da etnografia, que sempre foi flexível e pragmática na escolha do método de pesquisa mais adequado para cada caso individual. Esse pluralismo implica não apenas na adoção conjunta ou sequencial de diferentes métodos em uma mesma pesquisa, mas também no abandono ou modificação de métodos inicialmente utilizados e até mesmo no desenvolvimento de novos métodos.

O tema do pesquisador

Uma peculiaridade das chamadas ciências sociais - incluindo a antropologia cultural - é o fato de quem investiga e o que é investigado compartilham o mesmo status ontológico do ser humano. A pesquisa qualitativa, portanto, implica uma atividade reflexiva: ao analisar a variedade de costumes e tradições existentes dentro e fora de sua sociedade, o pesquisador indiretamente questiona a si mesmo e seus pressupostos culturais.

Como você pode imaginar, isso complica muito a situação. A abordagem hipotético-dedutiva tradicional contornou esse problema, fazendo com que o pesquisador 'desaparecesse' como indivíduo (ou pelo menos é isso que se aspira: para minimizar os fatores responsáveis ​​pelo viés do experimentador, vários cuidados são tomados). O método qualitativo, por outro lado, reconhece a especificidade do pesquisador, sendo ele um indivíduo pertencente a uma cultura, uma sociedade, um grupo, uma determinada categoria, com crenças, opiniões, valores, motivações, interesses e sócio-demográficos pessoais. características. Em termos concretos, isso significa não só aceitar o fato de que a pesquisa nunca pode ser 'neutra', imune aos pontos de vista subjetivos e aos valores de quem a conduz, mas também encontrar uma forma de reavaliar essa subjetividade, fazendo é um instrumento analítico fundamental, útil para evidenciar significados tanto na fase de coleta de dados, por meio do envolvimento pessoal, quanto na fase de análise, por meio do trabalho de interpretação.

Uma vez que o objeto de investigação da etnografia consiste em significados ocultos, a atividade de interpretação e conceituação dos dados coletados assume particular importância. Esta atividade, no entanto, não pode ser confiada (ou não pode ser confiada apenas) a ferramentas de medição convencionais e requer inevitavelmente a aplicação de habilidades e recursos interpretativos do pesquisador (influenciados pelo estudo, experiência, intuição pessoal etc.). Para dar apenas um exemplo, pense em como a interpretação é fundamental quando você procede à classificação e quantificação das respostas dadas em uma entrevista (mas também, e tendemos a esquecê-lo com muita frequência, ao tentar 'fazer as pessoas falarem' resultados da aplicação de procedimentos estatísticos na investigação experimental).

Se, no contexto da pesquisa qualitativa, o pesquisador assume um papel central no processo de produção do conhecimento científico (ao invés de constituir uma fonte de preconceito), sua subjetividade (e, portanto, suas reflexões pessoais, suas impressões e emoções vivenciadas no contexto de a pesquisa), ao lado dos participantes, é parte integrante da própria pesquisa. No entanto, um possível problema surge a partir daqui: não importa o quanto você tente para se manter neutro e distanciado, o pesquisador é, de fato, portador de um determinado ponto de vista, que pode não coincidir com o dos participantes da pesquisa. Esta 'lacuna', que existe inevitavelmente, nunca pode ser preenchida e nem faria sentido tentar preenchê-la: não constitui um 'erro' de medição. No entanto, é possível arquivá-lo, negociando as diferentes interpretações (do pesquisador e dos participantes da pesquisa): alguns etnógrafos defendem, a esse respeito, a necessidade de verificar as interpretações produzidas pelo pesquisador com as dos participantes de sua pesquisa ( ver abaixo, § 5.2), como critério para garantir a sua validade, pertinência e reflexividade. Na etnografia, de fato, a realidade estudada não se 'dá' em sentido absoluto, mas se constrói em perspectiva, em uma arena social da qual participam as diversas subjectividades envolvidas: o processo etnográfico de produção de conhecimento se realiza graças ao interação entre pesquisador e participantes.

Ética e epistemologia da pesquisa etnográfica

Por epistemologia, entendemos aquele tipo específico de investigação filosófica relacionada às modalidades e legitimidade com as quais viemos a conhecer uma certa coisa, evento ou fenômeno (Oldroyd 1989, p. 9). Na base dos dois métodos de pesquisa ilustrados até agora (o quantitativo e o qualitativo), existem, portanto, não apenas diferentes tensões metodológicas, mas também conceitos mais amplos de conhecimento, cada um dos quais propõe uma visão específica do conhecimento científico e métodos apropriados .e legítimo para alcançá-lo. Nos parágrafos anteriores, essas concepções foram ilustradas em suas implicações para a metodologia de pesquisa. A seguir, vou me limitar a resumi-los e torná-los explícitos do ponto de vista de seus pressupostos básicos. O paradigma subjacente ao método hipotético-destrutivo, experimental ou “quantitativo” é o positivismo. Representa a visão mais tradicional da ciência, típica da física, e pressupõe a resistência de uma única realidade externa, regida por leis e mecanismos imutáveis, que cabe ao pesquisador descobrir. A verdade das afirmações científicas pode ser verificada comparando as afirmações teóricas com os 'fatos' supostamente objetivos e neutros. Considera-se possível - e mesmo necessário - que o pesquisador mantenha uma posição de independência em relação ao objeto estudado, ou seja, que não o influencie com seu próprio ponto de vista subjectivo e valores, e que a utilização de procedimentos padronizados garante a objetividade do método científico.

Mesmo o paradigma falsificacionista, proposto para enfrentar as inúmeras críticas recebidas do positivismo, não se afasta muito desses pressupostos. Nessa segunda perspectiva, acredita-se que haja uma realidade externa, que, no entanto, só pode ser conhecida de forma imperfeita devido às limitações humanas (por exemplo, 'vieses' sociais). Em outras palavras, não se considera mais possível alcançar a independência completa entre o pesquisador e o objeto estudado, mesmo que a objetividade total continue sendo um objetivo a ser perseguido. A objetividade seria, em particular, favorecida por critérios como consistência dos resultados com a literatura anterior e consenso dentro da comunidade científica; o pesquisador não pode 'provar' uma teoria, mas pode eliminar interpretações alternativas, demonstrando sua não falseabilidade. Em termos de método, embora privilegie o experimental, aceitam-se também metodologias mais qualitativas, embora lhes seja atribuído um papel secundário e secundário (adequado, por exemplo, para as fases preliminares da investigação).

O paradigma alternativo, que inspirou a etnografia e a maioria dos métodos qualitativos, é o constructivista. De acordo com o constructivismo, o objeto é O saber e o sujeito que conhece estão inextricavelmente ligados um ao outro, como partes de um mesmo processo. Um dos principais pressupostos desta orientação é, portanto, que não existe uma única análise da realidade, mas muitas diferentes perspectivas de análise, que podem estar em conflito entre si, alternativamente ou em complemento (o mesmo fenómeno pode ter diferentes significados para pessoas diferentes, perseguindo interesses diferentes). Além disso, cada representação da realidade é construída socialmente por pessoas que desempenham um papel ativo no processo de pesquisa.

De modo geral, o paradigma construtivista sublinha, portanto, que a pesquisa não é um mero 'espelho do mundo', mas é sempre produto dos interesses do pesquisador, que devem, portanto, ser explicitados. Além disso, o pesquisador e os participantes da pesquisa não são independentes, mas influenciam-se mutuamente.

Uma vez que o trabalho do etnógrafo é analisar e compreender os eventos socioculturais, métodos de coleta de dados mais interativos são favorecidos, ou seja, de forma a permitir ao pesquisador ter uma experiência direta do que está investigando e detectar na opinião dos sujeitos investigados abrir. Isso também tem consequências importantes para a ética e a ética profissional do trabalho etnográfico.

Um primeiro aspecto do problema está relacionado à privacidade e ao impacto que a divulgação de notícias sobre determinado grupo social pode ter para seus membros. Na verdade, não é incomum que a divulgação das informações coletadas em campo acabe criando problemas para as pessoas identificadas e os próprios informantes, trazendo à tona manobras, fofocas, conflitos de interesses que de outra forma teriam seguido seu curso tácito e implícito ( especialmente em pequenas comunidades investigadas por antropólogos).

De maneira semelhante, as etnografias operam na opinião pública mais ampla, à qual oferecem certas representações dos grupos sociais sob investigação. Por exemplo, o tom 'exótico' e 'primitivista' de muitos relatos das décadas de 1930 e 1940, embora não tenha intenções racistas, ajudou a divulgar uma imagem das populações não ocidentais como entidades fechadas, isoladas, estáticas e tradicionais; os efeitos discriminatórios desses preconceitos ainda estão presentes no imaginário coletivo hoje.

Finalmente, permanece a questão premente dos clientes. Se, no caso da pesquisa universitária, o aspecto é de importância limitada, devido às restrições impostas pelo propósito exclusivo de pesquisa, sua relevância é forte no caso de organismos de fomento externos, movidos por aplicativos ou intenções comerciais. Além do elo muitas vezes presente entre etnografia e empreendimento colonial (na pessoa de missionários ou funcionários coloniais), exemplares na história da disciplina são os dois famosos casos de etnógrafos usados ​​como espiões no México na primeira metade do século XX. e na Birmânia na segunda metade do século. Mais recentemente, situação semelhante veio às manchetes, no que diz respeito ao uso de antropólogos pelos militares dos EUA no Iraque.

Justamente por fazer parte da realidade social que estuda, faz da prática da etnografia um empreendimento que exige vigilância constante com respeito aos interesses que a produzem e aos ambientes nos quais seus resultados circularão. Como ilustraremos com mais detalhes ao longo da exposição, a realização de um trabalho de pesquisa eticamente responsável exige que, para cada contexto e situação, seja considerado um conjunto de medidas cautelares, que podem incluir o consentimento dos sujeitos, o anonimato dos informantes, a gestão astuta de tópicos 'quentes' (por exemplo, HIV, estereótipos raciais, processos judiciais e disputas políticas) e, como um caso limítrofe, a própria oportunidade de escolher um tópico de pesquisa específico.

Bibliografia

Stocking, G. W. (1992). The Ethnographer’s Magic and Other Essays in the History of Anthropology. Madison: The University of Wisconsin Press.

Malinowski, B. (1976). Argonautas do Pacífico Ocidental. São Paulo: Victor Civita.

Denzin, N. K., & Lincoln, Y. S. . (2006). O planejamento da pesquisa qualitativa: teorias e abordagens. Porto Alegre: Artmed.

Fetterman, D. (2010). Ethnography step by step. Los Angeles: Sage.

Oldroyd, D. (1989). Storia della filosofia della scienza. Milano: Il Saggiatore.


                            6ª aula 14 de Novembro: trabalho de campo 

Fazer trabalho de campo na Antropologia Cultural

O trabalho de campo em antropologia cultural pode ser excitante, frustrante,  assustador, chato e às vezes perigoso.  Uma coisa é verdade: ele transforma a vida de todos os envolvidos.  Esta lição  explora as fases de um projeto de pesquisa de campo, começando com o planejamento inicial e terminando com a análise e apresentação das conclusões. Na sua chegada, o antropólogo, como qualquer estrangeiro, é objecto de curiosidade, receberá visitas, haverá muitas perguntas, a sua chegada provocará hostilidade e suspeita; Ele pode ser considerado chato e irritante do ponto de vista social ou pelo contrario pode ser exibida a sua presença, como motivo de orgulho. Mas em ambos os casos, o curso natural dos acontecimentos, chega a seu termo estabelecendo um acordo com a população: o processo global de recíproca adaptação leva, depois de algum tempo, o antropólogo a encontrar o seu lugar na comunidade a sua presença será aceite; as pessoas irão responder às suas perguntas, irão preocupar-se pelo seu sustento, vão convidá-lo nas suas cerimónias, para contar e explicar as coisas que perceberam que lhe interessam. Vai rir-se ele próprio dos seus erros e das suas gafes desconhecendo a etiqueta local, poderá ficar divertido ao considerar as suas formas bizarras ou até permanecer perplexo quando tentará de dar-se uma explicação. Aos poucos, o que era estranho se tornará familiar: dar-se-á conta das fofocas da aldeia, e assim apreenderá o que é ordinário e extraordinário na vida diária das pessoas. E as pessoas dar-se-ão, a conhecer com características um pouco diferentes daquelas que ele deixou na sua terra natal. De facto, sob o a capa da alteridade cultural, o antropólogo reconhecerá os mesmos tipos de personalidade e acabará por considerar essas pessoas não apenas como protótipos étnicos, mas como pessoas que poderão agradar ou desagradar-lhe. Ao progredir os seu trabalho, identificará as pessoas e estudará as suas reacções. O antropólogo inevitavelmente estabelecerá laços mais estreitos com os uns que com os outros. Haverá quem o ajuda o ajuda como um assistente, outro como informante, intérprete, mordomo, cozinheiro ou empregado de mesa; Há outros que para obter a sua consideração, estarão de ida e volta ao redor da sua casa, na esperança de ser selecionados para uma comissão ou para fornecer uma pequena notícia. Um ou outro, na base do seu conhecimento especial ou habilidades, autoridade, qualidade do intelecto ou caráter, poderá tornar-se um seu informante especial e íntimo associado. A relação entre o antropólogo e o informante tem muitos dos atributos de outras espécies de relações básicas: aquelas entre aluno e professor, entre empregado e empregador, entre amigos ou entre parentes - e na prática, será uma ou outra destas relações a estabelecer-se. Mas, em alguns casos, reproduzirá o relacionamento entre o psiquiatra e seu paciente: por certos aspectos terá a mesma profundidade, o mesmo desejo de entrar profundamente na personalidade do indivíduo e da sua cultura; haverá ao mesmo tempo o esforço para ser objetivos na analise dos fenómenos. No entanto, existem diferenças notáveis: a relação entre o antropólogo e o seu informante chega a estabelecer uma ponte entre duas culturas, de tal modo que irão aparecer menos episódicas, com maior reciprocidade, afecto e respeito.


O antropólogo, imerso na vida das pessoas que ele estuda, pode experimentar a alegria de chegar a compreender outros povos e ser aceite; ou pelo contrario às vezes o relacionamento pode ser acompanhado por um sentimento desastroso de isolamento, estranheza, desorientação e um desejo angustiado de receber conforto. Aqui está o dilema, porque ele participa plenamente da vida que estuda e já não é simplesmente um observador passivo; mas tem uma tarefa intermediária que pode ser resumida na composição 'participante-observador'. Uma vez que não nasceu naquela cultura que permanece estranha, o antropólogo deve manter uma certa distância psicológica e emocional: sendo um cientista objetivo, ele não pode 'tornar-se indígena'; nem pode manter-se estranho pois deve observar os factos humanos na mesma medida de um pesquisador que estuda uma colônia de formigas. Entre os homens, há sempre a possibilidade e a necessidade de comunicar. Assim, a capacidade de entrar de forma imaginativa na vida de outras culturas torna-se a qualidade fundamental do antropólogo (Casagrande, 1966, pp. 7-10).

Trabalho de Campo

Inicialmente, em Antropologia, a preparação para o trabalho de campo implica inúmeras etapas, uma delas é a construção do próprio tema e objeto de pesquisa desde a adoção de determinados recortes teórico-conceituais do próprio campo disciplinar e suas áreas de conhecimento (Antropologia rural, Antropologia urbana, Antropologia Simbólica, Antropologia do parentesco, Antropologia da saúde, Etnografia). Não é usual este projeto contemplar hipóteses iniciais de pesquisa uma vez que estas emergem na medida em que a investigação avança com a aproximação ao universo do ser pesquisado.

Assim, através dos diversos campos em que a etnografia, ou algo muito parecido com ela, tem vindo a ser proposta, encontra-se uma diversidade considerável de opiniões na teoria e na prática.

Há um desacordo acerca da etnografia se constitui uma característica distintiva ou é somente um corolário do conhecimento cultural (Spradley 1980), se é uma investigação detalhada dos padrões da vida e da interação social (Gumperz 1981), ou a análise holística das sociedades (Lutz 1981). Às vezes, a etnografia é retratada como essencialmente descritiva, ou talvez como uma forma de contar história (Walker 1981) ; de vez em quando, pelo contrário, é dada grande ênfase no desenvolvimento e no teste da teoria antropológica  (Glaser e Strauss , 1967; Denzin 1978).

Assim, os antropólogos fizeram questão de ir pessoalmente a esses lugares para observar e experimentar os povos e suas culturas de primeira mão. Isso é chamado de trabalho de campo. Hoje, o trabalho de campo antropológico ocorre não só em comunidades de pequena escala em cantos distantes do mundo, mas também em bairros urbanos modernos em sociedades industriais ou pós-industriais. Os antropólogos podem ser encontrados fazendo trabalho de campo em uma ampla gama de lugares e dentro de uma série de diversos grupos e instituições, incluindo corporações globais, organizações não-governamentais (ONGs), comunidades trabalhistas migratórias e pessoas refugiadas por causa de catástrofes naturais ou provocadas pelo homem. Em nosso mundo inesgotável e globalizante, onde fronteiras de longa data entre culturas estão sendo apagadas, novas redes sociais e construções culturais estão emergindo, tornadas possíveis pelas tecnologias de comunicação de massa e comunicação de longa distância. Atualmente, os antropólogos estão ajustando os seus métodos de pesquisa para melhor descrever, explicar e compreender essas dinâmicas complexas mas fascinantes na condição humana em rápida mudança do século XXI.

Observação Directa

Se o método etnográfico é composto por inúmeros procedimentos incluindo levantamento de dados de pesquisa probabilística e quantitativa (demografia, morfologia, geografia, genealogia, etc.), a observação direta é sem dúvida a técnica privilegiada para investigar os saberes e as práticas na vida social e reconhecer as ações e as representações coletivas na vida humana. É se engajar em uma experiência de percepção de contrastes sociais, culturais, e históricos. As primeiras inserções no universo de pesquisa conhecidas como “saídas exploratórias”, são norteadas pelo olhar atento ao contexto e a tudo que acontece no espaço observado. A curiosidade é logo substituída por indagações sobre como a realidade social é construída. Esta demanda é habitada por aspectos comparativos que nascem da inserção densa do pesquisador no compromisso de refletir sobre a vida social, estando antes de mais nada disposto a vivenciar a experiência de inter-subjetividade, sabendo que ele próprio passa a ser objeto de observação (Lévi-Strauss, 1974, p. 1 à 36). O (A) aprendiz a antropólogo(a) coteja os aspectos que percebe cada vez mais orientados por questões teórico-conceituais apreendidas já nos primeiros anos do curso de ciências humanas.

Pesquisa social

Como ficará claro mais tarde, para nós etnografia (ou observação participante, um termo conhecido) é simplesmente uma pesquisa social, método, embora um tanto incomum, desenhando uma ampla gama de fontes de informação. o etnógrafo participa, aberta ou veladamente, nas vidas diárias  dos povos para um longo período de tempo, observando o que acontece, ouvindo o que é dito, fazendo perguntas; na verdade, qualquer que seja a recolha de dados que estão aptos para iluminar acerca das questões em causa.

Em muitos aspectos, a etnografia é a forma mais básica de pesquisa social. Não só ela tem uma história muito longa (Wax 1971), mas também tem uma estreita semelhança com as formas de rotina em que as pessoas fazem sentido do mundo na vida de cada dia. Alguns comentaristas consideram esta como a sua força de base, outros a vêm como uma fraqueza fundamental.

Etnografia e ciências sociais

Etnografia por vezes tem sido descartada como bastante inapropriada para as ciências sociais, com o fundamento de que os dados e resultados que ela produz são “subjetivos”, meras impressões que não podem fornecer uma base sólida para a análise científica rigorosa. Outros argumentam que somente através da etnografia pode-se compreender os significados que dão forma e conteúdo aos processos sociais. Os métodos 'artificiais', como os experimentos e as entrevistas são rejeitadas com o fundamento de que estas são incapazes de captar o significado das atividades humanas diárias. Na verdade, a própria noção de uma ciência da vida social que pretende explicar o comportamento humano em termos causais às vezes é rejeitada.

Todos os pesquisadores sociais sentem a tensão entre concepções de ciência modelada sobre as práticas da ciência natural, dum lado e ideias sobre o carácter distintivo do mundo social e as implicações disto para como deve ser estudado do outro. Muitas vezes, essa tensão é apresentada como uma escolha entre dois paradigmas conflituantes (Wilson, 1971; Johnson, 1975; Schwartz e Jacobs, 1979). Enquanto os nomes dados a esses paradigmas muitas vezes diferentes, existe uma sobreposição considerável de conteúdo entre as várias abordagens. Seguindo essas premissas vamos chamar esses paradigmas de 'positivismo' e `naturalismo'; o antigo privilégio dado aos métodos quantitativos, este último aplicado à etnografia como se fosse central, se não o único, método de investigação social não é mais legítimo.

O positivismo e o naturalismo

Vamos começar por analisar o positivismo e o naturalismo e suas implicações para a etnografia. Talvez deva ser apontado, no entanto, que, embora as ideias que agrupam sob estes títulos têm uma certa afinidade, não pretendemos que os cientistas sociais podem ser divididas em dois grupos diretamente sobre esta base. Na verdade, mesmo aqueles cujo trabalho citamos como

exemplificando uma ou outra característica das duas perspectivas porém nem sempre aderem à perspectiva completamente. Ao invés de produzir descrições simples acerca dos métodos  dos grupos específicos de cientistas sociais, temos procurado capturar duas tendências influentes no pensamento sobre a natureza das ciências sociais em geral, e da etnografia, em particular.

A etnografia pode ser compreendida como uma metodologia qualitativa, originada da antropologia cultural, cujo foco maior de interesse está centrado no significado e nas estruturas da vida. Os estudos etnográficos advêm de uma inquietude dos antropólogos de conhecer o outro, conhecer a problemática do outro. A etnografia possibilita adentrar ao contexto sociocultural e interagir, ultrapassar os muros da pesquisa social. Desse modo, a etnografia se consolida como uma importante opção de estudo qualitativo na área da antropologia. Questões referentes ao rigor desta metodologia merecem ser discutidas. Sendo assim nos dispusemos no presente estudo a realizar reflexões sobre o rigor metodológico da pesquisa etnográfica, com um enfoque na metodologia de pesquisa antropológica.

Pesquisa etnográfica

A pesquisa etnográfica pode ser compreendida como sendo uma modalidade de pesquisa científica, de caráter qualitativo, contendo em sua base traços de fenomenologia, do interacionismo simbólico e da sociologia; tem como objetivo compreender o mundo pelo olhar dos próprios actores sociais.

Com essa visão, entendemos o homem como um ser “amarrado às teias de significados” que ele próprio teceu, o qual é representado pela cultura. Dessa forma, o uso da etnografia para análise de uma cultura, não deve ser visto apenas como o uso de uma ciência experimental, na qual se pesquisa por leis dinâmicas, mas como uma ciência interpretativa, na qual se busca um significado (GEERTZ, 1989).

O trabalho de campo

De qualquer forma, uma coisa parece clara: mais e mais anos de pesquisa conduziram os antropólogos, especialmente no contexto norte-americano, a praticar o trabalho de campo por conta própria na sociedade onde pesquisavam. Pode-se, em parte, atribuir isso ao aumento de interesse pela dimensão social da antropologia científica. Seria mesmo acrescentar que alguns especialistas chegam a afirmar que o único trabalho eficaz que poderia levar a frente o antropólogo é exercido dentro da sua própria sociedade. Em seguida, passa a partir de uma posição para outra extrema.

Abordagem comparativa

A partir desta perspectiva, a objectividade remete assim para uma outra atitude de capital importância na abordagem do antropólogo: a comparação. Muito antes dos pesquisadores decidirem de observar no campo e recolher informações acerca das populações em causa, os 'antropólogos de gabinete' (antropologia de mesa), como eram chamados, tinham descoberto um dos fundamentos da tarefa antropológica localizada na forma holística de compreender o comportamento de muitas sociedades do mundo.

Holismo e evolucionismo

Os erros cometidos durante  a tentativa eram inúmeros. Mas não queremos assumir posições evolucionísticas nos estudos comparativos. Basta lembrar que foi a abordagem holística a sensibilizar os antropólogos em dar muita importância para a comparação.

Tomar uma tal posição acarreta múltiplas consequências.  Uma das principais consiste no facto de que, mesmo trabalhando em casa, na sua própria sociedade, no modo de apreensão o antropólogo é obrigado a manter em mente uma perspectiva holística, para ter em conta um vasto número de pontos de referência.  O peso que a atitude comparativa fornece às análises e generalizações representa uma grande vantagem pela pesquisa.  As Generalizações são riscosas e emergem durante a comparação de vários campeões, em vez disso, a análise aprofundada de um caso segundo o particularismo histórico de Boas é um dos pressupostos recomendados por Lévi-Strauss (1952:28).  Em uma situação como na outra, a atitude comparativa se afirma, e as suas implicações não são mais do que um interesse puramente intelectual apesar de ter uma finalidade eminentemente prático

TRABALHO DE CAMPO, TEORIA E CONSTRUÇÃO

A abordagem antropológica possui como premissa básica a convivência e a interação com as pessoas que pretendemos trabalhar e compreender, e é diferente da sociologia e da ciência política. O trabalho do antropólogo não se caracteriza apenas por uma transcrição do conhecimento do nativo, mas sim por um diálogo entre o seu conhecimento (ponto de vista émico) com o conhecimento do pesquisado (posto de vista ético)

INTRODUÇÃO

Até o século 20, os trabalhos de campo eram realizados através do método conhecido como antropologia do gabinete ou antropologia de varanda, no qual os nativos eram enfileirados no exterior de uma casa, geralmente, de um oficial ou missionário, e aguardavam serem convocados para recolha de dados etnográficos. O trabalho realizado por Malinowski nas Ilhas Trobiand, no início do século XX, rompe com a tradição dos antropólogos de gabinete e consolida o método etnográfico.

Malinowski (1975) defendia que para a realização de um bom trabalho de campo o antropólogo precisava adotar os seguintes critérios:

a) ter um contato direto e mais estreito com os nativos;

b) isolar os nativos do contato com os os colonos;

c) e acompanhar continuadamente a vida na tribo para a apreender dos fenômenos cotidianos, visto que questionar o nativo sobre regras gerais era quase impossível. Apesar de Malinowski não mencionar o termo observação participante, a noção apresentada acima, bem como outras considerações em seu estudo levam a crer que este método estava presente em seu trabalho. “Apreender o ponto de vista do nativo, sua relação com a vida, compreender sua visão do seu mundo” (MALINOWSKI, 1975, p. 60-61), compõem o modelo ideal de uma etnografia.

“Historicamente ficou comprovado que, anterior ao trabalho de campo realizado nas ilhas Trobiand, WH Rivers já havia explicitado muito dos pressupostos de Malinowski”. Apesar disso, foram as incursões de Malinowski que ganharam visibilidade modificando o fazer antropológico, centrado agora no ponto de vista do nativo.

Na década de 1960, profetizava-se o desaparecimento da pesquisa de campo por recusa do nativo que passou a ser cidadão de nações independentes. No entanto, Lévi-Strauss enfatiza que o principal objeto da etnografia são as diferenças e essas dificilmente desaparecerão. Outros questionamentos metodológicos reaparecem, a exemplo da reflexão sobre o que se passa lá, para o que se diz aqui, questionamento trazido, principalmente, por Clifford Geertz. “É no ato de escrever que a questão do conhecimento torna-se tanto ou mais crítica”. Geertz separa duas etapas na investigação, o estando lá e o estando aqui. O olhar e o ouvir fazem parte da etapa do “estando lá”, e o escrever do “estando aqui”. Trata-se de uma con-textualização da cultura nativa, um processo de interpretação da cultura, balizada pelas categorias básicas ou pelos conceitos da disciplina.

TRABALHO DE CAMPO

É a partir do diálogo entre o conhecimento nativo e o conhecimento do pesquisador que se compõe o trabalho do antropólogo. Através da simetria desses conhecimentos que se constrói a etnografia: “As impressões de campo não são, portanto, apenas recebidas pelo intelecto, mas exercem um verdadeiro impacto na personalidade total do etnógrafo, fazendo com que diferentes culturas se comuniquem na experiência singular de uma única pessoa”. Desnaturalizar a cultura do outro é inventar a cultura para si. A  antropologia favorece, em determinadas pessoas e em determinados contextos, uma reestruturação da visão do mundo. Na antropologia, a pesquisa de campo é o meio pelo qual a teoria antropológica se desenvolve. [...] o lugar da pesquisa de campo no fazer da antropologia não se limita a uma técnica de colecta de dados, mas é um procedimento com implicações teóricas especificas. Se é verdade que técnica e teoria não podem ser desvinculadas, no caso da antropologia a pesquisa etnográfica é o meio pelo qual a teoria antropológica se desenvolve e se constitui como teoria, quando desafia os conceitos estabelecidos pelo confronto entre (i) a teoria e o sentido comum que o pesquisador leva para o campo e (ii) a observação entre os nativos que estuda. Não há como propriamente ensinar a fazer pesquisa de campo, pois apesar de existir um modelo “ideal”, assim como algumas rotinas comuns, não há uma norma ou regra que sirva como baliza para a pesquisa de campo.

ABORDAGEM

Não são apenas as culturas diversas o objeto da antropologia, mas sim os mundos diferentes.  A antropologia é um dos lugares para pensar a diferença ou para explicar racionalmente a diferença de mentalidades dos outros.

A antropologia valoriza essa diferença, na tentativa de apreendê-la sem suprimi-la, pensá-la em si mesma, como ponto de apoio para impulsionar o pensamento, não como objeto a ser simplesmente explicado

A experiência de campo nos leva a não só a reconsiderar a noção, mas, principalmente, a repensar a antropologia, e colocar em suspensão o método da observação participante. Os  antropólogos parecem combinar dois gêneros de ABORDAGENS no campo, A primeira, com o trabalho dos informantes, em que o antropólogo interroga e observa, dando a ideia de ser nativo quem participa do trabalho o etnográfico e não o contrário. A segunda abordagem é a observação de eventos cuja participação é, apenas, uma tentativa de estar lá. Num primeiro momento, os nativos podem recusar-se no campo, todavia, com percepções e sensações que são distintas das deles, experimenta-se de uma forma indireta, as sensações, percepções e pensamentos do outro somos impulsionados pelas mesmas forças que movem o nativo; e nos identificamos com o outro. Para efectuar uma abordagem, precisa sobretudo, estar no lugar acessível a uma comunicação involuntária e desprovida de intencionalidade que cria uma situação de comunicação interativa.

Ha uma espécie de “incompreensão entusiasta”, onde é possível admirar sem imitar  “é possível relatar subjetividades alheias sem recorrer a pretensas capacidades extraordinárias para obliterar o próprio ego e para entender os sentimentos de outros seres humanos”(GEERTZ, 1997, p. 106). Dito d’outra maneira, a compreensão dos informantes é independente do facto que o antropólogo tenha a sensação de estar sendo aceite (GEERTZ, 1997). Apesar de Geertz afirmar não defender a falta de sensibilidade, as suas considerações soam de maneira pouco sensível para compreender as subjetividades do nativo,

A aproximação pesquisador/informante através da experiência  da comparticipação contribui significativamente para o trabalho de campo, pois não é o tempo num campo que vai influenciar a relação do antropólogo com o nativo, como Malinowski defendia. O pesquisador sempre será um intruso na comunidade e, por isso, obterá algumas informações mas outras será quase impossível obtê-las. Entrar em sintonia, que é completamente diferente de colocar-se dentro da pele do outro, é uma forma de compreender o trabalho de campo através da experiência que permite diminuir a distância entre o pesquisador e o interlocutor. Nesta forma o método de observação participante parece ser ultrapassado por dinâmicas interactivas.

Nesta nova perspectiva, o campo não existe como uma entidade já dada no início, mas deve ser 'construída' de vez em quando, isolando na confusão da vida própria de cada sociedade das áreas em que o antropólogo é capaz de observar e recolher dados significativos e quantitativamente gerenciável

A abordagem tradicional da relação entre informantes e antropólogo como era concebida no início da história da antropologia foi modicada  pela escolarização básica e superior dos povos e portanto se impõe um diferente envolvimento dos grupos estudados em relação aos objectivos da investigação e dos métodos antropológicos utilizados.

Um outro elemento a ter presente no novo panorama antropológico é a mobilidade dos indivíduos e dos grupos, há um novo nomadismo real e virtual, que provoca novos fluxos migratórios:

Exige-se portanto o desenvolvimento de novas ferramentas e métodos de pesquisa que obrigam a reconsiderar a ideia de 'campo', quase fosse necessário um suplemento à ideia tradicional, dada a oposição e a distancia do local de origem do antropólogo e dados os 'novos deslocamentos' que obrigam a etnografia a ser repensada em termos de multilocalidade.

Muitos estudiosos de vários ramos da ciência que lida com o homem e suas obras, dedicam atenção ao homem ocidental. Ao contrário de seus colegas, o antropólogo estende o campo de estudo por toda a humanidade, e olha para o conjunto desses diferentes modelos de vida socialmente organizados e socialmente compartilhados, que usamos chamar cultura. Como o biógrafo tenta penetrar e retratar a vida de um homem, do mesmo modo o antropólogo, assim o etnógrafo, tenta entender e descrever o modo de vida de um povo. Tradicionalmente, o antropólogo estuda as pessoas analfabetas no mundo, se elas eram caçadoras, primitivas, dos cantos mais remotos da terra ou produtos sofisticados florescentes da civilização: a pesquisa antropológica considera igualmente os bosquímanos do deserto de Kalahari e os escultores de Benin, nativos nus da Tierra del Fuego e os construtores dos impérios Incas. Ultimamente, tem-se dedicado uma atenção especial ao estudo das comunidades camponesas do Velho Mundo e as sociedades complexas das nações modernas, incluindo-se a si próprio; mas, apesar da maior extensão do campo de observação, e dos métodos de investigação fundamental - talvez o mais importante - é a sua maneira de considerar o comportamento do homem como um todo, eles continuam a ser os mesmos que tinham desenvolvido o trabalho de campo com os grupos mais simples. Onde não há registros nem livros, mas apenas a memória do homem, o antropólogo deve necessariamente colher os seus primeiros dados a partir da vida - ações e palavras - das pessoas entre as quais ele vive e age: sem descuidar dos documentos, confia muito nas observações diretas ou declarações orais dos informantes. O escopo do antropólogo é a principal fonte de conhecimento e serve de laboratório e biblioteca: a pesquisa é necessariamente realizada em companhia humana. Esse trabalho exige, por sua própria natureza, a colaboração; e é uma empresa audaciosa, ficar a pesquisar alguém que não se conhece e viver entre um povo desconhecidos. Entende-se que a sua presença deve, pelo menos, ser tolerada e deve saber perdoar as murmurações; mas o antropólogo leva muito mais: porque seu trabalho é rentável, ele precisa da cooperação do povo. O facto de que muitas vezes se dá testemunho eloquente da boa vontade universal dos homens. Temos de admitir, finalmente, que o sucesso não depende apenas da capacidade do antropólogo, mas também da capacidade, compreensão e do envolvimento dos informantes.

O trabalho de campo em antropologia cultural pode ser excitante, frustrante, assustador, chato e às vezes perigoso.  Uma coisa é verdade: ele transforma a vida de todos os envolvidos.  Esta lição explora as fases de um projeto de pesquisa de campo, começando com o planeamento inicial e terminando com a análise e apresentação das conclusões. Na sua chegada, o antropólogo, como qualquer estrangeiro, é objecto de curiosidade, receberá visitas, haverá muitas perguntas, a sua chegada provocará hostilidade e suspeita; Ele pode ser considerado chato e irritante do ponto de vista social ou pelo contrario pode ser exibida a sua presença, como motivo de orgulho. Mas em ambos os casos, o curso natural dos acontecimentos, chega a seu termo estabelecendo um acordo com a população: o processo global de recíproca adaptação leva, depois de algum tempo, o antropólogo a encontrar o seu lugar na comunidade a sua presença será aceite; as pessoas irão responder às suas perguntas, irão preocupar-se pelo seu sustento, vão convidá-lo nas suas cerimónias, para contar e explicar as coisas que perceberam que lhe interessam. Vai rir-se ele próprio dos seus erros e das suas gafes desconhecendo a etiqueta local, poderá ficar divertido ao considerar as suas formas bizarras ou até permanecer perplexo quando tentará de dar-se uma explicação. Aos poucos, o que era estranho se tornará familiar: dar-se-á conta das fofocas da aldeia, e assim apreenderá o que é ordinário e extraordinário na vida diária das pessoas. E as pessoas dar-se-ão, a conhecer com características um pouco diferentes daquelas que ele deixou na sua terra natal. De facto, sob o a capa da alteridade cultural, o antropólogo reconhecerá os mesmos tipos de personalidade e acabará por considerar essas pessoas não apenas como protótipos étnicos, mas como pessoas que poderão agradar ou desagradar-lhe. Ao progredir os seu trabalho, identificará as pessoas e estudará as suas reacções. O antropólogo inevitavelmente estabelecerá laços mais estreitos com os uns que com os outros. Haverá quem o ajuda o ajuda como um assistente, outro como informante, intérprete, mordomo, cozinheiro ou empregado de mesa; há outros que para obter a sua consideração, estarão de ida e volta ao redor da sua casa, na esperança de ser selecionados para uma comissão ou para fornecer uma pequena notícia. Um ou outro, na base do seu conhecimento especial ou habilidades, autoridade, qualidade do intelecto ou caráter, poderá tornar-se um seu informante especial e íntimo associado. A relação entre o antropólogo e o informante tem muitos dos atributos de outras espécies de relações básicas: aquelas entre aluno e professor, entre empregado e empregador, entre amigos ou entre parentes - e na prática, será uma ou outra destas relações a estabelecer-se. Mas, em alguns casos, reproduzirá o relacionamento entre o psiquiatra e seu paciente: por certos aspectos terá a mesma profundidade, o mesmo desejo de entrar profundamente na personalidade do indivíduo e da sua cultura; haverá ao mesmo tempo o esforço para ser objetivos na analise dos fenómenos. No entanto, existem diferenças notáveis: a relação entre o antropólogo e o seu informante chega a estabelecer uma ponte entre duas culturas, de tal modo que irão aparecer menos episódicas, com maior reciprocidade, afecto e respeito.

O antropólogo, imerso na vida das pessoas que ele estuda, pode experimentar a alegria de chegar a compreender outros povos e ser aceite; ou pelo contrario às vezes o relacionamento pode ser acompanhado por um sentimento desastroso de isolamento, estranheza, desorientação e um desejo angustiado de receber conforto. Aqui está o dilema, porque ele participa plenamente da vida que estuda e já não é simplesmente um observador passivo; mas tem uma tarefa intermediária que pode ser resumida na composição 'participante-observador'. Uma vez que não nasceu naquela cultura que permanece estranha, o antropólogo deve manter uma certa distância psicológica e emocional: sendo um cientista objetivo, ele não pode 'tornar-se indígena'; nem pode manter-se estranho pois deve observar os factos humanos na mesma medida de um pesquisador que estuda uma colônia de formigas. Entre os homens, há sempre a possibilidade e a necessidade de comunicar. Assim, a capacidade de entrar de forma imaginativa na vida de outras culturas torna-se a qualidade fundamental do antropólogo. 

 

Trabalho de Campo em Mbanza Kongo

7-11 Setembro 2016

Percorremos um itinerário de formação caracterizado pelo utilizo, no processo de aprendizagem, de centros culturais arqueológicos, históricos, museológicos e abordando em todos os seus aspectos a cultura tradicional bacongo na tentativa de desenvolver as competências dos estudantes do quarto curso envolvidos na aplicação de teorias e métodos antropológicos no campo.

Em outras palavras, era necessário que o itinerário de formação fluísse num ambiente de trabalho específico com o objectivo de por em acto uma certa habilidade profissional e aumentar a capacidade de inserção numa cultura angolana diferente.

Procuramos portanto de interagir, e de fruir dos bens culturais demo-antropológicos que encontramos no ambiente de Mbanza Kongo incentivando a responsabilização perante os conteúdos adquiridos e visando a oportunidade de aplicar e exercer directamente técnicas de abordagem à alteridade cultural.

Isto foi possível na visita aos lugares arqueológicos e ao museu do palácio real que ocupou toda a actividade do primeiro dia. Há relatos de factos e acontecimentos que evidenciam a mentalidade mítico-celebrativa dos Bacongo face à qual é necessário aplicar uma sabia deconstrução para obter o dado cultural integro.

Ao 10 de Novembro último dia de permanência avaliamos a actividade baseando-nos em

quatro critérios:

- A capacidade de iniciativa na abordagem cultural

- A identificação do campo de pesquisa antropológicos e a investigação com informantes

- A abordagem holística à cultura bacongo

- O compromisso individual do antropólogo na colheita de dados etnográficos 

A subdivisão em grupos visava ao treinamento para o trabalho comum, considerando-se necessário delimitar um âmbito de pesquisa e avaliando o seu impacto formativo na capacidade de colher dados etnográficos que enriquecessem a analise antropológica.

A fim de proceder a uma analise objectiva e uniforme dos factos culturais, económicos, políticos, organizacionais, cada grupo definiu a duração da actividade de pesquisa através da elaboração de um projecto e do preenchimento de um questionário permitindo obter uma imagem geral do facto cultural e dando provas da existência dos dados etnográficos recolhidos.

Pelo efeito a equipe formada por três docentes (Kavula, Hebo, Bortolami) atribuiu a cada grupo tarefas especificas a serem executadas no dia 9 de Setembro durante a permanência dos alunos nas aldeias de Sumpi, Ndembo, Nkoko, Nkama, Lula, Boa Esperança pertencente à comuna de Lukossa e ao município de Mbanza Kongo.

A Comissão dos três docentes decidiu credenciar aos seis grupos os seguintes âmbitos de pesquisa:

- Antropologia da nutrição: a preparação, consumo e venda dos alimentos (Sumpi)

- Estrutura social e ciclo da vida (Ndembo).

- Antropologia política: organização social, chefes tradicionais, exercício do poder (Nkoko)

- A cultura material (Nkama)

- Antropologia do parentesco e iniciação mascolina (Lula)

- Antropologia económica (Boa Esperança)

Cada grupo foi incentivado a individuar e adquirir habilidades na colheita dos dados etnográficos que ocorreu no campo de trabalho através da aplicação de instruções e procedimentos que permitiram a interacçao com os informantes e a realização de actividades antropológicas específicas, o uso de técnicas e métodos de pesquisa. A abordagem cultural permitiu a aplicação de procedimentos e instruções que se estenderam para os aspectos relacionais não somente a nível de dinâmica entre os membros dos seis grupos que pesquisavam mas também com os informantes e o povo da aldeia onde o grupo pesquisava. Isto favoreceu um maior inserção no ambiente de pesquisa e um impacto profissional no exercício de actividades antropológicas.

Os métodos que cada grupo aplicou no campo eram diferentes para cada situação, mas principalmente foi adoptada a observação participante e participativa, prestando atenção a evitar em tudo abordagens etnocêntricas, supervisionando os dados culturais e aplicando um sistema de avaliação e analise que tivessem o corte antropológico.

A participação dos grupos de trabalho o estudo, e o aperfeiçoamento das técnicas de pesquisa foram excelentes e pela primeira vez os alunos reflectiram sobre a importância de aplicar noções abstractas e conceitos assumidos em quatro anos de formação académica ao campo concreto e real onde a cultura vive e muda.

Nos cinco dias passados nas viagens efectuadas incentivamos a tarefa de aprendizagem através da interação com o grupo e os colegas que interagiram para as seguintes tarefas:

 Nas actividades realizadas no âmbito dos trabalhos de grupo os alunos documentaram-se e puderam incluir na revisão dos processos e procedimentos a literatura científica-antropológica estudada durante o curso (Franz Boas, Bronislaw Malinowski, Margareth Mead, Edward Evans Pritchard, Radcliffe Brown). Esta documentação bibliográfica serviu de base para a acreditação, a identificação dos factos sociais (Mauss) habilitando os estudantes  a gerir praticas de pesquisa, dando postura científica às discussões em grupo e favorecendo o desempenho de tarefas que cada membro assumiu durante o trabalho de campo. 

 No trabalho dos seis grupos os estudantes abordaram: a pesquisa e a organização da documentação antropológicas, as leituras científicas e a discussão em grupo, a análise antropológica dos dados etnográficos colhidos no campo, a preparação duma relação acerca dos resultados da pesquisa, a sua apresentação e discussão na assembleia geral, a produção de diretrizes ou procedimentos de auto-avaliação das actividades realizadas, a revisão de procedimentos de trabalho, e a tentativa de organizar um método de pesquisa. 

Participação em Pesquisa

A participação na investigação cientifica e o levantamento de dados foi possível através da colaboração activa e isso permitiu a busca de novos conhecimentos com relação aos âmbitos de pesquisa delimitados e atribuídos a cada grupo, nomeadamente: actividade e produção, estrutura organizacional e parentesco, cultura material, organização económica e comercio, alteridade cultural e convivência. Essa investigação assumiu muitas formas:

Essa investigação visava a habilitar o aluno no contexto antropológico ao: estudo e organização bibliográfica, colaboração no projecto de pesquisa, colecta e processamento de dados etnográficos, discussão em grupo sobre os resultados, preparação, apresentação e discussão de processamento e avaliação dos resultados no local de pesquisa para produzir novos conhecimentos e activar os processos de mudança cultural e operacional.

Abordagem antropológica

O impacto com a nova alteridade cultural bacongo favoreceu o alcance do objectivo de melhorar a qualidade da colecta dos dados, a analise e os resultados dos processos aplicados através duma sistemática revisão das actividades de pesquisa de campo divididas nas seguintes fases:

Referência;

- Tivemos a valiosa colaboração de dois antropólogos da Oxford University que introduziram os alunos ao trabalho de campo aconselhando-os e instruindo-os oportunamente.

Elementos marcantes a experiência realizada

 

1. Objectivos alcançados

1.A – Aquisição de competências

 

1.B – Níveis aadquiridos

 

2. Modalidades de aprendizagem

2.A – Contexto cultural bacongo

2.B – níveis de actividade

 

3. Actividades

3.A – Tipologia

 

3.B – Tempo dedicado a cada actividade

Subjectividade e objectividade no conhecimento

As condições do conhecimento o estudo e a pratica antropológica não é algo de abstracto e racional mas envolve a intersubjetividade, as emoções, a empatia: antropologia  a relação cognitiva não se realiza sem a alteridade que deve-se tornar proxima e com a qual tenho que me sentir implicado, e não distanciado metodologicamente e linguisticamente: não podemos tratar o outro como objecto ou instituições e ou produto de sentido dos indivíduos, sem interagir com ele em um processo de dialogo, e sem fazer interagir horizontes diferentes de pertença histórica e sociocultural.

Antropologia dialógica

O processo do conhecimento se dá na reciprocidade dialógica, e na comunicação e n0 olhar recíproco: portanto, conhecer não é uma simples recomposição mental de conceitos a partir do que foi observado em uma história de pesquisa, como se houvesse uma transição linear e pacífica da ordem do visível para o ordem de representação mental e ideal, do ver ao dizer.

Antropologia experiencial

Na antropologia, como em toda ciência humana, o que se vê não é um espectáculo, que basta reorganizar, mas é uma experiência vivida: em outras palavras, é algo que surge em um contexto pragmático e vivo, onde os fenómenos se encontram de modo intensivo, qualitativo e temporal.

O encontro

No encontro com o outro - como nos ensina o conceito fenomenológico de "olhar" - "ver" não é nem observação neutra, guiada por parâmetros pré-definidos, nem identificação emotiva.

No encontro antropológico, o ver torna-se um olhar que se encontra com outro olhar e é modificado por ele:  o ser visto muda o ver; o olhar é uma troca de olhares: é ver e ser visto (Affergan, 1987). O olhar do outro e o olhar meu devem ser vistos intencionalmente e numa primeira fase de desorientamento, um ver habitado por emoções, que se afasta à medida que se aproxima. Nesse sentido, o que sinto como afecto, as minha emoções e, em quanto subjecto que investe o meu corpo não devem ser esquecidas; isto é, não devemos esquecer o horizonte de opacidade que permanece ao redor da relação com o outro e lá onde o outro vive.

Olhar o outro

O antropólogo vai ao outro, entra em uma comunicação que é feita de olhares, laços afectivos e afrouxamentos, na corporeidade, no dizer e não dizer. Mas lembramos que, ao mesmo tempo, o antropólogo deve saber também permanecer ele mesmo, com seu próprio saber e sua própria cultura diferente. Na verdade, o que é a nossa cultura senão esse limite, esse horizonte positivo que divide e relaciona? Além disso, escreve Wittgenstein em On Certainty (Wittgenstein, 1969), se não tivéssemos um horizonte de pertencimento (Hintergrund), um horizonte de significados (jogos linguísticos, rituais, hábitos, conceitos) que constituem nossa identidade e quando nos movemos, agimos, pensamos, não teríamos um ponto de partida para chegar ao outro, não teríamos como ver a diferença e tentar uma comunicação à parte da diferença. Com o outro não há troca nem comunicação, nem relacionamento, mas há fusão e simbiose. Muitos antropólogos hoje retomam de Wittgenstein o tema segundo o qual não podemos pensar em nós mesmos sem pensar no outro, isto é, sem experimentar os nossos limites comparando-os com outras formas de vida possíveis, como ele fazia continuamente com seus exemplos de antropologia imaginária.

Distanciamento

Em outras palavras, em termos metodológicos, isso significa que o antropólogo sabe que deve regressar da pesquisa, não se deve transformar no outro. O antropólogo deve voltar a escrever a monografia etnográfica, para tornar compreensíveis para sua própria comunidade os significados e as instituições da comunidade onde ele estuda, e ele pode fazer isso apenas mantendo o distanciamento e a sua própria diferença e mostrando a diferença entre os seus próprios significados e valores e aqueles da cultura onde ele estuda. Ou seja, adoptar o ponto de vista do nativo, princípio metodológico da antropologia interpretativa, deve permanecer um esforço consciente e reflexo de simulação e tradução.

Epistemologia antropológica

Na segunda metade do século XX, a antropologia estava no centro de um verdadeiro processo de crescimento da autoconsciência epistemológica que dizia respeito às ciências humanas, cujo desfecho deveria ter sido, em um mundo ideal, a interiorizarão do sentido do outro. Se esse desfecho é distante, no entanto, entendeu-se que a cultura não é "algo" de que falamos, mas é o lugar de onde falamos, e somos falados e interpretados por outros. Entendeu-se que na antropologia não falamos em forma de classificar outras culturas, como se constituíssem um conjunto de diferenças silenciosas e indiferentes, mas estamos a falar dos "outros" que falam de "nós": como aponta Roy Wagner, o antropólogo que pensa a cultura melanésia, ele a inventa a partir do seu próprio eu, ao mesmo tempo, é reinventado na sua própria cultura ocidental pelos melanésios - em um processo de tradução recíproca e reinvenção contrastiva (Wagner, 1981). Podemos falar de um "estrabismo" da teoria antropológica contemporânea, empenha-se em substituir um olhar de cima, que busca as essências universais, um olhar que ultrapassa fronteiras e atravessa regiões heterogéneas de sentido, em busca de um "universal lateral" . Isso significa sublinhar o carácter processual e dinâmico do modelo interpretativo de outras culturas: como as culturas são feitas e desconstruidas, a partir de processos que oferecem seja encenação quanto questionamento da sua própria ontologia, e os momentos de construção, ambos momentos de crise, para que os modelos de antropologia saibam se colocar em desconstruções: em outras palavras, devem ser capazes de mostrar seu próprio caráter de artifício, seu próprio caráter de variações possíveis sem um mundo dado em presença, seu próprio caráter de cruzamento figurativo e translacional (Affergan, Borutti, Calarne et al., 2003).

Entender o outro

A prática de traduzir é basicamente uma boa base para entender o que significa entender o outro: o conhecimento antropológico, como aprender uma língua, certamente exige imersão em uma forma de vida, formação, que seja linguística e social, e que coloque o antropólogo na condição de poder participar de relacionamentos e de linguagem regulamentados. Mas, assim como a tradução é a transferência dos significados de outro texto para o próprio corpo linguístico, a compreensão antropológica é um aprendizado que visa traduzir o outro na nossa língua, sem se transformar no outro: é uma prática da diferença, não da identidificação.

Distanciamento

Poderíamos pensar a antropologia como uma obra de comparação que não visa a homologar (encontrar o humano em geral), mas sim a reconhecer o contraste e diferenciação entre quem pesquisa e quem é pesquisado: Nós, os primitivos - como diz o título de um livro de Francesco Remotti ( 1990); nós que só podemos cruzar a distância do outro depois de nos distanciarmos de nós mesmos - como escreve Lévi-Strauss, lendo o fundamento das ciências humanas nas Confissões de Rousseau (Lévi-Strauss, 1962b). Finalmente, não podemos deixar de esperar que o que chamamos de autoconsciência da razão antropológica também produza efeitos políticos. A antropologia está irremediavelmente ligada à vontade de saber, uma pulsão insuperável que, como mostrou Tzvetan Todorov (1989), é também um desejo de autocompreensão. Na verdade, foi na forma do exotismo e do orientalismo, que já eram formas de estranhamento e de elaboração crítica de si, sob o olhar do outro; em seguida, tornou-se mais radical na forma de etnografia, que passou a questionar o significado desse olhar trazido do Ocidente para o outro. Nesse sentido, a antropologia atesta a vontade de saber do Ocidente: a vontade do Ocidente de conhecer o outro e de se conhecer por meio do outro, sem jamais poder encontrar outra coisa senão a si mesmo: esta é a feroz crítica dirigida ao Ocidente por Edward Said (1978) e pela chamada "antropologia pós-colonial", feita pelos próprios indígenas, crítica que o Ocidente deve saber ouvir. Esses antropólogos tiveram o mérito de chamar a atenção para os distúrbios e abalos mútuos causados pelo encontro, a invasão, a hibridização das culturas - contra a retórica da tolerância multiculturalista e «politicamente correcta». Eles ensinam que a antropologia hoje está dramaticamente no centro de um problema ético-político, quem pesquisa consegue manter a distância com o pesquisado sem manter relações de poder que abundaram no período colonial?

O homem é essencialmente um ser de cultura O longo processo de hominização começou há mais ou menos quinze milhões de anos. Da cultura derivam os papéis e as funções que se reservam ao homem ou à mulher. Onde não há constrangimento é a cultura que determina o comportamento.

Por assim dizer a cultura remete aos  modos de vida de uma sociedade.

Implica a adaptação do homem ao meio ambiente.

Noção de cultura

A noção de cultura é importante para acabar com as explicações que invocam a natureza como único meio de explicação do comportamento humano.

A noção de cultura se aplica somente ao ser humano E ela oferece a possibilidade de conceber†  a unidade do homem na diversidade de seus modos de vida e de crença.

Esta é a razão pela qual o exame do conceito científico de cultura implica o estudo da evolução histórica, da sociedade angolana ligada à génese do Estado Nação e à ideia moderna de cultura. Esta génese revela que, há formas diferentes de entender a realidade cultural angolana. Este esforço revela questões sociais fundamentais.

A Aculturação

A aculturação permitiu de ultrapassar as divisões culturais e sem aparecer um fenómeno negativo justificou as modalidades habituais para uma sociedade evoluir culturalmente, permitiu também de renovar o conceito de cultura. Nas sociedades complexas há sempre encontros culturais. Mas há hierarquias sociais que determinam hierarquias culturais, mas de facto as culturas locais não são privas de autonomia nem de capacidade de auto-gerir-se.

Cultura e identidade

A defesa da autonomia cultural é ligada à preservação da identidade colectiva. Cultura e identidade são conceitos que indicam a mesma realidade, vista por diferentes pontos de vista. Pesquisas sobre sociedades angolanas diferentes fizeram aparecer a coerência simbólica do conjunto das práticas (sociais, económicas, políticas, religiosas) do povo angolano em particular e das etnias

e culturas angolanas em particular.

O estudo atento do encontro das culturas angolanas revela que este encontro se realiza segundo modalidades que levam a resultados contrastantes segundo as situações de contacto.

Historia e cultura angolana

As palavras fazem a história. Se isto é verdadeiro para todas as palavras, é particularmente verificável no caso do termo "cultura". O "peso das palavras", é grandemente influenciado por esta relação com a história, e è a história que faz a cultura (Cuche 1999:17).

Onde nasceu o conceito de cultura

No contexto do Iluminismo francês a cultura era a soma dos saberes acumulados como totalidade ao longo da história e transmitidos pela humanidade, e reflecte o universalismo e o humanismo associados ao progresso da humanidade. A ideia de cultura participa do otimismo do momento, baseado na confiança no futuro perfeito do ser humano. No contexto colonial a cultura foi associada à civilização e designava a afinação dos costumes, e concretamente a praxe colonial de arrancar o selvagem da irracionalidade e da ignorância para civiliza-lo.

O civilizado angolano

O colono português admitia um degrau de desenvolvimento na estrutura social: o civilizado. O Estado enquanto estrutura sócio-política deve libertar de tudo aquilo que é irracional; a civilização era intendida como o processo de assimilação da cultura africana àquela europeia.

Processos de aculturação

O aculturado pertencia à camada distintiva da burguesia intelectual urbana e os traços característicos dos assimilados,  manifestavam uma cultura,  sinceramente e profundamente ligada, à pátria lusitana especificamente portuguesa. Isto escondia um mecanismo psicológico ligado a um sentimento de inferioridade do assimilado angolano cuja classe social criada pela administração colonial portuguesa se sentia alinhada ao poder e às honras da portugalidade que legitimava o assimilado a possuir uma certa consciência de pertença ao ultramar português.

Os civilizados

Dentro das populações angolanas as que viviam em contextos urbanos eram mais avançadas que outras neste movimento,  e submetidas a um processo de civilização podiam ser consideradas como "civilizadas", todos os povos, mesmo os mais "selvagens", tinham vocação para entrar no mesmo processo de assimilação cultural.

Nacionalismo angolano e cultura

Os então nacionalistas angolanos alimentavam aspirações nacionais sonhando de pertencer à um “povo, de ter uma história e de procurar um destino”. Pois cada cultura exprimia à sua maneira um aspecto da nova nação angolana. Este modelo cultural era propriamente ligado ao sonho iluminista de marca francesa-alemã onde a unidade nacional era realizável e possível com uma intelligentsia cuja missão nacional era procurar a unidade no plano cultural das diversas etnias angolanas.

Cultura socialista

Em Angola na véspera da independência o termo civilização perdeu a sua conotação aristocrática da burguesia intelectual portuguesa passando a evocar modelos culturais ligados ao mundo socialista que sonhava uma unidade cultural angolana além das diferenciações étnicas que se opunham ao sonho socialista. Portanto a noção de cultura angolana debateu-se entre assimilados à pátria lusitana e aspirantes ao comunismo soviético.

Bibliografia

 

Casagrande, J. (1966). La ricerca antropologica. Torino: Einaudi.

Spradley, J., & McCurdy, D. W. (2012). Conformity and conflict: readings in cultural anthropology. Boston: Pearson.

Gumperz, J. J. (1982). Discourses Strategies. Vew York: Cambridge University Press.

Lutz, E. W. (1981). Ethnography: the holistic approach to understanding schooling. In Ethnography and language in educational setting. Norwood: Ablex.

Walker, K. (2004). Archaic Eretria. A political and social history from the earliest times to 490 BC. London: Routledge.

Glaser, B. G., & Strauss, A. L. (2009). La scoperta della grounded theory. Strategie per la ricerca qualitativa. Roma: Armando.

Affergan, F. (2003). Figure dell’umano. Roma: Meltemi.

Wittgenstein, L. (1964). Tractatus logico-philosophicus e Quaderni 1914-1916. Torino: Einaudi.

Wagner, R. (2010). A invenção da cultura. São Paulo: Cosac Naify.

Remotti, F. (2010). L’ossessione identitaria. Bari: Laterza.

TodorovTzvetan. (2009). A conquista da América. Lisboa: Martins Fontes.

 

 

         7ª aula 21 de Novembro: prepararar o trabalho de campo 

 

Antropologia ontem e hoje

Nos meados do século XX, o principal objectivo dos antropólogos culturais era obter o máximo possível de informações sobre as pessoas a línguas, músicas, rituais, e a vida social, porque muitas culturas estavam desaparecendo. Neste momento, a maioria dos antropólogos culturais fizeram trabalho de campo em pequenas culturas, relativamente isoladas, pensando que eles poderiam estudar tudo sobre essas culturas, seguindo o princípio do holismo. Normalmente, o antropólogo (um homem branco) iria sair com seus cadernos para colectar dados numa lista padronizada de tópicos, incluindo a economia, a vida familiar, política, religião, língua, arte e artesanato, e muito mais. Se ele era casado, a sua esposa podia ajudar, fornecendo informações sobre a vida das mulheres.

Etnografia multilocal

Hoje, poucas ou nenhuma de tais culturas permanecem aparentemente isoladas devido à globalização e comunicação de massa, incluindo a Internet. Os antropólogos culturais criaram novos métodos de pesquisa para que poder estudar as culturas numa maior escala, tendo em conta das globalizações locais e da mudança cultural. Uma inovação metodológica do final do século XX ajuda a abordar estas novas questões: a pesquisa multilocal, que é o trabalho de campo não realizado numa área especifica mas em mais lugares (Marcus 1995). Embora especialmente útil no estudo das populações migrantes, tanto no seu local de origem como também nas novas localizações, a pesquisa multilocal é útil para monitorar um fenómeno presente em lugares diferentes.

Lanita Jacobs-Huey realizou um trabalho de campo multilocal  para aprender acerca da língua e da cultura, dos estilos de penteados das mulheres Afro-americanas (2002).  Ela escolheu uma série de lugares nos Estados Unidos e em Londres, Inglaterra,  para explorar as muitas modas de trançar os cabelos: salões de beleza, exposições de cabelos regionais e internacionais e seminários de formação, encontros de estudo, clubes.

Fazer trabalho de campo na Antropologia Cultural

Muitos estudiosos de vários ramos da ciência que lidam com o homem e suas obras, dedicam atenção ao homem ocidental. Ao contrário doutros estudiosos, o antropólogo estende o campo de estudo por toda a humanidade, e olha para o conjunto desses diferentes modelos de vida socialmente organizados e socialmente compartilhados, chamados cultura, presentes contemporaneamente em diferentes mundos. Como o biógrafo pra compor uma biografia deve penetrar e delinear a vida de um homem, do mesmo modo o antropólogo, e o etnógrafo, tenta de perceber e descrever o estilo de vida de um povo. Tradicionalmente, o antropólogo estuda as culturas locais nos diferentes mundos: caçadores-colectores, agricultores, dos cantos mais  remotos da terra ou analisa produtos sofisticados presentes na civilização: a pesquisa antropológica considera igualmente os !Kung do deserto do Kalahari e os Kwanhamas do Cunene, os Bakongo de Mbanza Kongo e os Ovimbundu de Huambo. Ultimamente, dedicou-se uma atenção especial ao estudo das comunidades !kung na Huila e as sociedades complexas de Luanda, incluindo os Bairros Epalanka, Cazenga, Mulemvos; mas, apesar da maior extensão do campo de observação, e dos métodos de investigação antropológica - o mais importante - foi a maneira de considerar o comportamento humano do ponto de vista holístico, pois,  são os mesmos antropólogos que tinham desenvolvido o trabalho de campo com os grupos mais simples. Onde não há nem registos nem livros, mas apenas a memória fixada na tradição oral das culturas angolanas, o antropólogo deve necessariamente colher os seus primeiros dados a partir da vida - ações e palavras - das pessoas no meio das quais ele vive, e observa: sem descuidar dos documentos, ele confia muito nas observações directas ou nos relatos dos informantes. O objecto de estudo do antropólogo é a principal fonte de conhecimento e se serve de bibliografia integrada com observações directas: enfim é a pesquisa necessariamente realizada nas culturas angolanas a determinar a base etnográfica que deve ser integrada com conhecimentos históricos, geográficos, botânicos adquiridos nas bibliotecas. Esse trabalho exige, por sua própria natureza, a colaboração dos informantes. É um trabalho árduo, ficar a pesquisar alguém que não se conhece e viver entre um povo desconhecido, com estilos de vida completamente diferentes e línguas que não se fala. Entende-se que a presença do antropólogo deve ser, pelo menos, tolerada e ele deve aturar murmurações, apreciamentos, críticas fomentadas pela sua presença no campo.

Para compor um trabalho de pesquisa valido, o antropólogo precisa da cooperação do povo e das informações das amostras. As pessoas parecem com boa vontade de acolher, ajudar e introduzir o estudante de antropologia quando se transfere no campo. Mas temos de admitir, que o sucesso não depende apenas da capacidade do antropólogo, mas também da capacidade de compreender e aturar e do envolvimento dos informantes.

O trabalho de campo em antropologia cultural pode ser excitante, frustrante,  assustador, chato e às vezes perigoso.  Uma coisa é verdade: ele transforma a vida de todos os envolvidos. 

Fases do projecto de pesquisa no campo

Um projeto de pesquisa de campo começa com uma planificação inicial, um questionário elaborado antes e termina com a análise dos dados e a apresentação dos resultados. Na sua chegada, o antropólogo, como qualquer estrangeiro, é objecto de curiosidade, receberá visitas, haverá muitas perguntas, a sua chegada pode provocar hostilidade, suspeitas e questões. Ele pode ser considerado um espião, ou alguém  que irrita porque mete o nariz nos problemas que não lhe competem ou pelo contrario a sua presença pode ser exibida, como motivo de orgulho. Mas em ambos os casos, o curso natural dos acontecimentos, obriga-o a estabelecer um acordo com a população: o processo global de recíproca adaptação leva, depois de algum tempo, o antropólogo a encontrar o seu lugar na comunidade a sua presença será aceite. O Rui começou a lavar pratos, a jogar football, as pessoas respondiam às suas perguntas, preocupavam-se pelo seu sustento, convidavam-no nas suas cerimónias, contavam e explicavam-lhe as coisas que percebiam que lhe interessavam. Riam-se dele próprio dos seus erros e das suas gafes pois desconhecia o habito da cultura local. O antropólogo poderá ficar divertido ao considerar as suas formas bizarras ou até permanecer perplexo quando tentará de dar-se uma explicação. Aos poucos, o que era estranho se tornará familiar: dar-se-á conta das fofocas da aldeia, e assim apreenderá o que é ordinário e extraordinário na vida diária das pessoas. E as pessoas, devagar e bem dar-se-ão, a conhecer com características um pouco diferentes daquelas que ele deixou na sua terra natal e que pensava fossem normais. De facto, sob o a capa da alteridade cultural, o antropólogo reconhecerá os mesmos tipos de personalidade e acabará por considerar essas pessoas não apenas como protótipos étnicos, mas como pessoas que poderão agradar ou desagradar-lhe. Ao progredir os seu trabalho, identificará as pessoas e estudará as suas reacções. O antropólogo inevitavelmente deve estabelecer laços mais estreitos com os uns que com os outros. Haverá quem o ajuda prestando-se a assistí-lo, um como informante, outro como intérprete, outro ainda como ajudante e cozinheiro ou empregado de mesa. Há outros que para obter a sua consideração, estarão de ida e volta ao redor da sua casa, na esperança de serem selecionados para uma comissão ou para fornecer uma pequena notícia. Um e outro, com base no seu conhecimento ou habilidade, autoridade, qualidade intelectual ou carácter, poderá tornar-se um seu informante especial e íntimo amigo. A relação entre o antropólogo e o informante tem muitos dos atributos de outras espécies de relações básicas: aquelas entre aluno e professor, entre empregado e empregador, entre amigos ou entre parentes - e na prática, será uma ou outra destas relações que se estabelecem. Mas, em alguns casos, reproduzirá o relacionamento entre o psiquiatra e seu paciente: por certos aspectos terá a mesma profundidade, o mesmo desejo de entrar profundamente na personalidade do indivíduo e da sua cultura; haverá ao mesmo tempo o esforço para serem objetivos na analise dos fenómenos. No entanto, existem diferenças notáveis: a relação entre o antropólogo e o seu informante chega a estabelecer uma ponte entre duas culturas, de tal modo que irão aparecer diferenças, reciprocidades, afecto e respeito recíproco.

O antropólogo, imerso na vida das pessoas que ele estuda, pode experimentar a alegria de chegar a compreender outros povos e ser aceite; ou pelo contrario às vezes o relacionamento pode ser acompanhado por um sentimento desastroso de isolamento, estranhamento, desorientação e um desejo angustiado de regressar em casa. Aqui está o dilema, pois ele  deve participar plenamente da vida das pessoas que estuda e já não simplesmente como observador passivo. Ele tem uma tarefa intermediária que pode ser resumida na composição 'participante-observador'. Uma vez que não nasceu naquela cultura que pode permanecer estranha, o antropólogo deve manter uma certa distância psicológica e emotiva: sendo um cientista objetivo, ele não pode 'tornar-se um indígena qualquer’; nem pode manter-se completamente estranho pois deve observar os factos humanos na mesma medida de um pesquisador que estuda o comportamento das abelhas ou o estilo dos orangos-tang. Entre os homens, há sempre a possibilidade e a necessidade de comunicar. Assim, a capacidade de entrar de forma imaginativa na vida de outras culturas torna-se a qualidade fundamental do antropólogo. (Casagrande, 1966, p. 17)

Para começar o processo do trabalho de campo

 Antes de ir para o campo, o pesquisador que se prepara deve selecionar um tópico de pesquisa e cuidar da pesquisa no trabalho de campo.  Estas etapas são críticas para o sucesso do seu projecto.

SELECÇÃO DE PROJECTOS

Encontrar um tema para um projeto de pesquisa é o primeiro passo básico.

O tema deve ser importante e viável. Os antropólogos culturais, muitas vezes encontram um tópico para pesquisa através da analise da literatura antropológica precedente, que é o termo formal para ler o que outros já escreveram sobre o assunto e avaliar os seus pontos fortes e lacunas (História dos estudos).

Por exemplo, Os antropólogos culturais nas pesquisas realizadas durante a década de 1970 viram que as pesquisas antropológicas até àquela data tinham ignorado o mundo das mulheres e meninas, e este é o motivo pelo qual a antropologia feminista começou (Miller, 1993).

Tendências e eventos importantes muitas vezes inspiram um projecto de pesquisa.  A epidemia de HIV /AIDS e a sua rápida disseminação continuam solicitar muita pesquisa, como também as outras novas ameaças à saúde (covid 19). A difícil situação de muitos refugiados e migrantes internacionais fornece um tópico de pesquisa para estudo. Os conflitos no Afeganistão, Iraque, RDC, Síria e outros lugares estimulam antropólogos culturais a questionar acerca das causa de tais conflitos e como a reconstrução após o conflito poderia ser mais eficazmente realizada (Lubkemann 2005). As questões Climáticas e ambientais tornaram-se importantes nos últimos anos, e os antropólogos culturais são ocupados em documentar como os grupos locais são afetados pela seca, matando os animais e as populações de peixes com o aumento das temperaturas

Alguns antropólogos culturais examinam um determinado item ou mercadoria dentro do seu contexto cultural, tais como o açúcar (Mintz  1985), carros (Miller 2001), (Caplan 2000), dinheiro (R.  Fomentar 2002), manteiga (Chalfin 2004), vestidos de noiva (Foster e Johnson 2003), drogados (Allen 2002) ou cocaína (Taussig 2004). 

O item, cujo campo pertence à antropologia económica, fornece uma janela para a compreensão das relações sociais em torno da sua produção, utilização e comércio, e o que isso significa em termos de identidade das pessoas.  Outro avanço nos métodos está relacionado com a necessidade de investigação aplicada para produzir conhecimento com resultados utilizáveis para governos, organizações não-governamentais (ONGs) e empresas.  Ao invés de gastar um ano ou mais no campo, eles contam com o conhecimento especializado da cultura, uma abordagem de trabalho de campo em equipe aplicando métodos de pesquisa, para obter fornecer informações necessárias no mais breve tempo.  Reconhecidamente tal pesquisa não possuem a profundidade e a amplitude de campo intendido tradicionalmente, mas tem a vantagem de  fornecer visuais  "suficientemente boas " para aplicações práticas.

Uma outra ideia para um projeto de pesquisa é um estudo, ou trabalho de campo realizado numa comunidade que já foi previamente pesquisada (Blanes e os tocoistas).  Muitos  estudos levados a cabo anteriormente oferecem uma base para desenvolver observações posteriormente, fornecendo panorâmicas sobre as mudanças que ocorreram ou  oferecendo um novo ângulo de visual. Um dos principais antropólogos, Bronislaw Malinowski, contribuiu à antropologia com o estudo clássico, Argonautas do Pacifico ocidental (1961 [1922]) e o seu exame pormenorizado  do kula nas ilhas Trobriand, uma troca de objectos que coligava muitas ilhas e através da qual os homens mantinham parcerias de longa data, era o intercâmbio de mercadorias todos os dias, tais como alimentos, bem como colares e braceletes altamente valorizadas. Mais de meio século mais tarde, Annette Weiner viajou para as ilhas Trobriand para estudar as esculturas em madeira. Parou numa aldeia perto do lugar onde Malinowski tinha feito a sua pesquisa e imediatamente começou a fazer observações surpreendentes: 

«No meu primeiro dia na aldeia, vi mulheres que realizavam uma cerimónia funerária [óbito]  em que distribuíram milhares de pacotes de tiras  de folhas de bananeira secas e centenas de saias fibrosas lindamente decoradas» (1976:xvii). 

Weiner estava impedida e decidiu mudar o seu projeto de pesquisa para investigar a troca de mulheres.  Poder e prestígio derivam de homens e de mulheres através de redes de intercâmbio.  A leitura de Malinowski nos informa somente sobre uma parte da população, mas não sobre o isolamento de metade da população das ilhas: mulheres. O Livro de Weiner , Mulheres de valor. Homens de renome (1976) fornece uma conta de negociações das mulheres e o prestígio das actividades bem como a forma como elas são vinculados dos homens. Com base no trabalho do seu antecessor (Malinowski), Weiner mostra como uma completa compreensão de um campo exige conhecimento do outro.

PREPARAÇÃO PARA O CAMPO

Depois de definir o tópico da pesquisa, é importante calcular como pode-la realizar. Os antropólogos académicos podem-se candidatar a financiamentos provenientes de uma variedade de fontes, governamentais e não governamentais. É mais difícil encontrar subvenções para apoiar o trabalho de campo, mas alguns conseguem.

Financiamento e autofinanciamento

Relacionado com a questão do financiamento é apropriado para um antropólogo realizar pesquisas enquanto empregado no ambiente onde pesquisa. O emprego fornece apoio financeiro para a pesquisa, mas levanta alguns problemas. Um dilema básico, é o princípio ético que os antropólogos não podem fazer a pesquisa 'disfarçados’. Se estiver trabalhando em uma empresa, por exemplo, ao estudar o que se passa na empresa, deve-se obter a permissão das pessoas que se estudam, algo que nem sempre é fácil. Mais positivamente, uma função de trabalho pode ajudar a ganhar confiança e respeito das pessoas. Um estudante britânico trabalhou como barman numa cidade turística da Irlanda (Kaul 2004). Esta sua posição o colocou no centro da aldeia, e as pessoas respeitavam-no como um trabalhador, assim aumentou mais a sua capacidade de aprender a cultura local, pelo menos, como pode obter um barman.

Vistos de entrada

Se o seu projeto implica viagens internacionais, o governo anfitrião pode exigir um visto e um pedido de autorização para conduzir pesquisas. Estas formalidades podem levar muito tempo e podem até ser impossíveis. O governo da Índia, por exemplo, restringe a pesquisa a estrangeiros, especialmente se a investigação está relacionada com problemas 'sensíveis', tais como os povos tribais, as áreas fronteiriças, e o planeamento familiar. As restrições da China contra antropólogos estrangeiros que fazem trabalho de campo foram atenuadas desde a década de 1980, mas ainda não é fácil de obter permissão para fazer trabalho de campo e observação participante num país comunista.

Controles

Muitos países exigem que os pesquisadores sigam orientações oficiais para a protecção dos seres humanos. Nos Estados Unidos, universidades e outras instituições que apoiam a pesquisa com grupos humanos viventes deve estabelecer uma revisão institucional (IRBs) para monitorar a investigação e certificar-se de que está em conformidade a princípios éticos e directrizes IRB, seguindo um modelo médico relacionado à protecção das pessoas que participam como 'sujeitos' na pesquisa médica. Normalmente, IRBs exigem o consentimento informado, escrito, dos participantes da pesquisa.

Consentimentos

O consentimento informado é um aspecto da ética na pesquisa que exige que o pesquisador informe o participantes acerca do objectivo e da intenção da pesquisa, o alcance e os possíveis efeitos do seu estudo e buscar o seu acordo que deve constar no estudo. Obtenção do consentimento por escrito dos participantes da pesquisa é razoável e possível em muitos projectos de investigação antropológica. Permissão por escrito, No entanto, muitas vezes não é razoável nem exequível, especialmente nas culturas orais onde a maioria das pessoas não são alfabetizados. Felizmente, IRBs estão ganhando mais experiência com os contextos em que antropólogos culturais fazer pesquisa.

Preparação para o campo

Dependendo da localização do projeto, a preparação para o campo pode envolver a compra de equipamento especializado, como uma tenda, muxila, roupas impermeáveis ​​e botas resistentes. As preparações no contexto da Saúde podem exigir a imunização contra doenças contagiosas tais como a febre amarela.

Instrumentos de pesquisa

Para a pesquisa em uma área remota, o kit médico deve ser bem abastecido e o antropólogo deve possuir um treinamento básico de primeiros socorros. Por isso são essenciais equipamentos de investigação e suprimentos tão importantes como a sua preparação. Câmeras, gravadores de vídeo, caça-palavras, e computadores portáteis estão dentro do equipamento de campo básico.

Conhecer a língua local

Se um pesquisador não está familiarizado com a língua local, treinamento intensivo de idioma antes de ir para o campo é crítica. Mesmo com formação linguística feita com antecedência, os antropólogos muitas vezes não conseguem comunicar no local de pesquisa, pois versão da língua que eles estudaram em uma sala de aula é muito diferente daquela que encontram no campo. Portanto, muitos pesquisadores de campo contam com a ajuda de um intérprete local, em todo o seu estudo ou, pelo menos nos seus estágios iniciais.

Trabalhar no campo

Um primeiro passo básico na criação de um projeto de trabalho de campo é decidir sobre a delimitação geográfica.

O segundo passo é encontrar um lugar para comer, dormir e viver.

Delimitação espacial

Um campo de pesquisa é o lugar onde o pesquisa ocorre. O pesquisador muitas vezes tem uma ideia básica do área onde o trabalho de campo irá ocorrer, por exemplo, uma aldeia da província do Zaire, uma aldeia do Bailundu ou uma empresa de Talatona. Mas muitas vezes é impossível saber com antecedência exactamente onde o projecto de pesquisa será localizado. A seleção de um local de pesquisa depende de muitos factores. Pode ser necessário encontrar uma grande cidade, se o projeto envolve diferentes classes sociais, ou uma hospital, se o estudo implica a analise do comportamento de saúde. Pode ser difícil encontrar uma aldeia, bairro, ou instituição em que as pessoas deem boas-vindas ao pesquisador e o projeto seja realizável. Muitas vezes, a falta de delimitação espacial significa que mesmo que a comunidade seja a mais acolhedora não pode fornecer espaço para o antropólogo viver.

Ganhar a confiança

Trata-se de estabelecer uma relação de confiança entre o pesquisador e a população em estudo. No início das etapas de pesquisa, o principal objectivo é estabelecer um relacionamento com os principais líderes ou responsáveis da comunidade que podem servir como chaves de entrada para o grupo ou a comunidade. O relacionamento envolve confiança por parte da população em estudo, e a confiança depende de como o próprio pesquisador se apresenta. Em muitas culturas, as pessoas têm dificuldade em compreender e ficam chateados do porque deve ser uma pessoa de fora a vir para estudá-los, como é que um que estudou nas universidades deve fazer pesquisas despachando-se como antropólogo. Eles podem fornecer suas próprias explicações baseadas em experiência anteriores com estranhos cujos objetivos diferem do seus e estes são antropólogos culturais, tais como soldados ou cobradores de impostos, que indagam sobre o seu planeamento familiar para depois fornecer às autoridades políticas melhor forma de aplicação das leis.

Histórias sobre as atribuições de funções falsas podem resultar ridículas.

Durante o seu trabalho de campo 1970 no noroeste do Paquistão, Richard Kurin relata que, na primeira fase da sua investigação, os habitantes achavam que ele fosse um espião internacional da América, Rússia, Índia ou China (1980). Ao longo do tempo, eles convenceram-se que não era um espião. Então, afinal quem era ele? Os habitantes atribuíram-lhe vários papéis. Primeiro, especularam que era um professor de Inglês, porque ele ensinava a um dos meninos da aldeia. Em segundo lugar, eles adivinharam que devia ser um médico porque deu às pessoas aspirina. Em terceiro lugar, eles pensaram que ele poderia ser um advogado que poderia ajudá-los em questões locais, porque ele conseguia interpretar as cartas enviadas pelo tribunal. Por último, eles decidiram que ele era um descendente de um antepassado, por causa da semelhança do seu sobrenome com aquele dum rei ancestral. Para Richard Kurin, o último destes papéis que lhe foram atribuídos ou seja de ser um verdadeiro 'Karan' foi o melhor de tudo.

Oferecer presentes

Dar presentes para as pessoas envolvidas na pesquisa ajuda o projecto a prosseguir, mas os presentes devem ser culturalmente e eticamente adequados.  Aprender as regras locais da reciprocidade é importante.  Hamabata Matthews, um nipo-americano que fez o trabalho de campo no Japão, aprendeu sobre a complexidade de oferecer dons  às famílias de negociantes japonenses (1990).  Ele desenvolveu um relação com uma família, o Itoos e ajudou sua filha a solicitar a admissão numa universidade dos Estados Unidos.  Quando  as inscrições foram concluídas, a Senhora  Itoo convidou-o para um restaurante para festejar.  Depois do jantar, ela entregou-lhe um pacote pequeno, cuidadosamente embrulhado, expressando seu embaraço para a inadequação da prenda em relação a tudo o que ele tinha feito para a inscrição da  filha dela.  Quando ele voltou para casa, ele abriu  o presente.  Era uma caixa de chocolates.  Ao abrir a caixa, ele descobriu 50.000 Yen (cerca de US$ 250).  Hamabata sentiu-se ofendido: «Veja só como os Itoos são. Não podem comprar os meus serviços!»  (1990:21-22).  Ele pediu a alguns amigos japoneses como é que ele devia fazer.  Disseram-lhe que o dom significava que os Itoos'  gostavam de ter uma longa relação e que devolvendo o dinheiro para o Itoos seria um insulto.  Eles o aconselharam a dar em troca um presente mais tarde, a fim de manter a relação.  Seu  dom deveria ultrapassar cerca de 25.000 Yen, dado o seu status de antropólogo.  Esta estratégia funcionou, e a relação entre Hamabata e os Itoos permaneceu intacta.

Bibliografia

Marcus, G., & Myers, F. (1995). The Traffic in Culture. Berkeley: University of California Press.

Jacobs-Huey, L. (2006). From the Kitchen to the Parlor. Oxford: University Press.

Guerreiro Viegas, M. (1968). Bochimanes!Kung de Angola. Lisboa: Junta de investigação do Ultramar.

Cuononoca, A. A. (2022). Os!Kung de Angola. História e dinâmicas sócio-culturais. Universidade de Agostinho Neto.

Casagrande, J. (1966). La ricerca antropologica. Torino: Einaudi.

Lubkemann, S. C. (2008). Culture in Chaos. Chicago: The University of Chicago.

Mintz, S. W. . (2003). O Poder Amargo do Açúcar. Recife: UFPE.

Caplan, P. (2003). Food, Health and Identity. New York: Taylor and Francis.

Chalfin, B. (2004). Shea Butter Republic. New York: Routledge.

Taussig, M. (2013). El Museo de la Cocaína. Popayán: Universidad del Cauca.

Blanes Llera, R. (2017). Uma Trajetória Profética. Luanda: Mulemba Waxa Ngola.

Malinowski, B. (1976). Argonautas do Pacífico Ocidental. São Paulo: Victor Civita.

Weiner, A. (1976). Women of Value, Men of Renown. Austin: University of Texas Press.

 

         8ª aula 28 de Novembro: pesquisa etnográfica 

O caráter inicialmente exploratório da pesquisa etnográfica

significa que muitas vezes não ficará claro onde, dentro de um cenário, a observação deve começar, quais atores precisam ser sombreados e assim por diante. As amostras terão de ser escolhidas e alteradas à segunda dos resultados que a pesquisa oferece no seu progresso. A entrevista normalmente tomará uma forma relativamente não estruturada, embora questionamentos mais estruturados ou estratégicos possam ser usados no final do trabalho de campo. Além disso, como já observado, os dados geralmente serão coletados de forma não estruturada, por meio de notas de campo escritas em termos concretamente descritivos e também por meio de gravações em áudio ou vídeo, além da coleta de documentos. Dada a natureza desses dados, será necessário muito esforço e tempo para processá-los e analisá-los. Em todos esses aspectos, a etnografia é uma atividade exigente, exigindo diversas habilidades, incluindo a capacidade de tomar decisões em condições de considerável incerteza. Isso é verdade apesar do facto de que, como um conjunto de métodos, a etnografia não está longe dos meios que todos nós usamos na vida cotidiana para dar sentido ao nosso entorno, às ações de outras pessoas e talvez até ao que nós mesmos fazemos. È necessário analisar os dados especificamente procurados para iluminar questões de pesquisa e regista-los cuidadosamente; Deve-se encontrar os modos comuns de dar sentido ao mundo social que todos nós usamos nas nossas vidas mundanas, de uma maneira que esteja em sintonia com os propósitos específicos de produzir conhecimento de pesquisa. Os métodos de pesquisa visam a obter as interpretações, as  perguntas do questionário que, sem dúvida, variam de pessoas em pessoas até que esses métodos de pesquisa seja padronizados.

 O comportamento das pessoas não é causado de maneira mecânica, não é passível de análise causal. Qualquer esperança de descobrir as leis do comportamento humano é infundada, sugere-se, uma vez que o comportamento humano é continuamente construído e reconstruído com base nas interpretações das pessoas sobre as situações em que se encontram.

Devemos usar uma abordagem que nos dê acesso aos significados que orientam seu comportamento. Enquanto actores sociais temos as capacidades que podem nos dar esse acesso. Como observadores participantes, podemos aprender a cultura ou subcultura das pessoas que estamos estudando. Podemos chegar a interpretar o mundo mais ou menos da mesma maneira que eles.

A necessidade de aprender a cultura daqueles que estamos estudando é mais óbvia no caso de outras sociedades que não a nossa. Aqui, não só podemos não saber por que as pessoas fazem o que fazem, mas muitas vezes podemos não ser capazes de reconhecer nem mesmo o que estão fazendo.

No processo de aprender a participar da sociedade de acolhimento, o estranho adquire gradualmente um conhecimento interno da mesma, que suplanta seu conhecimento “externo” anterior. Quando o antropólogo pesquisa numa outra cultura adquire uma certa objetividade que normalmente não está disponível para os membros da cultura. Os últimos vivem dentro da cultura e tendem a vê-la simplesmente como um reflexo de “como o mundo é”. Eles muitas vezes não estão conscientes dos pressupostos fundamentais que moldam sua visão, muitos dos quais são característicos de sua própria cultura.

Isto refere-se ao trabalho dos antropólogos, que tipicamente estudam sociedades muito diferentes das suas. No entanto, a experiência da alteridade não se restringe àqueles que se deslocam para viver em outra sociedade. Há muitas camadas ou círculos diferentes de conhecimento cultural dentro de qualquer sociedade. Sobretudo nas sociedades industriais modernas com suas complexas divisões de trabalho, estilos de vida variados, diversidade étnica e comunidades desviantes; e as subculturas e perspectivas que mantêm e são geradas por essas divisões sociais. Desde a cidade alta onde vive a alta sociedade até as favelas ou bairros como o Kazenga.

O método de pesquisa social da antropologia baseia-se na existência de tais mudanças nos padrões culturais entre e dentro das sociedades e seu significado para a compreensão dos processos sociais. qualquer antropólogo social possui habilidades de aprender novas culturas e na sua analise poderá ser objectivo. Quando ele ou ela pesquisa um grupo ou um ambiente familiar, o observador participante é obrigado a tratar isso como “alteridade cultural”, em um esforço para tornar explícitos os pressupostos que ele ou ela assume como um membro da cultura. Dessa forma, a cultura pode se tornar um objeto disponível para estudo. Assim, a descrição das culturas torna-se o objetivo principal da etnografia.

Método da pesquisa social

O campo da metodologia da pesquisa social hoje em dia é complexo. Houve uma diversificação considerável na pesquisa qualitativa, incluindo o surgimento da análise do discurso e da narrativa, de vários tipos de pesquisa-ação, da autoetnografia e dos estudos da performance, e assim por diante. Ao mesmo tempo, tem havido crescentes apelos para combinar métodos qualitativos com técnicas quantitativas. Junto com isso, tem havido críticas às formas mais antigas de trabalho etnográfico, alegando que elas ainda traem a influência do positivismo e do cientificismo. O que se aponta aqui é que, apesar de suas diferenças, o positivismo e o naturalismo têm muito em comum. Como resultado, ambos estão empenhados em tentar compreender os fenômenos sociais como objectos que existem independentemente do pesquisador. E eles, portanto, afirmam que a pesquisa pode fornecer um conhecimento do mundo social que é superior em validade ao das pessoas que estão sendo estudadas. Igualmente importante, ambos consideram os compromissos práticos e políticos por parte do pesquisador como, em grande parte, estranhos ao processo de pesquisa - na verdade, como uma fonte de distorção potencial cujos efeitos devem ser evitados para preservar a objetividade. O relativismo cultural que molda sua compreensão das perspectivas e do comportamento das pessoas que estudam (Hammersley 1992: p. 3). Como vimos, os etnógrafos retratam as pessoas como construtoras do mundo social, tanto por meio de suas interpretações quanto por meio de ações baseadas nessas interpretações. Além disso, essas interpretações às vezes refletem culturas diferentes, de modo que há um sentido em que, por meio de suas ações, as pessoas criam mundos sociais distintos (Blumer 1969: 11). Mas esse construcionismo e relativismo é compatível com o naturalismo apenas enquanto não for aplicado à própria pesquisa etnográfica. Uma vez que passamos a ver os etnógrafos como eles mesmos construindo o mundo social por meio de suas interpretações.

Também é importante reconhecer que a pesquisa é um processo activo, em que os relatos do mundo são produzidos por meio da observação selectiva e da interpretação teórica do que é visto, por meio de perguntas particulares e interpretação do que é dito em resposta, por meio de anotações de campo e transcrição de áudio. - e gravações de vídeo, bem como através da elaboração de relatórios de pesquisa. E é verdade que alguns aspectos desse processo não receberam a atenção que merecem até recentemente. No entanto, dizer que nossas descobertas, e até mesmo nossos dados, são construídos não implica automaticamente que eles não representem ou não possam representar fenómenos sociais. Os pesquisadores, é provável que tenham um efeito sobre as pessoas que estudam, mas, não significa que a validade das descobertas se restrinja.

Projecto de pesquisa

Problemas, casos e exemplos

Cada novo pesquisador deve descobrir por si mesmo o que é necessário para produzir um estudo antropológico. A pesquisa etnográfica não pode ser programada, a sua prática está cheia de imprevistos. Toda pesquisa é uma atividade prática que requer o exercício de apreciação no contexto; não se trata de seguir regras metodológicas, nem todos os problemas podem ser antecipados ou resolvidos.

Assim, devemos reconhecer que, ainda menos do que outras formas de pesquisa social, o curso do trabalho etnográfico não pode ser predeterminado. No entanto, isso não elimina a necessidade de preparação pré-trabalho de campo.

O desenvolvimento de problemas de pesquisa

O objetivo na fase de pré-trabalho de campo, e uma das tarefas nas fases iniciais de colecta de dados, é transformar os problemas prenunciados em um conjunto de perguntas para as quais uma resposta pode ser dada, seja uma descrição narrativa de uma sequência de eventos, um relato generalizado das perspectivas e práticas de um determinado grupo de pessoas, ou uma formulação teórica mais abstrata. Às vezes, nesse processo, os problemas originais são transformados ou até mesmo completamente abandonados em favor de outros.

A mudança nos problemas de pesquisa pode derivar de várias fontes. Pode-se descobrir que a formulação original foi fundada em suposições erradas. Da mesma forma, pode-se concluir que, dado o estado atual do conhecimento, o problema de fundo não pode ser tratado.

Formular a pergunta de partida certa é mais importante, e às vezes mais difícil, do que respondê-la. O que são problemas de pesquisa viáveis ​​depende, é claro, dos recursos disponíveis para o pesquisador; e o que é relevante aqui não são apenas recursos externos, como tempo e fundos, mas também pessoais, como conhecimento prévio, características sociais e circunstâncias. Além disso, estes podem mudar durante o curso da pesquisa, talvez forçando uma reorientação da investigação.

Grande parte do esforço que vai para a análise de dados inicial está preocupado em formular e reformular o problema de pesquisa de forma a torná-lo mais frutífero e/ou mais passível de investigação.

 

         9ª aula 5 de Dezembro: como ir no campo 

Trabalho de Campo em Mbanza Kongo

7-11 Setembro 2016

Percorremos um itinerário de formação caracterizado pelo utilizo, no processo de aprendizagem, de centros culturais arqueológicos, históricos, museológicos e abordando em todos os seus aspectos a cultura tradicional bacongo na tentativa de desenvolver as competências dos estudantes do quarto curso envolvidos na aplicação de teorias e métodos antropológicos no campo.

Em outras palavras, era necessário que o itinerário de formação fluísse num ambiente de trabalho específico com o objectivo de por em acto uma certa habilidade profissional e aumentar a capacidade de inserção numa cultura angolana diferente.

Procuramos portanto de interagir, e de fruir dos bens culturais demo-antropológicos que encontramos no ambiente de Mbanza Kongo incentivando a responsabilização perante os conteúdos adquiridos e visando a oportunidade de aplicar e exercer directamente técnicas de abordagem à alteridade cultural.

Isto foi possível na visita aos lugares arqueológicos e ao museu do palácio real que ocupou toda a actividade do primeiro dia. Há relatos de factos e acontecimentos que evidenciam a mentalidade mítico-celebrativa dos Bacongo face à qual é necessário aplicar uma sabia deconstrução para obter o dado cultural integro.

Ao 10 de Novembro último dia de permanência avaliamos a actividade baseando-nos em

quatro critérios:

- A capacidade de iniciativa na abordagem cultural

- A identificação do campo de pesquisa antropológicos e a investigação com informantes

- A abordagem holística à cultura bacongo

- O compromisso individual do antropólogo na colheita de dados etnográficos 

A subdivisão em grupos visava ao treinamento para o trabalho comum, considerando-se necessário delimitar um âmbito de pesquisa e avaliando o seu impacto formativo na capacidade de colher dados etnográficos que enriquecessem a analise antropológica.

A fim de proceder a uma analise objectiva e uniforme dos factos culturais, económicos, políticos, organizacionais, cada grupo definiu a duração da actividade de pesquisa através da elaboração de um projecto e do preenchimento de um questionário permitindo obter uma imagem geral do facto cultural e dando provas da existência dos dados etnográficos recolhidos.

Pelo efeito a equipe formada por três docentes (Kavula, Hebo, Bortolami) atribuiu a cada grupo tarefas especificas a serem executadas no dia 9 de Setembro durante a permanência dos alunos nas aldeias de Sumpi, Ndembo, Nkoko, Nkama, Lula, Boa Esperança pertencente à comuna de Lukossa e ao município de Mbanza Kongo.

A Comissão dos três docentes decidiu credenciar aos seis grupos os seguintes âmbitos de pesquisa:

- Antropologia da nutrição: a preparação, consumo e venda dos alimentos (Sumpi)

- Estrutura social e ciclo da vida (Ndembo).

- Antropologia política: organização social, chefes tradicionais, exercício do poder (Nkoko)

- A cultura material (Nkama)

- Antropologia do parentesco e iniciação mascolina (Lula)

- Antropologia económica (Boa Esperança)

Cada grupo foi incentivado a individuar e adquirir habilidades na colheita dos dados etnográficos que ocorreu no campo de trabalho através da aplicação de instruções e procedimentos que permitiram a interacçao com os informantes e a realização de actividades antropológicas específicas, o uso de técnicas e métodos de pesquisa. A abordagem cultural permitiu a aplicação de procedimentos e instruções que se estenderam para os aspectos relacionais não somente a nível de dinâmica entre os membros dos seis grupos que pesquisavam mas também com os informantes e o povo da aldeia onde o grupo pesquisava. Isto favoreceu um maior inserção no ambiente de pesquisa e um impacto profissional no exercício de actividades antropológicas.

Os métodos que cada grupo aplicou no campo eram diferentes para cada situação, mas principalmente foi adoptada a observação participante e participativa, prestando atenção a evitar em tudo abordagens etnocêntricas, supervisionando os dados culturais e aplicando um sistema de avaliação e analise que tivessem o corte antropológico.

A participação dos grupos de trabalho o estudo, e o aperfeiçoamento das técnicas de pesquisa foram excelentes e pela primeira vez os alunos reflectiram sobre a importância de aplicar noções abstractas e conceitos assumidos em quatro anos de formação académica ao campo concreto e real onde a cultura vive e muda.

Nos cinco dias passados nas viagens efectuadas incentivamos a tarefa de aprendizagem através da interação com o grupo e os colegas que interagiram para as seguintes tarefas:

 Nas actividades realizadas no âmbito dos trabalhos de grupo os alunos documentaram-se e puderam incluir na revisão dos processos e procedimentos a literatura científica-antropológica estudada durante o curso (Franz Boas, Bronislaw Malinowski, Margareth Mead, Edward Evans Pritchard, Radcliffe Brown). Esta documentação bibliográfica serviu de base para a acreditação, a identificação dos factos sociais (Mauss) habilitando os estudantes  a gerir praticas de pesquisa, dando postura científica às discussões em grupo e favorecendo o desempenho de tarefas que cada membro assumiu durante o trabalho de campo. 

 No trabalho dos seis grupos os estudantes abordaram: a pesquisa e a organização da documentação antropológicas, as leituras científicas e a discussão em grupo, a análise antropológica dos dados etnográficos colhidos no campo, a preparação duma relação acerca dos resultados da pesquisa, a sua apresentação e discussão na assembleia geral, a produção de diretrizes ou procedimentos de auto-avaliação das actividades realizadas, a revisão de procedimentos de trabalho, e a tentativa de organizar um método de pesquisa. 

Participação em Pesquisa

A participação na investigação cientifica e o levantamento de dados foi possível através da colaboração activa e isso permitiu a busca de novos conhecimentos com relação aos âmbitos de pesquisa delimitados e atribuídos a cada grupo, nomeadamente: actividade e produção, estrutura organizacional e parentesco, cultura material, organização económica e comercio, alteridade cultural e convivência. Essa investigação assumiu muitas formas:

Essa investigação visava a habilitar o aluno no contexto antropológico ao: estudo e organização bibliográfica, colaboração no projecto de pesquisa, colecta e processamento de dados etnográficos, discussão em grupo sobre os resultados, preparação, apresentação e discussão de processamento e avaliação dos resultados no local de pesquisa para produzir novos conhecimentos e activar os processos de mudança cultural e operacional.

Abordagem antropológica

O impacto com a nova alteridade cultural bacongo favoreceu o alcance do objectivo de melhorar a qualidade da colecta dos dados, a analise e os resultados dos processos aplicados através duma sistemática revisão das actividades de pesquisa de campo divididas nas seguintes fases:

Referência;

- Tivemos a valiosa colaboração de dois antropólogos da Oxford University que introduziram os alunos ao trabalho de campo aconselhando-os e instruindo-os oportunamente.

Elementos marcantes a experiência realizada

 

1. Objectivos alcançados

1.A – Aquisição de competências

 

1.B – Níveis aadquiridos

 

2. Modalidades de aprendizagem

2.A – Contexto cultural bacongo

2.B – níveis de actividade

 

3. Actividades

3.A – Tipologia

 

3.B – Tempo dedicado a cada actividade

 

Delimitação Geográfica

Delimitar uma região geográfica e com um determinado povo muitas vezes depende dos interesses de pesquisa e das experiências dos professores que orientam sua formação a escolha de um grupo específico para estudo muitas vezes deriva de um interesse em testar hipóteses de pesquisa particulares em um ambiente cultural ainda não conhecido por meio de relatórios baseados em residência de longa duração por um acadêmico treinado.

Status da arte

Ao revisar estudos sobre tema escolhido na literatura antropológica, se descobre que parecia não haver pesquisa mas que afinal há muito material. Começa-se com uma leitura sistemática das publicações sobre o tema. A leitura pode durar um ano. Começa-se então a elaborar uma proposta de pesquisa para um estudo de campo.

Escrevendo uma proposta de pesquisa

A redação do projecto de pesquisa envolve a apresentação, com detalhes específicos e com alguma exatidão, das respostas às seguintes questões:

(1) O que você se propõe a fazer?

(2) Como é que queres realizar a pesquisa?

(3) Que pesquisas desse tipo já foram realizadas, particularmente entre o grupo a ser estudado?

(4) Qual é o montante estimado de fundos necessários para apoiar a pesquisa?

(5) Qual o período de tempo a ser dedicado à pesquisa?

A forma das propostas de pesquisa pode variar muito na inclusão de detalhes e com estilos de escrita individuais, mas na maioria dos casos deve fornecer respostas diretas a essas perguntas.

Preparativos para o Estudo

 

 Os livros lidos no campo tendem a ter um impacto maior do que quando lidos em casa, pois sua consciência de si mesmo e das experiências de vida será aprimorada e aguçada no trabalho de campo. Por isso, a literatura que mereceu críticas é útil. Todos os livros lidos devem ser anotados nas anotações do diário de observações diárias. Existem pontos teóricos importantes na literatura profissional que se lê que podem ser destacados de forma mais distinta em sua pesquisa, e pode haver teorias sobrepostas em diferentes textos que contribuem para sua compreensão dos dados que estão sendo registrados. Notas diárias sobre sua leitura ajudam você a retornar ao ponto de primeira preocupação com uma ideia.

Chegando ao local de estudo

Geralmente é vital que as visitas oficiais sejam feitas imediatamente aos representantes do governo local. Tais visitas podem envolver procedimentos que não estão descritos em qualquer literatura disponível para o pesquisador de campo; assim, ao chegar a um território. A falta de conhecimento e observância de tal costume local pode resultar em um apoio pouco entusiasmado das autoridades locais.

Para tornar o curso da cooperação oficial necessária mais fácil do que poderia ser o caso, também ajudará a aprender sobre o etnocentrismo local e as personalidades locais. Um funcionário local umbundu que não gosta de «kaluanda», um chefe de povo que pode colocar bloqueios no caminho de um estudo por causa de sensibilidades ofendidas por uma suposta falta de 'maneiras' por um visitante que desconhece o local.

Geralmente é apropriado solicitar a ajuda de funcionários do governo local para escolher o local exato para o estudo. Um pedido de assistência e aconselhamento pode fornecer uma oportunidade para corrigir quaisquer violações de costumes cometidas nas primeiras visitas. As autoridades locais podem estabelecer contactos pessoais que podem diminuir consideravelmente os problemas de abastecimento, assistência médica e proteção em caso de necessidade.  É útil prever que Um funcionário pode ou não ter viajado na área de estudo proposto e pode ser muito preconceituoso sobre as pessoas escolhidas para o estudo devido a diferenças culturais locais de longa data.

. Normalmente, um comerciante local pode dar conselhos úteis sobre os tipos gerais de equipamentos mais adequados para residência em uma comunidade nativa e os melhores tipos de presentes a serem dados a informantes e amigos. Suposições sobre presentes que podem agradar as pessoas podem ser caras e até perigosas; por exemplo, a escolha de contas de cores erradas onde a cor é temida ou detestada pode causar dificuldades em uma comunidade.

Com vários tipos de conselhos em mãos, ainda é útil, antes de prosseguir, fazer um tour pela região geral do estudo. As possibilidades para tal passeio serão limitadas pelos fundos e tempo disponível, mas os benefícios são grandes. Adquire-se uma idéia bastante precisa da distribuição e estilo de vida das pessoas, as rotas de transporte de suprimentos, as variações de clima e topografia, e passa-se a conhecer geralmente os tipos de condições com as quais teríamos que lidar em uma aldeia nativa.

Com algum conhecimento do país, das condições locais e das personalidades, e com os equipamentos encomendados de forma geral, ainda é preciso delimitar o local preciso da pesquisa. Essa escolha pode ser forçada pela decisão de um político local de restringir o pesquisador de campo ao estudo de uma determinada área. Muitos governos não desejam que pessoas de fora tomem conhecimento da falta de instalações de saúde, escola e transporte em algumas das regiões mais remotas de seus países, pois esse fato está em desacordo com suas declarações públicas. E muitas nações recém-livres são sensíveis ao fato de que existem povos 'nativos' em seus países e esconderiam o fato por meio de proibições de viajar para essas áreas. Em alguns países, um estado de insurreição local, movimentos revivalistas (como o “culto da carga”), rebeliões fiscais, populações em declínio ou presumivelmente em declínio, ou qualquer uma de uma ampla variedade de condições sociais, econômicas ou políticas podem resultar na negação do acesso para áreas específicas.4

Se a escolha do local for relativamente livre, então os fatores a serem tratados devem envolver uma variedade de questões que começam com a proposta de pesquisa e continuam pela saúde e segurança pessoal. Deve ser determinado se a região escolhida tem uma população de alta densidade do grupo que se estuda, se as mudanças culturais estão ou não afectando drasticamente a região, a facilidade ou dificuldade de entrar e sair da área.

Informantes

Apurar a disponibilidade na área de pessoas para servir como intérpretes, e como “representante” da cultura nativa. Essas perguntas só podem ser respondidas com referência à adequação de suas informações locais, sua viagem inicial no país e sua avaliação das possibilidades de fazer o tipo de pesquisa proposto. Há estudantes de antropologia que querem ir apenas ao nativos supostamente “intocados” de uma região de cultura. O desejo de superar outros antropólogos – ser “o primeiro” – é propriamente parte da motivação que leva um pesquisador de campo a estudar povos remotos. Mas a maioria das pessoas que desejam ir aos nativos “intocados” não tem idéia real dos problemas de pesquisa sob tais condições. Um investimento substancial de tempo e esforço é feito na formação do antropólogo. Seu bem-estar é importante para seus colegas. Um antropólogo doente não é um antropólogo trabalhador. A imagem do especialista em pesquisa se arrastando pela selva com pouco mais do que uma muda de meias, uma escova de dentes e um caderno é atraente para uma 'coca' e um cheeseburger em uma lanchonete do campus. Há uma diferença, no entanto, entre essa imagem idealizada e estar muito perdido, faminto, molhado, dolorido, exausto e sangrando de sanguessugas. Os antropólogos viajam e vivem com povos muito isolados nas partes mais remotas do mundo. Geralmente são profissionais experientes, plenamente conscientes dos riscos que correm e preparados para lidar com a maioria das emergências. Tem-se dito que “Quanto menos aventuras, melhor o trabalho de campo”.

Há uma variedade de outros problemas no trabalho de campo que não foram mencionados,

mas que são importantes para a sua condução. Alguns delas são:

(1) portar óculos e medicamentos pessoais;

(2) roupas para eventos formais;

(3) conhecimento dos costumes locais de bebida, estilo, precedência, brindes;

(4) conhecimento dos protocoles atribuidos à hospitalidade

(5) maneiras adequadas de lidar com as pessoas, maneiras de vestir, dicas, meios de retransmitir mensagens dos servos;

(7) ofertas locais para residentes

Fase exploratória

Em estudos experimentais e pesquisas sociais quantitativas, um desenho de pesquisa é um plano avançado para organizar a coleta de dados de modo que eles sejam relevantes ao máximo para a validade de certas generalizações relativas às relações entre variáveis. O trabalho de campo em antropologia social e cultural apenas ocasionalmente envolve um projeto de pesquisa nesse sentido. Mais frequentemente, tem sido pensado como uma exploração no desconhecido, em que o investigador deve adquirir conhecimento de primeira mão com os factos de fundo da situação geográfica, língua, organização social e cultura de um povo antes de formular objectivos de pesquisa mais específicos. No passado, muitos antropólogos pararam com essa fase exploratória, satisfeitos em contribuir com outra descrição etnográfica para o arquivo da mudança cultural, ou com a intenção de retornar para uma investigação mais especializada em algum tempo futuro indefinido. Isso é em consonância com uma concepção de antropologia social como história natural, utilizando métodos de investigação naturalistas e exploratórios e produzindo estudos de caso. Há uma tendência crescente, no entanto, de adotar objectivos específicos para o trabalho de campo, formular problemas intelectuais que o trabalho de campo pretende resolver, selecionar grupos para trabalhar com base em sua relevância para esses problemas e usar métodos de estudo que são suscetíveis de replicação. O estudo exploratório continua importante na antropologia, mas agora é dada mais ênfase à pesquisa especializada que usa a exploração etnográfica como plataforma de lançamento. Até a etnografia geral está cada vez mais planejada para produzir dados comparáveis ​​que possam ser usados ​​em testes comparativos subsequentes de hipóteses por outros pesquisadores. Diante dessas tendências, pesquisas o projecto de pesquisa no trabalho de campo antropológico merece mais atenção do que tem recebido até agora.

Esta aula aborda o desenho da pesquisa de campo sob os quatro seguintes títulos:

(a) formulação de um problema de pesquisa;

(b) seleção de uma região ou grupo para estudar o problema;

(c) a fase exploratória da etnografia geral; e

(d) a fase de resolução de problemas ou teste de hipóteses.

FORMULAÇÃO DO PROBLEMA DE FUNDO

Actualmente, os antropólogos sociais estão começando seu trabalho de campo com objetivos que variam desde testar uma hipótese altamente específica até o de simplesmente “estudar” um povo que nunca foi estudado antes. A maioria dos pesquisadores vai para o campo com pelo menos um interesse especializado em um aspecto da cultura, como religião, parentesco, política, economia e conhecimento de inúmeras hipóteses e problemas empíricos relativos a esse aspecto. Seu procedimento básico é combinar seu conhecimento de hipóteses que poderiam ser estudadas em base a certas dimensões, com as mudanças reais que se encontram no grupo a ser estudado; quando uma correspondência é descoberta, um problema pesquisável foi identificado. Esse processo de correspondência pode ocorrer antes do pesquisador ir ao campo, se houver informações suficientes sobre o grupo com antecedência, ou durante a fase exploratória do trabalho de campo. Com demasiada frequência, parece ocorrer muito tarde no trabalho de campo ou mesmo depois dele, porque o antropólogo é muito ocupado a colectar dados quando se trata de se afastar deles e dizer: “Quais problemas podem ser estudados de forma mais frutífera aqui; que hipóteses poderiam ser testadas nas variáveis disponíveis?” Se seus esforços de pesquisa abrangentes foram intensivos e abrangentes, ele pode ter dados suficientes para testar hipóteses desenvolvidas depois de deixar o campo; se não, ele pode estar sem sorte sem outra viagem de campo.

BOAS, MALINOWSKI E O DESIGN DE PESQUISA NA TRADIÇÃO CIENTÍFICA

Apesar do interesse de longa data dos antropólogos na atenção aos detalhes, a estrutura para reunir esses detalhes foi documentada e explicada de forma muito menos completa do que os próprios detalhes. Franz Boas e a maioria de seus alunos defendiam uma lógica das ciências naturais na coleta de materiais etnográficos e uma verdadeira preocupação com a coleta de dados confiáveis que pudessem levar à produção de uma teoria válida Não obstante sua preocupação com o método científico, Boas foi mais explícito sobre seus métodos de análise de dados do que sobre seus métodos de trabalho de campo e coleta de dados (Boas 1920; Ellen 1984). Malinowski, outro grande colaborador da investigação antropológica, também se preocupava com os objetivos da ciência e com o rigor metodológico. No entanto, suas primeiras contribuições foram mais uma demonstração do valor da escrita etnográfica – seu “sentido literário incomum” (Lowie 1937, p. 231) – do que de detalhes metodológicos do trabalho de campo etnográfico (Ellen 1984). Um bom exemplo dessa tensão entre as primeiras preocupações declaradas com os métodos da ciência e o uso real de tais métodos na etnografia vem da correspondência entre Boas e sua aluna Margaret Mead durante seu primeiro trabalho de campo em Samoa. Como Orans (1996) descreve, Mead escreveu a Boas com suas preocupações sobre possíveis violações de princípios científicos nos dados que ela havia coletado até aquele momento. Ela escreveu sobre suas dúvidas sobre a comparabilidade dos casos e sobre sua capacidade, ou mesmo a necessidade, de fazer uma comparação quantitativa da semelhança de atitudes entre as adolescentes de seu estudo. Ela estava preocupada – e acreditamos que ela achava que seu mentor, Boas, sentiria o mesmo – sobre se uma comparação válida desse tipo poderia ser feita, dado o processo de seleção para sua amostra de meninas. As restrições da pesquisa de campo podem levar alguém a se desviar das prescrições idealizadas de um projeto de pesquisa, mas Mead estava realmente tentando renunciar aos procedimentos de pesquisa defendidos por Boas e outros. Orans diz:

«O que ela quer é permissão para apresentar dados simplesmente como 'material ilustrativo' para a representatividade (…) Sou decididamente da opinião de que um tratamento estatístico de um comportamento tão intrincado como o que você está estudando não terá muito significado e que a caracterização de um número selecionado de casos deve necessariamente ser o material com o qual você opera. O trabalho estatístico exigirá a remoção de seu cenário natural, alguns aspectos particulares do comportamento que, sem esse cenário, podem não ter qualquer significado. É claro que uma eliminação completa do uso subjetivo do investigador é totalmente impossível em um assunto desse tipo, mas sem dúvida você tentará superar isso na medida do possível. (Orans 1996, 128)

Essa resposta é importante por pelo menos duas razões. Em primeiro lugar, demonstra as diferenças entre os objetivos científicos declarados do trabalho etnográfico, como defendido por Boas, e a prática real da pesquisa etnográfica. Parece haver uma percepção de que um tratamento sistemático dos dados terá que ser abandonado para preservar o contexto e o significado. Ironicamente, essa preocupação com o contexto e o significado sobre o rigor metodológico, particularmente para aqueles em busca de fundamentos teóricos (ou seja, a ideia boasiana de dados que levam à construção da teoria), acabaria por dificultar a comparabilidade de dados de diferentes fontes etnográficas (ver Moran [1995] para uma discussão sobre esta questão, e ver Ember et al., neste volume). Em segundo lugar, a preocupação de Boas com o significado contextual sobre a análise estatística dos dados era profética. A preocupação em compreender o comportamento humano em contexto é um dos pontos fortes da antropologia. No entanto, pensar na quantificação como incompatível com a atenção ao contexto e ao significado muitas vezes obscureceu as discussões sobre o desenho da pesquisa. A frase final de Boas em sua resposta a Mead ilustra que mesmo nessa fase inicial a questão da subjetividade da pesquisa etnográfica era preocupante. Havia fé, no entanto, que a consciência dos potenciais vieses associados à subjetividade do investigador significava que poderia ser tratado de alguma maneira razoável. Outra ironia é que a única coisa que poderia ter diminuído potenciais vieses de subjetividade – o uso de métodos padronizados – foi rejeitada por completo porque havia uma preocupação (talvez incorreta) de que o significado pudesse ser comprometido. A posição de Mead sobre esses vários elementos do projeto de pesquisa forneceu incentivo para as discussões contínuas sobre quão bem-sucedidas foram suas descobertas originais ao abordar as questões que ela colocou, quão válidas foram suas interpretações e se o projeto de pesquisa foi adequadamente rigoroso (Brim e Spain 1974; Freeman 1983; Orans 1996). Assim, enquanto os primeiros antropólogos britânicos e norte-americanos defendiam o método científico na pesquisa etnográfica, há pouca evidência de que eles consideraram questões de projeto de pesquisa apropriadas quando realmente fizeram a pesquisa. Como Urry (1984) vê: Na Grã-Bretanha, as alegações de que a antropologia não apenas estudava um corpo distinto de dados, mas também que possuía uma metodologia sofisticada para colectar esses dados, foi um factor importante no estabelecimento da antropologia como disciplina. Isso era menos necessário na América onde, no final do século XIX, a antropologia já estava estabelecida em universidades, museus e agências governamentais. Mas, apesar das alegações de metodologia científica, particularmente na tradição britânica, há surpreendentemente poucos detalhes sobre os métodos reais que os antropólogos usaram no campo, além de alguns primeiros princípios e anedotas ilustrativas. Havia uma ampla crença entre os antropólogos britânicos de que o trabalho de campo não podia ser ensinado a novos recrutas, mas apenas por indivíduos experimentados no campo. Na tradição americana, os textos forneciam o que era considerado um corpo objectivo de dados, enquanto a tradição britânica era mais uma questão de experiência subjectiva. É um estranho paradoxo no desenvolvimento de métodos de campo que o estudo científico de outras culturas tenha sido construído sobre tal fundamento. Há muitas evidências anedóticas de uma crença inabalável, nas tradições britânica e norte-americana, no método experimental de formação de etnógrafos. Essa crença provavelmente apóia a atual falta de treinamento formal em métodos e desenho de pesquisa em antropologia cultural. Agar (1980) e Bernard (2011) relatam histórias sobre as recomendações de Kroeber sobre como a pesquisa etnográfica é ensinada e conduzida. Kroeber declarou sucintamente a um estudante nervoso

«sugiro que você compre um caderno e um lápis» (Agar 1980, 2). Mesmo no final da década de 1960, quando a preocupação com o rigor metodológico provavelmente estava no auge na antropologia, muitos tratamentos de métodos de pesquisa e projectos na literatura minimizaram a necessidade de métodos mais sistemáticos e detalhes de design, incluindo a operacionalização de conceitos, a confiabilidade e generalização dos achados e avaliação de alegações concorrentes por meio de comparação formal de modelos e teste de hipóteses (LeVine 1973). Um bom exemplo disso é um livro de Thomas Rhys Williams (1967) publicado na série Spindlers sobre métodos de campo. Willians escreve:

Formular o problema antes ou depois do trabalho de campo?

O investigador científico não familiarizado com a antropologia pode perguntar: “Por que não formular uma única hipótese ou conjunto de hipóteses com a maior precisão possível antes do trabalho de campo?” A resposta usual é que o antropólogo que planeja uma viagem de campo se depara com a perspectiva de fazer um enorme investimento de recursos pessoais em um ambiente de pesquisa que provavelmente de antemão desconhece terrivelmente. Quanto mais precisa sua hipótese for, menor a probabilidade de encontrar varáveis dependentes e independentes que forneceriam um teste adequado por ela. Muitos trabalhadores de campo inexperientes (e alguns experientes) viram-se tendo que mudar problemas especializados selecionados antes do trabalho de campo uma vez que estavam no campo e então se perguntando por que se deram ao trabalho de formulá-los com antecedência (a segunda daquilo que a dissertação exige). Em outra disciplina, o investigador pode mudar o cenário de pesquisa e reter seu problema original, mas o pesquisador antropólogo de campo fez tantos esforços para se preparar e até mesmo viajar para seu local de campo, que invariavelmente está menos disposto a mudar o lugar de pesquisa do que o problema de fundo se os dois não corresponderem. Mesmo dentro da antropologia, o pesquisador que usa dados etnográficos publicados para testar hipóteses pode desperdiçar algumas semanas de seu tempo e de seus assistentes em um beco sem saída tentando medir uma dimensão que não varia culturalmente de tal forma que possa ser medida, mas ele pode e altera sua abordagem ao problema e reformula novamente com relativa facilidade. O pesquisador de campo, no entanto, tendo descoberto que sua hipótese não pode ser testada em seu local actual de campo, deve encontrar uma maneira de recuperar dados de pesquisa recolhidos durante seus anos de permanência no campo e da preparação que foi aplicada nele. Portanto, ele não é aconselhado a definir tudo antecedentemente como hipótese ou problema de pesquisa, a menos que conheça o cenário de campo com muita antecedência. Portanto nem sempre é necessário  formular a priori os problemas antes de transferir-se no trabalho de campo antropológico.

Essas dificuldades no planejamento antecipado não significam que o projeto de pesquisa não tenha lugar no trabalho de campo antropológico, mas apenas que seu lugar deve ser definido adequadamente para os tipos de situações de pesquisa em que os antropólogos operam. Nos estudos antropológicos, tanto quanto em qualquer outra investigação científica, o sucesso de um esforço para testar uma hipótese ou resolver um problema empírico depende em grande parte da adequação do projeto de pesquisa. Reconhecendo suas dificuldades únicas em combinar seus interesses problemáticos com o cenário em que trabalhará, o antropólogo deve ser diligente e engenhoso na elaboração de estratégias para a construção de projetos de pesquisa viáveis que sejam apropriados ao seu trabalho de campo.

Várias dessas estratégias têm sido usadas e estão disponíveis.

1) Primeiro, o antropólogo deve desenvolver e estar preparado para testar uma série de hipóteses relevantes para seu interesse principal de pesquisa (por exemplo, um aspecto da cultura ou comportamento) que possam servir como focos alternativos para o trabalho de campo. Presumivelmente, cada hipótese seria de generalidade suficiente para que apoiá-la ou refutá-la traria uma contribuição significativa para o conhecimento nas ciências comportamentais. Pelo menos uma dessas proposições deveria ser tão voltada para as características universais da vida humana que pudesse ser testada em uma ampla variedade de sociedades, senão em todas. Armado com tais alternativas, o pesquisador de campo provavelmente não ficará perdido se achar o ambiente cultural inadequado para testar sua hipótese de primeira escolha.

2) Em segundo lugar, o antropólogo deve fazer uso máximo da informação etnográfica disponível para selecionar uma área do mundo e uma sociedade onde as condições pareçam mais favoráveis para testar sua hipótese. Este procedimento é discutido abaixo.

Mesmo que estes dois primeiros procedimentos não sejam seguidos, todo antropólogo tem à sua disposição a possibilidade de dividir seu trabalho de campo (em uma ou mais saídas de campo) em duas fases explícitas: uma fase exploratória em que um problema específico é formulado, um projeto de pesquisa viável é construído e os métodos de campo são pré-testados; e uma fase de teste de hipóteses na qual o desenho da pesquisa é colocado em actuação. As oportunidades crescentes de residência prolongada ou viagens repetidas anos locais de campo tornam essa sequência cada vez mais possível. É altamente desejável do ponto de vista de um projeto de pesquisa eficaz, não importa quanta preparação pré-campo tenha sido feita.

É óbvio que no projeto de pesquisa ainda não realizado no campo antropológico, não se  pode formular as dificuldades  antecipadamente. Uma vez que essas dificuldades claramente não impedem o projeto de pesquisa, e uma vez que a obtenção de objetivos científicos o exige, é razoável concluir que o pesquisador de campo deve se esforçar para formular uma hipótese testável e elaborar um projeto de pesquisa para testá-lo antes de completar seus dados coleta e não depois.

DELIMITAÇÃO GEOGRÁFICA DUMA ÁREA OU SOCIEDADE PARA ESTUDO DE CAMPO

Assumindo que o investigador identificou um conjunto de problemas relacionados e uma série de hipóteses testáveis antes de começar seu trabalho de campo, ele está na posição de escolher um local de campo na base  que um campo fornece um teste adequado para suas hipóteses. O que é adequado? Muitas hipóteses teoricamente significativas podem ser estudadas em qualquer sociedade, com cada replicação em outra população fornecendo uma base adicional para aceitar ou rejeitar a hipótese. O investigador cujo interesse reside em tal hipótese decidirá onde trabalhar em bases não relacionadas ao problema teórico.

Outros problemas parecem ditar a escolha da sociedade. Tornou-se comum para um antropólogo se interessar por um “problema” como o pastoreio e, portanto, selecionar sociedades pastoris nas quais trabalhar, ou uma economia de mercado e selecionar sociedades com mercados, ou liderança política e selecionar um grupo com um estado centralizado, ou mudança de cultura e encontrar uma área em rápida mudança, ou as relações de uma religião mundial com um culto tribal e selecionar uma área apropriada da Ásia ou África. Os antropólogos que procuram entender a organização burocrática, um funcionário especializado, a poliginia, a couvade e assim por diante tornam-se trabalhadores de campo em sociedades onde essas instituições ou costumes são conspícuos. Isso é amplamente considerado como um avanço em relação aos dias da etnografia geral, quando os locais de campo não eram selecionados por sua relevância para o problema, e não pode haver duvida que as instituições particulares sejam melhor compreendidas por estudos detalhados delas em suas formas mais desenvolvidas. Para testar hipóteses sobre essas instituições, no entanto, precisamos de estudos detalhados de situações em que estejam ausentes ou pouco desenvolvidos elementos comparativos. Se todo antropólogo se interessasse por um padrão institucional específico e fizesse trabalho de campo apenas onde esse padrão fosse mais elaborado ou desenvolvido, os estudos transculturais desses padrões se tornariam impossíveis, pois é a partir de variáveis na magnitude dos factores institucionais que podemos testar hipóteses sobre as relações funcionais desses factores com outras variáveis. Do ponto de vista dos estudos transculturais, a antiquada etnografia geral tinha a vantagem de garantir uma cobertura bastante uniforme em uma lista de tópicos em muitas sociedades, enquanto a etnografia intensiva em sociedades com problemas selecionados impede a comparabilidade.

Independentemente dos estudos transculturais, estudar instituições onde elas são notáveis tem sido notavelmente recompensador na antropologia moderna. Estudos de política em sociedades sem Estado, de grupos de descendência onde não há linhagens, de liderança onde não há chefes, preços onde não há dinheiro, de guerras entre povos pacíficos, de história e ciência entre os analfabetos e tecnologicamente primitivos – representam alguns dos avanços mais significativos e subtis na compreensão antropológica durante as últimas décadas. Esses avanços deram-se porque os trabalhadores de campo não se limitaram a investigar o que era mais óbvio, elaborado, enfatizado ou desenvolvido istitucionalmente entre os povos com os quais trabalhavam e porque não selecionaram uma cultura para trabalhar com base em seus interesses de pesquisa mais fortes. A antropologia social deve muito de sua excitação intelectual por uma combinação muito rígida de interesse do problema e cenário de campo. Assim, devemos especificar com cuidado o que queremos dizer ao escolher um local de campo que forneça um campo de teste adequado para a hipótese do investigador.

Do ponto de vista do projeto de pesquisa, a adequação de um cenário de campo para estudar um determinado problema tem uma relação direta com a quantidade de variáveis fornecidas por esse cenário nas dimensões que são relevantes para aquele problema. Se o trabalho de campo for realizado uma área onde há homogeneidade estática em tais dimensões, o investigador estará (sem mais comparação) na posição mais fraca para tirar conclusões válidas sobre as conexões necessárias e suficientes existentes entre o conjunto de variáveis ​​que ele se propôs a estudar. Embora ele perceba conexões que parecem inerentes a esse ambiente cultural específico, e seus informantes transmitam seu senso de relações dentro de seu comportamento e instituições, ele não terá informações sobre o que aconteceria se algumas das variáveis estivessem ausentes ou presentes em níveis mais fracos ou mais fracos. forma mais forte do que eles. Sem esta última informação, ele não pode dizer nada sobre a contingência necessária de uma variável sobre outra e, além disso, é provável que seja enganado pelas peculiaridades dessa configuração a acreditar que certas variáveis ​​são correlacionadas quando na verdade não são.

Um exemplo disso pode ser o caso de um trabalhador de campo que busca encontrar as pré-condições socio-econômicas para uma organização estatal altamente centralizada. Trabalhando intensamente em uma sociedade organizada dessa maneira, sem grandes variações internas nas variáveis socio-econômicas, o antropólogo pode ver inúmeras conexões entre a economia e a política e começar a tirar conclusões sobre as condições sociais e econômicas necessárias para o desenvolvimento ou manutenção de um sistema centralizado. Estado. Ele poderia posteriormente se surpreender ao encontrar outras sociedades nas quais essas condições estivessem ausentes, mas o Estado ainda assim existisse, refutando sua afirmação de que elas eram necessárias. Nesse caso, o pesquisador de campo pode ou não estar certo sobre as conexões observadas entre economia e política no caso que estudou, mas ser enganado pela ausência de oportunidades para observar a variação política e concluir que as conexões eram necessárias e, portanto, mantidas. geralmente. Outro pesquisador de campo, trabalhando em uma sociedade rica em antagonismo institucionalizado entre os sexos em que as mulheres eram mais frequentemente consideradas bruxas do que os homens, poderia concluir que o último padrão foi causado pelo primeiro. Mais tarde, pode-se chamar sua atenção para o facto de que a crença na maior propensão das mulheres à feitiçaria é extremamente difundida, mesmo entre sociedades sem antagonismo sexual institucionalizado. Este investigador pode estar errado não apenas em generalizar além do caso único de sua observação, mas mesmo dentro desse único caso: ele poderia ter visto erroneamente a co-ocorrência “acidental” de dois padrões em uma única sociedade como evidência de que eles estão necessariamente conectados.

Mesmo se assumirmos que esses dois pesquisadores de campo estavam suficientemente cientes da literatura etnográfica relevante para saber que as co-ocorrências observadas não provaram relações necessárias ou invariáveis, o ponto é que seus dados de campo não os ajudariam a decidir qual das muitas co-ocorrências - as ocorrências observadas eram mais prováveis do que outras de ter alguma conexão necessária umas com as outras. Em outras palavras, seus cenários de campo foram mal escolhidos para refletir sobre a validade dos tipos de hipóteses em que estavam interessados. A menos que seu objetivo fosse gerar hipóteses em vez de testá-las, seus estudos de pesquisa não foram adequadamente planejados. A situação de tal investigador é semelhante à de um pesquisador médico que busca estabelecer um nexo causal entre tabagismo e câncer de pulmão com base em um caso em que um fumante inveterado desenvolveu câncer de pulmão. Os estudos de caso geralmente levantam questões importantes, mas não as respondem.

Assim, uma única sociedade que é homogênea nas dimensões de interesse no estudo é claramente um cenário de campo inadequado para uma investigação de teste de hipóteses. Não existe uma única configuração de campo adequada, mas apenas um único guia para a seleção da configuração – quanto mais variação (em termos de alcance e distribuição) nas variáveis a serem estudadas, melhor. (Pode-se acrescentar: quanto menos variação nas dimensões não incluídas nas hipóteses, melhor; veja o capítulo de Clignet para uma discussão sobre constantes em estudos de variação concomitantes.) Em termos desse critério, há graus de adequação das configurações de campo. Um exemplo grosseiro servirá para todos eles. Suponha que um investigador esteja interessado nos correlatos do tamanho da comunidade, levantando a hipótese de vários efeitos específicos que o tamanho da comunidade tem sobre os padrões de comportamento interpessoal. Cinco tipos de configurações de campo, em ordem crescente de adequação, podem ser imaginados:

(a) Uma única comunidade, de qualquer tamanho. Isso seria inadequado porque, como argumentado acima, o pesquisador não teria uma base sólida para distinguir as características fortuitas daquela comunidade daquelas que estão necessariamente ligadas ao seu tamanho.

(b) Várias categorias de tamanho discreto de comunidades com um representante de cada; por exemplo, uma grande comunidade em comparação com uma média e pequena. Nesse tipo de cenário, que envolve a comparação de uma forma familiar aos antropólogos, algumas afirmações provisórias podem ser feitas sobre as dimensões, embora se reconheça que as diferenças no comportamento interpessoal entre quaisquer três (ou cinco...) diferenças nas características da comunidade além do tamanho. Em outras palavras, a menos que as demais características da comunidade sejam mantidas constantes (como na comparação controlada), elas podem ser confundidas com o tamanho, deixando o investigador incapaz de destrinchar seus respectivos correlatos.

(c) Várias categorias de tamanho discreto de comunidades (por exemplo, grande, médio, pequeno), com vários representantes de cada um. Este tipo de comparação, menos frequente feita por antropólogos, é mais adequada do que a anterior porque (a menos que haja uma comparação controlada) dá maior garantia de que as diferenças de comportamento interpessoal entre categorias de tamanho se devem ao tamanho e não às outras características da comunidade , que variam dentro e entre as categorias de tamanho.

(d) Uma distribuição ampla e contínua de comunidades de acordo com o tamanho, mas dentro de uma faixa restrita de tamanhos. Por exemplo, suponha que o trabalhador de campo possa colectar dados de cem comunidades que variam em tamanho de 300 a 1.000 pessoas, com uma distribuição razoavelmente uniforme ou em forma de sino de comunidades ao longo da dimensão de tamanho. Seria então possível examinar as correlações do tamanho da comunidade com variáveis de comportamento interpessoal usando estatísticas correlacionais sensíveis e sem impor categorias elaboradas pelo investigador. As conclusões poderiam ser tiradas com base em evidências quantitativas sobre se o tamanho ou outras características da comunidade estavam mais fortemente relacionadas às variáveis do comportamento interpessoal, mas as conclusões seriam limitadas ao intervalo de tamanho de 300 a 1.000 pessoas.

(e) Uma distribuição ampla e contínua de comunidades em uma ampla gama de tamanhos. Suponha uma situação de campo semelhante à anterior, exceto que a amostra de comunidades incluiu algumas entre 50 e 300 em tamanho e outras até 20.000. As conclusões sobre a relação do tamanho da comunidade com o comportamento interpessoal seria similarmente expandido.

Deve-se notar, além disso, que quanto mais semelhantes são as comunidades comparadas em termos de outras variáveis além do tamanho, mais certo pode ser que as correlações do tamanho com o comportamento interpessoal não se devem a outras variáveis não estudadas; mas – nas grandes amostras de (d) e (e) – quanto mais diferentes ou heterogéneas (por exemplo, em origem étnica) são as comunidades comparadas, mais certo pode ser que qualquer relação de tamanho com comportamento interpessoal não é limitada em sua generalidade para qualquer conjunto particular de sociedades (por exemplo, aquelas de uma área do mundo ou em um nível de desenvolvimento socio-econômico). Assim, embora o investigador possa ser inequívoco na busca de variação máxima nas dimensões incluídas em suas hipóteses, ele enfrenta uma decisão mais difícil em relação às dimensões consideradas “irrelevantes” antecipadamente. Para o trabalhador de campo em oposição ao analista comparativo, as considerações práticas quase invariavelmente pesam em favor de uma “comparação controlada” de grupos vizinhos que se assemelham em muitas características de fundo. O trabalhador de campo também enfrenta uma limitação prática no número de unidades que pode comparar e, com números pequenos, é aconselhável manter os fatores de fundo constantes.

Ao discutir a situação do trabalhador de campo antropológico, geralmente pensamos em termos de uma pessoa operando independentemente e tentando dominar uma língua e cultura local em um período de dois anos ou menos. Isso coloca severas limitações na quantidade de variação que ele pode cobrir, mas a seleção inicial do cenário de campo com o princípio de variação máxima em mente pode aumentar muito a capacidade do trabalhador de campo de atender aos critérios para teste de hipóteses. Ele pode escolher uma unidade étnico-linguística que obviamente exiba contrastes internos nos quais ele está interessado, com subgrupos variando em modo de subsistência (por exemplo, agricultura versus pastoreio ou pesca), organização do grupo de descendência, organização política (por exemplo, centralizado versus acéfalo). ), religião (por exemplo, islamizado versus pagão), urbanização ou modernização – para mencionar apenas algumas possibilidades. A maioria dos grandes grupos étnicos da África e da Ásia é bastante heterogénea internamente, de modo que as oportunidades de seleção desse tipo são menos limitadas do que a simplificação etnográfica geralmente sugere. Se ele visitar a área antes de decidir qual grupo trabalhar com o trabalhador de campo geralmente pode descobrir rapidamente onde pode encontrar o tipo de variável que procura.

Exemplos etnográficos recentes devem tranquilizar os futuros pesquisadores de campo de que eles podem, de fato, encontrar variações intraétnicas teoricamente significativas. Por exemplo, Fallers (1957) e Fallers e Fallers (1960) encontraram entre os Soga um subgrupo que teve suas linhagens dispersas por deslocamentos populacionais causados ​​por uma epidemia, para comparar com uma área Soga em que a localização da linhagem estava mais intacta. Suas comparações quantitativas de separações marido-mulher (1957) e taxas de suicídio (1960) nas duas áreas fornecem evidências importantes para hipóteses relacionadas a conflitos gerados estruturalmente e índices de estresse individual. Geertz (1959) encontrou grandes variáveis estruturais entre as aldeias em Bali, embora variações em alguns temas comuns, que permitem obter mais informações sobre as relações funcionais entre os aspectos da estrutura da comunidade do que se as aldeias tivessem sido estruturalmente uniformes. Lloyd (1954) observa grandes variações na estrutura política entre os reinos dos iorubás. Há exemplos que indicam como variaveis internas em diferentes níveis estruturais (principal subgrupo étnico, aldeia, indivíduo) podem ser exploradas em projetos de pesquisa para testar hipóteses relevantes a esse nível. Os antropólogos psicológicos devem tomar nota particular das diferenças inter-individuais no tratamento ambiental ou na participação a fim de projetar estudos para testar suas hipóteses, enquanto outros antropólogos sociais devem selecionar cenários de campo que ofereçam variação em um nível apropriado à natureza dos problemas que estão estudando.

Permanecendo dentro das limitações do trabalhador de campo solitário, mas indo além dos limites da viagem de campo única, existe a possibilidade de encontrar variáveis para testar hipóteses trabalhando com uma série de grupos étnicos relacionados que diferem em certas dimensões de interesse. Isso pode ser feito em viagens de campo sucessivas. É o “método de comparação controlada” defendido por Eggan (1954) e ilustrado em sua obra (1941, 1950).

Finalmente, o trabalhador de campo pode tornar-se parte de um empreendimento coletivo em que sua própria pesquisa fornece alguns, mas não todos os dados que entram em uma análise comparativa. Ele pode selecionar um grupo relacionado, mas diferentemente relevante, de outros sobre os quais já existe material publicado adequado. Ele pode concordar em colaborar com um ou mais antropólogos que trabalham em grupos vizinhos, usando métodos comparáveis ​​de coleta de dados e comparação de resultados. Ele pode colectar dados de campo de acordo com os requisitos de um manual de campo (por LeVine e Campbell 1965 ) para que seu material seja agrupado com o de outros que trabalham em outras partes do mundo para testes comparativos de hipóteses.

Com todas essas e outras oportunidades de encontrar variações disponíveis para o potencial trabalhador de campo, parece não haver obstáculos práticos para a seleção de um cenário de campo com o objetivo de testar hipóteses claramente em vista.

A FASE EXPLORATÓRIA DA ETNOGRAFIA GERAL

Se a etnografia geral fosse tratada como a fase exploratória em qualquer tipo de estudo, a grande questão sobre ela do ponto de vista do desenho da pesquisa seria: como ela pode ser organizada para facilitar a formulação de hipóteses, a seleção de amostras, a operacionalização de conceitos em locais termos, e o desenvolvimento de instrumentos de pesquisa apropriados? O aparente consenso entre os antropólogos de que uma “descrição etnográfica básica” de uma sociedade vale por si mesma e é necessária fundamentação para estudos mais especializados exige discussão prévia sobre o que é essa descrição e qual a contribuição que ela traz para o conhecimento antropológico.

Ao colectar os dados para uma descrição etnográfica básica, o etnógrafo tenta alcançar comparação e abrangência. Comparabilidade significa que sua descrição da cultura deve ser em termos que permitam a comparação com culturas já descritas na literatura etnográfica. Cada trabalhador de campo está ou deveria estar replicando em sua base etnográfica um conjunto de operações realizadas por trabalhadores de campo em outros ambientes. Essa replicação permite que ele entenda o que está encontrando no contexto de seu conhecimento da etnografia do mundo; também permite que outros usem suas descrições publicadas para fins de estudos comparativos. Assim, as regras implícitas das investigações de campo etnográficas não permitem que o pesquisador de campo seja completamente idiossincrático em sua abordagem e cobertura. Ele deve ser guiado, pelo menos inicialmente, pela história dos estudos. É aqui que entra a abrangência, pois a etnografia geral até hoje tem sido regida pelo amplo acordo entre os antropólogos de que o pesquisador de campo deve se esforçar para monitorar a cultura ou modo de vida das pessoas em estudo, com o reconhecimento de que tal a cobertura pode ser superficial e é sempre desigual.

A abrangência como objetivo da etnografia geral faz duas exigências ao pesquisador de campo: que ele colecte dados sobre uma variedade de tópicos considerados pelo consenso antropológico para representar o espectro de costumes, instituições sociais e culturais, ou aspectos da cultura, e que ele investigue características da cultura. Embora as opiniões sobre os aspectos da cultura a serem abordados não sejam unânimes, o forte consenso existente no campo pode ser visto nos índices das monografias etnográficas gerais, onde os títulos dos capítulos frequentemente seguem um padrão: ambiente, economia, organização social ( incluindo casamento, família, parentesco, descendência e grupos locais, grupos de status, organização política), religião e magia e o ciclo de vida. Padrões semelhantes são observáveis ​​para os títulos dos primeiros capítulos que apresentam material contextual em monografias especializadas. Listas formais de tópicos para descrição etnográfica básica são disponível em Notes and Queries on Anthropology (1951, 6ª ed.) e em The Outline of Cultural Materials de Murdock et al. (1950). Essas listas tendem mais a super-representar do que a sub-representar a gama de tópicos considerados essenciais por antropólogos profissionais; especialmente em Murdock et al., pouco se omitiu do que alguém já pensou digno de inclusão em uma etnografia geral. O pesquisador de campo deve reconstruir o estado da arte.

O cânone da abrangência também ordena ao pesquisador de campo que vá além das categorias estabelecidas e registre quaisquer costumes ou instituições locais que lhe pareçam distintos em comparação com outras culturas ou particularmente importantes no pensamento e comportamento das pessoas que estão estudando. Tais instituições podem atravessar as categorias convencionais e parecer mais importantes como contextos necessários para a compreensão do comportamento local. A fim de contribuir para o registro etnográfico da mudança cultural, o pesquisador de campo deve relatar o que é transculturalmente distintivo e, para fornecer um contexto tão significativo quanto possível para seu estudo especializado, ele deve incluir o que parece central, focal ou integrador em pensamento e ação locais. O isolamento e a descrição de traços distintivos absorvem muito da engenhosidade e esforço de antropólogos cujos objetivos são principalmente descritivos, mas do ponto de vista do projeto de pesquisa de campo, é sua contribuição para a compreensão do contexto em que uma hipótese será testada.

No quadro das exigências de comparabilidade e abrangência, o trabalhador de campo tem muitas opções na forma como realiza seu trabalho etnográfico geral e no que escolhe descrever. Em outras palavras, ele toma muitas decisões cruciais sobre o que vale a pena gravar e o que não vale. Essas decisões são muitas vezes baseadas em uma posição filosófica na qual certos fenómenos comportamentais e culturais são considerados mais reais do que outros; há uma visão implicitamente metafísica da natureza da cultura de acordo com premissas idealistas ou materialistas. O idealista, quer que a cultura explicitamente conceptualize ou reconheça seus pressupostos ontológicos, acredita que a realidade cultural consiste em eventos mentais compartilhados, como ideias, crenças, conceitos e regras que governam, orientam e direcionam o comportamento observável, sendo este último um reflexo imperfeito. do anterior. Deste ponto de vista, uma cultura pode ser pensada como um conjunto de regras.

bibliografia

 

Ellen, R. F. (1984). Ethnographic Research. London: Academic Press.

Williams, R. T. (1967). Field Methods in Study of Culture. New York: Holt, Rinehart and Winston.

Geertz, H., & Geertz, C. (1975). Kinship in Bali. Chicago: The University of Chicago Press.

Eggan, F. (1954). Social Anthropology and the Method of Controlled Comparison. American Anthropologist, LVI(5), 743–763.

Campbell, D.T., & LeVine, R.A. (1965). Propositions about Ethnocentrism from social science theories. Selbstverl.

Garson, G. J., & Read, C. H. (1892). Notes and Queries on Anthropology. London: The Anthropological Institute.

 

         10ª aula 13 de Dezembro: técnicas de pesquisa 

 

METODOLOGIA

objectivos

DESENHO DE INVESTIGAÇÃO

Componentes da antropologia

Conforme explicado a antropologia cultural tem dois principais componentes acadêmicos: etnografia e etnologia.

Historicamente, a antropologia se concentrou nos povos tradicionais não ocidentais cujas línguas não eram escritas - pessoas cuja comunicação era frequentemente directa e cara a cara e cujo conhecimento sobre o passado se baseava principalmente na tradição oral. Mesmo em sociedades onde a escrita existe, não há muito do que interessa aos antropólogos, por escrito.

  

Desenho de investigação refere-se à estrutura geral ou plano de investigação de um estudo, como seja se o estudo é experimental ou descritivo e qual o tipo de população. Definido o desenho, torna-se necessário especificar o método de estudo e de recolha de dados. Por método de investigação entende-se as técnicas e práticas utilizadas para recolher, processar e analisar os dados (Bowling , 1998)

 

  “Quando se pode medir o que se está falando e expressá-lo em números, se sabe algo sobre isso. E quando não se pode medi-lo, quando não se pode expressá-lo em números, O seu conhecimento é fraco e insatisfatório. Pode ser o começo do conhecimento, mas não um estágio da ciência”

     Muitos anos antes de Kelvin, Pitágoras afirmou de forma mais sucinta,  "a matemática é a maneira de entender o universo... O Número é a medida de todas as coisas "

 

1. “Toda a investigação tem em última  análise uma base qualitativa”.                                                                 

2. “Não há tal coisa chamada dados  qualitativos. Tudo é ou Zero (0) ou Um”

   A diferença que geralmente se estabelece entre os conceitos descrever e explicar pode, aproximadamente, indicar como a pesquisa descritiva se distingue da experimental. Descrever é narrar o que acontece. Explicar é dizer por que acontece. Assim, a pesquisa descritiva está interessada em descobrir e observar fenómenos, procurando descrevê-los, classificá-los e interpretá-los. A pesquisa experimental pretende dizer de que modo ou por que causas o fenómeno é produzido.

 

1.   Perspectiva de investigação: quantitativa, qualitativa ou mista.

2.  Tipo de investigação: experimental, quase-experimental, causal-comparativo, correlação, descritivo, avaliativo, estudo de caso, etnográfico, investigação-acção.

3.  Métodos: testes, escalas, entrevistas, observações, questionários, documentos

 

 Após uma ideia clara do problema de investigação e uma boa base da revisão da literatura, o próximo passo é fazer uma escolha preliminar da metodologia. Devem distinguir-se três conceitos relacionados:

PERSPECTIVA QUANTITATIVA E QUALITATIVA

  

A perspectiva quantitativa deriva duma epistemologia positivista a qual defende que há uma realidade objectiva que pode ser expressa numericamente. 

   Como consequência, a perspectiva quantitativa enfatiza estudos que são experimentais por natureza, enfatiza medidas, e procura relações.

   Se num estudo são usados os seguintes termos ou conceitos, foi provavelmente usada a perspectiva quantitativa: variável, controlo, validade, fidelidade, hipótese ou significância estatística. 

PALAVRAS-CHAVE DA INVESTIGAÇÃO QUANTITATIVA EM EDUCAÇÃO

 

   Por outro lado, a perspectiva qualitativa enfatiza uma visão fenomenológica, na qual a realidade está inerente à percepção dos indivíduos. Estudos derivados desta perspectiva são focados em significados e compreensão, tendo lugar em situações naturais (McMillan , 1996). 

   Se um estudo usa termos ou conceitos como os seguintes, provavelmente foi usada uma perspectiva qualitativa: naturalista, estudo de campo, estudo de caso, contexto, situacional, construtivismo, significado ou realidades múltiplas. 

   Essas duas perspectivas podem ser combinadas.

CARACTERÍSTICAS DA INVESTIGAÇÃO QUALITATIVA

 

   Patton (1990) explica que as técnicas qualitativas permitem que o investigador estude um assunto em profundidade. A abordagem do trabalho de campo sem estar constrangido por categorias predeterminadas contribui para o aprofundamento, abertura, e detalhe da inquirição qualitativa.

  As técnicas quantitativas, por outro lado requerem o uso de medidas e de métodos padronizados convertíveis em números, de tal modo que não permitem a expressão da variedade de perspectivas e experiências das pessoas dado que as opções de resposta são limitadas á partida. 

TIPOS DE INVESTIGAÇÃO

De natureza quantitativa:

1.   Investigação experimental: 

     usa métodos aplicadas nas ciências físicas e biológicas. Na maior parte dos estudos experimentais são usados os seguintes processos: é seleccionada uma amostra de sujeitos, os sujeitos são distribuídos aleatoriamente ao grupo experimental e ao grupo de controlo, e um tratamento é administrado apenas ao grupo experimental. Os dois grupos são então avaliados na base da variável dependente, a consequência da variável independente. Esta última é a causa da variável dependente. Exº: O investigador distribui aleatoriamente 200 alunos do 4º ano por 10 turmas. Cinco dessas turmas são seleccionadas aleatoriamente. É-lhes dado um novo programa em resolução de conflitos; as outras cinco turmas não recebem nenhum programa. Ao fim do ano lectivo, ambos os grupos são testados com um instrumento que avalia as suas atitudes e conhecimentos acerca da resolução de conflitos. Técnicas estatísticas são usadas para analisar os resultados.  

 

2) Investigação quasi-experimental: 

 

  Segue os procedimentos da investigação experimental sem o uso do grupo de controlo ou sem distribuição aleatória, porque a distribuição aleatória ou o uso de grupos de controlo nem sempre é possível nos meios educacionais. 

   Num estudo quasi-experimental de resolução de conflitos, o investigador não usaria a distribuição aleatória mas poderia usar uma de várias estratégias para compensar a ausência. O investigador pode, por exemplo, administrar um pré-teste a todos os alunos, dar o tratamento a metade dos alunos, administrar um pós-teste, e usar um procedimento estatístico chamado análise de co-variância para determinar se o tratamento fez alguma diferença. 

 

3) Investigação causal-comparativa:

  

Estudos causais-comparativos são desenhados para determinar as possíveis causas de um fenómeno. Algumas vezes, estes estudos são chamados ex post facto  porque as causas são normalmente estudadas depois de terem tido um efeito sobre outra variável. Vários estudos dos efeitos de retenção de ano usam um desenho causal comparativo, estudando os efeitos de não passar pela comparação do último desempenho daqueles que foram retidos e daqueles que passaram. 

         A pesquisa ex-post facto é uma investigação sistemática e empírica na qual o pesquisador não tem controlo directo sobre as variáveis independentes, porque já ocorreram suas manifestações ou porque são intrinsecamente não manipuláveis.

IDENTIFICAR FACTORES CAUSAIS

  O erro mais comum na leitura e interpretação de investigações é o de assumir que foi identificado um factor causal, quando de facto não o foi. A maior parte das investigações no campo educacional não permitem uma interpretação em termos de causa-efeito, embora seja extremamente tentador interpretá-los como se fosse esse o caso. Esta é a armadilha mais grave que espreita o estudioso imprudente.  O facto de duas variáveis estarem associadas não significa que uma delas seja a causa da outra. 

4) Investigação correlacional: 

   Estudos correlacionais são desenhados para analisar a relação entre duas ou mais variáveis, ordinariamente através do uso de coeficientes de correlação. Você pode, por exemplo, estudar os estilos de liderança dos gestores escolares e o moral dos professores para determinar se há alguma relação estatisticamente significativa entre esses dois factores.  É preciso ter em atenção que a correlação não significa causalidade. Estudos correlacionais podem mostrar uma relação directa entre dois factores mas não podem provar causa-efeito.

 

5) Investigação descritiva:

   

Como o termo indica, o propósito da investigação descritiva é descrever um fenómeno. Embora alguns professores desvalorizem estudos descritivos, eles podem ser especialmente valiosos como uma das primeiras fases num projecto de investigação. Estudos descritivos apresentam frequências, médias e percentagens.  Por exemplo, você pode estudar as atitudes dos professores nas escolas públicas em relação às escolas a tempo inteiro. Você não tiraria conclusões acerca de relações; só apresentaria frequências, médias e percentagens.

6) Investigação Avaliativa

 

    A investigação avaliativa faz julgamentos acerca do mérito ou valor de programas educativos, produtos e organizações. É normalmente feita para ajudar os administradores a fazerem decisões profissionais. Estudos avaliativos são normalmente descritos como formativos ou sumativos. Estudos formativos são feitos enquanto um novo programa ou produto está sendo desenvolvido; estudos sumativos são feitos quando estão completos. Você podia fazer a avaliação dum currículo novo, fazendo uma avaliação formativa e sumativa.  

7) investigação qualitativa

     Os seguintes tipos de investigação tendem a tomar uma perspectiva qualitativa: 

1.   Estudo de caso: 

     Uma definição útil de estudo de caso é dada por Yin (1989 ): 

           “um estudo de caso é uma pesquisa empírica que investiga um fenómeno contemporâneo dentro do   seu contexto real; quando os limites entre fenómeno  e contexto não são evidentes; e no qual muitos  recursos ou evidência são usados” (p. 23).

     Embora, como Yin e outros indicam, estudos de caso frequentemente usam medidas qualitativas, tendem mais frequentemente a tomar uma perspectiva quantitativa, preocupada com explorar, descrever e explicar um fenómeno. 

2) Investigação etnográfica:

   A investigação etnográfica é um tipo especial de estudo de caso. Distingue-se de outros tipos de estudo de caso porque usa teorias e métodos da antropologia para estudar a cultura das escolas e das salas de aula. 

3) Investigação-acção

    A maior parte da investigação acção documenta como um problema educacional foi identificado, compreendido e resolvido pelos profissionais.

    Segundo Elliot, 1991 , p. 69, a investigação acção é “um estudo de uma situação social com o objectivo de melhorara qualidade da acção desenvolvida no seu interior.”  

   

4) Estudos  biográficos/histórias de vida

  

A investigação centrada no estudo das vivências e experiências individuas constitui o domínio das narrativas biográficas e das histórias de vida. Howard Becker refere que 

“a história de vida pode ser particularmente útil para nos fornecer uma visão do lado subjectivo de   processos institucionais muito estudados sobre os   quais pressupostos não verificados também são  feitos com frequência” (Becker , 1999, p. 108).

   Há, claro, ouros métodos usados em investigação educacional, tal como a investigação filosófica, investigação histórica e investigação legal. Cada uma destas tem as suas próprias características e usa métodos especiais. 

TÉCNICAS DE INVESTIGAÇÃO

   Métodos de investigação significa técnicas usadas para recolher os dados relativamente ao problema de investigação. No geral, cinco métodos são tipicamente usados na investigação educacional.

1. Testes e medidas:

   Testes são administrados e medidas são feitas  para determinar a extensão da mudança

2. Entrevistas:

   Entrevistas são conduzidas com indivíduos ou grupos para averiguar as suas percepções. 

3. Observações:

   Observações são feitas para determinar o que está ocorrendo e o que os indivíduos estão fazendo.

4. Questionários:

    Questionários são administrados para  avaliar opiniões, percepções e atitudes.

5. Documentos:

    Documentos são analisados para estabelecer a prova

   Como o quadro seguinte indica, os tipos de investigação expostos fazem mais uso de certos métodos que outros, embora haja muita variação na relação dos tipos com os métodos.

 

ESCOLHAS PRELIMINARES

 

      Tendo feito uma escolha preliminar da perspectiva, tipo e métodos, tenha em consideração o seguinte 

1.   A natureza do problema de investigação:

       Este é provavelmente o facto mais importante de todos. De facto, a identificação do problema e a escolha da metodologia pode ser visto como um processo interactivo, cada um influenciando o outro. Por exemplo, se você está preocupado em identificar uma possível causa de relação entre pais lendo aos filhos em casa e o interesse dos filhos em livros, o estudo obviamente tem de ser de natureza causal-comparativo 

2.   Conhecimentos de investigação:

       Embora seja sempre possível desenvolver novas técnicas, você descobrirá que desenvolvendo e conduzindo o estudo será mais fácil se você dominar as técnicas requeridas. Se você não compreender estatística avançada, você provavelmente não deveria seguir com um estudo quasi-experimental

3. Tempo disponível:

   No geral, estudos qualitativos levam mais tempo que os quantitativos. 

   Estudos etnográficos são especialmente intensivos.

4. Acesso ao local de investigação:

   No geral, os administradores escolares não dão acesso a estudos experimentais porque os pais são relutantes a que os seus filhos participem em qualquer experimentação, independentemente das promessas. 

O DESENHO DA INVESTIGAÇÃO

  Independentemente do tipo de investigação usado, você deve desenvolver um bom desenho de investigação. Um desenho de investigação é um plano específico para estudar um problema de investigação. Os seguintes elementos são normalmente empregues em todos os desenhos de investigação:

 

1.   A perspectiva de investigação

(quantitativa, qualitativa ou ambas)

2.  O tipo e subtipo de investigação

(ex: se usa um estudo de caso deve também indicar o subtipo: etnográfico)

3.  O contexto do estudo

(onde e quando o estudo se realiza)

4.  Os participantes no estudo

(Quem é envolvido no estudo? (“o estudo centra-se em cinco professores do Departamento de Inglês; todos concordaram em participar no estudo)

5.  Os métodos e os instrumentos de pesquisa

usados na recolha dos dados (Explicar como recolherá os dados – análise de documentos ou consulta de arquivos, entrevistas, testes, escalas, observações ou questionários). Indicar os instrumentos que serão usados. (“Os dados serão recolhidos através de observações e entrevistas. O investigador fará observações semanais de todos os professores e entrevistá-los-á em grupo”)

6.  Análise de dados.

Explique como organizará, reduzirá, analisará e apresentará os dados recolhidos.  

7. Instrumentos 

A definição dos instrumentos de pesquisa deve estar visceralmente adequada aos objectivos do estudo já delineados aquando da escolha to tema, bem como à(s) hipótese(s) levantada(s) e perfeitamente sintonizada(s) com o marco teórico. Nas pesquisas de abordagem qualitativa, dentre os mais importantes instrumentos ou técnicas de pesquisa que ajudam a desvendar os fenómenos e factos, destacam-se: observações, histórias de vida, questionários e entrevistas semi-estruturada, a qual facilita a comunicação quanto à obtenção de dados qualitativos. 

METODOLOGIA DO TFC

   Este capítulo deve proporcionar uma descrição detalhada sobre o modo como a investigação foi realizada, permitindo a sua réplica por outros, sem haver a necessidade de consultar o autor. Este capítulo é redigido no pretérito perfeito e deve conter as seguintes alíneas:

   Sujeitos. Deve estar indicado o universo 

  O universo

dos sujeitos em questão, bem como o processo de definição da amostra que foi utilizada e a sua caracterização nas variáveis pertinentes para a sua dimensão e estratificação. Se for uma amostra representativa, deve indicar o seu grau de representatividade e como se minimizaram os erros de amostragem.

Instrumentos:

Esta alínea deve conter a descrição dos instrumentos de recolha de dados que foram utilizados e a respectiva justificação. Há que indicar, sempre que possível, o grau de fiabilidade e validade dos instrumentos.

Procedimentos:

Devem ser apresentados os procedimentos para recolher os dados, bem como os constrangimentos e dificuldades encontrados, com especial destaque para os que possam ter impacto nos resultados. Importa indicar a data e os locais em que os dados foram recolhidos.

Análise de dados. Devem ser indicadas as técnicas, estatísticas ou outras, que foram utilizadas para tratar os dados. 

Técnicas de pesquisa

Por «técnicas» designamos procedimentos operativos específicos - reconhecidos pela comunidade científica e que se transmitem com o ensino – as disciplinas científicas apoiam-se nestas técnicas para adquirir o controle dos seus resultados científicos

O terreno que separa a metodologia da técnica não apresenta fracturas, mas é continuo: a metodologia é aquela de explicar a causalidade a indução a dedução e passa-se a conceitos operativos quais a validade e a atendibilidade de um certo processo operativo.

Como escreve Max Weber a metodologia pode ser somente uma auto-reflexão acerca dos meios que foram apurados e confirmados pela praxes. A técnica absorve o método e a teoria: todas as energias e recursos são catalisados pela perfeição técnica, cujo procedimento realiza-se tornando-se mais tarde método e portanto fim. nas duas abordagens – quantitativa e qualitativa - a pesquisa se caracterize como um esforço cuidadoso para a descoberta de novas informações ou relações e para a verificação e ampliação do conhecimento existente, o caminho seguido nesta busca pode possuir contornos diferentes. O relacionamento entre a pesquisa quantitativa e a pesquisa qualitativa é o mesmo relacionamento que existe entre as técnicas de apuro e de analise estatística dos dados. claramente especificadas um plano estabelecido a priori e variáveis operacionalmente definidas.

A medição objetiva e a quantificação dos resultados. Busca a precisão, evitando distorções na etapa de análise e interpretação dos dados,  a pesquisa qualitativa não procura enumerar e/ ou medir os eventos estudados, nem emprega instrumental estatístico na análise dos dados.

Parte de questões ou focos de interesses amplos, que vão se definindo à medida que o estudo se desenvolve. Envolve a obtenção de dados descritivos sobre pessoas, lugares e processos interactivos pelo contacto directo do pesquisador com a situação estudada, procurando compreender os fenómenos segundo a perspectiva dos sujeitos, ou seja, dos participantes da situação em estudo.

O TFC

O projeto

A etnografia e a pesquisa qualitativa em geral muitas vezes encontram dificuldades em serem aceitas e financiadas pelas instituições, devido ao seu resultado incerto e à sua variabilidade no progresso. A realização de uma pesquisa etnográfica, portanto, põe em questão não apenas a capacidade intelectual do pesquisador, mas também sua capacidade comunicativa. 1 No bom planejamento, não se deve tomar nada como garantido e enfrentar cada detalhe de forma concisa e eficaz. Na exposição aconselha-se a utilização de linguagem simples, compreensível por todos os referentes, tendo em vista que, muitas vezes, os júris não são compostos, os especialistas da disciplina. Para destacar a viabilidade do trabalho, também pode ser útil explicitar as vantagens e limitações das escolhas feitas.

Para ser realizado, um projeto de pesquisa deve, de fato, ser escrito e apresentado de maneira persuasiva: seu objetivo é convencer o órgão financiador ou o júri universitário de que o tópico é interessante, bem planejado e realizável. Em um nível mínimo, um modelo de projeto de pesquisa básica deve mostrar pelo menos os seguintes pontos:

- Título (não genérico).

- Resumo e Abstract (em inglês).

A temática da presente pesquisa, Os dados como foram colectados, os informantes que dominam a história e a cultura do povo, o carácter relevante do estudo, com uma história, hábitos e costumes a serem descobertos e levados ao conhecimento dos leitores.

- Introdução (incluindo, em breve, o estado atual do debate sobre o tema).

 Deve ser redigido no fim do trabalho feito. Os objectivos do estudo: recolher e analisar os diferentes factos (história) da vida do povo. Para o desenvolvimento da comunidade na província em questão. Como se estrutura a monografia em três capítulos. O primeiro, trata sobre os termos e conceitos da pesquisa. Nessa secção vai-se definir alguns termos:.

No segundo capítulo se desenvolve a metodologia utilizada, a amostra e as variáveis em estudo, bem como os instrumentos usados. 

No terceiro e último capítulo a finalidade será o de apresentar, analisar, interpretar os dados e os resultados do estudo. 

Formulação do problema

 

A falta de uma boa política no que toca a pesquisa científica em Angola acaba colocando em risco todo futuro da história da nação angolana. Desta forma, urge a necessidade de se procurar estudar mecanismo para não deixarmos morrer todo manancial da tradição oral dos povos de Angola que por sinal cada estudioso pode aproveitar todos os factos da vida dos povos para escrever e rescrever a história do nosso povo.

O pesquisador passou a ter contacto com a história, cultura, hábitos e costumes dos povos que habitam em Angola. E isto permite ter conhecimento histórico, antropológico, sociológico e linguístico de cada grupo étnico que habita no território nacional. Porém, ao fazer o trabalho de campo, várias vezes se houve termos que remetem para um valor semântico.       

De salientar os aspectos que já foram estudados por muitos pesquisadores. Assim, tendo em conta que os estudos já feitos  remetem para a mesma explicação histórica, antropológica e sociológica (cf. Estermann (1983); Redinha (1971); Argenta (2012), o contacto que o pesquisador teve quer com as obras consultadas quer com as fontes orais ajuda bastante a ficar esclarecidos ou interrogados, quanto ao significado e origem étnica do povo. Este assunto constitui, actualmente um problema que carece de explicação científica. Assim formulam as seguintes questões:

Questão 1: Qual será a razão histórica, antropológica das pessoas da mesma região?

Questão 2: A que grupo étnico pertencem ?

Questão 3: Que aspectos poderão ser relevantes no estudo da etnografia?

Importância do estudo

Os aspectos científicos antropológicos deste trabalho poderão ser de grande relevância para a divulgação, preservação e conhecimento da cultura e história do povo em estudo. 

Descrever a cultura do povo é importante, pelo facto de que muita história do povo ainda se encontra na oralidade. Assim, acredita-se que os dados aqui apresentados poderão contribuir para a divulgação, preservação, explicação e desenvolvimento antropológico social do povo  de modo particular, para a difusão da etnografia do grupo em questão.

Descrever a cultura do povo poderá ser relevante numa Angola independente, pelo facto de que muita história do povo ainda se encontra na oralidade. Assim, acredita-se que os dados aqui apresentados poderão contribuir para a divulgação, preservação, explicação e desenvolvimento antropológico social e de modo particular, para a difusão da etnografia dos grupos angolanos.

A insuficiência de obras ligadas ao tema em análise pode comprometer o futuro da história e da antropologia como ciência de Angola.

Razão da escolha do tema

São vários os motivos que leva o/a pesquisadora a escolher o tema da presente pesquisa. Uma deles está relacionado com o emprego do/a pesquisadora. A segunda razão está relacionada com o local de serviço. A terceira motivação está ligada a parte científica. As viagens de campo nos vários pontos de Angola, e o contacto com os vários povos motiva bastante para continuar a pesquisar e a aprofundar os dados sobre os povos.

Assim, o que chama mais atenção ao/à pesquisadora é o grupo étnico com uma história pouco explorada

Objectivos do estudo

Objectivos gerais

Apresentar os conceitos, de base, do presente estudo;

Analisar os dados de acordo a temática escolhida;

Desenvolver os aspectos metodológicos da presente pesquisa;

 

Objectivos específicos   

Identificar as razões que levam a pesquisar;

Recolher informações sobre a que grupo étnico

Compreender os aspectos de relevância da vida do povo em questão

Formulação das hipóteses

Em conformidade com a tradição dos estudos feitos sobre as culturas e grupos étnicos de Angola, concretamente na vertente da Antropologia como ciência, complexa resultante do alargamento da estrutura sócio-cultural Deste modo, considerando a problemática levantada em função dos objectivos traçados nesse estudo, são apresentadas as seguintes hipóteses:

Hipótese 1:  

Hipótese 2:

 Hipótese 3:            

Campo disciplinar do trabalho

Considera-se campo disciplinar a área do saber que se ocupa em estudar e desenvolver pesquisas ligadas a um determinado assunto da vida social ou ainda de fenómenos quer inerente ao homem quer fora da vida do próprio homem. O campo disciplinar onde o estudo se enquadra: qual o ramo da antropologia que tratar deste tema com o objectivo de se desenvolver teorias gerais sobre como funcionam as sociedades. Segundo Layton (1997),  a antropologia social tem sido muitas vezes encarada como o estudo das sociedades de “pequena escala”, cuja simplicidade relativa as torna mais fáceis de analisar na íntegra.

Delimitação do estudo

Nesta secção vai-se desenvolver a delimitação do trabalho passando pela delimitação espacial e temporal. Delimitação do estudo

Temporal: o arco destempo que abrange a pesquisa

Espacial: O estudo foi delimitado a partir da temática. Restringir ainda o campo de colecta dos dados na província e município. 

 

A delimitação espacial do presente estudo foi feita a partir da escolha da temática. A referida província localiza-se em Angola geograficamente falando. 

feita em duas fases uma bibliográfia e outra de campo. Portanto, recolhemos os dados deste povo, que remontam a….  A recolha dos dados quando teve início …..

Objectivos do estudo

- Objetivos (ou seja, a questão de pesquisa): os problemas que eu gostaria de abordar nesta pesquisa são X e sua relevância no debate é Y. O trabalho tem dois objectivos:

Objectivos gerais

A)           Apresentar os conceitos, de base, do estudo;

B)           Analisar os dados de acordo a temática escolhida;

Objectivos específicos   

A)           Identificar os tipos de culturas;

B)        Recolher informações sobre a que grupo étnico;

C)          Compreender os aspectos ligados à situação populacional do povo.

Análise bibliográfica  .

De todos os livros e as fontes mais utilizadas propor uma resenha bibliografica apresentando o autor e o seu livro e fornecendo criticamente apreciações que dizem respeito ao tema da pesquisa

Técnicas utilizadas - Técnicas, descrevem o caso escolhido e os procedimentos para coleta de dados, consistentes com sua orientação teórica.

As seguintes técnicas:

Métodos utilizados

1.          Método exploratório: foi usado com o intuito de explorar todos os fenómenos ligados ao tema

2.          Métodos quantitativos e métodos qualitativos: tradicionalmente a investigação quantitativa e a investigação qualitativa estão associadas a paradigmas a distinção entre paradigmas diz respeito à produção do conhecimento e ao processo de investigação e pressupõe existir uma correspondência entre epistemologia, teoria e método.    

3. Método das histórias de vida

4. Método interpretativo

População                                        

Para o nosso trabalho, a população representa todos os indivíduos que fazem parte da nossa pesquisa

Amostra

Spiegel et al (2004:164-165), afirmam que a amostra é uma pequena parte de uma população, que pode ser muito grande, dificultando a pesquisa. Enquanto, Marconi e Lakatos (2010:28) e Basto (2012:23), definiram a amostra como o conjunto de elementos relativamente aos quais se recolhem dados, é um subconjunto representativo da população.

No parecer de Zassala (2012:85), orienta aos pesquisadores que na fase de qualquer estudo na área das ciências humanas “deve ser indicada a população para qual os resultados poderão ser generalizados. Representa o grupo total do qual a amostra será retirada”. Assim, no ver de Sampiere et al. (2006:252-253), apresentam uma ideia para população e amostra. Segundo, eles (2006), “população ou universo (enfoque quantitativo): conjunto de todos os casos que concordam com determinadas especificações; e, amostra (enfoque qualitativo): unidade de análise ou conjunto de pessoas, contextos, eventos ou factos sobre o qual se colectam os dados sem que necessariamente seja representativo do universo”. 

Variáveis

Variável do latim para Zassala (2012:58), “uma variável pode ser considerada uma classificação ou medida; uma quantidade que varia; um conceito, ou conceito operacional que contém ou apresenta valores; aspecto, propriedade ou factor, discernível num objecto de estudo e passível de mensuração”. No ver de Sampieri et al. (2006:121), “uma variável é uma propriedade que pode variar cuja variação é susceptível à medição e a observação”.    

Achou-se pertinente nesse estudo utilizar as seguintes variáveis:

1.          Variável dependente:

consiste naqueles valores (fenómenos, factores) a serem explicados ou descobertos, em virtude de serem influenciados, determinados ou afectados pela variável independente; é o factor que aparece, desaparece, ou varia à medida que o investigador introduz, tira ou modifica a variável independente; a propriedade ou factor que é feito, resultado, consequência ou resposta a algo que é manipulado. Esta informação pode-se consultar em Zassala (2012:60) e Marconi e Lakatos (2008:189) pelo facto de comungarem as mesmas ideias.

 

2.       Variável independente:

é aquela que influencia, determina ou afecta uma outra variável; é factor determinante, condição ou causa para certo resultado, efeito ou consequência; é o factor manipulado, geralmente, pelo investigador, na sua tentativa de assegurar a relação do factor com um fenómeno observado ou a ser descoberto, para ver que influência exerce sobre um possível resultado

Instrumento

O instrumento de pesquisa é o conjunto de ferramentas que se usam para auxiliar o pesquisador no trabalho de campo, a fim de obter, gravar e transcrever ou armazenar os dados. Assim, foram usados vários instrumentos ou materiais como:

Dificuldades encontradas

Ao longo da elaboração da presente monografia, o pesquisador deparou-se com inúmeras dificuldades quer do ponto de vista material, científico e financeiro, quer no quadro das aplicações metodológicas, envolvendo a análise dos dados colectados no campo.

 

Resultados esperados e formas de comunicá-los

 

O processo de pesquisa

Uma vez que o projeto de pesquisa tenha sido aprovado  A técnica, da fase operacional começa.

A este respeito, é necessário destacar como a crise etnográfica não se caracteriza apenas pela escolha de certas técnicas de coleta e perspectivas de análise, mas também pressupõe uma concepção diferente da

em geral. Essa concepção, apenas de maneira muito circunscrita, é compatível com a lógica que conta a pesquisa quantitativa e experimental.

Na pesquisa quantitativa,

pelo menos em princípio, é possível identificar uma sequência linear de momentos conceptuais, metodológico< e empíricos, cada um dos momentos pode ser tratado e considerado como uma fase em si mesmo

coleção de dados.

De acordo com essa abordagem, o pesquisador, a partir da literatura teórica e empírica, define o problema que ele quer estudar, formula as hipóteses e sua definição' hipotética (operacionalização), prepara as ferramentas de pesquisa, decide o tipo e método de seleção da amostra e procede à coleta de dados. Feito isso, os resultados são analisados e interpretados, que são então comunicados através da elaboração de um relatório de pesquisa.

Neste modelo ideal, teorias e métodos são objeto de pesquisa. As teorias são verificadas e algumas vezes rejeitadas, ou modificadas e expandidas através da formulação de outras hipóteses, por sua vez sujeitas à verificação empírica.

Os 'objectos' de pesquisa

(as pessoas ou fenômenos estudados) têm o papel de espécimes, em relação aos quais as hipóteses são verificadas, e são selecionados com base em critérios que visam assegurar a representatividade dos resultados em relação à população total.

O processo de pesquisa quantitativo-experimental

baseia-se, portanto, em uma lógica vertical, que vai de cima para baixo de maneira unidirecional: da formulação do problema à conclusão ou, novamente, à teoria. O pressuposto implícito desse modelo é que há uma ordem ideal a seguir para realizar as diferentes atividades exigidas pela condução de um estudo, mesmo que a sequência possa ser repetida várias vezes.

Obviamente, a realidade das coisas nunca é tão limpa e previsível. Como resultado, vários pesquisadores argumentam que tal modelo vertical é adequado apenas para manuais de metodologia e não é apropriado descrever a forma como a pesquisa é conduzida na prática. O que é certo é que esse modelo não representa adequadamente a lógica e o processo da etnografia.

De fato, as tentativas de sistematizar sistematicamente as pesquisas qualitativas partem do pressuposto de que são processos circulares (Ronzon 2008: 30)

 O estudo em questão tem servido de modelo para todos os principiantes no campo das análises das línguas nacionais quer a nível da Faculdade de Ciências Sociais, quer a nível de outras instituições de investigação

científica, que se debruçam sobre a questão daquelas línguas.

Marconi Presotto (2008:15) é uma técnica de colecta em que o pesquisador se vale dos sentidos para obtenção dos dados ver e ouvir principalmente.

O conceito amostra adquire diferentes significados e representa algo diferente, conforme o enfoque de pesquisa. Para o enfoque quantitativo a amostra é um subgrupo da população de interesse (do qual serão colectados dados e que é definido ou delimitado antecipadamente com precisão) e deve ser representativo dessa população. Cf. Sampieri et al. (2006)

Cf. Zassala (2012:60) Mesquita e Duarte (1997:31)

Ronzon, F. (2008). Sul campo. Breve guida alla ricerca etnografica. Roma: Meltemi.

Bibliografia

 

Bowling, A. (2002). Research Methods in Health. Philadelphia: Open University Press.

McMillan, L. (2002). Profit with Options. Essential Methods for Investing Success. New York: John Wiley & Sons.

Patton, M. Q. (2002). Qualitative Research & Evaluation Methods. Thousand Oaks: Sage.

Yin, R. K. (2016). Pesquisa Qualitativa do início ao fim. São Paulo: Penso.

Elliott, J. (1991). Action Research for Educational Change. Philadelphia: Open University Press.

Becker, H. S. (1994). Métodos de Pesquisa em Ciências Sociais. HUCITEC.

 

 

         11ª aula 10 de Dezembr0: Observar o Outro 

 

Pensar e Objectivar O OUTRO

O Ocidente queria unificar e tornar o conhecimento, hegemónico: foi o modelo hegemónico de conhecimento que afetou a antropologia. A antropologia esqueceu-se do seu caracter histórico-particularista, assumiu posições etnocêntricas em relação a outras formas de civilização e outras práticas de conhecimento e de vida diferentes da forma de civilização ocidental moderna. A exaltação da racionalidade científica ocidental - para aqueles que nela vivem, a vida dominada pela tecnologia, aparece como necessária e absoluta, quase fosse o topo dum novo evolucionismo.

O método quantitativo das ciências empírico-racionais, funda-se na vontade de objectivar e teorizar, organizando logicamente o saber num domínio de objectos, expressos em linguagem formal e quantitativa. Diante desse paradigma, que dominou as ciências naturais modernas desde seu nascimento, no século XVII, como se organizaram os territórios de pesquisa das produções culturais humanas, consideradas em seus aspectos materiais e simbólicos? Porque objectivar o conhecimento da Alteridade?

Oralidade

A oralidade , ou o espaço do outro: Léry, Michel De Certeau (1990:221) nos mostra de forma icástica como também a antropologia, como forma de conhecimento que se ocupa de conhecer outras culturas e outros sujeitos, praticou inconscientemente uma vontade real de saber e objetivar desde a sua fundação , antropologia desde a sua origem um esforço de dominação, que objetiva o outro, esse impulso de dominação é realizado por meio do poder objetivante de quem observa, racionaliza e  escreve (De Certeau 1990: 39).

De  Certeau nos explica que o mito do fundamento da antropologia é o mito de uma cultura que exerce um violento acto de objetivação sobre a outra. A antropologia é o conhecimento que o Ocidente conquistador moderno traz de volta ao retornar de sua jornada para o Outro.

Diogo Cão

Diogo Cão com as suas caravelas que trarão tesouros de volta ao Portugal,  é representado pela cruz e pela espada, em frente às fozes do rio Padrão. O Reino do Congo que naquele tempo se achava colocado na Baixa Ethiopia  (d’Abbeville 1655) espaço de vegetação e animais exóticos representa e é alteridade: é um sujeito obrigado a adaptar-se à forma oral de comunicação, imerso em um tempo fora da história evoluída do Ocidente e ligado a uma dimensão corporal inconsciente, ou seja, alheia aos seus próprios significados.

A escrita

O Ocidente traça sua própria história no corpo do outro. A antropologia traduz a palavra oral e sem sentido do outro , e mostra a conexão desse saber com outros que, como a historiografia, coloca à distância o outro para compreendê-lo por meio da escrita (De Certeau 1990:178). Na textualidade antropológica, mostra-se a ligação entre a escrita, como lugar de saber e poder, e o Ocidente: a escrita se apropria do Ocidente, e seu presente, o que foi projectado, com uma 'grande divisão', Na distância espacial (a geografia do dentro / fora como distanciamento imaginário do outro) e na distância temporal (primitividade como construção política do tempo do outro).

Se a fundação da antropologia como ciência foi marcada por uma relação de poder, é possível superar esse compromisso original do conhecimento antropológico? É possível manter a vontade ocidental de saber separada da relação de poder que é o Ocidente exercita? E, em particular, é possível resolver o problema do sentido de alteridade com ferramentas puramente metodológicas? O rigor processual e metodológico é suficiente para reunir um tecido humano e cultural como aquele angolano com raízes completamente diferentes daquelas que permitiram o nascimento da antropologia cientifica colonial?

Cientificidade

Numa perspectiva geral, a busca da cientificidade perseguida pelo rigor processual e metodológico de inspiração positivista tem o defeito de negligenciar a relação de sentido que, em todas as ciências humanas, vincula o sujeito compreensivo e o objeto conhecido; Na perspectiva específica das disciplinas antropológicas, há o defeito de negligenciar as condições dialógicas e afectivas segundo as quais nos relacionamos com outras culturas e outros sujeitos.

Consideremos o modelo positivista de cientificidade. A imagem positivista do método científico a que se referia o conhecimento antropológico no século XIX (mas também a antropologia mais recente, cada vez que tentava assumir mimeticamente o padrão de cientificidade das ciências da natureza) separava a experiência da teoria, e usava do método indutivo a partir do momento da observação e coleta de dados, até ao momento da abstração teórica.

O método antropológico

Isso implica, por um lado, o silêncio sobre o estado dos dados e das técnicas de colecta, como se o objeto de estudo fosse externo e dado, e como se o sujeito fosse um instrumento neutro de observação; doutro, uma passagem indutiva dos dados para a busca dos universais da cultura, pela comparação e generalização. Enfim não é bem claro o uso do método indutivo ou dedutivo. A antropologia entre os séculos XIX e XX foi, assim, modelada na imagem positivista da relação experiência-teoria: ou seja, foi representada como uma sequência cognitiva linear, que vai desde a observação e registro de dados (coleta de evidências factuais), até a descrição de uma sociedade em seus aspectos institucionais e simbólicos (nível de documentação etnográfica), para a comparação com aspectos semelhantes de outras sociedades e, finalmente, para a formulação de leis gerais sobre a sociedade e definição (nível de generalização em uma teoria antropológica)

Método interpretativo

Uma ruptura decisiva com esse paradigma científico ocorreu na segunda metade do século XX com o interpretativismo de Clifford Geertz . Se o positivismo visa conhecer os 'factos' da natureza humana, a abordagem interpretativa visa a uma desconstrução dos objetos do conhecimento antropológico, passando “da teoria dos fatos sociais como coisas, à teoria deles como construções” (Holy, 1987, p. 5). A concepção interpretativa teve o mérito de oferecer uma nova configuração da relação entre teoria e experiência, pois mostrou que a relação entre forma e conteúdo, entre sujeito e objeto de conhecimento, positivamente não é uma relação de exterioridade, mas é uma relação de significado. Nas ciências etno-antropológicas, existe um vínculo circular entre os objetos e suas condições de conhecimento: o conhecimento tem a ver com o significado dos sujeitos e, portanto, é ele próprio uma relação de significado. Então, quais são as características de um conhecimento que se apresenta como uma relação de significado? Aplicado na antropologia, o modelo interpretativo impede que os objetos antropológicos sejam metodologicamente reificados e nos permite falar sobre os sujeitos e seus significados: nas ciências humanas os fenômenos não são explicados (pensáveis ??em abstrato como objetos dados com propriedades), mas são compreendidos.

«O que ocorre mais comumente a dificuldade persistente, constante, reexperimentada, de aprender certos aspectos da natureza, de si mesmo e da sociedade, de trazer certos fenómenos esquivos para a esfera dos fatos culturalmente formuláveis que tornam o homem cronicamente inquieto, dirigindo para eles um fluxo mais uniforme de símbolos de diagnóstico» (Geertz 2008:76).

 Os significados pretendidos pelos sujeitos em suas formas de vida. Em última análise, o interpretativismo pensa o objeto antropológico como uma construção da linguagem - uma perspectiva que tem uma realização exemplar, em virtude e limitações, no modelo de 'texto' de Clifford Geertz, Pretende ser uma construção textual de um sistema de significado.

Factos etnográficos

Segundo Geertz, os factos etnográficos (ações, mitos, instituições, rituais) devem ser tratados como tantos manuscritos incompletos e elípticos, a serem decifrados e reconstruídos. Desse modo, a abordagem de Geertz toca na questão epistemológica fundamental do trabalho de configuração que o antropólogo realiza ao escrever a monografia, mas acaba superestimando a função epistemológica e ontológica da linguagem, remetendo as culturas aos códigos linguístico-simbólicos. Assim, ele acaba negligenciando as dimensões não verbais do significado como sentido corporificado (comportamento, ação, olhar), e as diferentes fases temporais e os diferentes níveis de construção de significados.

«Visto sob esse ângulo, o objetivo da antropologia é o alargamento do universo do discurso humano. De fato, esse não é seu único objetivo — a instrução, a diversão, o conselho prático, o avanço moral e a descoberta da ordem natural no comportamento humano são outros, e a antropologia não é a única disciplina a persegui-los. No entanto, esse é um objetivo ao qual o conceito de cultura semiótico se adapta especialmente bem. Como sistemas entrelaçados de signos interpretáveis (o que eu chamaria símbolos, ignorando as utilizações provinciais), a cultura não é um poder, algo ao qual podem ser atribuídos casualmente os acontecimentos sociais, os comportamentos, as instituições ou os processos; ela é um contexto, algo dentro do qual eles podem ser descritos de forma inteligível — isto é, descritos com densidade» (Geertz 2008:16).

Nas últimas décadas do século XX, os antropólogos começaram a refletir sobre o que está antes da redação da monografia científica: isto é, a refletir sobre as formas de presença de alguém com o outro e sobre a relação comunicativa, possível ou impossível, que essa presença implica. Em última análise, eles entenderam que o conhecimento antropológico tem na base do trabalho de campo, e que essa experiência é constitutiva da compreensão da alteridade. Para compreender a alteridade e seus significados, não basta ao antropólogo observar estando na posição neutra de cientista que olha de fora. Nas ciências humanas não existe situação artificial, restrita, controlada e repetível, como uma experimentação em laboratório.

Antropologia da viagem

O laboratório do antropólogo é peculiar e deve ser construído em um processo: ele deve antes de tudo fazer um trabalho onde experimenta o desterro sobre si mesmo, empreender uma viagem, mergulhar em uma cultura estrangeira, com todas as dificuldades de comunicação que isso acarreta; Ele deve não apenas aprender outro idioma, mas ser aceite pelos nativos, superar a desconfiança - em última análise, participar de uma forma de vida (Todorov 2009:239-243).

O campo

O conhecimento em antropologia é o que acontece no campo, na forma de processos de fala e comportamento emocional, ou seja, na forma de trocas comunicativas com o informante indígena. O antropólogo não recebe passivamente as informações do informante, mas deve persegui-las e provocá-las discursivamente com a fala, e deve ser capaz de decodificar até mesmo os não ditos, silêncios, dissimulações e reticências dos nativos. O antropólogo, com uma expressão de Lévi-Strauss, deve 'entregar algo de si' para se apossar do outro (Lévi-Strauss 2015:17). A questão torna-se delicada quando se trata de pesquisar sobre a problemática que envolve o feitiço, ao investigar acerca das crenças religiosas, muitas vezes encontra encontra apenas recusas, dissimulações, reticências; Ele só entende algo quando se torna um “sujeito” da magia, quando aceita o desafio e se mostra capaz de assumir um papel de vítima de poder mágico, ou torna-se ele também ganga (Todorov 2009: 240-241). Em outras palavras, começa a compreender quando é admitido nas relações de poder que dominam aquele núcleo social. Tudo isso nos diz que a epistemologia do conhecimento antropológico está fortemente entrelaçada com as questões éticas: é também delas que o antropólogo deve se equipar.

Objectivar é criar identidade e etnicidade

A antropologia começa a refletir sobre sua própria vontade de objetivar e sobre o perigo da classificação do outro, que cria etnias separadas sobre os conceitos de identidade e etnicidade. Na verdade, estamos começando a ver o perigo do pensamento classificatório, que pode levar a classificações arbitrárias de diferentes grupos, um perigo que também é inerente às formas do multiculturalismo contemporâneo. Ou seja, começamos a ver as responsabilidades da razão etnológica, e a compreender que o modelo classificatório da etnologia e o processo de 'invenção da identidade' podem ter tido o efeito de fortalecer as políticas dos administradores coloniais, curvando-se em busca de vantagens econômicas. E para fins políticos. Entendeu-se que atribuir etnicidade aumenta a distância (Fabietti, 2013:108): por que, por exemplo, para os conflitos africanos sempre falamos em “guerras tribais na África”? Estamos começando a entender que a antropologia pode ajudar a criar categorias políticas; E que mesmo o excesso de relativismo do multiculturalismo pode dar lugar à manutenção forçada das diferenças. Jean-Loup Amselle (1998:26) , em contribuições que merecem grande atenção, ensinam que as barreiras devem ser reduzidas e abertas para uma maior permeabilidade. Amselle ensina-nos que o cruzamento é original, não substitui a pureza: pelo contrário, é uma categoria que vai precisamente contra a ideia de pureza(1998:33). Não se trata apenas de proteger os diferentes e as diversidades, mas de fazer desaparecer as barreiras e permitir que ocorram as misturas sociais: as sociedades e as culturas se constituem num inevitável processo de crioulização. Um processo, não uma estrutura: onde emerge a noção de arquipélago, que significa a non definição  como uma matriz comum; E nos lembra o direito à opacidade - para o qual compreender o outro não significa compreender-se completamente, mas poder viver juntos, alimentando-se do que a opacidade do outro deixa filtrar.

Antropologia dialógica

A antropologia é alimentada por práticas, relacionamentos, emoções, empatia que estão envolvidas nas condições do conhecimento das ciências humanas e sociais: O conhecimento se dá na troca dialógica, e no tempo da comunicação e do olhar mútuo: portanto, conhecer não é uma simples recomposição do que foi observado no trabalho de campo em uma história, como se houvesse uma transição linear e pacífica da ordem do visível para o Ordem de representação mental e ideal, do ver ao dizer. Na antropologia, como em qualquer ciência humana, o que se vê não é um espectáculo, que basta reorganizar, mas é uma experiência vivida: em outras palavras, é algo que surge em um contexto pragmático e vivo, onde os fenómenos se encontram com intensidade, qualitativamente e temporalmente.

O outro

O encontro com o outro - como nos ensina o conceito fenomenológico de “olhar” - “ver” não é nem observação neutra, guiada por métodos ad hoc, nem identificação emotiva. No encontro antropológico, o ver torna-se um olhar que se encontra com outro olhar e é modificado por ele: o visto muda quem vê; O olhar é uma troca de olhares: é ver e ser visto por ele. O olhar do outro e o olhar no outro é um interagir que desorienta, um ver cheio de emoções, que afasta à medida que se aproxima. O antropólogo vai ao outro, entra em uma comunicação com olhares, laços afetivos e afrouxamentos, dizer e não dizer. Mas lembremos que, ao mesmo tempo, o antropólogo deve também saber permanecer ele mesmo, com seu próprio saber e sua própria cultura diferente. Movendo-nos, agimos, pensamos, não teríamos um ponto de partida para chegar ao outro, se não conseguíssemos ver a diferença tentando uma comunicação. Com o outro eu não não há troca e comunicação, não há relacionamento, mas fusão e simbiose. Muitos antropólogos hoje retomam de Wittgenstein o tema segundo o qual não podemos pensar em nós mesmos sem pensar no outro, isto é, sem experimentar nossos limites comparando-os com outras formas de vida possíveis, como ele fazia continuamente com seus exemplos de antropologia imaginária. Em outras palavras, em termos metodológicos, isso significa que o antropólogo deve retornar do trabalho de campo mantendo-se a si mesmo, não deve se tornar o outro. O antropólogo deve voltar a escrever a monografia etnográfica, para tentar tornar os significados e instituições da comunidade que ele estuda compreensíveis para sua própria comunidade, e ele pode fazer isso apenas mantendo sua própria diferença e mostrando a diferença entre seus próprios significados e valores e aqueles da cultura que ele estuda.

Traduzir

Ou seja, a suposição do ponto de vista nativo deve permanecer um esforço consciente e reflexo de simulação e tradução. A cultura não é 'algo' de que falamos, mas é o lugar de onde falamos e somos falados e transformados por outros. Nesta senda na antropologia não falamos de forma classificatória de outras culturas, mas falamos a 'outros' que falam de 'nós’. Entender o outro: o conhecimento antropológico é como aprender uma língua, certamente exige imersão em uma forma de vida, formação que seja juntamente linguística e social, e que coloque o antropólogo em posição de participar de dialogos. A compreensão antropológica é um aprendizado que visa dizer o outro na nossa língua, não se tornar o outro: é uma prática da diferença, não do 'identidade. A chamada 'antropologia pós-colonial', feita pelos próprios indígenas, crítica que o Ocidente deve conhecer e ouvir.

Os dêz Mandamentos da Observação participante

Inserção no campo

O campo é pouco a pouco “desbravado” pelo antropólogo aprendiz que pesquisa e que apenas o conhecia por “ouvir dizer”. Ao mesmo tempo ele se insere na localidade e vai redefinindo os objetivos da sua pesquisa, começam as primeiras dificuldades no convívio com os habitantes que moram no campo; ele aprende a pensar e a refletir sobre

a natureza das suas relações com os informantes.

Informante

Aos poucos vai sendo aceite, mas se dá conta que é fundamental poder contar com um intermediário para realizar a sua observação. Trata-se de um informante-chave, um mediador, que garante o bom acesso à localidade e/ou ao grupo social em estudo. O informante desempenha também o papel de conselheiro e “protetor”, porque defende o pesquisador contra os perigos e os imprevistos próprios do trabalho de campo.

Trata-se de constituir um guia da observação participante nas sociedades complexas. Nos estudos de caso das “comunidades” ou dos territórios urbanos de Luanda circumscritos geograficamente nos bairros.

Dez “mandamentos” da observação participante

1) Observação que demora

A observação participante, implica, necessariamente, um processo longo. Muitas vezes o pesquisador passa inúmeros meses para “negociar” e ser aceite à sua entrada na área. Trata-se de uma fase exploratória que é, essencial para o desenrolar ulterior da pesquisa. O tempo é um requisito para os estudos sobre o comportamento e a a ação dos grupos: monitorizando a evolução e a mudança de comportamento das pessoas e dos grupos é necessário que a observação demore por um longo período de tempo e não seja num único momento correndo o risco de ser superficial.

2) Situação social

O pesquisador não pode saber de antemão onde está caindo e que tipo de território está pesquisando. Não é esperado

pelo grupo, desconhece muitas vezes as teias das relações que marcam a hierarquia de poder e a estrutura social do grupo onde se encontra. Não pode pretender de ter o controle da situação.

3) Interação participante

A observação participante supõe a interação pesquisador/pesquisado. As informações que obtém, as respostas que são dadas às suas pesquisas, dependerão, ao final das contas, do seu comportamento e das relações que desenvolve com o grupo estudado. Uma auto-análise faz-se, portanto, necessária e convém ser inserida na própria história da pesquisa. A presença do pesquisador tem que ser justificada e a sua transformação em “nativo” não se verificará, ou seja, por mais que se pense inserido atrai sempre a “curiosidade” e às vezes a desconfiança.

4) Destaque

Por isso mesmo o pesquisador deve mostrar-se diferente do grupo pesquisado. O seu papel de pessoa de fora terá que ser afirmado e reafirmado. Não deve enganar os outros, nem a si próprio pensando de ser integrado no grupo.

“As pessoas não esperam que o antropólogo seja igual a elas. Na realidade devem ver que o pesquisador é diferente. Abandonar, portanto, os esforços de imersão total”.

5) Informante

Uma observação participante não se faz sem um, intermediário que “abre as portas” e dissipa as dúvidas junto às pessoas da localidade que poderiam ficar desconfiantes. Com o tempo, o informante, passa a ser colaborador da pesquisa: é com ele que o pesquisador esclarece algumas das incertezas que permanecerão ao longo da investigação. O informante pode mesmo chegar a influir nas interpretações do pesquisador, mediando o resultados da pesquisa, e cobre a função de “assistente informal”.

6) O “look” do pesquisador

O pesquisador quase sempre desconhece a sua própria imagem junto ao grupo pesquisado. Os seus passos durante o trabalho de campo são conhecidos e muitas vezes controlados por membros da população local. O pesquisador é um observador que está sendo todo o tempo observado. Inverte-se o papel o pesquisador è pesquisado e o pesquisado torna-se pesquisador

7) A escuta

A observação participante implica saber ouvir, escutar, ver, fazer uso de todos os sentidos. É preciso aprender quando perguntar e quando não perguntar, assim como as perguntas que dever ser feitas na hora certa. As entrevistas formais são muitas vezes desnecessárias, devendo a colecta de informações não se restringir a isso. Com o tempo os dados podem ser revelados ao pesquisador sem que ele faça qualquer esforço para obtê-los.

8) Não desistir

Desenvolver uma rotina de trabalho é fundamental. O pesquisador não deve recuar em face dos esforços infrutuosos que se repitem apesar da dedicação intensa. Redigir o diário de campo, o pesquisador se autodisciplina a observar e apontar tudo sistematicamente. A sua presença constante contribui, por sua vez, a gerar e manter confiança na população estudada.

9) Os erros

O pesquisador aprende com os erros que comete durante o trabalho de campo e deve tirar proveito deles, na medida em fazem parte do treino e aprendizagem da pesquisa. Deve, assim, refletir sobre o porquê de uma recusa, o porquê de um desacerto, o porquê de um silêncio.

10) Os resultados

O pesquisador é, em geral, “cobrado”, sendo esperada uma “devolução” dos resultados do seu trabalho. “Para que serve esta pesquisa?” “Que benefícios ela trará para o grupo ou para mim?” Mas só uns poucos consultam e se servem do resultado final da observação. O que fica são as relações de amizade pessoal desenvolvidas ao longo do trabalho de campo.

Conclusão

A observação participante não é uma prática simples mas cheia de problemas teóricos e práticos que o antropólogo

Deve resolver. A observação participante exige, uma cultura metodológica e teórica.

Exemplos bibliográficos: Foote Whyte, Malinowsky, Durkheim, Pareto, Lynd,  Elton Mayo, Conrad Arensberg, Lloyd Warner, Everett Hugues; Gilberto Velho, são mai pertinentes para entender as áreas pobres e o mundo popular da Angola de hoje. A pesquisa leva a contrapor-se à imagem produzida pelo senso comum, que considera as áreas pobres exclusivamente um problema: degradadas, homogêneas, desorganizadas, caóticas e fora da lei, devendo necessariamente ser “ajudadas” uma vez que “abandonadas à sua própria sorte” nunca se desenvolverão.

Os problemas vistos de dentro, e a partir do olhar antropológico, levam a uma outra visão: as localidades e as áreas coexistem em espaços e grupos locais que são sim diferenciados mas porém estruturados a partir de redes de relações sociais. A desorganização social não é, portanto, o argumento fundamental – o que não significa negar a existência de conflitos entre os grupos. Não devemos ter uma visão “miserabilista” nem populista dos pobres.  É  o bairro, o espaço informal, onde as decisões são tomadas, é o bairro que estrutura os grupos e que constrói e destrói as relações sociais.

 

Bibliografia

 

De Certeau, M. (1990). A invenção do quotidiano. Petrópolis: Vozes.

Radcliffe-Brown, A. A. (1972). il metodo nell’antropologia sociale. Roma: Officina.

Geertz, C. (2008). A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: LTC.

Holy, L. (1986). Strategies and Norms in a changing Matrilineal Society. Cambridge:    University Press.

TodorovTzvetan. (2009). A conquista da América. Lisboa: Martins Fontes.

Lévi-Strauss, C. (2015). Antropologia Strutturale. Milano: Il Saggiatore.

Fabietti, U. (2015). L’identità etnica. Roma: Carocci.

Amselle, J.-L. (1998). Mestizo Logics. Anthropology of Identity in Africa an Elsewhere. Stanford: University Press.

 

         12ª aula 9 de Janeiro: Método interpretativo 

 

Clifford Geertz e o seu método

A idéia de uma cultura como um texto, que podemos se pode considerar como a metáfora do 'paradigma interpretativo' deriva da hermenêutica filosófica contemporânea e constitui o ponto nodal do trabalho teórico de Clifford Geertz (1926-2006), o Representante virtual da antropologia interpretativa. Discípulo do Antropólogo Clyde Kluckhohn (1905, 1960) e do sociólogo Talcott Parsons (1902-1979) em Harvard, Geertz é uma das figuras mais importantes da antropologia contemporânea. Os seus estudos de campo o levaram a tocar os extremos geográficos do mundo muçulmano: a Indonésia e Marrocos, em um grande 'vôo etnográfico' que também constituiu a base para o trabalho comparativo (Geertz 1973, 1988).

 

3 questões da antropologia interpretativa

Todos os recursos intelectuais atuais e incorporadas na antropologia interpretava, implicam pelo menos três grandes questões:

a) consideração do chamado 'ponto de vista nativo' através de uma reformulação das bases inteiramente novas do problema 'emico' já abordado como 'etnociência;

b) uma discussão dos processos de comunicação que se estabelecem entre o etnógrafo no  campo e o seu informante, ou seja  o encontro entre culturas; e, finalmente,

c) a questão de como a experiência deste encontro será transcrita num texto etnográfico.

O método interpretativo

A nível epistemológico, a antropologia interpretativa coloca o problema da cognoscibilidade de culturas a partir de dentro 'das mesmas culturas; avançando então, a questão dos meios que permitem atingir o conhecimento do outro, ou seja, o procedimento etnográfico que permite a tradução de uma cultura para outra; e, finalmente, a questão da transmissibilidade daquilo que foi traduzido para o público.

Antropologia interpretativa

A antropologia interpretativa contrasta com as perspectivas do estrutural-funcionalismo ou do chamado neo-evolucionismo que tornaram a cultura o comportamento e as estruturas sociais uns objetos suscetíveis de tratamento tipológico, formal ou um sistema formulado de proposições gerais. A crítica elaborada pela antropologia interpretativa nem sequer poupa o estruturalismo de Lévi-Strauss em que vê um excesso de 'cerebralismo' e 'abstractismo' sem nenhum contexto; enfim, nem sequer concorda com a etnociência que tenta

'mostrar que o significado pode emergir de uma maneira misteriosa da concatenação mecânica de elementos sem sentido'.

A perspectiva interpretativa, ao mesmo tempo que enfatiza o comportamento, a linguagem e o aspecto simbólico da cultura, reconhece ao mesmo tempo em que a interpretação e a vida social são uma 'negociação de significados'.

Mas o que é que significa 'negociar significados' neste contexto preciso?

Para entender o programa da antropologia interpretativa, é preciso partir do facto da base de entendimento entre o observador e o observado (ou seja, entre antropólogo e 'nativo') é formada por práticas e comportamentos significativos que respondem a um sistema de regras. Um pouco como num jogo de xadrez, onde os movimentos de um jogador pressupõem, o respeito de um conjunto de regras. Do mesmo modo, as práticas, a fim de serem reconhecidas como significativas, devem poder existir dentro de um contexto de significados. Sendo as práticas e os significados que eles transmitem intersubjetivos: elas não são puramente redutíveis aos estados psíquicos individuais, ou crenças pessoais ou modelos culturais 'totais'.

Circularidade hermenêutica

A cultura não pode ser estudada num laboratório com os critérios das ciências humanas. Na antropologia, também, o observador e o observado estão na mesma situação (o encontro etnográfico), e o antropólogo não possui uma posição privilegiada por ser capaz de descrever o que acontece, porque o antropólogo e o nativo estão numa relação de interacção recíproca que permite de elaborar proposições e decisões relativas à cultura em estudo. Não há, em antropologia, o ‘destaque’ entre o observador e o observado, entre cientista e objeto da pesquisa que se pode ter noutros campos de estudo. Há, sim, uma 'circularidade hermenêutica' entre as partes, cada um dos quais é 'produtor se significados'.

A Antropologia também assume o facto que, além de ser 'animais simbólicos' (Cassirer, 1969), os seres humanos também são “auto-interpretantes” e animais que se “auto-de definem”. Assim, o conhecimento antropológico não é simples 'observação' e a etnografia não é entendida como simples coleta de dados brutos. Nenhum desses dois pressupostos (a objetividade da observação e a neutralidade da linguagem descritiva) tem efeitos em termos de valor nas ciências humanas, porque o contexto significante, que é constituído pela interação dialógica entre antropólogo e informante, é absolutamente um dado primordial que não se pode descuidar se não ao preço de grandes distorções.

Para Geertz, não se trata de observar os fenômenos aproveitando da verdade representada psiquicamente num conceito. Assim, surge o problema de definir a natureza do objeto da antropologia e o método pelo qual 'obter acesso ao mundo conceitual no qual os nossos sujeitos vivem para que possamos conversar com eles no sentido amplo da palavra'.

“Alcançar o acesso ao mundo conceitual' parece significar que temos que cavar perfurando uma superfície e somente além desta se encontra a 'verdade”  (Geertz 1987: 63).

De facto trata-se de operar uma extrapolação tirando fora os significados estratificados na textura entrelaçada fazendo emergir o texto da cultura. De que maneira podemos dizer que a cultura é um texto e o método para conhecê-la consiste em extrapolar o significado? Precisamos voltar para a concepção do significado típico da perspectiva interpretativa em geral. O significado não é um assunto privado mas o significado é intersubjetivo, público, global. Para Geertz, na verdade, a cultura, consiste em ações simbólicas entrelaçadas numa, 'teias de aranha de significados’. Geenz fala sobre o tema da etnografia e não da antropologia. Seria errado acreditar que ele está implicitamente estabelecendo uma distinção entre um momento etnográfico destinado a um momento de coleta de dados e um momento 'antropológico' visto como um momento de elaboração teórica desses dados. Para Geenz a etnografia é antropologia (e vice-versa), já que é no momento em que o antropólogo destratifica as estruturas simbolicas que produz antropologia, como um texto que é levado ao conhecimento. Malinowski expressou, segundo Geertz, não apenas 'o desconforto do antropólogo' diante da cultura outra; não só revelou, através desses diários, que o antropólogo está longe de ser um 'camaleão' etnográfico - uma imagem que o próprio Malinowski fornece com as suas obras. Embora ninguém tenha percebido isso, o diário de Malinowski foi um problema epistemológico: como podemos conhecer uma outra cultura, se é impossível entender o outro por empatia? 'O que acontece à compreensão quando a identificação desaparece?'

 

Como é que o antropólogo, lê esses textos, e descreve os símbolos significativos e densos que constituem a cultura? Uma leitura simples do fenómeno - um comportamento, uma afirmação - não é de fato uma leitura do texto cultural que, assim como o texto literário, tem consistência e um significado específico feito de referências internas, de referências ao seu contexto. O conceito de 'descrição densa' deve ser capaz de explicar o que o antropólogo faz ou deve fazer quando tenta entender uma cultura. Geertz retoma, a esse respeito, uma passagem do filósofo inglês Gilbert Ryle, onde ele mostra como um gesto simples pode ser interpretado de forma diferente, dependendo do contexto. Uma piscadela de olhos pode significar muitas coisas.

 Clifford Geertz e o seu método

A idéia de uma cultura como um texto, que podemos se pode considerar como a metáfora do 'paradigma interpretativo' deriva da hermenêutica filosófica contemporânea e constitui o ponto nodal do trabalho teórico de Clifford Geertz (1926-2006), o Representante virtual da antropologia interpretativa. Discípulo do Antropólogo Clyde Kluckhohn (1905, 1960) e do sociólogo Talcott Parsons (1902-1979) em Harvard, Geertz é uma das figuras mais importantes da antropologia contemporânea. Os seus estudos de campo o levaram a tocar os extremos geográficos do mundo muçulmano: a Indonésia e Marrocos, em um grande 'vôo etnográfico' que também constituiu a base para o trabalho comparativo (Geertz 1973, 1988).

3 questões da antropologia interpretativa

Todos os recursos intelectuais atuais e incorporadas na antropologia interpretava, implicam pelo menos três grandes questões:

a) consideração do chamado 'ponto de vista nativo' através de uma reformulação das bases inteiramente novas do problema 'emico' já abordado como 'etnociência;

b) uma discussão dos processos de comunicação que se estabelecem entre o etnógrafo no  campo e o seu informante, ou seja  o encontro entre culturas; e, finalmente,

c) a questão de como a experiência deste encontro será transcrita num texto etnográfico.

O método interpretativo

A nível epistemológico, a antropologia interpretativa coloca o problema da cognoscibilidade de culturas a partir de dentro 'das mesmas culturas; avançando então, a questão dos meios que permitem atingir o conhecimento do outro, ou seja, o procedimento etnográfico que permite a tradução de uma cultura para outra; e, finalmente, a questão da transmissibilidade daquilo que foi traduzido para o público.

Antropologia interpretativa

A antropologia interpretativa contrasta com as perspectivas do estrutural-funcionalismo ou do chamado neo-evolucionismo que tornaram a cultura o comportamento e as estruturas sociais uns objetos suscetíveis de tratamento tipológico, formal ou um sistema formulado de proposições gerais. A crítica elaborada pela antropologia interpretativa nem sequer poupa o estruturalismo de Lévi-Strauss em que vê um excesso de 'cerebralismo' e 'abstractismo' sem nenhum contexto; enfim, nem sequer concorda com a etnociência que tenta

'mostrar que o significado pode emergir de uma maneira misteriosa da concatenação mecânica de elementos sem sentido'.

A perspectiva interpretativa, ao mesmo tempo que enfatiza o comportamento, a linguagem e o aspecto simbólico da cultura, reconhece ao mesmo tempo em que a interpretação e a vida social são uma 'negociação de significados'.

Mas o que é que significa 'negociar significados' neste contexto preciso?

Para entender o programa da antropologia interpretativa, é preciso partir do facto da base de entendimento entre o observador e o observado (ou seja, entre antropólogo e 'nativo') é formada por práticas e comportamentos significativos que respondem a um sistema de regras. Um pouco como num jogo de xadrez, onde os movimentos de um jogador pressupõem, o respeito de um conjunto de regras. Do mesmo modo, as práticas, a fim de serem reconhecidas como significativas, devem poder existir dentro de um contexto de significados. Sendo as práticas e os significados que eles transmitem intersubjetivos: elas não são puramente redutíveis aos estados psíquicos individuais, ou crenças pessoais ou modelos culturais 'totais'.

Circularidade hermenêutica

A cultura não pode ser estudada num laboratório com os critérios das ciências humanas. Na antropologia, também, o observador e o observado estão na mesma situação (o encontro etnográfico), e o antropólogo não possui uma posição privilegiada por ser capaz de descrever o que acontece, porque o antropólogo e o nativo estão numa relação de interacção recíproca que permite de elaborar proposições e decisões relativas à cultura em estudo. Não há, em antropologia, o ‘destaque’ entre o observador e o observado, entre cientista e objeto da pesquisa que se pode ter noutros campos de estudo. Há, sim, uma 'circularidade hermenêutica' entre as partes, cada um dos quais é 'produtor se significados'.

A Antropologia também assume o facto que, além de ser 'animais simbólicos' (Cassirer, 1969), os seres humanos também são “auto-interpretantes” e animais que se “auto-de definem”. Assim, o conhecimento antropológico não é simples 'observação' e a etnografia não é entendida como simples coleta de dados brutos. Nenhum desses dois pressupostos (a objetividade da observação e a neutralidade da linguagem descritiva) tem efeitos em termos de valor nas ciências humanas, porque o contexto significante, que é constituído pela interação dialógica entre antropólogo e informante, é absolutamente um dado primordial que não se pode descuidar se não ao preço de grandes distorções.

Para Geertz, não se trata de observar os fenômenos aproveitando da verdade representada psiquicamente num conceito. Assim, surge o problema de definir a natureza do objeto da antropologia e o método pelo qual 'obter acesso ao mundo conceitual no qual os nossos sujeitos vivem para que possamos conversar com eles no sentido amplo da palavra'.

“Alcançar o acesso ao mundo conceitual' parece significar que temos que cavar perfurando uma superfície e somente além desta se encontra a 'verdade”  (Geertz 1987: 63).

De facto trata-se de operar uma extrapolação tirando fora os significados estratificados na textura entrelaçada fazendo emergir o texto da cultura. De que maneira podemos dizer que a cultura é um texto e o método para conhecê-la consiste em extrapolar o significado? Precisamos voltar para a concepção do significado típico da perspectiva interpretativa em geral. O significado não é um assunto privado mas o significado é intersubjetivo, público, global. Para Geertz, na verdade, a cultura, consiste em ações simbólicas entrelaçadas numa, 'teias de aranha de significados’. Geenz fala sobre o tema da etnografia e não da antropologia. Seria errado acreditar que ele está implicitamente estabelecendo uma distinção entre um momento etnográfico destinado a um momento de coleta de dados e um momento 'antropológico' visto como um momento de elaboração teórica desses dados. Para Geertz a etnografia é antropologia (e vice-versa), já que é no momento em que o antropólogo destratifica as estruturas simbolicas que produz antropologia, como um texto que é levado ao conhecimento. Malinowski expressou, segundo Geertz, não apenas 'o desconforto do antropólogo' diante da cultura outra; não só revelou, através desses diários, que o antropólogo está longe de ser um 'camaleão' etnográfico - uma imagem que o próprio Malinowski fornece com as suas obras. Embora ninguém tenha percebido isso, o diário de Malinowski foi um problema epistemológico: como podemos conhecer uma outra cultura, se é impossível entender o outro por empatia? 'O que acontece à compreensão quando a identificação desaparece?'

 

Como é que o antropólogo, lê esses textos, e descreve os símbolos significativos e densos que constituem a cultura? Uma leitura simples do fenómeno - um comportamento, uma afirmação - não é de fato uma leitura do texto cultural que, assim como o texto literário, tem consistência e um significado específico feito de referências internas, de referências ao seu contexto. O conceito de 'descrição densa' deve ser capaz de explicar o que o antropólogo faz ou deve fazer quando tenta entender uma cultura. Geertz retoma, a esse respeito, uma passagem do filósofo inglês Gilbert Ryle, onde ele mostra como um gesto simples pode ser interpretado de forma diferente, dependendo do contexto. Uma piscadela de olhos pode significar muitas coisas.

Clifford Geertz, a importancia da interpretação

Interpretazione di culture, 1973, trad. it. Bologna, il Mulino Clifford Geertz (1926-2006) é mais famoso por sua pesquisa etnográfica realizada em Java (ilha indonésia Sul do Bornéu) em Bali e Marrocos, e suas reflexões sobre a interpretação das culturas. Talvez o mais especial do trabalho de Geertz é constituído pela importância que ele atribui nas suas obras à dimensão simbólica (ou seja, os sistemas de significação) em sua relação com a estrutura social, mudança cultural e prática da pesquisa etnográfica.

O conceito semiótico da cultura

'A ideia de cultura que eu afirmo... é essencialmente semiótica. Convencido, como Max Weber, que o homem é um animal suspenso por

redes de significados que ele mesmo teceu, acredito que a cultura é composta dessas redes, e, portanto, a sua análise não deve ser uma ciência experimental em busca de leis, mas uma ciência interpretativa em busca de significado. O que eu estou procurando é uma explicação (pp. 4-5).

Ler as culturas

Geertz muitas vezes coloca um paralelo entre o antropólogo (metodologia que analisa uma cultura) e o crítico literário que analisa um texto: 'Extrapolar as estruturas de significado ... e determinar a sua matriz social e sua relevância ... Fazer etnografia é como tentar ler (no sentido de' construir uma leitura de ') um manuscrito ...'

O Significado é uma construção social

Geertz argumenta que a cultura é pública porque os significados são atribuídos socialmente, no sentido de que os sistemas de significação são necessariamente propriedade coletiva de um grupo, porque o que torna plausível a associação arbitrária entre significante e significado é a sua partilha social, nomeadamente a implementação associada de significante com o significado público.

Quando dizemos que não se percebe as acções das pessoas que vêm de uma cultura diferente, estamos reconhecendo a nossa 'falta por estramos familiarizados com um universo imaginativo no qual as nossas ações são sinais que indicam um significado' que se pode perceber somente dentro dum contexto.

Etnografia como descrição densa

... Os textos antropológicos são por si próprio interpretações, muitas vezes, de segunda e terceira mão (na verdade, por definição, apenas um 'nativo' faz interpretações de primeira mão porque é a sua cultura). Neste sentido as etnografias são uma ficção narrativa ... O etnógrafo se 'inscreve' no discurso social, e o penetra (o descreve por baixo). Análise cultural é (ou deveria ser) tentar adivinhar os significados que controlam esses conhecimentos e delinear os diagramas explicativos das perspectivas melhores. Não devemos pretender de descobrir a América. Significado e mapeamento de suas opiniões inconsistentes. A ideia de que podemos chegar a captar é a essência das sociedades nacionais, das civilizações, das grandes religiões ou de qualquer outra construção cultural... é um absurdo óbvio. Análise cultural é intrinsecamente incompleta. Por isso Geertz propõe de ancorar a etnografia à 'descrição densa'.

Metodologia comparativa

O risco é tentar generalizar a partir de casos específicos, para considerar um caso e, em seguida, descobrir o que está por detrás para dizer que tem um significado mais amplo, ao invés de começar com uma teoria e depois baixá-la para forçar com a ideia um único exemplo.

Sobre este ponto vale a pena mencionar alguns passos de uma entrevista

que Geertz concedeu em 1992.  PERGUNTA: Professor Geertz, no seu trabalhos Obras e vidas, falou de dois tipos diferentes de ansiedade. Por um lado, há o medo do cientista não ser suficientemente destacada; o outro é o medo humanista dele também. Ela acredita que a diferença entre o cientista e humanista hoje é a distinção real em antropologia? Não, eu não acho que a captura do todo. Meu objetivo principal era para indicar essa ambiguidade. De acordo com a velha concepção da antropologia é tratada como uma ciência natural; portanto, os estudiosos desta disciplina teve que manter uma certa distância do objeto de estudo.

Por outro lado, é evidente - e sempre foi - que você não pode entender as pessoas sem interagir com ele do ponto de vista humano. Eu não acho que o padrão que os resultados devem ser necessariamente 'ciências naturais contra as humanidades'; mas sem dúvida que é um problema e uma preocupação muito difundida(...) o sentimento de estar tão 'objetiva' para com as pessoas, tratando-as como objetos e, portanto, não ser capaz de compreender adequadamente as suas emoções, sentimentos, atitudes, e sua visão de mundo. Ao mesmo tempo, também é verdade que os antropólogos tentar não só 'subjetiva' Eles querem não só comunicar a sua impressão, ou a idéia de que você tem feito sobre isso, não quero falar sobre intuição. Há, portanto - e torna-se mais e mais sério - alguma preocupação em ambos os pontos. ,

Para mim, é feita a distinção fundamental entre aqueles que insistem em

uma teoria geral da sociedade, da qual extraem consequências práticas a serem aplicadas a casos específicos, e aqueles - como eu me vestir - que

desejam compreender as diferentes empresas para ser capaz de interagir

com eles de forma inteligente nos próximos anos. Eu acredito que esta é

uma diferença muito mais profundo - que tende a ser expressa em termos do modelo de engajamento ou retirada de Israel - em comparação à que existe entre ciências naturais e ciências humanas, ou para outro similar. Então Geertz um lado está ciente da oposição entre cientista e humanista (com base no seu desprendimento do objecto de estudo)Mas, então, insiste que a oposição mais importante é que entre métodos generalizados e métodos de localização

 

Antropologia Simbólica de Geertz

A noção de símbolo representa a essência e a idéia norteadora da antropologia Clifford Geertz. Lamentando a falta de interesse pelas ciências sociais para o estudo dos significados e sua impermeabilidade à obra de filósofos como Peirce, Wittgenstein, Cassirer, Ryle, ou Morris, ou críticos literários como Coleridge, Eliot, Burke, Empson, Blackmur, Brooks ou Auerbach, Geertz coloca o centro de seu esforço intelectual tentando processar o que Kenneth Burke chamou de 'ciência da ação simbólica' (Geertz, 1973, pp. 263-64). Esta disciplina está comprometida com o estudo dos símbolos em termos do qual indivíduos e grupos vivem, como são comunicadas, alterada, reproduzida. Fazendo uma síntese dos argumentos e conceitos extraídos de diferentes fontes - fenomenologia hermenêutica, a filosofia analítica, àquilo que sociologia inclui, à crítica literária à filosofia pós-empirista da ciência - Geertz desenvolveu, assim, uma 'fenomenologia científica da cultura 'com base na análise das maneiras em que a estrutura de significado que informam a experiência são implementadas por membros de uma sociedade particular em um momento histórico particular.

Max Weber

Base da unidade de análise é o conceito de comportamento significativo, compreendido e motivado e definido por Max Weber.
Segundo Weber, 'o objetivo da sociologia não é todo tipo de' estado interno 'ou comportamento externo, mas ação. 'Agir' apesar do facto que se trata sempre de um comportamento inteligível em face a certos factos sociais totais portanto é um comportamento especificado com base em algum sentido (subjetivo) 'possuído' ou 'intencionado' , mesmo sendo mais ou menos despercebido '(Weber, 1922, p.224
)


Analise simbólica do facto social

A necessidade de enquadramento metodológico convida a enquadrar o comportamento do agente e a considerar o comportamento significativo, referindo-o aos objetivos e valores em que o ator social funda suas ações: a interpretação antropológica define sua especificidade em dirigir a análise de sistemas simbólicos 'respeito aos atores '(Geertz, 1973, p.52). Baseado na síntese de Schutz das influências de Scheler, Weber e Husserl com as de James, G.H. Mead e Dewey, Geertz se apropria do postulado da ‘interpretação subjetiva' para atender a necessidade analítica e para entender a referência ao significado que a ação tem para o agente social (Geertz, 1973, p. 342). Reproduzindo o discurso atributos Habermas para Weber e Parsons na caracterização da qualidade do método de análise científica do comportamento humano, mediado pelo mundo da vida social (Habermas, 1980, pp. 63-64), a 'semântica' geertziana articula o conceito de Dilthey «Auslegung», o que significa que a interpretação no sentido da exegese textual, com a de Verstehen, a interpretação no sentido de compreensão daquilo que uma pessoa tem, a intenção com base em sinais através dos quais a vida psíquica é expressa. A exegese de Geertz faz o caminho inverso em relação a Dilthey, indo desde a objetificação das forças da vida até as conexões psíquicas. A suposição de Geertz é que o acesso ao outro só pode ocorrer por meio de seus significados, objetivados nos discursos dos atores que vivem em uma determinada forma de vida: a sua análise etnográfica é baseada nas instalações do ator, a sua relação com 'ação e os significados que seu professor Parsons chamou de' sistema cultural '(Parsons, 1951)


A imposição social


Reinterpretando em termos polifônicos o preceito que define a disciplina, sistematizando exortação  de Malinowski de 'entender o ponto de vista nativo' (Malinowski, 1922, p. 25), Geertz se apresenta como um problema central de ' análise antropológica a compreensão do modo como os atores sociais pensam, sentem e percebem. Ele visa à análise dos significados subjetivos que constituem as ações dos indivíduos no mundo social e considera a ação humana a partir de descrições intencionais e das formas pelas quais os agentes interpretam o significado de seu comportamento. A ação - de acordo Geertz - não tem significado direto assume um significado simbólico, tornando-se símbolo significativo devido às atividades humanas ', o significado não é inerente a objetos, ações ou outros procedimentos que possuem, mas - como apontou Durkheim, Weber e muitos outros - é imposto sobre eles; e, portanto, a explicação de suas propriedades deve ser encontrada naquilo que a impõe - nos homens que vivem na sociedade '(Geertz, 1973, pp. 389-90). Pela partilha de cargos que compõem a sociologia e a tradição hermenêutica, Geertz considera a interpretação de uma categoria ontológica: a condição humana é uma circunstância hermenêutica que se define em uma interpretação uniforme dos atos próprios e os dos outros (Geertz, 1973, p. 424).

Verstehen = compreender a rede simbólica de significados

O uso do conceito de Verstehen por Geertz indica um processo complexo pelo qual o homem interpreta o significado de suas ações e daqueles que interagem com ele. Serve para analisar o ponto de vista do ator, colocando a ação em relação à configuração de ideais, atitudes e valores em que se baseia. O sentido subjetivo é simbólico e é Verstehen ou seja compreensão da rede simbólica complexa que fornece significado à existência humana: 'Nossa se concentrta nos significados, nas formas em que os balineses (ou qualquer outra pessoa) dão a uma sensação que eles provam [ ...] colocando-os dentro de estruturas maiores de significado, e como eles mantêm estáveis essas estruturas mais amplas de significado, ou pelo menos nós tentamos, organizando o que eles fazem dentro deles '(Geertz, 1983 pp 226-27).

Descrição densa

= reconstruir os níveis de significado que não aparecem

Este aspecto da Verstehen, é ligado com um termo definido por G. Ryle (1949) descrição densa, 'Descrição densa’, que convida a reconstrução dos níveis de significado que não aparecem explícitamente nos agentes, e na multiplicidade de estruturas complexas conceptuais que informa a realidade. A descrição densa são 'versões do mundo' e outras 'formas de vida', ou 'sistemas abstratos’ eventos sociais, comportamentos, instituições, processos. A regra metodológica requer a orientação da análise em relação aos atores, levando em consideração seu 'ponto de vista' e reconstruindo os níveis de cultura nos quais eles baseiam seus significados. De tal modo que remete à comparação de comportamento e ação de Weber, Geertz explicou o significado da análise etnográfica 'densa' ao comparar tiques involuntários a piscadelas: os primeiros são comportamentos simples, enquanto os últimos são comportamentos significativos, o objeto específico de etnografia (Geertz, 1983, pp. 42-43).

Acção - agente - símbolo

Para o observador externo, os dois tipos de ação não têm diferenças. Eles assumem o significado apenas contextualmente, referindo-se às perspectivas do agente e inserindo a ação em seu contexto, em sua forma de vida. Como Ricoeur afirma, depois de mencionar explicitamente a interpretação geertziana do conceito de 'descrição densa', é apenas em função de uma certa convenção simbólica que podemos interpretar o significado de uma determinada ação: o mesmo gesto de levantar o braço pode, dependendo contexto, para ser entendido como uma maneira de cumprimentar, chamar um táxi ou votar (Ricoeur, 1977, p. 99) ou mandar vir…


A perspectiva é essencialmente linguística e comunicativa. O significado cultivado subjetivamente só pode ser expresso em símbolos: a linguagem que falamos ou, melhor, que fala através de nós (Wittgenstein, 1953) torna-se 'o meio' para a compreensão dos horizontes da cultura outra. Geertz recolhe a sugestão de Ricoeur para se voltar à linguagem como ela é concebida pela filosofia analítica, examinando 'o que é dito quando compreendemos de forma abrangente o que fazemos, por que fazemos, o que nos motiva a agir assim, como e com que meios isso é feito e em vista do que '(Ricoeur, 1983, pp. 37-38). Na análise linguística, segundo Ricoeur, podemos apreender 'o signo em que o homem' diz seu fazer '(Ricoeur, 1983, p.38), o índice de uma experiência encontrada através dos enunciados que expressam a estrutura.

Compreender a partir do ponto de vista do nativo

Assim, a abordagem geertiana se opõe às reduções dualistas, ao reducionismo e aos fundacionalismos que postulam realidades internas ao sujeito como antecedentes mentais ou causas finais da ação. A passagem pela expressão linguística nos permite confiar na expressão pública da ação, na objetivação da experiência no discurso, no estudo das formas disponíveis para a observação exterior e para a reflexão sobre o significado. O entendimento é assim 'despsicologizado' (Ricoeur, 1979, p.83): entendimento não significa referir-se às intenções do autor, por meio de relações empáticas ou identificações emocionais. Em vez disso, de acordo com Geertz, a intenção do autor está no mesmo texto ou na mesma ação. Esse princípio, que Ricoeur chama de 'atomização da ação', concebe a compreensão da vida psíquica por meio dos signos, dos 'traços' externos e públicos que o sujeito deixa para trás.

O trabalho do antropólogo

Também se refere à dimensão social e pública do pensamento como 'tráfico de símbolos significantes' (Geertz, 1983, p.87). O conceito geertziano de trabalho antropológico subtrai a identificação do Verstehen, excluindo a possibilidade de epoché, ou reduções fenomenológicas (Husserl). Abrir-se à alteridade não significa uma neutralidade objetiva, nem um esquecimento de si mesmo baseado na objetividade do método. Uma identificação total é impraticável, tanto para a diferença necessária que deve distinguir entre discursos antropológicos e nativos, como também porque os antropólogos são ontologicamente baseados na sua cultura e conhecimento (Geertz, 1973, pp. 73-97; Malighetti, 2008, pp. 64-74).


Concepção da cultura

Para uma ciência empírica das idéias Segundo Geertz a principal fonte de confusão empática dentro da tradição antropológica é a concepção 'cognitivista' que vê a cultura como composta de estruturas psicológicas através das quais indivíduos ou grupos de indivíduos orientam seu comportamento. De acordo com essa concepção, o elemento intencional e, portanto, significativo do comportamento, seria considerado uma idéia, algo antecedente à ação a ser traçada de volta causalmente (Geertz, 1973, p.48). Essa hipótese tem suas origens no dualismo cartesiano que divide a vida humana em uma parte física e, portanto, observável como qualquer outro processo físico, e em uma parte mental, a causa da primeira, privada e inacessível à observação. De acordo com o que Ryle chamou de 'a lenda dos dois mundos', fazer ou dizer algo significativo, implicaria em fazer duas coisas, isto é, considerar algumas proposições apropriadas e depois colocá-las em prática.

Entrar na mente do outro

Nessa perspectiva, o entendimento se identificaria com 'uma ampla gama de leituras mentais' (Geertz, 1973, p.52): a mente dos outros, como antecedente causal do comportamento, seria conhecida apenas por inferências extraídas do comportamento observado de um corpo cujos motivos constituiriam sinais de certos estados mentais por analogia com o que sabemos sobre nós mesmos. No Ryle crítico, as posições dos partidários do 'Legenda da vida dupla' são reduzidos a um 'erro de categoria', que estabelece uma analogia causadora improvável entre os acontecimentos da vida mental e os factos mecânicos, acreditando que a compreensão envolve a inferência além da meccanica do que é visto ao que acontece na mente do ator, 'um pouco 'como pelos movimentos dos sinais num entrocamento da ferrovia infere-se a partir das trocas dos carris as manovras que o operador esta fazendo’ (Ryle, 1949, p. 11). É impossivel inspecionar uma mente pois navegamos na ignorância das leis que governam os pensamentos da mente e sua relação com os movimentos corporais, não sujeitos às leis conhecidas da física ou às psicológicas ainda a serem descobertas (Ryle, 1949, p.41). Se é permissível ver aquilo que um corpo faz, não se pode inferir nada acerca de uma mente: qualquer alegação que deduz o pensamento a partir das obras é injustificada. Além disso, não só é impossível confirmar a semelhança com a observação da relação entre movimentos dos dois corpos e os pensamentos das respectivas mentes, mas também é bastante difícil de escapar do solipsismo 'a alma não pode escapar de uma absoluta solidão: apenas os corpos se encontram '(Ryle, 1949, p.8).

Mas o que é a mente?

Com base nisso, Geertz considera a mente não como o ponto oculto e privado de Arquimedes, a partir do qual explicar o comportamento. Em vez disso, a define como 'uma classe de habilidades, inclinações, habilidades, tendências, hábitos'. Referindo-se a Dewey, Geertz refere-se a ela como a um «fundo ativo e atento à espera das percepções que os fenomenos imprimem nela». Como tal, não é uma ação nem uma coisa, mas um 'sistema organizado de provisões que encontram sua manifestação em certas ações e coisas' (Geertz, 1973, p.103). Citando as palavras de Ryle, Geertz argumenta que a mente não é um 'lugar onde você trabalha ou joga, 'nem' de outra pessoa que trabalha ou brincadeiras por trás de uma teia impenetrável' ou 'outra ferramenta com a qual você trabalho ou um meio de brincar '(Ryle, 1949, p.47, citado por Geertz, 1973, p.99). Em vez disso, identifica o 'tabuleiro de xadrez, o anfiteatro, a mesa, a cadeira, o painel de instrumentos, o estudo, o campo de futebol,' como lugares onde 'as pessoas trabalham e jogam tão estúpidamente ou inteligentemente’ (Geertz, 1973, p.99). Falar da mente ou dos atributos mentais de uma pessoa não significa referir-se a uma loja que aceita objetos excluídos do mundo chamados 'físicos': ela inclui, em vez disso, o que a pessoa conhece, cuida e está sujeita a fazer no mundo comum.

Acção simbólica

Dizer algo de forma significativa de uma forma consciente não envolve, portanto, fazer um pouco de teoria e um pouco de prática, dizendo em voz alta ou mentalmente algo determinado por “algum outro movimento oculto”. Isso significa que, ao contrário, 'fazer uma coisa numa determinada maneira e com alguma atitude', não por acaso, mas voluntariamente 'com um método, com cuidado e ficando alerta' (Ryle, 1949, pp. 249-50 ). O exercício das qualidades mentais não se refere a episódios ocultos, ações sombrias, vistas como um preâmbulo das manifestações 'públicas', que ocorrem 'na mente'. Em vez disso, indica provisões que são exercidas pela observação de cânones e critérios. Seu desenvolvimento pode ser indiferentemente aberto ou coberto, pode consistir de ações executadas ou imaginadas, em palavras pronunciadas ou ditas apenas para si mesmas (Ryle, 1949, p.37). A esse respeito, Geertz enfatiza que pensar não é um ato oculto mas é uma capacidade derivada. No entanto pensar é um assunto privado: antes de tudo é um ato aberto realizado com os materiais da cultura comum como evidenciado pela forma como aprendemos a lidar ou lendo mentalmente, habilidades mais sofisticadas e complexas daquelas que se somam com papel e lápis ou lendo em voz alta (Geertz, 1973, p. 124). A análise do fator intencional é fundamentada por Geertz sobre a consideração do pensamento como atividade pública e intersubjetiva. Geertz argumenta que o pensamento consiste na construção e manipulação de sistemas simbólicos, não acontecimentos fantasmagóricos.

O método interpretativo

Navegar além

A antropologia realiza assim a sua importante vocação de combinar o método com as formas de vida possíveis, as formas variadas de organizar grupos sociais, tratar das necessidades, exercer o poder (Malighetti , 2016, pp. 169-178).

Nesta maneira colonial e etnocêntrica de abordar o outro até a própria possibilidade de comunicação tinha desaparecido. O reposicionamento de horizontes e a descentralização de perspectivas colocaram a necessidade de ter um espírito antropológico para navegar além, para longe do continente, em uma canoa juntamente com o nativo. (Geertz , 2001, p. 83)

Ter muitas disciplinas antropológicas que tornem a pesquisa mais especifica, e a etnografia mais eficiente na descrição social, permite assumir 'um papel significativo' na sociedade (Geertz  , 1998, p. 100):

A realidade etnográfica se apresenta diversificada e estratificada em divisões sociais (de etnia, religião, classe, gênero, língua, raça) isto permite de ampliar a possibilidade análise antropológica  entre povos completamente diferentes uns dos outros em interesses, modos de ver, riqueza e poder, e onde a alteridade torna-se verdadeiramente o objecto da análise antropológica. (Geertz, 1988, p. 156).

Antropologia como ciência interpretativa

Se deve redescobrir nas ciências sociais a dimensão interpretativa como semiótica para uma compreensão, interpretação e carácter construtivo do conhecimento (Malighetti, 2016, pp. 75 -100). A interpretação torna-se o instrumento de mediação de oposições: entre construir o conhecimento e espelhar a realidade entre teoria e observação, entre antecipação de sentido e compreensão, entre particular e geral, entre sujeito e objeto, entre empatia e distanciamento, entre indutivo e dedutivo.

A antropologia interpretativa se constitui quando se estabelece a relação entre interpretação e tradução num texto que interprete e explique a realidade etnográfica. É assim que se actualiza a compreensão a partir da dupla ligação entre ontologia e epistemologia: o sujeito conhece o seu objecto a partir de si mesmo e na medida que se relaciona com o objeto se auto-percebe a si mesmo. A compreensão antropológica parte da necessidade de comunicar com o outro na linguagem isto permite de interpretar o sentido profundo da realidade etnográfica.

O círculo interpretativo

Do ponto de vista etnográfico, o círculo hermenêutico constitui um importante mecanismo que obriga o antropólogo a examinar e resolver os problemas metodológicos, teóricos e éticos que surgem no relacionamento  com os seus interlocutores e as próprias práticas de escrita. Esse diálogo parte da compreensão dos próprios preconceitos, das deformações, erros e falhas que, sem incidentes, constituem os métodos interpretativos de pesquisa e o fundamento da antropologia reflexiva.

A tarefa do etnógrafo é encontrar maneira de explicar a realidade com sua própria linguagem, sem impor seus próprios preconceitos, evitando erros derivados de pressupostos que não se confirmam no objeto. Mesmo isto implique uma continua revisão da forma de abordar e interpretar. Porque o outro se apresenta sempre como imprevisível. A elaboração e articulação parte de preconceitos que só podem ser validadas em relação às 'próprias coisas'. Mas a verdadeira compreensão e interpretação do outro baseia-se em uma continua conversação e renovação constante do próprio projeto: a interpretação implica a rever continuamente as hipóteses e pressupostos com base para compreender o significado imediato que exige, mais tarde penetrar o texto que se elabora (ibidem, p. 313).

O método interpretativo

O método interpretativo nos convida a exercer uma avaliação contínua entre interpretações. Requer que o antropólogo relacione seus próprios pré-conhecimentos com as formas de vida que procura compreender. Induz a pôr em jogo e a reformular os modelos teóricos que o inspiraram no começo da sua análise, aqueles elementos que julgava constitutivos do horizonte etnográfico a partir dos seus pressupostos teóricos segundo os quais o antropólogo interpretava a realidade e a sua própria linguagem com a qual dava sentido ao mundo. Então os mitos e as técnicas de pesquisa etnográfica no campo pretendem uma elaboração teórica constante como um processo dinâmico e aberto, sempre produzindo novas 'acomodações' à realidade.

Essa perspectiva supera e resolve a dicotomia entre 'objetos' que existem em si e 'sujeitos' independentes. Que pensam em si As 'coisas em si' são compreendidas ao perceber que seu significado as transcende e aparece por meio do nosso entendimento. Da mesma forma, não podemos nos entender como 'sujeitos' se não entendermos que somos formados pela nossa experiência académica, histórica e pela nossa tradição e estamos sempre em relação com o mundo dos outros em constante mudança e variação: 'O outro se mostra tanto quanto nós o reformulamos quase o reconstruímos dando-lhe dignidade e contexto onde o ilegítimo se torna justificado e o estranho se torna normal a partir do que é nosso  mais do que pretender de fazer luz (Gadamer  , 2000, p. 351).  A primeira compreensão exige que o intérprete se autoperceba a partir do seu mundo. Como podemos pretender de perceber o outro se não o escutamos? Se o catalogamos como fosse um fenómeno estranho devemos nos conta que existe existencialmente numa história constituída e determinada que nos da os elementos indispensáveis para interpretar.

De acordo com os princípios do círculo hermenêutico, sujeito e objecto  o sujeito interpreta, em seu próprio horizonte, um objeto que adquire sentido quando quem o apreende o dignifica. Os objectos etnográficos adquirem dignidade antropológica quando o sujeito que os estuda se conhece a si mesmo numa continua abertura que ultrapassa o seu constituir ciência e quando elabora o seu conhecimento a partir de propriedades independentes livres das constrições sócio-culturais que o sujeito que conhece. Quem temos a frente não é pensado a partir de paradigmas que nós elaboramos, nem o antropólogo poderá ser 'neutro' ou assexuado como fosse um 'eunuco dentro dum harém’ (Geertz , 2000, p. 53). O sujeito é, ao contrário, deve se reconhecer como sujeito histórico, inserido em uma forma de vida e condicionado e fundado pela sua cultura e formatado pelo seu próprio conhecimento.

Os condicionamentos na compreensão antropológica

Tudo é condicionamento operado pelo evento histórico do précompreensão portanto circulo hermenêutico define a reciproca pertença sujeito-objecto dentro da qual o intérprete é mediado e medido com o seu objecto. As interpretações do antropólogo e dos indígenas se fundem e se lembram: uma não pode ser compreendida independentemente das outras.

Na operação cognitiva, o sujeito se leva consigo e por sua vez se deixa levar pelo objeto. Não há oposição entre dois mundos, nem estranheza, mas sim um vínculo de 'afinidade' e 'co-pertença’ que liga o antropólogo que interpreta ao objecto etnográfico que ele interpreta a partir da história e da linguagem.

Interpretar significa colocar em jogo os pré-conceitos como horizontes a partir dos quais a realidade é compreendida e como linguagem com a qual se dá sentido ao mundo. A actividade de pesquisa antropológica une sujeito e objecto dentro de um contexto, dentro duma tradição ou dum conhecimento que os coloca reciprocamente em relação (Gadamer, 1960, pp. 317-318).

«Na alegada ingenuidade do nosso entendimento, em que seguimos o critério da compreensibilidade, o outro se mostra a tal ponto apenas a partir do que é nosso, que um e outro elemento já não se distinguem com clareza»

Somente por meio de nossos pré-entendimentos podemos entender 'as próprias coisas' e obter acesso ao ponto de vista do nativo. Estar aberto às opiniões dos outros significa colocá-los dentro dos seus próprios sistemas de opinião ou, melhor, agir como sujeitos em relação a eles:

«Se nos colocarmos na situação do outro, vamos compreender, ou seja, iremos tomar consciência da alteridade, da individualidade que não se pode manipular do outro precisamente na medida em que nos colocamos na sua situação» (ibidem, p. 355).

Não  se trata de transposições entre almas diferentes, mas de ‘colocar-se' na situação do Outro oferece um sentido à relação de reciprocidade que permite o conhecimento.

A abertura para a alteridade não significa uma neutralidade objectiva como se fossemos inatingíveis pelo Covid por ter a mascara e o álcool gel armados dum método antropológico indiscutível. Devemos no esquecimento de nós mesmos basear-mo-nos na objetividade do método ‘sem serrar o galho no qual estamos sentados’ (Wittgenstein, 1953, 55, p. 41). A história nos leva do perigo de assumir a ilusória posição de um observador desencantado que foge dos seus próprios horizontes. Manter os próprios conceitos fora do processo interpretativo é impossível, é “uma contradição”, pois “interpretar significa realmente colocar continuamente em jogo os próprios preconceitos” (Gadamer, 2000, p. 456). O sujeito deve, portanto, usar o máximo de conhecimento possível para abrir seu mundo ao maior número de pontos de vista, usando teorias e modelos como ferramentas de uma caixa de ferramentas.

DO PONTO DE VISTA DO NATIVO

A perspectiva hermenêutica parte do preceito malinowskiano de apreender as coisas 'do ponto de vista dos nativos' (Malinowski  , 1966, p. 25). Geertz considera a ação humana a partir de descrições intencionais e das formas como os agentes sociais interpretam o significado de seus comportamentos. Ele escolhe como objetivo de sua etnografia a análise dos significados subjetivos que constituem as ações dos indivíduos no mundo social. Sua ‘semiótica da ação' considera o comportamento como uma ação simbólica: 'ação que tem um significado como um som emitido pela boca se torna palavra, como uma mistura de cores se torna pintura, como o escrever notas na linha se torna música' (Geertz, 1998, p. 47).

Ao combinar as indicações da hermenêutica com a sociologia e a fenomenologia permite elaborar uma 'fenomenologia científica da cultura' a partir da análise das estruturas de sentido em que vivem os indivíduos e grupos de indivíduos, em particular de símbolos e sistemas. de símbolos por meio dos quais essas estruturas são formadas, comunicadas, alteradas, reproduzidas. Rejeitando explicações mecanicistas em favor da negociação de entendimentos, Geertz propõe a elaboração de uma semântica de expressões significantes que inclui como 'a estrutura de sentido que informa a experiência [...] como ela é percebida por membros representativos de uma determinada sociedade em um determinado momento '(ibidem, pp. 341-342). Visto que o sentido não é intrínseco à realidade, mas atribuído a ela, “a explicação de suas propriedades deve ser buscada naquilo que aquele que a impõe - nos homens que vivem em sociedade” (ibidem, p. 390).

Descrição densa

A análise geertziana investiga o ponto de vista do actor colocando a ação em relação à configuração de ideais, atitudes e valores em que se baseia. Esta abordagem é definida por Geertz com uma expressão de Gilbert Ryle  , descrição densa (Ryle, 1949). Entende-se por descrição densa o método de observação criado por Clifford Geertz (1978), que objetiva proporcionar a compreensão das estruturas significantes implicadas na ação social observada, que necessita primeiramente ser apreendida para depois ser apresentada. A descrição densa consiste na reconstrução dos níveis não explícitos de significado das perspectivas dos atores e da multiplicidade das estruturas conceituais complexas que os informam. Ele representa a busca por 'um contexto' dentro do qual eventos sociais, comportamentos, instituições, processos podem ser inteligivelmente descritos , isto é, “densamente”. Isso requer orientar a análise a respeito dos atores, levando em consideração seu 'ponto de vista' e reconstruindo as estratificações culturais em que se baseia o sentido de sua ação.

 Geertz expõe o significado da análise etnográfica 'densa' comparando tiques e piscadelas involuntários: os primeiros são gestos simples enquanto os últimos são exemplos de comportamento significativo, que é o específico objeto da etnografia. Para o observador externo, os dois tipos de ação são idênticos. Somente referindo-se às perspectivas do agente e inserindo a ação em seu contexto ou forma de vida é que ela pode adquirir um significado (Geertz, 1973, pp. 42-43). U uso da ’descrição densa', é apenas 'em função de' uma certa convenção simbólica que podemos interpretar um acto como sendo capaz de significar uma determinada coisa: «o mesmo gesto de erguer o braço pode, dependendo do contexto, ser entendido como uma forma de cumprimentar, chamar um táxi ou expressar um voto» (Ricoeur, 1979, p. 99). Geertz explica desta forma os aspectos metodológicos da descrição densa. Tal abordagem das coisas […] não traz as regras ou o que acontece para o centro das atenções, mas o que Nelson Goodman chamou de 'versões do mundo' e outras 'formas de vida', epistemes Sinnzusammenhange ou sistemas abstratos. Nosso olhar se restringe aos significados, às maneiras como os balineses (ou qualquer outra pessoa) dão sentido ao que fazem, [...] colocando-os dentro de estruturas maiores de significado, e como eles mantêm essas estruturas maiores, estruturas de significado estáveis, ou pelo menos nos tente, organizando o que eles fazem dentro deles. (Geertz, 1983, pp. 226-227)

A perspectiva geertziana é substancialmente linguística e comunicativa. O sentido apreendido subjetivamente só pode se expressar em símbolos: a linguagem que falamos, ou melhor, que, Wittgensteiniano falando por nós, torna-se o meio de compreensão de nossos interlocutores. Como argumenta Ricoeur, a linguagem é a ferramenta para examinar 'o que é dito quando afirmamos de forma abrangente o que fazemos, por que o fazemos, o que nos leva a agir dessa forma, como e por que meios está feito, e em vista do quê ”(Ricoeur  , 1983, pp. 37-38). Na análise linguística pode-se apreender 'o signo em que o homem diz fazer [...] o signo ou índice de uma experiência detectado por meio dos enunciados, que são assim utilizados como expressão da estrutura da experiência' (Ibidem, p. 38).

Analisar os significados

A análise do significado subjectivo não envolve, diacronicamente, a esfera privada ou a intimidade. Em vez disso, é baseado na declaração pública da ação. Nesse sentido, o entendimento é “despsilogizado” (Ricoeur, 1979, p. 85). Centra-se no estudo sincrónico das formas objetivas em que a experiência é organizada (Ricoeur  , 1977, p. 38). Fenómenos culturais, como a linguagem, recebe seu significado a partir do contexto, como foi teorizado por De Saussure: «A linguagem é um sistema em que todos os termos estão unidos e no qual o valor de um só resulta da presença simultânea dos outros» (De Saussure  , 1916, p. 139),

A abordagem geertziana contrasta com os dualismos, reducionismos e fundamentalismos que postulam realidades 'internas' ao sujeito como antecedentes mentais ou causas finais da ação. Compreender não significa referir-se às intenções do autor por meio de relações empáticas ou repetições de si, identificações empáticas ou reduções fenomenológicas. Não é possível ao sujeito cancelar e colocar entre colchetes seu próprio ser e sua própria cultura, ou esquecer seu próprio saber e sua própria subjetividade. Geertz acredita que a identificação é impraticável: «Os relatos da subjetividade de outras pessoas podem ser construídos sem recorrer a reivindicações de capacidade extraordinária de cancelar a si mesmo e semelhantes» (Geertz  , 1998, p. 90). Por um lado, os antropólogos, como todos os seres humanos, baseiam-se ontologicamente em sua cultura e conhecimento (Geertz, 1998, pp. 73-97). Por outro lado, referindo-se a uma série de autores bastante heterogêneos (Husserl e Wittgenstein, GH Mead e Ryle), Geertz considera o pensamento humano fundamentalmente intersubjetivo, social e público: um 'tráfico de símbolos significativos'.

Tradições antropológicas

A tradição antropológica opõe-se, desde os primórdios evolucionistas aos resultados cognitivos, preocupada em identificar o elemento intencional e, portanto, significativo do comportamento, como algo antecedente mental à ação (Geertz  , 2000, pp. 209-210). Geertz apreende as origens desse preconceito no dualismo cartesiano e na presunção de ser capaz de dividir claramente a vida humana em uma parte física e, portanto, observável como qualquer outro processo físico, e em uma parte mental, e inacessível à observação. De acordo com essa doutrina, não se poderia esperar um conhecimento melhor do que o das obras. A mente dos outros - o 'espectro na máquina', segundo a expressão de Gilbert Ryle - seria conhecida apenas por inferências tiradas do comportamento observado de um corpo, cujos movimentos seriam sinais de certos estados mentais por analogia com o que nós sabemos sobre nós mesmos.

A leitura

Fazer ou dizer algo significativo, de acordo com o que Ryle chama de 'a lenda dos dois mundos', envolveria fazer duas coisas, isto é, considerar certas proposições como adequadas e depois colocá-las em prática: significaria fazer 'um pouco de teoria e um pouco de prática '. Pelo contrário, o exercício das qualidades mentais indica fazer apenas uma coisa de uma certa maneira, isto é, seguir disposições que são exercidas pela observância de cânones e critérios. Seu desenvolvimento pode ser indiferentemente público ou privado, pode consistir em ações realizadas ou imaginadas, em palavras faladas apenas para si mesmo (Ryle, 2007, p. 37). Em qualquer caso, não se refere a 'ações sombrias' que ocorreriam 'na mente' como um preâmbulo para as 'ações públicas'.

Geertz usa as ferramentas desenvolvidas pela filosofia de Ryle para apoiar a impossibilidade de rastrear do comportamento aos antecedentes causais mentais. Segundo Ryle, a concepção dualística se baseia em uma espécie de 'erro categórico': não só não é possível inspecionar uma mente como se inspeciona o mundo das coisas, mas as leis que governam as obras da mente e sua relação com os movimentos do corpo são desconhecidas. Não é possível confirmar pela observação a semelhança da relação entre os movimentos de dois corpos e os actos de suas respectivas mentes.

Crescimento da cultura e evolução da mente

 De acordo com Ryle, falar sobre a mente ou atributos mentais de uma pessoa não é falar sobre um depósito que contém objetos excluídos do mundo físico, mas sobre o que a pessoa sabe, tende e está sujeita a fazer no mundo comum (ibidem, p. 171). Geertz ilustra sua posição citando na íntegra uma passagem de Ryle na abertura de seu ensaio 'Crescimento da cultura e evolução da mente' A afirmação 'que a mente é o seu próprio lugar', como os teóricos podem interpretar, não é verdadeira, porque a mente não é um 'lugar', nem mesmo metafórica. Ao contrário, o tabuleiro de xadrez, a arquibancada, a mesa do aluno, a mesa do juiz, o banco do motorista do camião, o ateliê do artista e o campo de futebol são alguns de seus lugares. É aqui que as pessoas trabalham e jogam de forma inteligente ou estúpida. 'Mente' não é o nome de outra pessoa que trabalha ou brinca atrás de uma tela impenetrável; Não é o nome de outro lugar onde se realizam trabalhos ou jogos; E não é o nome de outra ferramenta com a qual o trabalho é feito, ou de outro instrumento com o qual se toca. (Ryle, 1949, p. 49, em Geertz, 1973, p. 99)

Abandonar a 'lenda dos dois mundos' significa rejeitar a ideia de que existe 'uma porta trancada com a chave ainda a ser descoberta' (Ryle, 1949, p. 35). As únicas manifestações a serem analisadas - e as únicas que podem ser consideradas 'mentais' - são as ações e reações humanas, o que o homem diz, com o tom de 'voz' ou com os gestos. Embora para julgar o sentido de uma ação seja necessário olhar para além da própria ação, isso não significa ir em busca de 'lugares secretos' como duplicatas ocultas da ação torna explícito. A caracterização do comportamento humano por meio de predicados mentais certamente requer ir além do aspecto perceptível da ação. No entanto, isso ir além não envolve causas ocultas removidas da investigação. Em vez disso, nos convida a considerar as habilidades e inclinações das quais a ação é uma implementação. Nessa perspectiva, Geertz considera a mente como o conjunto de disposições de um organismo para realizar determinado tipo de ação. O mental não é algo 'oculto', mas é totalmente observável e existe no mundo da vida.

A mente

'Mente' é um termo que denota uma classe de habilidades, inclinações, habilidades, tendências, hábitos: em uma frase, Dewey se refere a ela como um 'pano de fundo ativo e atento que espera e envolve tudo o que encontra'. E, como tal, não é uma ação nem uma coisa, mas um sistema organizado de disposições que encontra sua manifestação em certas ações e coisas. (Geertz, 1973, p. 103)

O princípio da interpretação subjetiva refere-se ao acesso aos fatos sociais e à apuração de dados. A análise coincide com a busca das habilidades e inclinações das quais a ação é a implementação: não causas ocultas, mas habilidades, hábitos, responsabilidades, inclinações.

Empreender o estudo da atividade cultural - uma atividade em que o simbolismo forma conteúdo positivo - é, portanto, não abandonar a análise social por uma caverna de sombras platônica. Os atos culturais, a construção, o aprendizado e o uso de formas simbólicas são eventos sociais como qualquer outro: são públicos como o casamento e observáveis ??como a agricultura. (Ibidem, p. 142)

Geertz elaborou assim uma metodologia que denomina de 'epistemologia prática' (Geertz, 1998, p. 192). Compreender o agir consiste em ser capaz de determinar uma referência à outra coisa.

A noção de significado, portanto, abre imediatamente e encontra o caminho para a sua avaliação empírica. Geertz articula os temas de Ryle com G.H. Mead, como “tráfico de símbolos significativos”. Desta forma, ele desenvolve uma metodologia científica que torna os pensamentos compreensíveis.

A visão de que o pensamento não consiste em processos misteriosos colocados no que Gilbert Ryle chamou de uma caverna secreta dentro da cabeça, mas em um tráfego de símbolos significativos - objetos encontrados na experiência (rituais e ferramentas; ídolos esculpidos e poças de 'água; gestos, signos, imagens e sons) nos quais os homens imprimiram um significado - torna o estudo da cultura uma ciência positiva como qualquer outra. (Geertz, 1998, p. 399)

Intencionalidade

A análise do fator intencional é fundamentada por Geertz  ele argumenta que o pensamento consiste na construção e manipulação de sistemas simbólicos, e não em 'eventos fantasmáticos':

O pensamento humano é fundamentalmente social e público [...] seu habitat natural é o quintal, o mercado e a praça principal da cidade. Pensar não consiste em 'acontecimentos na cabeça' [, ..] mas no trânsito daqueles que foram chamados, por G.H. Mead e outros, símbolos significativos - principalmente palavras, mas também gestos, desenhos, sons musicais, dispositivos mecânicos como relógios ou objetos naturais como joias - qualquer coisa que seja separada de sua realidade simples e usada para dar sentido à experiência.

Do ponto de vista de qualquer indivíduo, esses símbolos são amplamente dados [...]. Enquanto vive, ele os usa todos ou em parte, com o mesmo propósito: fornecer uma interpretação dos acontecimentos através dos quais ele vive.

Geertz usa várias fontes para considerar a intersubjetividade como o centro da subjetividade humana e para sublinhar o enraizamento da ação em práticas de linguagem e comunicação socialmente determinadas: dos ensinamentos de Parsons e Weber às pesquisas de Schütz, Habermas e a filosofia analítica. Criticando o que ele chama, citando Husserl, de 'teorias sobre a privacidade do significado' (Geertz, 1973, p. 50), Geertz não considera a simbolização uma operação 'psicológica' e Wittgensteinian identifica o significado com o uso:

Desistir da esperança de encontrar a 'lógica' da organização cultural em alguma 'esfera de significado' pitagórica não é abrir mão da esperança de encontrá-la. E voltar nossa atenção para o que dá vida aos símbolos: seu uso. (Ibidem, p. 390)

O sentido entendido subjetivamente é dado pelo uso, conexões simbólicas e esquemas sociais: depende de uma sintaxe pública, incorporada à ação e decifrável a partir da própria ação pelos atores do jogo social. Tanto o pensamento quanto o comportamento são expressões dos valores dominantes e padrões organizacionais de uma determinada comunidade. Pensar como um ato privado é uma habilidade derivada. A maneira como aprendemos a contar ou ler mentalmente é o suficiente para provar isso:

Na verdade, pensar como um ato público, aberto que inclui a manipulação deliberada de materiais objetivos, é provavelmente fundamental para os seres humanos; E pensar como um ato oculto, privado e sem recurso a esses materiais é uma capacidade derivada, ainda que não inútil. Como mostra a observação da maneira como os escolares aprendem a fazer matemática, somar números com a cabeça é, na verdade, uma habilidade mais sofisticada do que adicioná-los com papel e lápis, arranjar paus ou contar os dedos das mãos e dos pés. Ler em voz alta é uma habilidade mais elementar do que ler mentalmente, já que esta última nasceu na Idade Média. (Ibidem, p. 124)

Geertz nos convida a compreender o pensamento 'etnograficamente', descrevendo como ele assume seu sentido. (Geertz, 1983, p. 194). Tomando emprestada uma frase de Joseph Levenson, ele transforma o estudo do pensamento no 'estudo dos homens que pensam' (Geertz, 1973, p. 390). Isso não acontece em algum lugar secreto em particular, mas no mesmo lugar - o mundo social - onde os homens fazem tudo o mais: 'Os processos mentais do homem ocorrem na mesa do aluno ou no campo de futebol, no ateliê do artista ou no motorista do caminhão assento, na plataforma, no tabuleiro de xadrez ou na mesa do juiz ”(ibidem, pp. 132-133).

Ao fundir a análise cultural e social com a semiótica, Geertz redefiniu o estudo das intenções e ideias considerando-as 'sociológicas'. Não os achatam em um determinismo mentalista ou materialista, combinando tipos de consciência e tipos de organização social, ou lançando 'dardos causais de algum ponto dos recessos do último na direção geral do primeiro' (Geertz, 1983 , p. 194). Sua abordagem considera as ideias como 'visíveis, audíveis e ... táteis'. Os significados das motivações e intenções, expressos simbolicamente embora de forma vaga e fugaz, podem ser compreendidos através de 'uma investigação empírica sistemática', da mesma forma que 'o peso atômico do hidrogênio e a função das glândulas supra-renais' (ibidem, p. 152). Desta forma, Geertz elabora uma 'ciência empírica das idéias':

As ideias são significados transmitidos. Veículos são símbolos (ou em alguns sinais de uso), sendo um símbolo qualquer coisa que denota, descreve, representa, exemplifica, rotula, indica, evoca, pinta, expressa - qualquer coisa que de uma forma ou de outra significa. E tudo o que de uma forma ou de outra signifique intersubjetivo, portanto público, portanto acessível ao ar livre, explicação aberta e corrigível. Argumentos, melodias, fórmulas, mapas e pinturas não são ideais a serem contemplados, mas textos a serem lidos: assim como rituais, edifícios, tecnologias e formulações sociais. (Geertz, 1981, p. 135). A exclusão da identificação empática impossibilita a redução do esforço interpretativo nas perspectivas dos interlocutores, entendidos como guardiães de uma autêntica e pura essência cultural. Impede a inclusão do 'ponto de vista nativo' em um Perspectiva padronizada e universalizante.

O método hermenêutico

O método hermenêutico se baseia, antes, em uma 'fusão de horizontes' que produz 'a elevação a uma universalidade superior' (Gadamer, 2000, pp. 355-356). Essa perspectiva negociadora é conduzida inevitavelmente 'do ponto de vista do antropólogo'.

A abordagem nos convida a considerar a diferença inevitável que distingue os discursos antropológicos daqueles dos informantes. Esse hiato sustenta a importância e o papel do antropólogo, retirando-o do mecanismo empirista ingênuo de delegar a seus informantes a elaboração de perspectivas que o antropólogo simplesmente coletaria mais ou menos imediatamente. Ela descarta a afirmação de que os membros de uma cultura são eles próprios autores de interpretações antropológicas em termos não apenas internos à sua cultura, mas também à linguagem do tradutor (Geertz, 1983, p. 14).

A adoção do princípio weberiano da interpretação subjetiva supera a redução do entendimento às perspectivas dos atores sociais. Ao contrário, Geertz acredita que as interpretações antropológicas, por sua natureza, se diferenciam dos relatos. A força da interpretação reside hermenêuticamente na lacuna que permite ao analista construir um sentido que transcende seu autor. Como argumenta Gadamer, “compreender nunca é apenas um ato reprodutivo, mas também um ato produtivo [...] quando em geral é compreendido, entendido de forma diferente” (Gadamer, 2000, pp. 345-346). Os objetivos antropológicos são necessariamente diferentes dos nativos. O objetivo da antropologia interpretativa e das ciências hermenêuticas consiste em obter maior clareza no que diz respeito à compreensão imediata do ator:

O etnógrafo não percebe - e não pode perceber - o que seus informantes percebem. O que ele percebe, é bastante incerto, é o que eles percebem 'com' - ou 'por meio de' ou 'através de', ou qualquer que seja o termo. (Geertz, 1983, p. 74)

Cada encontro de campo ocorre dentro de um contexto intelectual formado pela tradição antropológica. A imersão analítica no mundo privado dos interlocutores é científica e na medida em que for relativa e participativa.

Bibliografia

Malighetti, R., & Molinari, A. (2016). Il metodo e l’antropologia. Il contributo di una scienza inquieta. Milano: Raffaello Cortina.

Geertz, C. (2001). Antropologia e filosofia. Frammenti di una biografia intellettuale. Bologna: Il Mulino.

Geertz, C. (1998). Interpretazioni di culture. Bologna: Il Mulino.

Gadamer, H.-G. (2000). Veritá e metodo. Milano: Mondolibri.

Malinowski, B. (1966). Argonauts of Western Pacific. London: Routledge.

Ryle, G. (2007). Il concetto di mente. Bari: Laterza.

Ricoeur, P. (1983). Ermeneutica filosofica ed ermeneutica bibblica. Brescia: Paideia.

Ricoeur, P. (2000). A metáfora viva. São Paulo: Loyola.

Saussure, F. de. (2005). Corso di linguistica generale. Bari: Laterza.

Geertz, C. (1998). O saber local. Petrópolis: Vozes.

Geertz, C. (2001). Nova luz sobre a antropologia. Rio de Janeiro: Zahar.

         13ª aula 9 de Janeiro: Os Método classicos 

Os grandes métodos de pesquisa

Não há um modelo único de pesquisa para todas as ciências, baseado no modelo de estudo das ciências da natureza. Radcliffe-Brown considerava a antropologia social um ramo das ciências naturais. O método da antropologia social era indutivo e consistia antes de tudo em identificar os mecanismos que operavam nas sociedades e permitiam seu funcionamento; depois na comparação desses mecanismos; era finalmente possível a sua generalização em lei. Este método orientou o investigador para uma recolha exaustiva de dados e para a sua colocação sistemática num todo que, pelo destaque das suas relações, se tornou significativo. As funções atribuídas a cada elemento individual, que compunha o sistema social, permitiram a formulação de novas hipóteses de pesquisa e sua verificação. Mas temos que confirmar que a maior parte dos erros da actividade antropológica a nível da reflexão encontra sua raiz numa falsa representação das ciências da natureza e colocada em relação com as ciências do homem. Estes pesquisadores se recusam a legitimar seus conhecimentos por processos quantificáveis que venham a se transformar em leis e explicações gerais. Afirmam que as ciências sociais têm sua especificidade, que pressupõe uma metodologia própria.

1- Augusto Comte

Os pesquisadores qualitativistas recusam o modelo positivista aplicado ao estudo da vida social. O fundador do positivismo. Augusto  Comte , (1798-1857), defendia a unidade de todas as ciências e a aplicação da abordagem científica na realidade social humana. Com base em critérios de abstração, complexidade e relevância prática, Comte estabeleceu uma hierarquia das ciências, em que a matemática ocupava o primeiro lugar, e a sociologia ou “física social”, o último, precedida, em ordem decrescente, da astronomia, física, química e biologia. Para Comte, cada ciência dependia do desenvolvimento da que a precedeu. Portanto, a antropologia náo poderia existir sem a biologia, que não poderia existir sem a química, e assim por diante.

Nesta perspectiva, na qual o objeto das ciências sociais deve ser estudado tal qual o das ciências físicas, a pesquisa é uma actividade neutra e objetiva, que busca descobrir regularidades ou leis, em que o pesquisador não pode fazer julgamentos nem permitir que seus preconceitos e crenças contaminem a pesquisa.

2 - Émile Durkheim (1858-1917)

Émile Durkheim (1858-1917), preocupado, como Comte, com a ordem na sociedade e com a primazia da sociedade sobre o indivíduo, também se posicionou a favor da unidade das ciências. Tomando “os factos sociais como coisas”, Durkheim defendia que o social é real e externo ao indivíduo, ou seja, o fenômeno social, como o fenômeno físico, é independente da consciência humana e verificável através da experiência dos sentidos e da observação.

Durkheim acreditava que os fatos sociais só poderiam ser explicados por outros factos sociais, e não por factos psicológicos ou biológicos, como pretendiam alguns pensadores de seu tempo. Defendendo a visão da ciência social como neutra e objetiva, na qual sujeito e objecto do conhecimento estão radicalmente separados, Durkheim teve uma influência decisiva para que as ciências sociais tenham adotado o método científico das ciências naturais.

3 - Wilhelm Dilthey (1833-1911)

Na segunda metade do século passado, alguns pensadores, influenciados pelo idealismo de Kant, reagiram criticamente ao modelo positivista de conhecimento aplicado às ciências sociais, acreditando que o estudo da realidade social através de métodos de outras ciências poderia destruir a própria essência desta realidade, já que esquecia a dimensão de liberdade e individualidade do ser humano.

A sociologia compreensiva, que tem suas raízes no historicismo alemão, distinguindo “natureza” de “cultura”, considera necessário, para estudar os fenômenos sociais, um procedimento metodológico diferente daquele utilizado nas ciências físicas e matemáticas. O filósofo alemão Wilhelm Dilthey (1833-1911) foi um dos primeiros a criticar o uso da metodologia das ciências naturais pelas ciências sociais, em função da diferença fundamental entre os objetos de estudos das mesmas. Nas primeiras, os cientistas lidam com objetos externos passíveis de serem conhecidos de forma objetiva, enquanto nas ciências sociais lidam com emoções, valores, subjetividades. Esta diferença se traduz em diferenças nos objetivos e nos métodos de pesquisa. Para Dilthey, os fatos sociais não são suscetíveis de quantificação, já que cada um deles tem um sentido próprio, diferente dos demais, e isso torna necessário que cada caso concreto seja compreendido em sua singularidade. Portanto, as ciências sociais devem se preocupar com a compreensão de casos particulares e não com a formulação de leis generalizantes, como fazem as ciências naturais.

Por meio de dois conceitos, Dilthey diferenciou o método das ciências naturais — erklaren —, que busca generalizações e a descoberta de regularidades, do das ciências sociais — verstehen —, que visa à compreensão interpretative das experiências dos indivíduos dentro do contexto em que foram vivenciadas.

4 - Max Weber (1864-1920)

O maior representante da chamada sociologia compreensiva é Max Weber (1864-1920), que se apropriou da idéia do comprehender proposta por Dilthey. Para Weber, o principal interesse da ciência social é o comportamento significativo dos indivíduos engajados na ação social, ou seja, o comportamento ao qual os indivíduos agregam significado considerando o comportamento de outros indivíduos. Os cientistas sociais, que pesquisam os significados das ações sociais de outros indivíduos e deles próprios, são sujeito e objeto de suas pesquisas. Nesta perspectiva, que se opõe à visão positivista de objetividade e de separação radical entre sujeito e objeto da pesquisa, é natural que cientistas sociais se interessem por pesquisar aquilo que valorizam. Estes cientistas buscam compreender os valores, crenças, motivações e sentimentos humanos, compreensão que só pode ocorrer se a ação é colocada dentro de um contexto de significado.

Frédéric Le Play, contemporâneo de Comte, foi um dos primeiros a estudar a realidade social dentro de uma perspectiva científica que considerava a observação direta, controlável e objetiva da sociedade como o método mais adequado à pesquisa social. Em La Reforme Sociale en France (1864), Le Play expõe o método das monografias, que se caracteriza por ser uma técnica, ordenada e metódica, de observação direta da sociedade. A sua preocupação de observar directamente e analisar sistematicamente as famílias operárias localizadas nos diferentes países da Europa onde pesquisou. De seus registros minuciosos e ordenados resultou um conjunto de monografias reunidas em Les ouvriers européens (1855).

No final do século XIX e início do século XX os estudos dos antropólogos nas sociedades “primitivas” foram determinantes para o desenvolvimento das técnicas de pesquisa que permitem recolher diretamente observações e informações sobre a cultura nativa. As sociedades estudadas diretamente por esses antropólogos são sociedades sem escrita, longínquas, isoladas, de pequenas dimensões, com reduzida especialização das atividades sociais, sendo classificadas como “simples” ou “primitivas” em contraste com a organização “complexa” das sociedades dos pesquisadores.

5 - Henry Lewis Morgan

O primeiro antropólogo a conviver com os nativos foi o americano Lewis Henry Morgan, um dos mais expressivos representantes do pensamento evolucionista. Jurista de formação, em 1851 publicou The League of Ho-dé-no-sau-nee, or Iroquois , considerado ο primeiro tratado científico de etnografia. A sua é uma base é sempre evolucionistica, ou seja uma metodologia utilizada por arqueólogos que constroem a história diacronicamente a partir de achados e estratificações. Embora a reconstrução histórica não seja decisiva para os antropólogos, de acordo com as propostas metodológicas mais recentes, é útil entender os sistemas, formas e funções que os diferentes sistemas sociais colocaram em prática para estabelecer metodologias antropológicas mais próximas dos dados científicos e matemáticos, ou seja, o análise de estruturas sociais. Como se vê, duas visões de evolução são oferecidas aqui: a primeira é a de invenções e descobertas que se relacionam entre si. A segunda é a das instituições que se desenvolvem ou se desenvolvem a partir do menos perfeito para o mais perfeito. Os cientistas sociais criaram grande confusão ao não distinguir entre formulações 'evolucionistas’. Tratam de explicar as mudanças sociais 'de forma misteriosa' como conclusões de um argumento cósmico que revela 'as implicações lógicas' que operam ao longo da história da sociedade. Essa seria a interpretação de Morgan sobre a evolução das instituições que se desenvolvem a partir de germes. Por outro lado, existem as formulações de Darwin em sua concepção de evolução biológica, onde as mudanças são explicadas como respostas a requisitos particulares em situações históricas específicas. Essa ideia aparece no parágrafo citado de Morgan quando ele fala sobre invenções e descobertas. Pensamos que essas duas concepções estão presentes nos evolucionistas clássicos, embora seja possível a ideia da explicação evolutiva como uma “exibição” de ideias ou germes presentes antes, seja algo que está desaparecendo.

6 - Franz Boas, 1883

Mas foram os trabalhos de campo de Franz Boas, entre 1883 e 1902, e, particularmente, a expedição de Bronislaw Malinowski às ilhas Trobriand, que consagraram a idéia de que os antropólogos deveriam passar um longo período de tempo na sociedade que estão estudando para encontrar e interpretar seus próprios dados, em vez de depender dos relatos dos viajantes, como faziam os “antropólogos de gabinete”.

Nos primeiros trinta anos do século XX, o trabalho de campo passou a orientar as pesquisas antropológicas. Boas, um geógrafo de formação, crítico radical dos antropólogos evolucionistas, ensinou que no campo tudo deveria ser anotado meticulosamente e que um costume só tem significado se estiver relacionado ao seu contexto particular. Ensinou também o “relativismo cultural”: o pesquisador deveria estudar as culturas com um mínimo de preconceitos etnocêntricos. Para Boas, o que constitui o “gênio próprio” de um povo repousa sobre as experiências individuais e, portanto, o objetivo do pesquisador é compreender a vida do indivíduo dentro da própria sociedade em que vive. Boas foi o grande mestre da antropologia americana na primeira metade do século XX. Formou toda uma geração de antropólogos, como Ralph Linton, Ruth Benedict e Margaret Mead, considerados representantes da antropologia cultural americana, que utilizam métodos e técnicas de pesquisa qualitativa somados a modelos conceituais próximos da psicologia e da psicanálise.

7 - Bronislaw Malinowski

 

A primeira experiência de campo de Malinowski foi em 1914, entre os Mailu na Melanésia. Impedido de voltar à Inglaterra, no início da Primeira Guerra Mundial, ele começou sua pesquisa nas ilhas Trobriand, de 1915 a 1916, regressou em 1917 para uma estadia de mais um ano. Esta longa convivência com os nativos teve uma influência decisiva na inovação do método de pesquisa antropológica. Argonauts of the Western Pacific , publicado em 1922, é um verdadeiro tratado sobre o trabalho de campo. A convivência íntima com os nativos passou a ser considerada o melhor instrumento de que o antropólogo dispõe para compreender “de dentro” o significado das lógicas particulares ca- racterísticas de cada cultura. Malinowski demonstrou que o comportamento nativo não é irracional, mas se explica por uma lógica própria que precisa ser descoberta pelo pesquisador. Colocou em prática a observação participante, criando um modelo do que deve ser o trabalho de campo: o pesquisador, através de uma estada de longa duração, deve mergulhar profundamente na cultura nativa, impregnando-se da mentalidade nativa. Deve viver, falar, pensar e sentir como os nativos.

Malinowski, considerado o pai do funcionalismo, acreditava que cada cultura tem como função a satisfação das necessidades básicas dos indivíduos que a compõem, criando instituições capazes de responder a estas necessidades. A análise funcional consiste em analisar todo facto social do ponto de vista das relações de interdependência que ele mantém, sincronicamente, com outros fatos sociais no interior de uma totalidade. A conduta de observação etnográfica, assim como a apresentação dos resultados sob a forma monográfica, obedecem aos pressupostos do método funcional.

Grande parte da renovação das ciências sociais se deve às influências (diretas ou indiretas) dos métodos de pesquisa de Malinowski. Argonauts of the Western Pacific provocou uma verdadeira ruptura metodológica na antropologia priorizando a observação direta e a experiência pessoal do pesquisador no campo.

Malinowski sugeriu três questões para o trabalho de campo: o que os nativos dizem sobre o que fazem? O que realmente fazem? O que pensam a respeito ao que fazem? Por meio do contacto íntimo com a vida nativa, exaustivamente registrado no diário de campo, Malinowski buscou as respostas destas questões preocupando-se em compreender o ponto de vista nativo.

Para Malinowski, a antropologia era o estudo segundo o qual compreendendo o “primitivo” poderíamos chegar a compreender melhor a nós mesmos. A rica experiência de campo de Malinowski, assim como suas propostas metodológicas, influenciaram decisivamente a aplicação de técnicas e métodos de pesquisa qualitativa em ciências sociais.

8 - Clifford Geertz

 

Na década de 1970, surge nos EUA, a antropologia interpretativa . Um dos principais representantes da abordagem interpretativa é Clifford Geertz, que propõe um modelo de análise cultural hermenêutico: o antropólogo deve fazer uma descrição em profundidade (“descrição densa”) das culturas como “textos” vividos, como “teias de significados” que devem ser interpretados. De acordo com Geertz, os “textos” antropológicos são interpretações sobre as interpretações nativas, já que os nativos produzem interpretações de sua própria experiência. Tais textos são “ficções”, no sentido de que são “construídos” (não falsos ou inventados). Esta perspectiva se traduz em um permanente questionamento do antropólogo a respeito dos limites de sua capacidade de conhecer o grupo que estuda e na necessidade de expor em seu texto, suas dúvidas, perplexidades e os caminhos que levaram a sua interpretação, percebida sempre como parcial e provisória.

Geertz inspirou a tendência atual da chamada antropologia reflexiva ou pós-interpretativa, que propõe uma auto-reflexão a respeito do trabalho de campo nos seus aspectos morais e epistemológicos. Esta antropologia questiona a autoridade do texto antropológico e propõe que o resultado da pesquisa não seja fruto da observação pura e simples, mas de um diálogo e de uma negociação de pontos de vista, do pesquisador e pesquisados.

Universo, amostras e o campo

 

 

A antropologia na para frente universo pesquisado pois seria cair numa abstração científica construída em função de um problema a ser investigado. Não é facil determinar o que deve ou não ser pesquisado porque o objecto de pesquisa não tem limites. Quando nos referimos à uma análise detalhada das amostras se pode adquirir conhecimento do fenômeno estudado a partir da exploração intensa de um único caso no campo. O estudo de caso não é uma técnica específica, mas uma análise holística, a mais completa possível, que considera o facto social estudado como total. As amostras podem ser um indivíduo, uma família, uma instituição ou uma comunidade, com o objetivo de compreendê-los em seus próprios termos6. O estudo de caso reúne o maior número de informações detalhadas, por meio de diferentes técnicas de pesquisa, com o objetivo de apreender a totalidade de uma  situação e descrever a complexidade de um caso concreto. Através de um mergulho profundo e exaustivo no campo, o estudo de caso possibilita a penetração na realidade social, não conseguida pela análise estatística.

No estudo de caso se aplica a observação direta, porque é o método que permite um acompanhamento mais prolongado e minucioso das situações. Essa técnica, complementada pelas técnicas de entrevista em profundidade, revela o significado que as situações possuem para os indivíduos, e que vão muito além daquilo que aparece no guião de perguntas. A tradição da pesquisa antropológica nas sociedades “primitivas” permitem de obter dados através de procedimentos de pesquisa que normalmente se relacionam com o método de estudo de caso, como a observação participante e as entrevistas em profundidade.

Não é possível formular regras precisas sobre as técnicas utilizadas em um estudo de caso porque cada entrevista ou observação é única: depende do tema, do pesquisador e de seus pesquisados. Como os dados  não são padronizados e não existe nenhuma regra objetiva que estabeleça o tempo adequado de pesquisa, um estudo de caso pode durar algumas semanas ou muitos anos. O pesquisador deve estar preparado para lidar com uma grande variedade de problemas teóricos e com descobertas inesperadas, e, também, para moldar o seu estudo. É muito frequente que surjam novos problemas que não foram previstos no início da pesquisa e que se tornam mais relevantes do que as questões iniciais.

9 - Pierre Bourdieu

 

Bourdieu, na sua Introdução a uma sociologia reflexiva , explica a importância da “interrogação sistemática de um caso particular” para retirar dele as propriedades gerais ou invariantes, ocultas “debaixo das aparências de singularidade”.

‹‹É ele [o raciocínio analógico] que permite mergulharmos completamente na particularidade do caso estudado sem que nela nos afoguemos, como faz a idiografia empirista, e realizarmos a intenção de generalização, que é a própria ciência, não pela aplicação de grandes construções formais e vazias, mas por essa maneira particular de pensar o caso particular que consiste em pensá-lo verdadeiramente como tal. Este modo de pensamento realiza-se de maneira perfeitamente lógica pelo recurso ao método comparativo, que permite pensar relacionalmente um caso particular constituído em caso particular do possível.›› (Bourdieu, 1989, pp. 32-33)

Historias de vida

 

 

Cada vida pode ser vista como sendo, ao mesmo tempo, singular e universal, expressão da história pessoal e social, representativa de seu tempo, seu lugar, seu grupo, síntese da tensão entre a liberdade individual e o condicionamento dos contextos estruturais. Portanto, cada indivíduo é uma síntese individualizada e ativa de uma sociedade, uma reapropriação singular do universo social e histórico que o envolve. Se cada indivíduo singulariza em seus atos a universalidade de uma estrutura social, é possível “ler uma sociedade através de uma biografia”, conhecer o social partindo da especificidade irredutível de uma história de vida individual. As Histórias de Vida é o melhor caminho para conhecer os indivíduos que tomam decisões estratégicas, suas origens, seus instrumentos para controlar e manter o poder, seus valores e interesses. Uma das dificuldades é que se limita àquelas pessoas que “querem falar”. Para muitos membros da elite, o silêncio e a discrição são a regra pois “quanto mais destacados e politicamente ativos forem os atores, mais conscientes são também do risco de conceder informações ‘verdadeiras’ sobre seu próprio desempenho. Os políticos aposentados, os excluídos, os exilados, os perdedores: aqueles que, ao contrário de temer o interesse do pesquisador, procuram denunciar injustiças, traições, corrupção e os interesses do grupo.

Bibliografia

 

Radcliffe-Brown, A. R. (1975). El método de la antropología social. Anagrama.

Goldenberg, Mirian. 2004. A Arte de Pesquisar. Como Fazer Pesquisa Qualitativa Em Ciências Sociais. Rio de Janeiro: Record.

Fabietti, U. (2011). Storia dell’Antropologia. Zanichelli.

Comte, A. (2008). Corso di filosofia positiva. In Vol. 1. Mondadori.

Durkheim, É. (1919). Les Règle de la Méthode SOciologique. Félix Alcan.

Dilthey, W. (2007). Introduzione alle Scienze dello Spirito. Bompiani.

Weber, M. (2003). A politica como vocação. Universidade de Brasilia.

Le Play, Frédéric. 1874. La Reforme Sociale En France. Vol. 1. Tours: Alfred Mame et fils.

Le Play, Frédéric. 1855. Les Ouvriers Européens. Paris: A L’Imprimerie Impériale.

Morgan, Henry Lewis. 1992. League of the Ho-Dé-No-Sau-Nee or Iroquois. New York: Dodd.

Malinowski, Bronislaw. 1976. Argonautas Do Pacífico Ocidental. São Paulo: Victor Civita.

Geertz, Clifford. 2008. A Interpretação Das Culturas. Rio de Janeiro: LTC.

Bourdieu, Pierre. 1989. O Poder Simbólico. Lisboa: Difel.

 

         14ª aula 7 de Março: história do método 1) Tylor

 

Tylor na História da antropologia

A posição de Tylor na história da antropologia é claramente excepcional. O filólogo alemão Max Müller chamava a antropologia ' a ciência do Sr. Tylor'. Em uma explosão de entusiasmo, R. H. Lowie (1974) escreveu que ‘ninguem mais dignamente  de Tylor representou o campo da etnologia'. A influência predominante de Tylor na antropologia moderna, no entanto, é devida tanto ao seu talento científico como também às suas qualidades de organizador e promotor. De ambos os pontos de vista a única figura comparável ao Tylor é o de Franz Boas, que teve um papel semelhante nos Estados Unidos (Palerm 2004 : 19).

Há dois fatos de relevância indiscutível na formação intelectual de Edward Burnett Tylor: a sua filiação a uma nova classe social que estava em ascensão desde o final do século XVIII, e sua adesão a um movimento ético-religioso dissidente, caracterizado naquela época por suas preocupações sociais, os Quakers. Dois outros fatos decisivos são importantes para perceber a atmosfera criada na Inglaterra: o evolucionismo biológico e social de Darwin e Spencer, e o processo histórico da expansão colonial do Império Britânico. A orientação evolutiva e o interesse pelas culturas não-ocidentais, tão características da antropologia de Tylor, são claramente a resposta a esse tipo de estímulo do ambiente social e histórico (ibidem).

Edward Burnett Tylor (1832–1917) é considerado o pai fundador da antropologia britânica. Tylor foi o primeiro professor de antropologia em Oxford; ele foi ativo no estabelecimento de associações e instituições antropológicas; e suas idéias contribuíram para os debates intelectuais do final do século xix, provocados por Darwin's On the Origin of Species. Seu amigo A. C. Haddon escreveu que os livros de Tylor, “embora repletos de vasta erudição, são tão sugestivos e agraciados por um humor tão calmo que se tornaram 'clássicos' e influenciaram profundamente o pensamento moderno. Desde a sua primeira aparição, foi reconhecido que um mentor estava guiando os destinos da ciência nascente ”(1910: 159).

Edward Burnett Tylor, o fundador da antropologia moderna, quis reconstruir o passado a partir da observação do presente. para procurar as origens e o desenvolvimento da história das culturas, por isso o pensamento e comportamento moderno deve seguir o curso da existência primitiva. Também estudando os vivos conheceremos os mortos.

 

Biografia

 

A família de Tylor era Quakers, então uma minoria religiosa, embora parte da classe média britânica. A religião de Tylor impediu a educação em Oxford ou Cambridge, que apenas concedia graus académicos aos membros da Igreja da Inglaterra. Tylor foi educado em escolas Quaker antes de ingressar na empresa de fundição de ferro familiar aos dezasseis anos. A educação Quakers de Tylor também levou a um agnosticismo que temperou os seus estudos sobre as origens da religião. Ackerman observa que o agnosticismo de Tylor o levou a abordar as religiões como sistemas intelectuais, em vez de expressões de crença, (1987: 77).

A familia de Tylor

 

Tylor nasceu em Camberwell, Inglaterra, no dia 2 de outubro de 1832. Seu pai Joseph Tylor tinha uma fundição de bronze bem encaminhada, que pertencia à família.  Ambos os pais eram Quakers e Tylor queria ser livre do formalismo religioso herdado deles.  O seu espírito de independência impediu-lhe de ser formado na cultura clássica: e não conseguiu ultrapassar os exames de ortodoxia religiosa, que eram requeridos  para a admissão à Universidade.  Em vez disso recebeu uma educação breve e informal numa escola mantida pela Sociedade dos Amigos.  Aos dezasseis anos, ele se juntou à empresa do pai e trabalhou por sete anos.  Em 1855, com a idade de 23 anos, apresentou sintomas de um esgotamento orgânico grave, por isso tentou recuperar com uma viagem distensiva em Mexico.  Com vinte e poucos anos, Tylor exibia sintomas preliminares de tuberculose e deixou asssim o negócio da família e viajou para latitudes mais quentes para recuperar sua saúde.

Como se tornou antropologo

 

Na primavera de 1856, ele estava em Cuba.  Em Havana dentro de um autocarro, escutou um passageiro que usava o pronome arcaico 'thou' que, durante este tempo, era uma fraseologia típica dos Quakers.  Tylor se aproximou do estrangeiro e apresentou-se, era Henry Christy, um arqueólogo e etnólogo que teria transformado a sua vida. Os dois imediatamente simpatizaram, Christy persuadiu Tylor para acompanhá-lo numa expedição arqueológica no México e assim Christy descobriu Tylor enquanto antropólogo.  Durante a viagem com frequentes paradas, o arqueólogo Christy procurava ravinas na estrada em busca de pontas de flechas de obsidiana (Tylor 1861: 35). Sob a orientação de Christy (mais velho dele de 20 anos), o poder natural de observação que ele possuia, e seus juizos equilibrados foram direcionados para reconstruir a pré-história do México desenvolveram-se. Descobriu achados pertencentes aos Mayas e aos Incas, bem como tradições populares, costumes, crenças e lendas observadas e colhidas entre as populações do México.  Ele observou que muitos costumes eram parecidos ou mesmo idênticos aos costumes dos povos antigos. Os dois viajadores visitaram sítios arqueológicos e procuraram por repertos comparando-os com as descobertas recentes da Europa.

Os dois partiram para uma viagem de quatro meses pelo México, desta viagem saiu o primeiro livro de Tylor, um diario de viagem com o título Anahuac: Or, Mexico and the Mexican, Ancient and Modern (1861). Mas a maior parte do livro Anahuac descreve o México moderno, não antigo.

Experiência mexicana

 

Tylor e Christy percorreram plantações de cana-de-açúcar, fábricas e lojas de tecidos e fazendas. Ele descreve a instabilidade política e a pobreza do México. A educação anticlerical de Tylor irrompe em uma série de diatribes contra a Igreja Católica. Suas críticas são tão pungentes que o próprio Tylor admite: “Parece difícil estar sempre atacando o clero católico romano”, mas depois passa a culpar os padres pela “ignorância desalentadora” e pela pobreza da população (1861: 126). Em Anahuac , Tylor se mostra um escritor informado e observador, embora não sem preconceitos. Nos quatro anos seguintes, Tylor amadureceu e se tornou um estudante mais sério da cultura humana. Em 1865, ele publicou Pesquisas sobre o Início da História da Humanidade e o Desenvolvimento da Civilização, onde delineou os temas analíticos que ele mais tarde desenvolveu no seu livro “A primeira história da cultura da humanidade”, escreveu Tylor, “deve ser tratada como uma ciência indutiva, coletando e agrupando fatos” (1964: 137). Tylor vasculhou os relatos dos missionários, os diários dos exploradores, os textos antigos e os relatórios etnológicos para procurar semelhanças nas culturas humanas. “Quando artes, costumes, crenças ou lendas similares são encontrados em várias regiões distantes, entre povos que não são conhecidos por serem da mesma raça”, perguntou Tylor, “como essa similaridade é explicada?” (1964: 3).

 

Sobrevivências

Ele observou, por exemplo, que a prática dos penitentes mexicanos, de fustigar-se na igreja sob as implacáveis exortações de um monge, eram idênticas aos rituais egípcios de celebração em honra de Ísis.  Este primeiro interesse na sobrevivência de costumes antigos na sociedade civil foi o ponto de partida de um dos mais importantes resultados por ele alcançados em antropologia: a doutrina das sobrevivências. Elaborando a teoria das sobrevivências, segundo a qual as crenças e tradições podem ser explicadas pela persistência, ao longo do tempo, de hábitos e processos mentais que perderam o seu significado original ou assumiram outro. Tylor denominou de "sobrevivências" (survivals) aos diferentes elementos culturais (que já haviam perdido sua importância específica) e através dos quais ele tentou reconstruir os diferentes estágios de desenvolvimento (selvageria, barbárie, civilização), compartilhando com Morgan que se tratava de fases sucessivas, mas acrescentando que alguns deles podem permanecer inalterados e decair posteriormente.

O método de Tylor

A experiência de campo pessoal de Tylor foi reduzida à viagem ao México e a uma breve visita aos índios Pueblo, no sudoeste dos Estados Unidos. Apesar disso, observa Lowie (1974), Tylor 'era tudo menos um antropólogo de gabinete ... [Ele se dedicou] ao estudo da cultura no coração da metrópole [de Londres].

Desta forma, Tylor não foi apenas um dos criadores da teoria e do método antropológico, mas também um grande organizador da antropologia acadêmica, um notável professor e um extraordinário divulgador  (Palerm 2004: 21). Há uma diferença radical com Spencer e Morgan. Pois o que lhe interessava era a história de elementos culturais separados e não elaborar sociologicamente sistemas sociais totais. Isso aparece claramente na primeira parte de sua carreira científica. Pelo menos até 1889, quando ele publica o seu famoso artigo 'Sobre o método de investigar o desenvolvimento de instituições aplicadas às leis do casamento e da descendência’ (1889), Tylor não se preocupa em analisar a mudança geral e sistemática nas sociedades humanas. Tylor não usa muito o conceito de evolução e não tenta dar uma definição formal do mesmo. Aplica-se de maneira bastante simplista a qualquer sucessão de formas específicas e não oferece nenhum critério para mostrar o processo evolutivo (Veiga 2010: 25).

Essas idéias serão repetidas continuamente. Frequentemente, ele diz que nenhum estágio da cultura aparece espontaneamente, sem crescer ou se desenvolver-se num estágio anterior, e afirma que esse é o princípio que todo pesquisador deve manter se quiser conhecer o mundo em que vive ou a história do passado.

Devemos considerar que Tylor usa o termo 'sobrevivências' ou sobreviventes como meios para demonstrar a sequência evolutiva. Estes são definidos como os elementos da cultura que passaram pela força do costume para os estágios posteriores daquele em que se originaram. De acordo com Tylor, as 'sobrevivências' provam que os estadios de cultura que podemos observar evoluíram de algo mais antigo.

Como Morgan, ou outros autores anteriores, Tylor divide a pré-história das sociedades humanas em três grandes etapas. É a selvageria em que os homens sobreviviam com a caça e coleta aplicando uma tecnologia muito limitada, a barbárie que é alcançada quando a agricultura aparece nas cidades permanentes e na vida urbana com grandes melhorias nos conhecimentos, costumes e governo. A civilização aparece como 'uma melhoria geral da humanidade por uma organização superior do indivíduo e da sociedade'. É verdade que é um esquema menos elaborado que o de Morgan, mas basicamente é bastante similar.

É verdade que o evolucionismo de Tylor foi aplicado mais à religião, mito e linguagem. Nisso há uma diferença muito grande entre ele e Morgan, pois, para ele, a religião não poderia ser tratada do ponto de vista evolucionista porque a religião primitiva tinha um caráter 'grotesco' e 'ininteligível'. Entretanto, Tylor afirma que a religião primitiva tem uma certa racionalidade e, portanto, a evolução da religião demonstrou uma compreensão racional do mundo. Ele aplica o método evolucionista perspectivando uma evolução a partir da crença primitiva em seres animados, depois em espíritos, depois em um panteão politeísta e depois no monoteísmo (Veiga 2010: 26).

Origem das sociedades

O problema que afectou Tylor era origem independente ou a difusão das instituições culturais. Essa pergunta tornou-se o cerne da antropologia com implicações importantes para o pensamento social, político e religioso. 

 

Catastrofismo

A teorias de cataclismos pertencia à cosmologia bíblica,  Tylor provou que a evolução da terra durou vários milhões de anos, não somente alguns milênios, como alegava a autoridade das Escrituras.  Com a doutrina das 'causas uniformes' que argumentava que no passado os progressos da mudança geológica eram semelhantes àqueles que podem ser observados hoje, foi possível esboçar uma cronologia da formação da crosta terrestre.  Em arqueologia, em 1857 por Boucher de Perthes, descubriu a existência do homem no Paleolítico.

 

Evolucionismo

 havia a teoria de que os seres humanos evoluiram gradualmente, não só dos animais, mas, de um estágio primitivo da humanidade, comparável ao dos selvagens.  O selvagem, nu, poligamo e seus deuses pagãos, apareceu muito longe da moralidade cristã e indigno de ser apresentado como o primeiro resultado da criação humana feita por Deus.

Evolucionismo: Lubbock

Sir John Lubbock expressou estas preocupações, afirmando que «se o passado do homem tinha sido uma história de degeneração, as nossas expectativas para um futuro de progresso eram infundadas». 

Evolucionismo: Tylor

Tylor, convencido da racionalidade do homem e das suas possibilidades de melhoria, era de opinião, que as implicações da teoria da degeneração ameaçavam seriamente a confiança do próprio homem em si mesmo e no seu futuro.  Se se quisesse manter a fé no progresso, era necessário consolidar a teoria evolucionista da civilização, removendo todas as dúvidas. 

 

Degeneracionismo

Para combater esta heresia, foi proposta a teoria da degeneração ' (ou degradação) como uma alternativa à teoria evolucionista.  De acordo com esta teoria a condição em que se encontrava o homem, logo que acabava de ser criado, era altamente moral e civil, mas os homens, sofreram um processo de degeneração e inversão ao estado selvagem — tornaram-se um pária da raça humana '

A teoria da degeneração tornou-se uma alternativa comum para uma concepção evolutiva do desenvolvimento ' e foi patrocinada por pessoas com autoridade, incluindo Richard Whately, Arcebispo de Dublin e o Duque de Argyll.  Esta teoria, se por um lado, estabeleceu a glória das origens humanas, tinha no entanto uma visão sombria do futuro.  Aqueles que consideravam com  otimismo a capacidade de melhoria humana no século XIX não podiam tolerar a teoria da degeneração e sentiam que tinha de ser travada. 

 

antropologia evolucionista

 

Teoria do desenvolvimento cultural

Duas eram as premissas gerais necessárias para fundar a teoria de desenvolvimento cultural progressivo:

(1) a afinidade fundamental da mente humana e,

(2) a prioridade do homem primitivo na série cronológica. 

O segundo livro de Tylor  Pesquisas acerca da pré-história da humanidade, de 1865, tratou amplamente da primeira pergunta, e o seu terceiro livro A cultura primitiva, do 1871 concluíu fixando a segunda premissa.

 

Holismo

Tylor foi o primeiro estudioso sério das culturas que abraçou todo o campo do homem e do seu ambiente.  Na sua opinião, a antropologia deveria estudar o homem em termos de corporeidade, do ambiente físico-geográfico e cultural e a alma.  Tylor não conduziu pesquisas pessoais no trabalho de campo, nem sequer era um antropólogo de mesa.  Ele em qualquer lugar se encontrasse estudava as componentes culturais: Dedicou a maior parte do seu tempo a várias formas de literatura que, tratavam da história da civilização e das instituições, artefatos, crenças e costumes dos povos primitivos

Edward Burnett Tylor

progresso cultural

evolução cultural por estadeações

de sociedades menos complexas a sociedades mais complexas

existem povos superiores e inferiores

há possibilidade de regressão cultural

antropólogo de mesa

Ele tornou-se, como se fosse 'um cosmógrafo de livros' o seu conhecimento sobre esta literatura foi tão amplo, quanto profundo.  Sendo que não se deslocava no campo, Tylor tinha que depender em grande parte de dados provenientes de relatórios e publicações de viajantes, missionários, aventureiros, conquistadores e marinheiros e assim por diante. 

 

Esses relatórios eram na sua maioria fragmentários, desprovidos de objetividade e senso crítico e geralmente não confiáveis.  A utilização acrítica deste tipo de material por parte de outros estudiosos tinha provocado grande confusão e contradições.  Na prática, se poderiam atribuir cada coisa às culturas primitivas, apoiados nas citações provenientes dessa literatura.

 

Tylor foi perfeitamente ciente deste problema e definiu os cânones da 'evidência interna que podia ser aplicada para identificar, nesta massa de evidências, dados fiáveis.  O seu principal instrumento era a 'evidência de recorrência' ou 'involuntárias coincidências', base para as declarações serem avaliadas de acordo com quantas vezes eles apareciam em outros relatórios, sendo a mais prováveis aquela que recorriam com maior exclusividade. 

 

Depois de ter conseguido um alto nível inserindo a antropologia na Universidade de Oxford, Tylor enviou especialistas em todo o mundo como 'pesquisadores experimentais sobre a natureza humana.' Entraram na área de estudo com instruções e técnicas precisas para recolher dados e para sistematizá-los, a fim de descobrir relações úteis e elaborar teorias. A coisa mais impressionante foi a massa real de material que Tylor coletou e utilizou.

Etnografia de Tylor

No seu livro A Cultura Primitiva. Tylor é famoso pela cautela e prudência com a qual ele propôs suas teorias e seus conceitos. Muitas vezes ele chama de 'infinito respeito pelos factos', deixando que os fatos em si falassem ele argumentou que a lista dos fatos deve ser a pedra angular do tratamento dos dados de tal modo que uma vez sistematizados pudessem evidenciar a lei geral que os sustentava.

Tylor enfrenta seu argumento principal — o homem — com um sentido da relatividade das culturas.  Medir o grão de outros povos com o próprio alqueire ', foi, o erro fundamental a evitar em cada momento. Em particular, Tylor estava convencido de que o ' impulsos internos do comportamento humano, crenças e atitudes que formam o substrato das instituições contêm os sinais mais fortes da história do desenvolvimento do homem.  Mito, folclore, religião e costume eram as fontes de informação que é necessário estudar juntamente com artefatos e documentos escritos, para uma reconstrução digna de fé. 

Um dos problemas de Tylor era de fixar a afinidade do comportamento espiritual humano recorrendo à teoria da unidade psíquica da do género humano como ele a chamava.  As semelhanças entre os artefatos, costumes e crenças das culturas do passado e da idade do presente já tinham sido observadas por muitos estudiosos, mas Tylor viu que onde há um contato de culturas resultando na transmissão de caracteres culturais, as semelhanças não são índice de desenvolvimento independente.  O que se devia provar era que homens diferentes em circunstâncias semelhantes teria agido da mesma maneira.  Este argumento teria de ser baseado mais em dados psicológicos que históricos.  Em algumas áreas, havia poucas variações, bem como na escritura ideográfica e na linguagem dos sinais, nos jogos, nos Provérbios e adivinhas, no mito, lenda, folclore e religião.  Estes caracteres representam com maior rapidez o processo mental não contaminado pela prática e fornece dados para a reconstrução mais segura do conhecimento humano como tal.  Como é evidente no seu livro Pesquisas (1865), Tylor começou a apresentar uma história de civilização baseada em primeiro lugar no exame da linguagem, mitos, rituais, costumes e crenças.

As afinidades que existem na língua dos sinais em sociedades separadas no espaço e no tempo eram por Tylor provas convincentes que em todos os momentos e em todas as regiões a mente do ser humano funciona quase da mesma maneira a menos que não seja influenciada pela cultura  A história da magia colocar em evidência um fenômeno: a projeção no exterior, na realidade material, dos processos internos do pensamento individual. Após a fixação da unidade psíquica da humanidade, o próximo passo de Tylor foi estabelecer uma reconstrução cultural que iria ilustrar o desenvolvimento progressivo do homem primitivo para o homem civilizado.  Ele fez este trabalho na publicação da  Cultura primitiva (1871), um clássico da antropologia que marca o início do estudo científico das culturas.  Disto emergiu duas contribuições importantes para a antropologia cultural: a 'doutrina das sobrevivências' e a teoria do 'animismo'. 

  Quanto à teoria do animismo, que exerceu tão grande influência, pode ser útil considerar primeiro o caminho onde Tylor enfrenta o problema do mito em geral, porque este problema constitui a base da discussão sobre o animismo. Para Tylor o mito nasceu numa fase infantil do desenvolvimento humano. Os Mitos representavam tentativas grosseiras, das populações infantis essencialmente racionais de compreender o significado do seu ambiente e das suas experiências. 'A lenda - ele diz -. Não diz mais nada, que a história eterna da vida cotidiana no mundo' Ele acreditava que o mito e a lenda, antigamente constituíam a filosofia primitiva da natureza e da vida.

O Animismo

Tylor definiu a crença do 'animismo' em seres incorpóreos e acreditava que era os mais antigo dos eventos religiosos.  A teoria do animismo de Tylor inclui a origem e o desenvolvimento de todos os sistemas religiosos. 

 Animismo é baseado em um conceito muito simples: que sempre que os homens sonham à noite, têm alucinações de dia e morrem, isto demnstra a crença nos espíritos.  Ele distinguiu o animismo dos povos primitivos em dois conceitos chaves: o conceito de alma e a crença em outros espíritos que é seu corolário.  Para Tylor, o conceito de alma foi o resultado de um raciocínio bruto, mas não sem fundamento, realizado pelo homem primitivo.  O selvagem, como todos os homens, encontra-se, cada dia a frente do dualismo do ser.  Com a morte, vê desaparecer certos fenômenos: respiração, pulso, consciência e a capacidade de executar movimentos voluntários.  O corpo fica, mas esse conjunto de fenômenos conhecidos como 'vida' desapareceram. A Vida, ou a alma, deixou o seu corpo.  Sonhos e aparições indicam um dualismo do mesmo tipo.  Em tais casos, aparecem formas humanas que são imagens de indivíduos que podem ser mais ou menos distantes, ou mesmo mortos.  O selvagem razoavelmente conclui que o corpo humano tem uma cópia imaterial que pode deixar e ter experiências independentes.  Segundo Tylor, a mentalidade primitiva recolega estes  dois atributos intangíveis e separáveis do corpo: a alma e a cópia — e os resume numa alma fantasma ou alma-espectro.  É essa alma-espectro que explica a morte, sonhos, visões, sono, desmaios, doença, coma e outros fenômenos deste tipo; São condições, onde os processos vitais são enfraquecidos, alterados ou cancelados no total.  Ele fornece insights sobre a psicobiologia inteira do homem primitivo: ' é uma imagem humana subtil e incorpórea, cuja natureza é a do vapor, um tênue véu ou uma sombra; é o princípio da vida e pensamento do indivíduo animado por ele.  A consciência e a vontade desta alma-espectro; Pode deixar o corpo e passar rapidamente de um lugar para outro; É principalmente intangível e invisível, mas às vezes também se manifesta num poder físico, especialmente quando ele aparece a homens acordados ou dormindo como sendo um fantasma separado do corpo e preserva a aparência; continua a existir e aparece aos homens após a morte do corpo; pode tomar posse dos corpos dos homens, animais e até mesmo das coisas e agir sobre eles.  Para apoiar esta teoria, Tylor cita muitos exemplos de sacrifícios de animais durante os enterros humanos cujo conceito informador é que a alma-espectro dos animais sacrificados acompanhará a alma-espectro do indivíduo e servi-lo-à noutro mundo. Como ele os serviu bem neste.  Em algumas culturas primitivas, juntamente às crianças se enterram cães porque eles os possam cponduzir para a terra das almas.  Os cavalos eram levados para o túmulo do guerreiro, sacrificados e jogados no tumulo juntamente ao seu dono. 

O evolucionismo baseia-se na ideia que as mudanças históricas na vida da humanidade segue leis bem definidas que se aplicam a todas as culturas e que colocam no mesmo plano todas as etnias e todos os povos da terra (Boas 1920: 311). Esta ideia é claramente expressa por Tylor na introdução a Primitive Culture onde se explica que há uma evolução uniforme, trata-se da teoria do uniformismo.
«Se o campo é delimitado pela história desse ramo do mesmo que nós aqui chamamos de cultura, ou seja, história, não de tribo ou de populações, mas do estado do conhecimento, da religião e da arte, dos usos, a tarefa da pesquisa resulta ao interior de um horizonte de muito mais modesto» (Tylor 1873: 11).
A tarefa do etnógrafo é àquela de classificar esses detalhes a fim de estabelecer a sua distribuição histórico-geográfica e estabelecer relações que sejam intercorrentes (Tylor 1873: 13).
Há pessoas que se concentram tanto sobre a vida que chegam a afirmar de não serem capazes de perceber a ideia da vida de uma comunidade no seu conjunto. Vêm as árvores, mas não a floresta (Tylor 1873: 17).
O estudioso que analisa o mundo mítico sem ter a capacidade de transferir-se nesta atmosfera imaginativa pode falhar tão completamente no avaliar a profundidade e a intensidade de significado desse mundo de tal maneira que se atrapalha com uma invenção estúpida  (Tylor 1873: 42).
Quando duas povoações de nível cultural diferente estabelecem contactos, a população mais rude acaba por assimilar a técnica científica mais elevada, mas, ao mesmo tempo, a sua própria cultura não progride e acaba por desaparecer (Tylor 1873: 120).

Bblografia

 

Nicholls, Um. 2016. «Max Muller e o método comparativo». Revista Estudos Críticos Comparativos.

Lowie, Robert H. 1917. «Edward B. Tylor». American Anthropologist 19(2):262–68.

Palerm, Angel. 2004. Historia de la etnologia. Tylor e los professionales británicos. Cidade do México: Universidad Iberoamericana.

Haddon, Alfred Cort. 1910. History of Anthropology. New York: Putnam.

Tylor, Edward, Burnett. 1877. Anahuac. Mexico and the Mexicans, Ancient and Modern. London: Longmans.

Tylor, Edward Burnett. 1878. Researches into the Early History of Mankind and the Development of Civilization. Boston: Estes&Lauriat.

Veiga, Ubaldo Martinez. 2008. História de la antropologia. Madrid: Universidad Nacional.